Acórdão nº 1519/18.2T8PTG.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 21 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelTOMÉ RAMIÃO
Data da Resolução21 de Novembro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam no Tribunal da Relação de Évora I- Relatório: BB, residente em Rua da …, nº … A, 7430-… Monte da Pedra, Portalegre, intentou a presente ação declarativa comum condenatória, contra CC, residente na Rua da …, nº …, 7430-… Monte da Pedra, peticionando a sua condenação no pagamento da quantia de €20.999,47, acrescida de juros vencidos e vincendos até efetivo e integral pagamento.

Alegou para o efeito, e em síntese, que se dedica à exploração agrícola de vários prédios rústicos sitos em Monte da Pedra, Crato e que o Réu, dono de uma propriedade próxima, tinha à sua guarda e responsabilidade cerca de 250 animais de raça bovina, os quais, por não se encontrarem devidamente contidos e deixados ao abandono, se deslocavam livremente, entrando nos terrenos explorados pelo Autor, derrubando vedações, pisando e comendo pastos, destruindo árvores e causando arrelias e inquietações, causando-lhe prejuízos que concretizou.

Regularmente citado, o Réu contestou, invocando a exceção de prescrição e impugnando a matéria factual alegada pelo Autor, rejeitando responsabilidade pelos danos peticionados.

O Autor respondeu à exceção invocada pugnando pela sua improcedência.

Saneado o processo e realizado o julgamento, foi proferida a competente sentença com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, e ao abrigo das disposições legais supra mencionadas, julgo a ação parcialmente procedente por provada, e, em consequência, decido condenar o Réu, no pagamento ao Autor da quantia de 17.249,47 € (dezassete mil duzentos e quarenta e nove euros e quarenta e sete cêntimos) a título de danos patrimoniais acrescida da quantia de 1.500,00 € (mil e quinhentos euros) a título de danos não patrimoniais, num total de 18.749,47 € (dezoito mil setecentos e quarenta e nove euros e quarenta e sete cêntimos), bem como no pagamento de juros vencidos e vincendos até efetivo e integral pagamento, absolvendo-o quanto ao demais peticionado.

Custas a cargo de ambas as partes, na proporção dos respetivos decaimentos”.

Desta sentença veio o Réu interpor o presente recurso, alegando e concluindo nos termos seguintes: 1. Vem o RECORRIDO, através da presente ação, intentada em 27 de Novembro de 2018, peticionar a condenação do ora RECORRENTE por diversos factos praticados por animais deste no período compreendido entre 2012 e 2016.

  1. O RECORRENTE, em sede de contestação, alegou a prescrição da presente ação, nos termos do n.º 1 do artigo 498.º, bem como que a prescrição também já se verificava mesmo que se entendesse ser aplicável o n.º 3 do artigo 498.º do Código Civil, uma vez que a presente ação deu entrada em Juízo em 28 de Novembro de 2018.

  2. O RECORRIDO invocou para efeitos de interrupção da contagem do prazo de prescrição, a existência do processo-crime que correu termos no Juízo Local Criminal de Portalegre sob o n.º 18/15.9GEPTG.

  3. Foi junto pelo próprio RECORRIDO aos autos, em 25 de Janeiro de 2019, um despacho proferido em 15 de fevereiro de 2018 no processo-crime acima identificado.

  4. No aludido despacho pode ler-se que o pedido de indemnização formulado pelo RECORRIDO foi recusado por ser legalmente inadmissível.

  5. Uma vez que o RECORRIDO manifestou em sede de inquérito não pretender procedimento criminal contra o RECORRENTE, e por esse facto, não constarem da acusação os factos alegados no aludido pedido de indemnização.

  6. Na douta sentença ora recorrida, afirmou o douto tribunal a quo, “Compulsados os autos, verifica-se que, conforme e bem se refere no despacho de acusação proferido em 17 de Outubro de 2017 (junto a fls. 107 e ss dos autos), os factos relativos ao ofendido BB, aqui Autor, são passíveis de integrar o crime de dano, previsto e punido pelo artigo 212º´do Código Penal, em abstrato com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa”.

  7. Não assiste qualquer razão ao douto Tribunal a quo, uma vez que como acima se transcreveu, o despacho junto pelo RECORRIDO em 25 de Janeiro de 2019 afirma precisamente o oposto.

  8. E na douta sentença ora RECORRIDA, consta ainda, “Contudo, por razões de ordem processual, o Autor não viu as sucessivas queixas apresentadas contra o Réu incorporadas nos autos de inquérito nº 18/15.9T8PTG, não tendo tais factos sido objeto de despacho de acusação e, consequentemente, não tendo sido admitido o pedido de indemnização civil que, oportunamente dirigiu aqueles autos”.

  9. As supostas queixas, não foram objeto de despacho de acusação, não por qualquer razão de ordem processual, mas sim porque o RECORRIDO não quis procedimento criminal contra o RECORRENTE.

  10. E pela mesma razão nem sequer foram alvo de despacho de arquivamento, uma vez que os factos reportados ao aqui RECORRIDO nunca constaram do processo criminal uma vez que este abdicou do mesmo.

  11. Consequentemente, o prazo prescricional não pode começar a correr com o despacho que põe termo ao inquérito, seja de arquivamento ou acusação, como alegado pelo RECORRIDO e acolhido na douta sentença ora recorrida.

  12. A redação do número 1 do artigo 498.º do Código Civil é expressa ao estatuir que, “O direito de indemnização prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respetivo prazo a contar do facto danoso”.

  13. É assim irrelevante que os prejuízos se tenham produzido ao longo do tempo, até porque, a própria lei processual civil prevê, sem necessidade de acordo da outra parte, a ampliação do pedido desde que o mesmo decorra do pedido originário.

  14. É certo que o n.º 3 da referida norma legal dispõe que se o facto ilícito constituir crime para o qual seja estabelecido prazo mais longo, é este o aplicável, sendo o prazo de prescrição previsto para o crime de dano de cinco anos.

  15. Tendo em conta que o próprio RECORRIDO alega que teve conhecimento do direito a ser indemnizado pelo ora RECORRENTE em meados de 2012, é manifesto que o prazo prescricional mais longo, há muito que tinha expirado à data da propositura da presente ação em 27 de Novembro de 2018.

  16. Para que a parte possa aproveitar o prazo de prescrição mais longo, tem que alegar factos que consubstanciam a prática de um crime, o que manifestamente o RECORRIDO não fez.

  17. O RECORRIDO não alegou factos a partir dos quais se possa extrair que estamos perante um crime continuado e não de vários crimes, mormente a unidade ou pluralidade de resoluções criminosas, e tão pouco alegam quaisquer factos integradores da verificação de crime de dano, que é um crime necessariamente doloso, nem sequer da consciência de ilicitude.

  18. Os factos julgados como provados no processo-crime identificado nos autos em nada dizem respeito ao ora RECORRIDO.

  19. Na Petição Inicial, o RECORRIDO nada demonstra, e nem sequer consta dos factos dados como provados na douta sentença ora recorrida, quanto ao elemento subjetivo, designadamente que o RECORRENTE sabia que a sua conduta causava prejuízos ao RECORRIDO e, ainda assim, não se inibiu de a alterar, agindo livre, voluntária e conscientemente.

  20. Para se aferir do carácter doloso da atuação do ora RECORRENTE, havia que ser alegada e demonstrada a atuação livre, voluntária e consciente do RECORRENTE, que saberia ser a sua conduta proibida e punida pela lei penal, para que se pudesse aferir o carácter doloso da sua atuação.

  21. A falta de alegação destes pressupostos e sua não demonstração, equivale à não verificação do elemento subjetivo do tipo legal do crime de dano, cuja prática foi imputada ao RECORRENTE na douta sentença ora recorrida.

  22. Bem como inexiste na Petição Inicial uma completa referência quanto ao preenchimento, por parte do RECORRENTE, do elemento subjetivo do tipo legal de crime cuja prática lhe foi imputada, consequentemente, como acima se demonstrou, sendo a verificação do elemento subjetivo indispensável para que se afirme o cometimento do crime, então devia a douta sentença ora recorrida concluir que os factos imputados ao RECORRENTE, como descritos na petição inicial, são insuscetíveis de constituir a prática do crime de dano.

  23. Era assim exigível ao RECORRIDO não só alegar os factos integrantes dos elementos objetivos do tipo legal imputado, mas era também necessária uma imputação subjetiva completa dos factos.

  24. Por não terem sido alegados factos que constituem um crime de dano, porquanto apenas foram alegados os elementos objetivos do tipo penal, não pode ao RECORRIDO aproveitar o prazo de prescrição mais longo.

  25. Em momento algum da petição inicial, onde é delimitado o pedido do RECORRIDO, é alegado que este foi vítima de qualquer crime, continuado ou não.

  26. O prazo prescricional aplicável nos presentes autos é assim de três anos, e começou a correr em meados de 2012.

  27. Termos em que, mal andou o douto tribunal a quo, ao ter julgado improcedente a exceção de prescrição deduzida pelo RECORRENTE.

  28. O douto Tribunal “a quo” deu como provado, que o Autor ora RECORRIDO teve de cultivar pastagens em terrenos cedidos por terceiro para alimentar o próprio gado, produzindo uma média de 350 fardos de 23kg, por hectare, por ano, num total de cerca de 25 hectares, à razão de 2,50 € por fardo, durante cinco anos, reservando o RECORRIDO 60% dos fardos para si e 40% dos fardos ao proprietário dos terrenos.

  29. Conforme consta da matéria dada como provada, nomeadamente no ponto 13, o RECORRENTE viu transitar em julgado a sentença que decretou a perda dos seus animais a favor do Estado em 25 de Setembro de 2015, deixando aí de ter a posse dos mesmos.

  30. Sendo o início da data dos...

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