Acórdão nº 18/15.9T9MMN.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 07 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelANTÓNIO JOÃO LATAS
Data da Resolução07 de Maio de 2019
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora I. Relatório 1. Nos presentes autos de processo comum com intervenção do tribunal singular que correm termos no Juízo de Competência Genérica de Montemor-O-Novo (Juiz 1) do Tribunal Judicial da Comarca de Évora, foi sujeita a julgamento, AA, divorciada, gestora de projetos, natural da Holanda, a quem o MP imputara a prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de falsificação p. e p. pelo artigo 256.°, n, 1, alínea e), do Código Penal.

O assistente, BB, na sequência do reenvio dos autos para a forma de processo comum, deduziu acusação particular contra a arguida.

  1. Realizada Audiência de Discussão e Julgamento, o tribunal singular decidiu condenar a arguida, AA, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de falsificação p. e p. pelo artigo 256.°, n,º 1, alínea e), do Código Penal, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa à taxa diária de € 12 (doze euros), perfazendo o montante global de € 1.440 (mil quatrocentos e quarenta euros); 3.

    Desta decisão, vem a arguida interpor o presente recurso, extraindo da sua motivação as seguintes «III. CONCLUSÕES

    1. Resultou provado nos presentes autos que aquilo que teria sido entregue na clínica veterinária Optivet não havia sido uma declaração falsificada, mas uma fotocópia.

    2. Não existe, no caso concreto, uma declaração (documento com relevo jurídico, idóneo a provar facto juridicamente relevante) mas apenas uma fotocópia.

    3. A fotocópia em questão não pode integrar o conceito de documento para efeitos de direito penal, ou seja, idóneo a provar facto juridicamente relevante, nos termos do disposto no artigo 255.°, aI. a), do CP.

    4. O relatório pericial constante dos autos não foi, nem poderia ser, conclusivo, sendo que aquilo que daí resultou foi a da existência de probabilidade de a assinatura constante de um hipotético documento subjacente à fotocópia poder ter sido manipulada.

    5. Não se encontra preenchido o tipo legal em causa porquanto não foi utilizado um documento com relevo jurídico penal, mas apenas uma fotocópia a qual não era idónea a provar facto juridicamente relevante.

    6. O tipo legal de crime em questão pressupõe que haja intenção daquele que usa um documento falso (o que, como vimos, não se verificou por não estarmos perante um documento e, por isso, não poder o mesmo ser falso, mas apenas uma fotocópia impressa) de obter para si ou para outra pessoa um benefício ilegítimo, ou de preparar, facilitar, executar ou encobrir outro crime.

    7. A Arguida ao requerer o registo do canídeo em seu nome não pretendeu obter nenhum benefício ilegítimo.

    8. A decisão recorrida violou, de resto, o disposto nos artigos 255.°, al. a), e 256.°, n. 1, al. e), ambos do CP.

    Termos em que, e nos melhores de Direito doutamente supridos por Vossas Excelências, deverá o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a decisão recorrida e absolvendo-se a Arguida do crime que lhe é imputado, Assim se fazendo inteira JUSTIÇA!» 4. Notificados, o MP e o Assistente, BB, vieram apresentar resposta ao recurso em que pugnam pela sua improcedência.

  2. Nesta Relação, o senhor Procurador Geral Adjunto emitiu parecer no mesmo sentido.

  3. Sentença recorrida (transcrição parcial): «2.1. Factos provados 1 Com interesse para decisão da vertente causa penal resultaram demonstrados os seguintes factos: Das acusações 1. A arguida AA e BB foram casados desde 08 de Agosto de 2008, tendo vivido até 2014 na Herdade...

  4. Desde Junho de 2013 que a arguida e BB tinham consigo um canídeo de raça boxer, tigrado.

  5. No dia 18/06/2013, o referido canídeo foi registado no SIRA (Sistema de Identificação e Recuperação Animal), com o Código de Chip 982000210065759, em nome de BB.

  6. Em Maio de 2014, aquando do terminus da relação conjugal, a arguida decidiu que iria transferir a propriedade do referido canídeo para si.

    1 Consigna-se que não se consideram os factos constantes da acusação particular na parte em que referem que a própria arguida falsificou a declaração que constitui o cerne dos autos, aí colocando ela mesma, mediante montagem, a assinatura do assistente, cabendo relembrar que o Ministério Público emitiu despacho de arquivamento nesse tocante (v., aliás, fls. 12 e 13 do despacho do Ministério Público de 7.11.2016) e que o assistente não reagiu contra o mesmo, mormente requerendo a abertura da instrução. Não obstante, sempre é de considerar que, ainda que assim não fosse, sempre a factualidade aduzida pelo assistente sempre resultaria elencada de entre os factos não provados, pois que da prova produzida em audiência de discussão e julgamento não foi viável esclarecer quem produziu a montagem, nomeadamente não se extraindo de qualquer meio de prova quem a terá realizado.

  7. De forma não concretamente apurada, sem o conhecimento de BB, desconhecidos, apuseram em declaração de cedência, no Detentor Anterior, a assinatura daquele, através de montagem e mediante cópia extraída dessa declaração e assinatura.

  8. Assim, de forma não concretamente apurada, a arguida entrou na posse da cópia extraída da declaração de cedência e da assinatura de BB aí montada, bem sabendo que tal assinatura não tinha sido aposta pelo punho daquele.

  9. Na posse da cópia da declaração referida em 6., que sabia ser falsa, a arguida, no dia 19/05/2014, entregou-a na Optivet - Serviços Médicos Veterinários, Lda, solicitando a alteração do registo do canídeo ao veterinário, e em consequência, desde essa data até 09/12/2014, o referido animal encontrou-se registado no SIRA em seu nome.

  10. A arguida sabia que a referida cópia de declaração de cedência que entregou na Clinica Veterinária seriam enviados, mediante digitalização, como efectivamente o foi, para o SIRA e faria crer enganosamente às entidades competentes que BB assinara tal documento expressando a sua vontade de ceder a posse do canídeo registado em seu nome, colocando assim em crise a fé inerente aos documentos e aos registos públicos, bem sabendo que, assim, prejudicava - como fez - o BB.

  11. Mais sabia a arguida que a sua conduta era proibida e punida por lei penal.

    Da contestação 10. O canídeo supra referido apareceu na Herdade …, tendo sido atirado por cima da cerca da Herdade.

  12. A arguida acolheu-o, como seu, tendo, desde então, tratado dele, alimentando-o, levando-o ao veterinário e dando-lhe afecto.

  13. Aquando do seu aparecimento, a arguida e o assistente levaram o canídeo ao veterinário no próprio dia porquanto uma das patas do mesmo aparentava não estar bem.

  14. O veterinário JC estimou a idade do cão em cerca de 6 a 12 meses, tendo a arguida decidido por uma data de nascimento, a qual foi levada ao registo do SIRA.

    Mais resultou demonstrado com relevância que: 14. A arguida não tem quaisquer condenações inscritas no certificado de registo criminal que...

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