Acórdão nº 446/14.7TBABF-B.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 07 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelFLORBELA MOREIRA LANÇA
Data da Resolução07 de Novembro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Évora

ACORDAM NA 1.ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA I.

Relatório Os executados BB e mulher CC deduziram o presente incidente, por via do qual arguiram a nulidade decorrente da sua alegada falta de citação para os termos da presente ação executiva, tendo requerido que fossem declarados como não citados, declarando-se nulo todo o processado subsequente ao requerimento executivo.

Alegaram os arguentes, em síntese, que se encontram a residir na Suíça, ele desde de 24.06.1990 e ela desde 21.12.1997, deslocando-se esporadicamente, em férias, a Portugal, sendo que a última vez que se deslocaram ao território nacional foi no final do ano de 2013, durante a época do Natal e da passagem do ano, tendo ainda o cônjuge marido, após essa data, se deslocado ao território nacional uma única vez, entre os dias 25 e 27 de Abril de 2015.

Mais alegaram que nunca tiveram conhecimento das citações que foram concretizadas no âmbito dos autos de execução, por não lhes ter sido entregues as cartas de citação ou cópias das aludidas citações e que tais citações seriam, em todo o caso nulas, já que das mesmas, sempre resultaria um encurtamento do prazo de que os arguentes dispunham para se oporem à execução, caso tivessem sido citados com referência à sua residência, sita na Suíça.

Regularmente notificado o exequente deduziu oposição, opondo-se à pretensão dos arguentes, por considerar regular a sua citação.

Procedeu-se à produção de prova e julgado o incidente improcedente, por não provado, e condenados os executados, como litigantes de má-fé, em multa, que se fixou em 10 (dez) Ucs, para cada um, os executados não se conformando com a decisão prolatada dela interpuseram recurso, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões: “1ª Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou improcedente a arguição de nulidade por falta de citação deduzida pelos Executados, aqui Recorrentes, no entendimento de que estes não lograram ilidir a presunção de entrega das cartas de citação que lhes foram dirigidas, condenando-os ainda como litigantes de má-fé.

  1. Essa é a decisão com que os Recorrentes não se conformam, que reputam como materialmente injusta e contrária à boa aplicação do Direito, e que pretendem ver submetida à prudente apreciação desse Venerando Tribunal.

  2. Na verdade, a citação, enquanto ato pelo qual se dá a conhecer a alguém que contra si pende um processo judicial, pode ser efetivada por via postal mediante remessa de carta registada com aviso de receção para o domicílio profissional ou pessoal do citando (art. 228º, nº 2, do CPC).

  3. Tal não se verificou nestes autos, tendo as cartas de citação sido enviadas para morada no concelho de Amarante que não constitui domicílio de qualquer espécie para os Recorrentes, há muito emigrados na Suíça.

  4. Com efeito, mostra-se pacificamente assente nos autos que a morada que consta da escritura pública de compra e venda dada à execução como residência dos Recorrentes é a Av. … 00-Vevey, Suíça.

  5. Na verdade, essa era a morada que o banco Exequente lhes conhecia e para a qual lhes endereçou interpelações para pagamento dos quantitativos que posteriormente viria a reclamar nos autos! 7ª Com efeito, consta expressamente da cláusula DÉCIMA SEGUNDA do documento complementar elaborado para integrar da escritura pública dos autos a previsão de que a morada indicada pelos mutuários no contrato “será considerada, também, a do seu domicílio, para efeito de citação, em caso de litígio”, o que constitui o estabelecimento de um domicílio eletivo ou convencionado (art. 84º do CC).

  6. Ademais, verdade é que resulta igualmente assente nos autos que os Recorrentes estão emigrados na Suíça há vários anos, não tendo residência na morada do concelho de Amarante para onde foram dirigidas as missivas de citação, o que aliás consta da fundamentação da douta sentença em crise sob os factos provados 1) e 2).

  7. Era, pois, na aludida morada suíça que os Recorrentes haviam de ter sido citados, não lhes sendo imputável que o banco Exequente tenha promovido a sua citação noutra morada que não aquela, que é a sua residência.

  8. Na verdade, é inócua para a apreciação da questão a factualidade que se mostra vertida nos factos provados sob os nºs 4) e 5) da sentença em crise no sentido de o imóvel a que corresponde a aludida morada no concelho de Amarante estar inscrita na matriz a favor do Executado Recorrente sob menção de ser aquela a sua residência, à luz do disposto nos arts. 84º e 364º, nº 1, do CC 11ª Ora, a morada indicada pelo banco Exequente no Requerimento Executivo para efeitos de citação não é residência nem local de trabalho dos Recorrentes (art. 228º, nº 2, do CPC), nem tão pouco é o seu domicílio convencionado nos termos do já visto art. 84º do CC.

  9. A verdade é que entre dezembro de 2013 e 25 de abril de 2015 os Recorrentes não estiveram em Portugal, não receberam nem lhes foi entregue qualquer citação, assim não lhes tendo sido possível dela tomarem conhecimento.

  10. Nos termos do art. 188º, nº 1, al. e), do CPC verifica-se a falta de citação quando se demonstre que o destinatário da citação pessoal não chegou a ter conhecimento do ato, por facto que não lhe seja imputável, à luz da diligência exigível a um bom pai de família em face do condicionalismo do caso concreto (art. 487º, nº 2, do CC).

  11. E isso mostra-se plenamente demonstrado nos autos, motivo pelo qual o tribunal havia de ter concluído por um efetivo desconhecimento do ato de citação por parte dos aqui Recorrentes, sem qualquer culpa sua, assim se afastando a presunção de efetiva entrega da carta de citação.

  12. O Tribunal de primeira instância entendeu ainda ser de condenar cada um dos Executados, aqui Recorrentes, com litigante de má-fé, na multa de 10 Unidades de Conta – arts. 542º, nº 2, als. a) e d), do CPC e art. 27º, nº 3, do Regulamento das Custas Processuais.

  13. Não obstante, e por tudo o exposto, não tem qualquer reflexo nos autos a consideração de que os mesmos fizeram um uso reprovável do incidente de que lançaram mão, antevendo a sua improcedência, com intuitos unicamente dilatórios.

  14. Os Recorrentes limitaram-se a recorrer a juízo para fazerem valer pretensão legítima e que entendem fundada nos factos alegados, cuja razão de ser esperavam que o Tribunal viesse a reconhecer, como seguramente esse Venerando Tribunal fará.

  15. Com efeito, sempre os Recorrente procederam de boa-fé, com a convicção de que o Tribunal dar-lhes-ia razão a final, sem qualquer réstia de desrespeito pela lei, pelo Tribunal ou pela contraparte.

  16. Assim sendo, não pode manter-se a condenação dos Recorrentes como litigantes de má-fé, sob pena de gritante violação dos direitos de acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional, à luz do disposto no art. 20º da Constituição.

  17. Face ao exposto, a decisão recorrida violou de forma manifesta o disposto nos arts. 84º, 364º, nº 1, e 487º, nº 2, do CC, o prescrito nos arts. 188º, nº 1, al. e), 228º, nº 2, e 542º do CPC, o disposto no art 27º, nº 3, do Regulamento das Custas Processuais, e ainda o consagrado no art. 20º da Constituição.

(…) Termos em que deve ser dado provimento ao recurso e, em consequência, ser a douta sentença em crise revogada e substituída por decisão que declare a nulidade do processado decorrente da falta de citação dos Executados/Recorrentes e revogue a sua condenação como litigantes de má-fé Assim se fazendo JUSTIÇA!”.

II.

Objecto do Recurso Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pela recorrente e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras (art.º 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º e 663.º, n.º 2 do CPC).

São, pois, questões a decisdir: - Da (in)verificação da falta de citação dos executados; - Da litigância de má-fé.

III.

Fundamentação 1.

De Facto Factos Provados 1) Com vista à concretização da citação dos executados BB e mulher CC, o Sr. AE remeteu a estes cartas registadas, datadas de 28.05.2014, com aviso de receção, para a morada sita na Rua dos …, n.º …, Ataúdes, Amarante.

2) Os executados são emigrantes na Suíça, desde de data não concretamente apurada, mas anterior a 13.05.2011, tendo residência, nesse país, na Av. … 00, Vevey, Suíça.

3) As cartas referidas em 1) foram rececionadas, na morada para a qual foram endereçadas, em 04.06.2014, pela mãe do executado, Maria … B….

4) O imóvel a que corresponde a morada mencionada em 1) encontra-se inscrito na matriz a favor do executado, tendo o mesmo declarado, perante a Autoridade Tributária, ser residente na morada mencionada em 1).

5) Também o imóvel que foi penhorado no âmbito destes autos encontra-se inscrito na matriz a favor do executado, tendo o mesmo novamente declarado, perante a Autoridade Tributária, ser residente na morada mencionada em 1).

  1. Factos não Provados Não se logrou provar que: 1) Que as cartas mencionadas em 1) não tivessem sido entregues aos executados.

    2) Que os executados apenas se tivessem deslocado a Portugal no final do ano de 2013/ início de 2014 e após essa data o executado marido apenas se tivesse deslocado a Portugal entre os dias 25 e 27 de Abril de 2015.

  2. O Direito A única questão a apreciar, como vimos, é relativa à citação dos executados, tendo o tribunal a quo, no âmbito do incidente requerido pelos executados, no qual alegaram, que não haviam recebido a carta de citação, porquanto a mesma não havia sido remetida para a sua residência, que se localiza na Suíça, onde são emigrantes, a que acresce o facto do banco exequente conhecer a morada da residência dos executados e para a qual lhes endereçou as interpelações para pagamento da divida, ora exequenda, tanto mais que consta expressamente da cláusula 12.ª do documento complementar e integrante da escritura pública, dados à execução, a previsão de que a morada indicada pelos mutuários no contrato – “será considerada, também, a do seu domicílio, para efeito da citação, em caso...

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