Acórdão nº 2255/17.2T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 11 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelANA MARGARIDA LEITE
Data da Resolução11 de Julho de 2019
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: 1.

Relatório BB intentou a presente ação declarativa, com processo comum, contra CC, Ld.ª, pedindo: a) se decrete a resolução do contrato de arrendamento existente entre o autor e a ré, relativo ao prédio que identifica; b) se condene a ré a pagar ao autor as rendas vencidas e não pagas, no valor € 1239, e as rendas vincendas até à efetiva entrega do locado, acrescidas de juros à taxa de 4%, desde a data de vencimento e até ao efetivo pagamento; c) se condene a ré a repor o imóvel no estado anterior ao da realização das obras; d) se condene a ré a entregar imediatamente o locado ao autor, livre e desocupado de pessoas e bens.

A justificar o pedido, alega que é dono do prédio urbano que identifica, o qual, por contrato verbal outorgado em janeiro de 1986, foi dado de arrendamento pelos anteriores proprietários à ré para a atividade de comércio de adubos, cereais, farinhas, rações para animais e outros produtos para a agricultura e respetivo armazenamento, sendo que a ré procedeu a obras no locado sem autorização do senhorio, que só teve conhecimento das mesmas em data não anterior a 01-08-2016, e não procedeu ao pagamento das rendas relativas aos meses de abril a julho de 2017, o que considera constituírem dois fundamentos de resolução do contrato de arrendamento, pelos motivos que expõe na petição inicial.

A ré contestou, defendendo-se por impugnação motivada, alegando que acordou com os pais do autor a desnecessidade de sujeitar a autorização prévia a realização de obras de adaptação do locado e que após a morte de seus pais o autor nunca se insurgiu contra as obras realizadas pela ré, acrescentando que o autor recusou o recebimento das rendas relativas aos meses indicados e que a contestante procedeu ao pagamento das rendas em causa acrescidas do montante correspondente a 50%, arguindo a caducidade do direito invocado pelo autor com o indicado fundamento e pugnando pela improcedência da ação.

Notificado para o efeito, o autor apresentou articulado no qual se pronuncia sobre a matéria de exceção invocada na contestação.

Foi realizada audiência prévia, na qual se fixou o valor da causa e se proferiu despacho saneador, relegando-se para final o conhecimento da exceção de caducidade arguida, após o que se identificou o objeto do litígio e se enunciou os temas da prova.

Realizada a audiência final, foi proferida sentença, na qual se decidiu o seguinte: a) julgo verificada a caducidade do direito de resolução do contrato de arrendamento com base na falta de pagamento das rendas vencidas de Abril a Julho de 2017; b) no mais, julgo improcedente a acção e, em consequência, absolvo a ré do pedido.

Custas da acção pelo A. (art. 527.º, do Código de Processo Civil).

Registe e notifique.

Inconformado, o autor interpôs recurso desta sentença, pugnando pela respetiva revogação, terminando as alegações com a formulação das conclusões que a seguir se transcrevem: «1 – O Tribunal a quo, discutida a causa, julgou provados os factos supra transcritos em 1.º e não provados os enunciados em 2.º, que aqui se dão por integralmente reproduzidos; decidida a matéria de facto, o Tribunal a quo, com os doutos fundamentos enunciados em sede de Do Direito, julgou verificada a caducidade do direito de resolução do contrato de arrendamento com base na falta de pagamento das rendas vencidas de abril a julho de 2017 e julgou improcedente a ação, absolvendo a ré do pedido.

2 – O recorrente, salvo o devido respeito por melhor opinião, entende que deverá ser alterada a matéria de facto como se segue: - A redação do texto do ponto 7 dos factos provados deverá ser a seguinte: Na sequência da avaliação realizada em 21.06.2007, o artigo 779º deu origem ao artigo matricial 549º, passando a constar da respetiva matriz predial que o mesmo se destina a comércio, com a área total de 412,50m2, correspondendo 188,50 m2 a área descoberta e confronta do Norte e Poente com o autor, do Sul com herdeiros de João … e do Nascente com a Estrada Nacional nº 2; - Considerar-se provada toda a factualidade constante das alíneas b) e e), dos factos não provados.

3 – Quanto ao ponto 7 dos factos provados: a área descoberta de 188,50 m2 resulta da respetiva caderneta predial urbana (cfr. fls. 19 – Doc. 1 da petição inicial).

4 – Quanto à alínea b) dos factos não provados: Relativamente a este facto, dever-se-á ter em conta as declarações de parte do autor BB (gravação digital de 10:44 a 13:05 e de 14:43 a 15:49, do dia 18.04.2018) que refere que o imóvel arrendado à demandada nunca sofreu qualquer alteração em termos de área a não ser a que foi doada à direção geral de estradas, mais nada; A frente só, os dois metros, foi tirada para a junta autónoma de estradas. Mais referiu que, em termos de áreas, o prédio se manteve sempre igual, o que é corroborado pelas fotografias aéreas tiradas nos anos de 1976 e 1985 e juntas aos autos em sede de audiência final. Conjugando estas declarações do autor com o teor da caderneta predial urbana (Doc. 1 da petição inicial), há-de concluir-se que, mantendo o locado a configuração inicial desde 28 de fevereiro de 1979, terá a área coberta de 223,70 m2 e descoberta de 188,80 m2, no total de 412,50 m2, facto que se haveria de ter dado como provado.

5 – Quanto à alínea e) dos factos não provados: Relativamente a este facto, dever-se-á ter em conta as declarações de parte do autor BB (gravação digital de 10:44 a 13:05 e de 14:43 a 15:49, do dia 18.04.2018) que refere que o logradouro existente no lado norte do imóvel arrendado à ré deveria ser utilizado em exclusivo pela ARS uma vez que faz parte dos armazéns que estão cedidos a esta entidade pública. O depoimento da testemunha H… … (gravação digital, de 15:51 a 17:14, do dia 18.04.2018), filho do autor, também é relevante: referiu que a única área descoberta que pertence à ré é da frente do edifício, da fachada principal até à estrada número 2, ou seja, desde a fachada nascente até ao limite da estrada. Sabe que o logradouro existente a norte do locado está arrendado à ARS do Algarve. Também confirma que a demandada utiliza esse espaço e, depois do autor ter enviado uma carta, a ré removeu parte dos materiais, removeu de lá um cilo e removeu alguns materiais, mas não removeu na totalidade. Mais explicou que ao confrontar o representante legal da ré, este lhe disse que só estava a ocupar junto à vedação e que aquilo acabava por não estar a estorvar, ou a empatar absolutamente nada, não é, e que, pronto, ia retirando à medida que iam-se gastando os materiais, pronto, a argumentação que ele deu foi um bocadinho, porque tinha ali à frente muito material e colocou ali, basicamente foi isso. Também sabe que sempre que o autor dizia à ré para retirar os materiais do logradouro, esta retirava mas mais tarde voltava a colocar. Em tom de desabafo, refere que o pai dirigia-se a ele, ele retirava de lá os materiais, depois ao fim de uns tempos voltava a abusar e voltava a colocar lá os materiais. Sinceramente o que eu acho é que, pronto, acabou por ser gozado este tempo todo, não é. E da mesma forma que quando eu fui lá a seguir às obras, não é, e que ele me apresenta aquele contrato, desobedece constantemente a todas as indicações que lhe são dadas, é que quer dizer, não só gozou com ele, como gozou comigo, não é, basicamente. Também a testemunha R…, cujo depoimento se encontra gravado no sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no tribunal, desde 10:18 a 11:23, do dia 19.04.2018, que auxiliou o autor na legalização dos armazéns afirmou, referindo-se aos imóveis arrendados à demandada e à ARS, respetivamente, artigos matriciais 549 e 2993, que cada edifício tem o seu logradouro.

Por outro lado, das várias fotografias aéreas juntas aos autos verifica-se que o imóvel arrendado à demandada apenas tem área descoberta na frente da fachada principal do edifício e do teor da caderneta predial urbana do artigo 2993 (os armazéns arrendados à ARS do Algarve) resulta que este edifício tem a área descoberta de cerca de 1.500,00 m2.

A ré não tem qualquer título válido para a utilização do logradouro referido em 17 dos factos provados.

6 – O autor também recorre da sentença que julgou improcedente o pedido de resolução do contrato de arrendamento com fundamento nas obras realizadas no locado pela ré.

7 – O Tribunal recorrido, apesar de entender que a inquilina incumpriu o dever de manutenção da coisa locada no estado em que a recebeu (face ao relevo das obras realizadas que implicaram a alteração exterior da fachada), considerou que por as obras se mostrarem necessárias ao exercício da atividade da ré e por a relação contratual ser de muito longa duração (sem que o senhorio impute à inquilina outras infrações com o alcance e gravidade desta), as obras não podem justificar a inexigibilidade por parte do senhorio da manutenção do contrato de arrendamento.

8 – A questão a resolver cinge-se a saber se as obras efetuadas pela recorrida no arrendado constituem fundamento de resolução do contrato de arrendamento.

9 – O recorrente considera que as obras ilícitas realizadas pela arrendatária, que modificaram a estrutura externa e a disposição interna do locado, tornam, salvo o devido respeito, inexigível a manutenção do arrendamento por parte do senhorio.

10 – No caso presente não estão em causa deteriorações lícitas, mas antes obras feitas pela inquilina sem autorização ou consentimento do senhorio e que consistiram na: Modificação da fachada exterior: na fachada principal (virada para a Estrada) abertura de um vão de janela e transformação em porta de entrada para o prédio e na fachada lateral (virada para Norte): o vão da janela, que já se encontrava fechada com tijolo pelo menos desde 2000, foi aberto para se transformar numa porta de entrada para o prédio; Modificação da estrutura interna das divisões: construção de uma parede divisória em pladur para criar duas divisões independentes entre si.

11 – Da...

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