Acórdão nº 153/18.1T8LGS.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelTOMÉ DE CARVALHO
Data da Resolução24 de Outubro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo nº 153/18.1T8LGS.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Faro – Juízo Central Cível de Portimão – J2 * Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora: * I – Relatório: Na acção declarativa sob a forma de processo comum proposta por “(…) – Transporte e Comércio de (…), Lda.” contra “(…), Unipessoal, Lda.” foi proferido saneador-sentença. Devidamente notificada, a Autora veio interpor recurso.

* A Autora pediu que a Ré fosse condenada no pagamento da quantia de € 40.000,00 e juros, calculando os já vencidos em € 9.227,28.

* Para o efeito, a Autora alega que celebrou com a Ré um acordo denominado de “promessa de cedência de estabelecimento e venda de embarcação”, tendo as partes acordado no preço – € 160.000,00 –, parcialmente pago aquando da outorga do contrato promessa – € 80.000,00 – e o remanescente na data da assinatura do contrato definitivo, acrescida de um reforço do sinal – € 40.000,00.

Afirma ainda que a Ré fez várias promessas de cumprimento do contrato, mas nunca pagou o remanescente do preço, mesmo após a Autora lhe ter enviado carta em que marcava data e local para realização da escritura do contrato definitivo.

* Devidamente citada, a Ré contestou, aceitando a outorga do acordo e alegando incumprimento do mesmo por banda da Autora.

* A Ré deduziu pedido reconvencional, recorrendo essencialmente à mesma fundamentação.

* A Autora apresentou articulado de réplica.

* Em sede de despacho saneador, o Tribunal «a quo» decidiu julgar: a) a acção improcedente por não provada e, em consequência, absolveu a Ré do pedido.

  1. a reconvenção improcedente por não provada, absolvendo-se a Autora reconvinda do pedido.

    * A recorrente não se conformou com a referida decisão e as alegações de recurso continham as seguintes conclusões:

  2. A sentença declara a acção improcedente, considerando que não se pode dizer que há incumprimento definitivo por banda da Ré, pois que, a tal conclusão não permite que se chegue em face da factualidade (alegada e) provada.

  3. Isto porque, a Autora apenas alegou e provou que em Outubro de 2016 enviou uma carta à Ré marcando o local e data para assinatura do contrato definitivo, não alegou a Autora que a Ré recebeu a carta a que se refere a factualidade dada por provada, pelo que não se pode sequer dizer que a Ré está em mora.

  4. O pedido da acção assenta no facto da Ré recusar cumprir o contrato (pagar o valor de € 40.000,00). A posição expressa da Ré, reflectida na sua contestação, é que não vai cumprir o contrato (ou seja, pagar o valor de € 40.000,00).

  5. A Ré, na sua contestação, refere expressamente que, no seu entendimento, a prestação tornou-se parcialmente impossível, encontrando-se, por uma impossibilidade objectiva superveniente desonerada da obrigação.

  6. A questão se existe incumprimento definitivo ou não, se a Ré tem que ser interpelada para cumprir o contrato, ou não, está ultrapassada, pela posição expressa das partes nos articulados, a Autora que diz que a Ré recusa cumprir o contrato e a ré diz que está desonerada dessa obrigação.

  7. A finalidade da prova da recepção da carta é provar a recusa do cumprimento do contrato pela Ré que, por seu turno, afirma peremptoriamente que não vai cumprir o contrato.

  8. Assumindo a Ré que a não vai cumprir o contrato, deve o processo prosseguir os seus trâmites para apurar se assiste à Autora o direito à quantia peticionada.

  9. A Ré contestou a acção, sem arguir a ineptidão da petição inicial, revelando ter percepcionado quais os pedidos formulados pela Autora com a propositura da presente acção, o que, nos termos do disposto no artigo 186.º, n.º 3, do CPC, afasta a possibilidade de se declarar a ineptidão da petição inicial, com fundamento na falta ou ininteligibilidade da causa de pedir.

  10. O Tribunal em questões de insuficiência de alegação de matéria de facto, hoje em dia, está vinculado face à redação do nº 2 do artº 590º do CPC ao convite às partes, não podendo avançar no processo sem previamente ter cumprido este comando.

  11. Impunha-se o convite ao aperfeiçoamento, por força do artigo 590º, nº 4, do CPC, o qual impõe que o juiz convide a parte a suprir as insuficiências ou imprecisões na exposição ou concretização da matéria de facto alegada, fixando prazo para ser completado ou corrigido o inicialmente produzido.

  12. Na apreciação do pedido da Autora foi dada relevância à deficiência do articulado, ou seja, o pedido formulado pela Autora foi julgado improcedente precisamente com fundamento naquela deficiência.

  13. A omissão do referido dever funcional de proferir despacho de convite ao aperfeiçoamento da petição inicial constituiu um desvio à regular tramitação do processo, e teve influência directa no desfecho da causa, pelo que configura uma nulidade, nos termos do artº. 195º, nº 1, 2ª parte, do CPC.

    Nesta conformidade, e em consequência, cumpre anular a decisão recorrida, devendo:

  14. O processo prosseguir os seus termos para apuramento do pedido da Autora, ou, quando assim não se entender, b) O Tribunal a quo deve praticar o acto omitido, proferindo despacho de convite ao aperfeiçoamento da petição inicial pela Autora, assim se fazendo Justiça!».

    * Não houve lugar a resposta.

    * Admitido o recurso, foram observados os vistos legais.

    * II – Objecto do recurso: É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do Tribunal ad quem (artigo 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608º, nº 2, ex vi do artigo 663º, nº 2, do mesmo diploma). Analisadas as alegações de recurso, o thema decidendum está circunscrito à apreciação da apreciação da violação da obrigação de emissão de despacho de aperfeiçoamento.

    * III – Dos factos apurados: 3.1 – Factualidade provada: Com interesse para a boa decisão da causa, mostram-se provados, por acordo e documentos, os seguintes factos: 1. Autora e Ré outorgaram em 14/07/2014 documento escrito denominado “Contrato promessa de cedência de estabelecimento e compra e venda de embarcação”, nos termos do qual, que no mais se dá por integrado e reproduzido, resulta que “(…) Primeira Outorgante: “(…)– Transporte e Comércio de (…), Lda.”, Sociedade Comercial por Quotas, com sede em Largo (…), Edifício (…), Loja A – 1.º Andar, na cidade, freguesia e concelho de Portimão, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Portimão sob o NIPC (…), neste acto representada pelo seu sócio-gerente, que outorga nessa qualidade e com poderes de vinculação da referida sociedade, adiante designada Promitente Cedente.

    Segunda Outorgante: “(…), Unipessoal, Lda.”, com sede na Rua das (…), s/n, freguesia de Sagres, concelho de Vila do Bispo, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Vila do Bispo sob o número único de matrícula e de pessoa colectiva (…), com o capital social de € 5.000,00 (cinco mil euros), neste acto representada pelo seu sócio-gerente, Sr. (...), que outorga nessa qualidade e com poderes de vinculação da referida Sociedade, adiante designada por Promitente Cessionária.

    Considerando: A – Que a promitente cedente é titular da licença de utilização de Recursos Hídricos para culturas biogenéticas, com o número (…), emitida a (…) pela Administração da Região Hidrográfica do Algarve, I.P.

    Que essa licença permite uma área total de implantação do projecto integrado em domínio público hídrico de 322.717,5 m2.

    Que a coberto dessa licença se encontra instalada uma infra-estrutura em mar aberto, com uma área de 9 (nove) hectares, para cultivo e engorda de bivalves, localizada na Costa Atlântica (…), numa zona denominada Ponta dos (…).

    Que essa estrutura possui dez linhas de 300 (trezentos) metros cada, em malha, "longlines" perfazendo 54 Lotes.

    Que a referida instalação, tem o sistema de ancoragem em 30 (trinta) linhas de molho de 115 (cento e quinze) metros cada, 110 (cento e dez) metros de cabo polysteel e 5 (cinco) metros de corrente, fixos a uma poita de betão de 3,5 (três e meia) toneladas.

    Que a promitente cedente, é também titular do direito de utilização de uma parcela dominial com a área total de 600 (seiscentos) metros quadrados, para armazenagem de material, localizada no Porto da...

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