Acórdão nº 305/16.9T8EVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 14 de Março de 2019
Magistrado Responsável | MANUEL BARGADO |
Data da Resolução | 14 de Março de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora I - RELATÓRIO BB instaurou a presente ação declarativa, com processo comum, contra CC, pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 14.427,73, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde 03.04.2014 até efetivo e integral pagamento.
Alegou, em síntese, que autor e ré viveram em união de facto desde o ano de 2006 até 09.03.2014, tendo durante a pendência da vida em comum adquirido em conjunto vários bens, os quais à data da rutura da vida em comum tinham os valores que indica, sendo um desses bens um veículo automóvel, com a matrícula 62-10-57, adquirido pelo valor de € 24.708,00, dos quais € 7.709,20 foram amortizados por via da entrega do veículo …-…-XA, propriedade do autor.
À data da cessação da vida em comum autor e ré tinham, em conjunto, direito a reembolso de IRS respeitante ao ano de 2013, no valor de € 840,00 e haviam também contraído passivo, resultante de créditos contraídos junto de várias entidades bancárias e financeiras, cujo valor total ascendia a € 12 400,96, sendo que tais dívidas beneficiavam de planos de amortização, com pagamentos em prestações, tendo as partes acordado em pôr termo à compropriedade nos referidos bens e proceder à sua divisão, tendo todos os bens do ativo sido adjudicados à ré, o mesmo sucedendo com o reembolso do IRS, e quanto ao passivo foi acordado que uma parte do mesmo ficava da responsabilidade do autor e outra ficaria da responsabilidade da ré.
Das divisões feitas ficou a caber à ré de valores do ativo a quantia de € 17.480,00 e de valores de passivo o montante de € 3.131,75, ficando a caber ao autor o valor do passivo de € 9.269,31, pelo que feitas as devidas compensações, resultou um saldo credor a favor do autor de € 14.427,73, cujo montante a ré não pagou.
A ré contestou, impugnando parte da factualidade alegada na petição inicial, contrapondo que não lhe foi adjudicado o ativo de € 17.480,00, mas apenas o de € 2.144,00, sendo adjudicado ao autor o de € 4.901,07, e quanto ao passivo ficou a cargo da ré pagar o pagamento da quantia de € 11.822,21 e não de € 3.131,75, sendo ainda o autor devedor à ré das dívidas próprias que esta pagou e que identifica, no montante de € 23.556,51.
Deduziu ainda a ré reconvenção, pedindo que a partilha seja feita nos termos do acordo junto como “Doc. nº 1” e o autor/reconvindo condenado a pagar-lhe a quantia de € 2.095,00. Mais pede a condenação do autor como litigante de má-fé, em multa e indemnização que o Tribunal julgue mais adequada.
O autor apresentou réplica, a qual, por despacho proferido em 05.01.2017, foi mandada desentranhar com fundamento na sua extemporaneidade.
Dispensada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador tabelar e admitido o pedido reconvencional, com subsequente identificação do objeto do litígio e indicação dos factos assentes e enunciação dos temas da prova, sem reclamação.
No início da audiência de julgamento ocorrida em 06.11.2017, a ré veio ampliar o pedido reconvencional, o que obteve provimento parcial nos ternos da decisão proferida a fls. 257 e 258.
Por despacho de fls. 270 proferido em 15.02.2018, foi atualizado o objeto do litígio.
Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença em cujo dispositivo se consignou: «Pelo exposto, o Tribunal decide:
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Julgar improcedente, por não provado, o pedido deduzido pelo autor e, em consequência, absolver a ré do mesmo; b) Julgar parcialmente procedente o pedido reconvencional deduzido pela ré contra o autor e, em consequência, condenar o autor a pagar à ré a quantia de 2.095,00€ e ainda, nas prestações vincendas que venha a pagar, a que acresce o montante de € 23556,31, relativo a dívidas próprias do autor, anteriores à união de facto e pagas na pendência desta, com fundamento no enriquecimento sem causa do mesmo.
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Julgar improcedente por não provado o pedido de condenação por litigância de má-fé do autor, absolvendo-o do mesmo.
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Custas do pedido principal a cargo do autor, nos termos do artigo 527.º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.
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Custas do pedido reconvencional a cargo do autor nos termos do artigo 527.º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.
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Custas do pedido de condenação como litigante de má-fé, a cargo da ré.
» Inconformado, o autor recorreu não apenas da sentença, mas ainda do despacho saneador “na parte em que julgou o processo isento de nulidades que o invalidassem e que julgou inexistentes nulidades ou questões prévias que cumprisse conhecer” e do despacho que admitiu a ampliação do pedido reconvencional, finalizando as alegações com as conclusões que a seguir se transcrevem: «i. Visa-se por este meio a impugnação do douto despacho saneador (referência 26824559) na parte em que julgou o processo isento de nulidades que o invalidassem e que julgou inexistentes nulidades ou questões prévias que cumprisse conhecer, do douto despacho de 6/11/2017 (referência 27182545) que admitiu a ampliação do pedido reconvencional e da douta sentença de 20/06/2018, impugnação por esta ordem dada a relação de prejudicialidade entre elas.
ii. Como se vê do articulado de contestação da Ré, autonomizou ela dois items: o da contestação; o da reconvenção - assim os epigrafando: contestando; reconvindo.
iii. Da economia e termos do item contestação (art.s 1º a 40º do articulado da Ré) vê-se que a defesa foi somente por impugnação, ainda que impugnação fundamentada ou per positionem se tratasse.
iv. Estando em causa esse tipo de defesa, e visto o disposto na alínea c) do artigo 572º do C.P.C. ( “Na contestação deve o réu: c) Expor os factos essenciais em que se baseiam as exceções deduzidas, especificando-as separadamente, sob pena de os respetivos factos não se considerarem admitidos por acordo por falta de impugnação), os factos levados à impugnação fundamentada ou per positionem têm-se por antecipadamente impugnados (na medida e termos em que se mostrem incompatíveis com a posição do autor expressa na petição inicial) – portanto, toda a matéria invocada pela ré em desconformidade ou além da levada à petição inicial se haveria de ter por impugnada.
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Por sua vez, quanto à reconvenção vale a regra do nº 1 do art. 583º: a reconvenção deve ser expressamente identificada e deduzida separadamente na contestação, expondo-se os fundamentos e concluindo-se pelo pedido, nos termos das alíneas d) e e) do nº 1 do art. 552º (a reconvenção é uma verdadeira e própria ação, ainda que a jusante da do autor, sujeita, por isso, aos requisitos desta).
vi. A omissão daqueles requisitos torna a petição reconvencional inepta, nos termos cominados no nº 2 do art. 186º, tornando nulo todo o processo reconvencional – nº 1 do 186º - com a consequência da nulidade de todo o processado posterior (art. 187º).
vii. Trata-se, por outro lado, de nulidade de conhecimento oficioso (art. 196º).
viii. Ora, no caso e no que à reconvenção concerne, a ré limitou-se a exarar os art.s 41º a 51º, claramente insuficiente em termos de cumprimento do exigido pela alínea d) do art. 552º (por força do 1 do 583º).
ix. Os art.s 41º a 51º da reconvenção encerram, todos eles, matéria manifestamente conclusiva, conclusões essas não suportadas em matéria fáctica adrede alegada, alegação essa que, como acima já dito, era ónus da reconvinte (nº 1 do 583º e d) do 1 do 552º), não tendo a reconvinte sequer invocado para esse efeito os precedentes art.s 1º a 40º - técnica que já de si seria defeituosa ou pouco explícita na medida em que competiria, nesse caso, ao reconvindo discernir de quais os factos que seriam relevantes também para a reconvenção daqueles que interessariam tão somente à matéria de impugnação, (mas à qual, esta última, nem seria admissível que se pronunciasse).
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Embora aquando do despacho de 19/05/2017 o tribunal tivesse intuído e tido presente a questão de ineptidão do pedido reconvencional, o tribunal no despacho saneador de 26/06/2017 veio a tomar posição expressa quanto à existência de nulidades que invalidassem o processo e das quais cumprisse conhecer no sentido negativo (o processo é o próprio, sem nulidades que o invalidem, e inexistem nulidades ou questões prévias que cumpra conhecer), afirmando, além do mais, expressamente que o pedido reconvencional se mostrava em conformidade com o disposto nos art.s … 583º do C.P.C.
xi. Ora, e como acima se intentou demonstrar, a petição reconvencional mostrava-se inepta por desrespeito precisamente ao nº 1 do art. 583º, e por correlação, à alínea d) do nº 1 do 552º, ineptidão que implicava a nulidade da instância reconvencional por força dos nºs 1 e 2 do art. 186º, a cujo conhecimento o tribunal estava vinculado nos termos do art. 196º.
xii. Aquele despacho fez nessa parte agravo àqueles preceitos, por isso merecendo ser revogado, declarando-se em seu lugar a nulidade decorrente da ineptidão.
xiii. Mesmo que se entendesse - e por cautela se diz - que a petição reconvencional não enfermava do vício da ineptidão, teria então que se concluir sofrer das deficiências que os nºs 3 e 4 do art. 590º do C.P.C. contemplam - isto é, que o método e os termos adotados para a exposição reconvencional eram duvidosos, pouco claros, conclusivos, imperfeitos, portanto, para assegurar a plenitude do contraditório e o princípio do processo “justo”.
xiv. Deveria então o juiz deitar mão do poder a que está vinculado constante do disposto no art. 590º, nº 1, b) e nº 4, do NCPC, e ter convidado a Ré a aperfeiçoar a sua petição, articulando todos os factos que suportam a sua pretensão.
xv. Não o tendo feito, e sendo tal aperfeiçoamento essencial para apreciar a bondade da pretensão da Ré, plasmada deficientemente na sua petição, o tribunal teria incorrido em nulidade por preterição de um seu dever vinculado – assim se lê por exemplo no Acórdão da Relação de Évora de 5/11/2015, Proc. 2635/11.7TBEVR.E1, na linha do que, de resto, se supõe ser jurisprudência uniforme.
xvi. A não ter concluído pela ineptidão da petição reconvencional nem pelo convite ao...
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