Acórdão nº 2230/17.7T8STR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 11 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelMOISÉS SILVA
Data da Resolução11 de Julho de 2019
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora I - RELATÓRIO Apelante: I... (autor).

Apelada: ... Companhia Portuguesa de Transportes Aéreos SA (ré).

Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, Juízo do Trabalho de Santarém, J1.

  1. O A. intentou processo especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento contra a R., apresentando o competente formulário.

    Foi agendada data para a realização da audiência de partes, tendo a entidade empregadora sido citada para o efeito como resulta de fls. 34.

    Mostrando-se inviável a conciliação das partes foi a entidade empregadora notificada para, no prazo e sob a cominação legal, apresentar o articulado a motivar o despedimento e juntar autos os documentos comprovativos do cumprimento das formalidades exigidas.

    A empregadora apresentou articulado a fundamentar o despedimento, tendo alegado, em síntese, que o trabalhador era comandante de avião ao serviço desta tendo sido o comandante de serviço nos voos TP 472 Lisboa/Lyon, TP 473 Lyon/Lisboa e TP 474 Lisboa/Lyon, tendo chegado a Lyon no dia 24 de março de 2017 onde permaneceu e pernoitou por duas noites, tal como a restante tripulação técnica e de cabina, no Hotel NH Lyon Airoport, em Lyon, França.

    Mais refere que no dia 25 de março de 2017 o autor permaneceu em Lyon e no referido hotel encontrando-se planeado para realizar, no dia 26 de março de 2017, também como comandante de voo, o voo 473 Lyon/Lisboa, com apresentação às 5h00 (hora local).

    Alega ainda que no dia 25 de março de 2017 o trabalhador no referido hotel e devidamente acompanhado do Oficial Piloto N..., que também fazia parte da tripulação técnica que tinha realizado o voo TP 474 de 24 de Março de 2017 e tinha igualmente planeado realizar, como co-piloto, o voo TP 473 de 26 de março de 2017 ingeriu diversas bebidas alcoólicas, conjuntamente com este, tendo falado muito alto, perturbando os clientes que se encontravam no restaurante do hotel, encetando discussões com o pessoal do mesmo quando advertido do seu comportamento, e assumindo um comportamento desordeiro e provocador para com este, tendo-se deslocado para o seu quarto sempre depois das 22h15/22H30 (hora local).

    Salienta que no dia 26 de março de 2017, o trabalhador tinha marcado o seu despertar para o voo do dia seguinte às 04h00 (hora local), para realizar o voo TP 473 – Lyon/Lisboa sendo que na noite de 25 para 26 de março de 2017 passou a vigorar a hora de verão (adiantou à 1h00 para as 2h00) tendo este se apresentado no aeroporto de Lyon para realizar o voo em questão com menos de cinco horas de descanso.

    Nesta sequência destaca que o trabalhador ainda se encontrava sob o efeito do álcool, sem ter cumprido o período de repouso obrigatório, exercendo as funções de Comandante do voo TP 473 de 26 de março de 2017 não podendo estar em condições físicas para realizar o voo em causa violando assim, de forma muito grave, as mais elementares regras legais e convencionais a que está obrigado no exercício das sus funções de piloto comandante de avião e trabalhador da P..., colocando em causa a segurança de pessoas, bens e equipamento que lhe estavam confiados, colocando ainda em causa o bom nome e a imagem da empresa ao consumir bebidas alcoólicas e adotando comportamentos inadmissíveis no hotel onde pernoitava, onde habitualmente pernoitam as tripulações da P..., sabendo os trabalhadores daquela unidade hoteleira que se tratava de um piloto que tinha um voo para realizar na madrugada seguinte.

    Por fim, alega que o trabalhador violou os seus deveres laborais, nomeadamente os decorrentes da atividade de piloto comercial de linha aérea e laborais, entre outros, os deveres de executar as suas funções com zelo e diligência, de cumprir as ordens e instruções do empregador respeitantes à execução e disciplina do trabalho e de cumprir as prescrições sobre a segurança no trabalho, de usar, durante o exercício das suas funções, da máxima diligência com vista à proteção de vidas e bens que a empresa lhe confie, de velar pela salvaguarda do prestigio interno e internacional da empresa, de adotar os procedimentos mais adequados à defesa dos interesses da empresa, de manter um regime de vida adequado às exigências da profissão e de cumprir as normas operacionais emanadas das entidades oficiais competentes e os regulamentos internos em vigor na empresa, deveres estes previstos nas als. c),d), i), j), k), m) e n) da Cláusula 6.ª do Acordo de Empresa Portugália/SPAC.

    Conclui requerendo que se considere lícito o despedimento do trabalhador juntando aos autos cópia do procedimento disciplinar e isto face à gravidade do seu comportamento o qual tornou impossível a subsistência da relação de trabalho.

    Devidamente notificado do teor do articulado supra, veio o trabalhador contestar o mesmo impugnando parte da factualidade alegada pela empregadora, assim como invocando a nulidade da nota de culpa.

    Para tanto refere que o trabalhador foi submetido a exames médicos surpresa no dia 30 e 31 de março de 2017, por imposição da empregadora nada tendo sido detetado no que respeita ao consumo de álcool.

    Menciona ainda que no dia em questão o trabalhador não só não estava em funções, nem fardado ou identificado, de algum modo como trabalhador da empregadora, inexistindo qualquer pretérito disciplinar desde a data da sua contratação em 16 de maio de 2005.

    Salienta uma série de imprecisões na produção de prova produzida em sede de processo disciplinar, nomeadamente no que respeita quer à quantidade de bebidas alcoólicas consumidas pelo trabalhador e pelo oficial piloto, e as quais, em seu entender, o foram em menor número do que aquelas que são indicadas na decisão de despedimento, assim como ao momento temporal em que as mesmas foram consumidas e o qual sucedeu, no seu entender, em momento anterior ao que foi imputado pela Entidade Empregadora e por fim, quanto ao comportamento adotado pelo trabalhador no hotel quanto aos outros hóspedes e pessoal do mesmo, desvalorizando qualquer evento passível de ser qualificado como perturbador e desrespeitador.

    Deduz pedido reconvencional peticionando a condenação da empregadora a pagar-lhe todas as retribuições que deveria ter normalmente auferido desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da sentença que declare a ilicitude do despedimento, a reconhecer ao trabalhador o direito de optar entre a integração e o recebimento da indemnização por antiguidade à razão de 45 dias de remuneração base e diuturnidades por cada ano completo ou fração e antiguidade e, por fim, a indemnizar o trabalhador por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais que com o seu despedimento sem justa causa lhe causa, tudo no valor global de € 25 000.

    Nessa sequência veio ainda a empregadora responder ao que esta entendeu ser, na sua perspetiva, uma exceção de caducidade do direito à ação disciplinar reiterando o respeito por todos os prazos processuais impostos por lei no que respeita ao processo disciplinar.

    Foi proferido despacho saneador, no qual se admitiu o pedido reconvencional deduzido.

    Foi dispensada a elaboração do despacho que fixa a matéria assente e controvertida.

    Procedeu-se a julgamento como consta da ata respetiva.

    Foi proferida sentença, onde se incluiu a resposta à matéria de facto, com a decisão seguinte: Face ao exposto: - Declara-se lícito o despedimento do trabalhador e, consequentemente, absolve-se a entidade empregadora do pedido de indemnização em substituição da reintegração nos termos do art.º 391.º do Código do Trabalho, ou em alternativa a sua reintegração nos quadros da empresa, assim como do pedido de pagamento das retribuições que deixou de auferir desde a data da cessação do contrato de trabalho até ao trânsito em julgado da sentença nos termos do art.º 390.º n.º 1 do Código do Trabalho, indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais nos termos do art.º 389.º n.º 1 do Código do Trabalho.

    Valor da ação: € 30 000,01 (cfr. art.º 98.º-P n.º 2 do CPT).

    Custas pelo autor (cfr. art.º 527.º n.º 1 do CPC).

  2. Inconformado, veio o A. interpor recurso de apelação motivado com as conclusões que se seguem: 1ª O presente recurso é o próprio, mostra-se interposto tempestivamente, por quem para tal tem plena legitimidade e para o Tribunal competente.

    2ª A sentença recorrida, antes de mais, padece de patente nulidade, a qual ora aqui se argui de forma expressa e separada para o caso de se entender como plenamente vigente o art.º 77.º n.º 1 do CPT e não o art.º 615.º n.º 4 do CPT. Com efeito, 3ª Os factos – aqui corretamente – dados como comprovados pela mesma sentença sob as al. “LL” e “OO” estão em claríssima contradição com outros factos erroneamente dados como provados pela decisão recorrida, máxime sob as alíneas “M”, “Q”, “S” e “X”.

    4ª E ao dar como provados factos que são manifestamente contraditórios entre si, se for – o que se não concede – para subsistirem os favoráveis à tese da R., então a sentença padece de vício de nulidade estatuído no art.º 615.º n.º 1, al. c) do CPC, aqui aplicável ex vi do art.º 1.º n.º 2, al. a) do CPT.

    5ª A sentença recorrida não considerou, nem julgou adequadamente, a matéria de facto, nem interpretou e aplicou corretamente o Direito aos factos.

    6ª O A. não desconhece que a primeira impressão – assente na apresentação da “segurança do voo” como um valor primordial que assume enorme importância para a ré, e para o A. – acerca da sua conduta tal como é apresentada pela mesma ré seria aliciante e tornaria como que “evidente” a justa causa invocada.

    7ª Todavia, a verdade é que uma análise mais atenta e de sintonia mais “fina” dos factos e os vários elementos com eles relacionados impõe a resposta precisamente oposta à que foi consagrada na decisão recorrida.

    8ª O A. não tem, nem nunca teve, qualquer problema de consumo de álcool e mesmo os extensos e repetidos exames médicos a que a ré o sujeitou rigorosamente nada assinalaram, 9ª E, por outro lado, é de todo injustificada a diferenciação de critérios...

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