Acórdão nº 2199/18.0T8EVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 30 de Maio de 2019
Magistrado Responsável | EMÍLIA RAMOS COSTA |
Data da Resolução | 30 de Maio de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Secção Social do Tribunal da Relação de Évora♣Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório “P…, SA” impugnou judicialmente a decisão da Autoridade para as Condições de Trabalho (doravante designada ACT) que aplicou à impugnante supra identificada o pagamento de uma coima no valor de €8.160,00 e a sanção acessória de publicidade, pela prática, como reincidente, de uma contraordenação muito grave, p. e p. pelos arts. 77.º do Decreto n.º 41821, de 11 de Agosto de 1958, 12.º da Portaria n.º 101/96, de 03-04, 22.º, n.º 1, al. m) e 25.º, n.º 4, ambos do DL n.º 273/2003, de 29-10 e 554.º, n.º 4 e 561.º, n.º 2, ambos do Código do Trabalho.
…O Tribunal de 1.ª instância julgou a impugnação judicial totalmente improcedente e, em consequência, manteve a decisão impugnada.
…Inconformada, veio a impugnante interpor recurso da decisão, apresentando as seguintes conclusões: a.
O Tribunal a quo manteve a decisão da Autoridade para as Condições de Trabalho que aplicou uma coima de 80 UC à Recorrente por ter desrespeitado as prescrições e regras técnicas de segurança e saúde no trabalho, nomeadamente não ter impedido a aproximação de trabalhadores não envolvidos na operação levada a cabo ou não ter implementado as medidas de prevenção adequadas, de modo a prevenir o risco de esmagamento e de atropelamento de trabalhadores.
b.
Tal-qualmente se demonstrou supra o sinistrado estava envolvido na operação levada a cabo, o que, aliás, resulta dos factos dados como provados: [facto 6.º] J… era condutor de um carro pesado para transporte da terra que estava a ser retirada da vala pela máquina escavadora, tendo saído do carro para ver se havia terra a ser transportada.
c.
Ora, resulta do facto dado como provado que o trabalhador estava envolvido nos trabalhos a ser executados, sendo, inclusivamente, a dita máquina escavadora que procederia ao carregamento das terras para o carro pesado.
d.
Desta maneira, não se pode concluir que se encontra preenchido o conceito de “pessoa estranha ao serviço resultante do § 3 do artigo 77.º do Decreto n.º 41821/58, de 11 de Agosto, motivo pelo qual, naturalmente, não pode a Recorrente ter cometido a contra-ordenação laboral ali identificada.
e.
Não pode igualmente ter cometido a contra-ordenação laboral ali identificada, porquanto não se encontram preenchidos os requisitos para a existência de uma contra-ordenação laboral, os quais constam do artigo 548.º do Código do Trabalho e que aqui se transcrevem: constitui contra-ordenação laboral o facto típico, ilícito e censurável que consubstancie a violação de uma norma que consagre direitos ou imponha deveres a qualquer sujeito no âmbito da relação laboral e que seja punível com coima.
f.
Se, por um lado, a própria sentença não autonomiza um facto típico e ilícito, antes resultando dois factos típicos alternativamente considerados, por outro, os factos típicos ali presentes não são censuráveis.
g.
A Recorrente adopta as medidas de segurança que pode adoptar para prevenir acidentes que sejam previsíveis.
h.
No caso sub judice não foi diferente, mas a sentença recorrida enferma de duas falácias.
i.
A primeira prende-se com a violação do princípio in dubio pro reo no que diz respeito à valoração da prova: o Tribunal, sem qualquer justificação, valorizou o testemunho da Inspectora da Autoridade para as Condições do Trabalho que se limitou a afirmar que não existia qualquer barreira de separação, tendo desvalorizado o testemunho de R… que afirmou quando cheguei vi que estava colocada uma baia a vedar o local onde o acidente de trabalho teve lugar.
j.
Ora, a existência ou não de uma baia no local tem relevância suma para a decisão de aplicação da coima, porquanto demonstra a existência de um perímetro de protecção.
k.
Não obstante, sem prescindir e ainda que tal baia não existisse, mantêm-se dificuldades de preenchimento do requisito da censurabilidade de tal facto: tal-qualmente resulta do Ac. TRC Processo n.º 974/10.3T4AVR.C1, Relator José Eusébio Almeida, se um trabalhador é perfeitamente temerário e descuidado, tem que se apurar se, não obstante, era previsível e possível afastar o acidente, mesmo com aquele descuido ou temeridade.
Continua o Ac. TRC Processo n.º 974/10.3T4AVR.C1, Relator José Eusébio Almeida, referindo que não parece ser imputável um comportamento negligente ao empregador que não prevê determinado risco exactamente quando o técnico especializado o não prevê.
l.
Neste caso, é certo, não se trata de um técnico especializado. Trata-se, sim, de um motorista que realiza aquele trabalho todos os dias, que tem vários anos de trabalho na construção e que não previu a possibilidade de que o acidente ocorresse.
m.
Ora, em tal caso será necessário verificar se a entidade empregadora o podia ter previsto e podendo-o ter previsto se o podia, também, ter prevenido.
n.
A resposta é negativa, para ambas.
o.
A verdade é que a entidade empregadora não o podia, com toda a probabilidade, ter previsto e, em simultâneo, também não o podia ter evitado: para tal, seria necessário construir erigir um muro de cada vez que o sinistrado se afastasse com terras, de maneira a que este não voltasse a aproximar-se do local até que a máquina escavadora parasse.
p.
Tal construção, inclusivamente, impediria o sinistrado de exercer as suas funções, uma vez que participava no trabalho de remoção de terras (era o motorista que as levava) e colocação de tubagem.
q.
Desta maneira, deve concluir-se pela inexistência de qualquer contra-ordenação laboral, sendo a sentença do tribunal a quo revogada e a impugnação judicial julgada totalmente procedente Nestes termos e nos demais de Direito que v/ Exa. doutamente suprirá, deve a sentença recorrida ser revogada, ser julgado procedente o presente recurso e, em consequência, ser a P…, S. A. absolvida da prática da infracção pela qual foi condenada e do pagamento da coima aplicada.
…Notificado o Ministério Público, veio o mesmo apresentar contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso, terminando com as seguintes conclusões: 1.
A Mma. Juiz, ao decidir pela improcedência do recurso da decisão da ACT fê-lo na sequência de uma adequada fixação da factualidade provada e de uma correcta aplicação da lei ao caso concreto.
-
Fê-lo de forma fundamentada, designadamente, quando explanou as razões que motivaram tal decisão e as razões porque entendeu valorar de modo diferenciado os depoimentos prestados em audiência de julgamento, o que fez sem violar o princípio in dubio pro reo.
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Demonstrou claramente que...
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