Acórdão nº 1969/12.8TXLSB-N.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 27 de Setembro de 2022
Magistrado Responsável | MARIA CLARA FIGUEIREDO |
Data da Resolução | 27 de Setembro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - Relatório.
Por decisão proferida autos de processo de liberdade condicional com o n.º 1969/12.8TXLSB-N, que correm termos no Juízo de Execução de Penas – J1 do Tribunal de Execução de Penas de Évora, não foi concedida a liberdade condicional ao arguido AA, identificado nos autos, atualmente preso no Estabelecimento Prisional ....
Inconformado com tal decisão, veio o arguido interpor recurso da mesma, tendo apresentado, após a motivação, as conclusões que passamos a transcrever: “1ª - A decisão que negou a liberdade condicional ao arguido não foi minimamente fundamentada no que concerne aos motivos de facto e de direito; 2ª - A douta decisão recorrida não especifica/elenca ou descreve nem os factos, nem o direito que levaram à negação de liberdade condicional ao arguido; 3ª - É consabido que estando em causa nos autos a negação da concessão da liberdade condicional depois de cumpridos 2/3 da pena de prisão o Tribunal se deve ater exclusivamente às necessidades de prevenção especial; 4ª – A decisão de recusa da liberdade condicional não pode ser tomada de ânimo leve e com recurso a puras formulas de retórica jurídica, carecendo, pois, de fundamentação, especificando os motivos de facto e de direito da decisão” (artº 146º, nº 1 do Cód. Exec. Penas e Med. Priv. Liberdade); 5ª - Pelos motivos elencados em “III”, a sua reaproximação ao meio livre já decorre à tempo suficiente e que permite antever um juízo de prognose francamente favorável relativamente ao seu comportamento futuro em conformidade com o direito, socialmente responsável e sem cometer crimes; 6ª – Perante a actualidade dos factos, mormente os supra elencados em “III” 10. a 17. e, salvo melhor e mais douto entendimento, considera o arguido que os mesmos demonstram um firme e sério percurso de reaproximação ao meio livre por tempo superior a DOIS ANOS e que permite antever um juízo de prognose francamente favorável relativamente ao seu comportamento futuro em conformidade com o direito, socialmente responsável e sem cometer crimes; 7ª - A decisão de privação de liberdade condicional do arguido terá necessariamente de se alicerçar em fortes indícios de que o mesmo, caso fosse colocado em liberdade, teria sérias probabilidades de vir a delinquir e a comportar-se de forma socialmente irresponsável, o que não se refere na douta decisão recorrida, nem se verifica in caso; 8ª - O arguido já está preso à mais de 11 anos e meio, já cumpriu 2/3 da pena de prisão, sem qualquer repreensão disciplinar, sempre se manteve ocupado laboralmente num percurso ininterrupto e isento de reparos negativos e responsável, tanto no interior na cadeia como no regime aberto ao exterior há mais de DOIS ANOS; 9ª – Motivos porque se entende que deve ser revogada a douta decisão recorrida e substituída por outra que conceda a liberdade condicional ao arguido; 10ª - A douta decisão recorrida violou, entre outras, as seguintes disposições legais: a) artº 146º, nº 1 do Cód. Exec. Penas e Med. Priv. Liberdade; b) artº 61º, nº 3 do Cód. Penal.” Termina pedindo a revogação da sentença recorrida e a sua substituição por outra que conceda a liberdade condicional ao condenado.
*O recurso foi admitido.
Na 1.ª instância o Ministério Público pugnou pela improcedência do recurso e pela consequente manutenção da decisão recorrida, tendo, embora sem formulação de conclusões, apresentado a seguinte argumentação: “III. Da resposta: Salvo o devido respeito, que é máximo, entendo que o recorrente não tem razão.
-
Da violação do artigo 146.º, n.º 1, do Código de Execução de Penas e Medidas Privativas de Liberdade: O tribunal a quo, por decisão datada de 09-07-2022, não concedeu a liberdade condicional ao recorrente, mantendo, em consequência, o cumprimento da pena e decidindo reapreciar a eventual concessão em renovação de instância, no prazo de doze meses, contados a partir daquela data.
Tal decisão veio a ser proferida após a realização da instrução prévia e junção aos autos, mormente, dos seguintes elementos: a) relatório dos serviços de educação do Estabelecimento Prisional ...; b) ficha biográfica do recluso; c) relatório dos serviços de reinserção social; d) audição do recluso/recorrente, nos termos do disposto no artigo 176.º do Código da Execução das Penas e de Medidas Privativas da Liberdade; e) esclarecimentos obtidos em reunião do Conselho Técnico, nos termos do disposto no artigo 175º do Código da Execução das Penas e de Medidas Privativas da Liberdade, cujo parecer foi desfavorável por unanimidade; f) Parecer do Ministério Público, o qual emitiu parecer desfavorável, nos termos do disposto no artigo 171º, n.º 1 do Código da Execução das Penas e de Medidas Privativas da Liberdade; g) Parecer do técnico gestor do Estabelecimento Prisional, o qual foi desfavorável; h) Relatório da Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, nos termos do disposto no artigo 171º, nº 1, alínea a) e b) do Código da Execução das Penas e de Medidas Privativas da Liberdade, o qual emitiu parecer desfavorável.
Todos estes elementos probatórios foram considerados e apreciados pelo tribunal a quo, como resulta expressamente dos pontos «I - Relatório» e «II – Fundamentação A – Factos».
O recorrente encontra-se em cumprimento de uma pena de 17 anos de prisão, pela prática dos crimes de homicídio qualificado e rapto, conforme decisão transitada em julgado no processo n.º 449/10.... da Secção ... (Juiz ...) da Instância Central ....
Cumpriu também 80 dias de prisão subsidiária aplicada no processo n.º 345/09...., pela prática de um crime de condução sem habilitação legal.
O recorrente atingiu os dois terços da pena em 14-06-2022.
Foi com base nestes elementos carreados para os autos, as circunstâncias dos crimes e respectiva natureza e bem assim os elementos aportados aos autos pelo próprio recorrente -em sede de audição - que o tribunal a quo veio proferir a decisão recorrida, após a realização de um juízo de prognose tendente à concessão da liberdade condicional – o qual se afigurou negativo e desfavorável ao recorrente.
Por serem perceptíveis quais os elementos utilizados para fundamentar, bem como, quais os argumentos utilizados para sustentar a decisão, tal como foram elencados nesta resposta, não se verifica a nulidade invocada, nem a violação do artigo 146.º, n.º 1, do Código de Execução de Penas e Medidas Privativas de Liberdade, pelo que improcede nesta parte o recurso.
-
Da violação do artigo 61.º do Código Penal: O recorrente sustenta lhe deveria ter sido concedida a liberdade condicional, uma vez que «(…) a sua reaproximação ao meio livre já decorre à tempo suficiente e que permite antever um juízo de prognose francamente favorável relativamente ao seu comportamento futuro em conformidade com o direito, socialmente responsável e sem cometer crimes».
Ora, compulsados os factos com relevância para a causa, os relatórios juntos e ainda a audição do condenado, a verdade é que, analisando a decisão recorrida, a mesma concluiu que o recorrente demonstrava ainda uma reduzida consciência crítica da conduta criminosa e, após uma adequada ponderação e apreciação dos fundamentos legalmente exigidos pelo artigo 61º, n.º 1 e n.º 3 do Código Penal, concluiu não se encontrar verificado o pressuposto material do qual depende a decisão de concessão da liberdade condicional.
A aplicação do instituto da liberdade condicional encontra-se assente em pressupostos formais e pressupostos materiais, tal como decorre do artigo 61º do Código Penal, os quais se encontram vertidos e apreciados na decisão recorrida.
Em especial, quando apreciada aos dois terços da pena, a liberdade condicional satisfaz-se com a verificação dos pressupostos atinentes à prevenção especial, seja negativa, de que o condenado não cometa novos crimes, seja positiva, de ressocialização, através de um juízo de prognose favorável sobre o comportamento futuro do condenado.
Tal juízo assenta na apreciação sobre a evolução da personalidade do condenado durante o tempo de reclusão, implicando que se possa criar a expectativa de que não voltará a delinquir no âmbito dos mesmos tipos de crimes.
Ainda assim, a decisão respeitante à referida concessão não poderá deixar de ter em...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO