Acórdão nº 95/16.5PBSTR-B.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 05 de Fevereiro de 2019

Magistrado ResponsávelCARLOS BERGUETE COELHO
Data da Resolução05 de Fevereiro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora 1.

RELATÓRIO Nos autos em referência, do Juízo Central Criminal de Santarém do Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, proferiu-se despacho que decidiu revogar a suspensão da execução da pena de 4 (quatro) anos de prisão aplicada ao arguido/condenado NN, nos seguintes termos: «1. Relatório Por acórdão, transitado em julgado em 21 de Junho de 2017, NN pela prática, em concurso efectivo e como co-autor material, de um crime de roubo, previsto e punido pelos artigos 210.º, n.ºs 1 e 2, alínea b) do Código Penal, por referência ao artigo 204.º, n.º 2, alínea f), do mesmo diploma legal, na pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão; de um crime de sequestro, previsto e punido pelo artigo 158.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 1 (um) ano de prisão; e, em cúmulo jurídico, na pena única de 4 (quatro) anos de prisão, a qual foi suspensa na sua execução por igual período e sujeita a regime de prova, assente em plano social de recuperação a elaborar pelo Instituto de Reinserção Social.

* Para além da aludida condenação, compulsado o certificado de registo criminal de NN verifica-se que o mesmo tem os seguintes antecedentes criminais: 1.1) Por sentença, proferida em no âmbito do processo com o n.º 756/17.1PBSTR e transitada em julgado em 22 de Novembro de 2017, NN foi condenado pela prática, em 3 de Setembro de 2017, de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, na pena de 80 (oitenta) dias de multa à taxa diária de €5,00 (cinco euros).

* Compulsados os autos, verificou-se que, não obstante as diligências realizadas pela DGRSP, o arguido nunca compareceu nas suas instalações, nem respondeu às notificações do Tribunal ou se interessou, por qualquer modo, pela execução da pena aplicada ao mesmo, o que inviabilizou a elaboração do plano de reinserção social.

Tomaram-se declarações ao arguido que compareceu coercivamente em Tribunal e não manifestou qualquer investimento num projecto de vida normativo. Aliás, como bem refere o Ministério na promoção que antecede, no decurso das suas declarações “NN não logrou justificar as razões do desacatamento, revelando, ademais, mediante o seu discurso anódino, enorme falta de juízo de auto censura”.

Cumpre apreciar e decidir.

  1. Fundamentação Em conformidade com o disposto no artigo 56.º, n.º 1 do Código Penal que “a suspensão da execução da pena de prisão é revogada sempre que, no seu decurso, o condenado: a) Infringir grosseira ou repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos ou o plano individual de readaptação social; ou b) Cometer crime pelo qual venha a ser condenado, e revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas.” No entanto, salienta Maia Gonçalves que “a condenação por crime doloso cometido durante o período de suspensão deixou de provocar automaticamente a revogação da suspensão, contrariamente à solução tradicional, tanto na vigência do CP de 1986 como na da versão originária do Código de 1982. Tudo depende agora tão só do condicionamento estabelecido no nº 1, o qual se aplica a todas as modalidades da suspensão da execução da pena de prisão” (cfr.

    Código Penal Português, Anotado e Comentado, 15ª edição, pág. 212).

    A este propósito, "importa não olvidar que a suspensão da pena de prisão insere-se numa filosofia jurídico-penal assente num princípio de subsidiariedade da pena privativa de liberdade e que pressupõe que, no momento da decisão, o julgador possa fazer um juízo de prognose favorável ao comportamento futuro do arguido, juízo este não necessariamente assente numa certeza, bastando, pois uma expectativa fundada de que a simples ameaça da pena seja suficiente para realizar as finalidades de punição e, consequentemente, a ressocialização do arguido – em liberdade!” (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de Julho de 1998, in CJ, tomo II, pág. 253).

    A finalidade político-criminal que a lei visa com o instituto da suspensão é, pois, clara e determinante: o afastamento do delinquente, no futuro, da prática de novos crimes e não qualquer "correcção”, “melhora” ou – ainda menos – “metanoia” das concepções daquele sobre a vida e o mundo. Decisivo é aqui o “conteúdo mínimo” da ideia de socialização, traduzida na “prevenção da reincidência” (cfr. Figueiredo Dias, in Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, pág. 519).

    Pressuposto formal da sua aplicação é que a medida da pena de prisão aplicada (em concreto) não seja superior, actualmente, a cinco anos. Pressuposto material é que o tribunal, atendendo à personalidade do agente e às circunstâncias do facto, conclua por um prognóstico favorável relativamente ao comportamento do arguido: a simples censura do facto e a ameaça da pena bastarão para afastar o delinquente da criminalidade e para satisfazer as necessidades de reprovação e prevenção do crime. Aliás, nunca será de mais lembrar que a suspensão de uma pena não prejudica os fins da prevenção criminal, sendo a ameaça da sua execução um factor que pode ser altamente dissuasor de novas violações criminais (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 31 de Março de 1993, in BMJ n.º 425, pág. 331 e ss).

    Assim, dentro dos limites consentidos pela prevenção geral positiva ou de integração, devem actuar pontos de vista de prevenção especial de socialização, sendo eles que vão determinar, em último termo, a medida da pena. Esta deve, em toda a sua extensão possível evitar a quebra da inserção social do agente e servir a sua reintegração na comunidade, só deste modo e por esta via se alcançando uma eficácia de protecção dos bens jurídicos. A função de socialização constitui actualmente o vector mais relevante da prevenção especial. A medida das necessidades de socialização do agente é, pois, em princípio, o critério decisivo das exigências de prevenção especial para efeito de medida da pena (neste sentido, vide Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Maio de 1995, in CJ, tomo II , pág. 210 e ss).

    Assim, a condenação pela prática de um crime no decurso do período de suspensão da execução da pena só implicará a revogação da suspensão se a prática desse crime infirmar definitivamente o juízo de prognose favorável que esteve na base da suspensão, quer dizer, a esperança fundada de que a simples censura do facto e a ameaça da pena de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (neste sentido, Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, pág. 357), pois que então não se cumpriram as expectativas que motivaram a concessão daquela suspensão.

    No caso sub judice, verifica-se, desde logo, que o arguido foi condenado pela...

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