Acórdão nº 1812/17.1PBBRR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 02 de Julho de 2019
Magistrado Responsável | MARIA DE FÁTIMA BERNARDES |
Data da Resolução | 02 de Julho de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em conferência, na Secção Criminal, do Tribunal da Relação de Évora: 1 – RELATÓRIO Neste processo comum, com intervenção do Tribunal Singular, n.º 1812/17.1PBBRR.E1, do Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal – Juízo Local Criminal de Setúbal, foi submetido a julgamento o arguido AT, melhor identificado nos autos, acusado da prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal p. e p. pelo artigo 3º, n.ºs 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro.
Realizado o julgamento, foi proferida sentença, em 26/02/2019, depositada nessa mesma data, decidindo: «(…) decide-se julgar a acusação deduzida pelo Ministério Público procedente, por provada e, em consequência:
-
Condenar o arguido AT pela prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, previsto e punido nos termos do artigo 3.º n.º 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro, na pena de 1 ano e 4 meses de prisão.
-
Condenar o arguido nas custas do processo, fixando a taxa de justiça em 2 UC.
(…).» Inconformado com o decidido, o arguido interpôs recurso para este Tribunal da Relação, apresentando a respetiva motivação e formulando, a final, as conclusões que seguidamente se transcrevem: I. O aqui recorrente/arguido, foi condenado na douta sentença ora aqui recorrida, a 1 ano e 4 meses de prisão efectiva, pela prática de um crime de condução sem habilitação legal.
-
Não tendo a 1ª data sido adiada e tendo o Tribunal a quo considerado que o julgamento podia decorrer sem a presença do arguido, foi dado início à audiência.
-
Como o julgamento não ficou concluído, na 1ª data, foi agendada uma 2ª data e posteriormente uma 3ª para a leitura da sentença.
-
Ora, o arguido não foi notificado da data da leitura da sentença, que ocorreu numa 3ª sessão, isto é, 26/02/2019.
-
Ao arguido é sempre conferido o direito de estar presente no dia da leitura da sentença mesmo não tendo assistido a nenhuma das audiências de julgamento.
-
O douto Ac. do TRG de 11/0712013, refere que: A realização da sessão da audiência onde se procede à leitura da sentença sem a presença física do arguido, que não foi notificado para esse efeito, constitui nulidade insanável tipificada na al. c) do art. 119 do CPP.
-
Ficou assim o arguido privado do direito de estar presento no dia da leitura da sentença, tendo sido preterido um direito essencial deverá ser anulado o julgamento com a subsequente repetição.
-
Além do mais, estando perante um caso em que a presença do arguido é obrigatória e tendo como vimos ocorrido mais 2 sessões de julgamento o Tribunal tinha o dever de tomar todas as diligências necessárias para assegurar a comparência do arguido, nem que a mesma ocorresse só na leitura da douta sentença.
-
Ora, não só o arguido não foi notificado da data da leitura, como também nenhuma medida foi tomada nesse sentido. (Vide douto Acórdão de 24-10-2007 do STJ): Assim, tendo-se realizado o julgamento do arguido - do qual saiu condenado - na sua ausência, apesar de estar notificado da data da audiência e a esta ter faltado, sendo obrigatória a sua presença, é nula a audiência de julgamento, efectuada na ausência do arguido sem que o juiz presidente tenha tomado as medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a sua comparência.
-
É que no seguimento do artigo 32° da CRP, o arguido é titular de vários direitos fundamentais, nos quais se deve incluir o direito de ser ouvido pelo tribunal, tais direitos encontram-se concretizados nos artigos 61° n° 1 al. b) do e 333° n° 3 2 ambos do CPP.
-
E ao não ter tomado todas as diligências necessárias para assegurar a presença do arguido no julgamento, o Tribunal a quo cometeu uma nulidade insanável, conforme referido no artigo 119°, nº 1 al. c) do CPP.
-
Tal nulidade implica a invalidade das sessões de julgamento e a própria sentença recorrida, devendo o tribunal proceder às respectivas repetições, (cfr artigo 122.° n.ºs 1e 2 do Código do Processo Penal).
-
Caso não seja determinado a repetição do julgamento, o que só por mera hipótese se admite, deverá a pena de prisão efectiva ser convertida em pena suspensa ou em alternativa ser substituída por trabalho a favor da comunidade.
-
Entende-se que as finalidades da pena seriam perfeitamente atingidas por uma condenação a pena suspensa ou pela substituição da pena pela, prestação de trabalho a favor da comunidade conforme alude o artigo 58° do CP.
-
Não podemos olvidar que a condução sem habilitação legal dentro do ordenamento jurídico repressivo, representa um caso de criminalidade bagatelar.
-
E este tipo de criminalidade salvo melhor opinião não se combate com a aplicação da sanção mais gravosa do nosso ordenamento jurídico, isto é a prisão efectiva.
-
A pena de prisão deve ser encarada como a ultima ratio. Alias é perfeitamente explicito na exposição dos motivos do D.L 48/95 de 5 de Março, no seu nº 4 e dando origem ao artigo 70° do CP.
"Devendo a pena de prisão ser reservada para situações de maior gravidade e que mais alarme social provocam, designadamente a criminalidade violenta e ou organizada, bem como a acentuada inclinação para a prática de crimes revelada por certos agentes, necessário se torna conferir às medidas alternativas a eficácia que lhes tem faltado.
-
E estando o arguido inserido profissionalmente, ao condená-lo a pena de prisão efectiva, a qual tem na sua essência, a ressocialização do agente, irá produzir o efeito inverso.
-
Poi e conforme é referido no relatório social, o arguido trabalha. É a principal fonte de rendimento do agregado familiar, composto por 2 filhos menores, 1 enteada e mais outra menor sua filha à qual também deve dar sustento.
-
A sua privação da liberdade, irá provavelmente ditar o seu despedimento, causando assim transtornos para os que deles dependem e para a sociedade.
-
Da última condenação em 2017 por factos posteriores aos dos presentes autos, resultou a sujeição a um regime de prova, O que permitiria ao Tribunal a quo a formular um juízo de prognose favorável quanto ao futuro comportamento do arguido, permitindo-lhe assim interiorizar a censura do facto e a ameaça de prisão, como refere o nº 1 do artigo 50º do CP in fine.
-
E como bem refere o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 11-03-2015, o juízo de prognose favorável consubstancia-se na convicção que o arguido não cometerá novos crimes.
-
Aquele regime de prova deveria ter permitido ao Tribunal a quo, optar por uma condenação a uma pena de prisão suspensa na sua execução ou a substituição por trabalho a favor da comunidade.
-
O Tribunal a quo violou assim os artigos 50°, 58°, 70º e 71°, todos do C.P. e os artigos 32° da CRP, 61° nº 1 al. b), 112° nºs 1 e 2, 119º nº 1 al. c.) e 333° nº 3, todos do CPP.
-
Deverão assim os Venerandos Juízes Desembargadores, dar provimento ao presente recurso e ordenar a repetição do julgamento, e caso assim não o entendam o que só por mera hipótese se admite decretar a suspensão da execução da pena de prisão ou a condenação em trabalho a favor da comunidade.
Em suma, deverá ser ordenada a repetição do julgamento por o arguido não ter sido informada da data da leitura da sentença e não ter tomado o Tribunal todas as diligências necessárias para assegurar a presença do mesmo. Caso isso não suceda entende-se que o Tribunal a quo em face dos pressupostos elencados pelo artigo 50° do CP, deveria ter formulado um juízo de prognose favorável ao arguido, pois a condenação a prisão efectiva deve ser reservada a crimes mais graves e não para a criminalidade bagatelar, sendo que as finalidades da punição, as necessidades de prevenção geral e especial, seriam perfeitamente alcançadas com a simples ameaça da prisão efectiva ou o trabalho a favor da comunidade.
Nestes termos e nos melhores de direito deverá ser dado provimento ao recurso, fazendo-se assim a habitual e costumada ... JUSTIÇA! O recurso foi regularmente admitido.
O Ministério Público, junto da 1ª Instância, apresentou resposta ao recurso pugnando pela respetiva improcedência e manutenção da decisão recorrida, formulando as seguintes conclusões: 1.
O arguido foi notificado para a morada constante do termo de identidade e residência para a data em que se iniciou o julgamento, conforme fls. 125 dos autos.
-
O tribunal não tem de diligenciar pela comparência do arguido em juízo, conforme tem sido entendimento, já constante do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 9/2012, disponível para consulta em www.dgsi.pt, e cujo resumo ora transcrevemos: “Notificado o arguido da audiência de julgamento por forma regular, e faltando injustificadamente à mesma, se o tribunal considerar que sua presença não é necessária para a descoberta da verdade, nos termos do n.º 1 do artigo 333.º do CPP, deverá dar início ao julgamento, sem tomar quaisquer medidas para assegurar a presença do arguido, e poderá encerrar a audiência na primeira data designada, na ausência do arguido, a não ser que o seu defensor requeira que ele seja ouvido na segunda data marcada, nos termos do n.º 3 do mesmos artigo”.
-
Como se percebe do conteúdo das duas actas, constantes de fls. 126 e 141 dos autos, o defensor do arguido nada requereu.
-
A sentença não enferma de qualquer nulidade, devendo, em consequência, manter-se a mesma.
-
O arguido foi condenado pela prática de um crime de condução de veículo sem habitação legal, previsto e punido nos termos do artigo 3.º, n.º 1 e 2, do DL n.º 2/98, de 3 de Janeiro, na pena de 1 ano e 4 meses de prisão efectiva, o que não se mostra excessivo.
-
Porque a escolha da pena deve ser encontrada com aplicação dos critérios constantes dos artigos 40.º, n.º 1 e 70.º, ambos do Código Penal e deve ter em atenção que o arguido conta já com mais 5 condenações pela prática de crime de igual natureza no seu certificado de registo criminal.
-
A última condenação aconteceu por factos datados de 30 de Agosto de 2017, na qual o arguido foi sentenciado a 6 meses de prisão, suspensa por 1 não e com regime de prova...
-
-
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO