Acórdão nº 2888/16.4T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 30 de Maio de 2019
Magistrado Responsável | FRANCISCO XAVIER |
Data da Resolução | 30 de Maio de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acórdão da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora I – Relatório1. BB instaurou acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra CC (1.ª R.) e DD (2.º R.), pedindo: - A condenação de ambos os réus a reconhecerem o seu direito de preferência, na aquisição do prédio urbano sito na Rua Professor Egas Moniz, nºs … e …, freguesia e concelho de Vila Real de Santo António, inscrito na matriz sob o artigo …, descrito sob o n.º …, da freguesia de Vila Real de Santo António, ordenando-se a substituição do 2.º réu na propriedade do aludido prédio, com o consequente cancelamento do registo de aquisição a favor daquele réu e elaboração de outro a favor da aqui autora; e, - A condenação do 2.º réu a restituir à autora todas as rendas que esta depositou e venha a depositar na sua conta bancária em consequência do contrato de compra e venda do imóvel acima referido, acrescido de juros de mora, à taxa legal em vigor calculados desde cada um dos depósitos/transferências até efectiva e integral restituição.
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Os RR. apresentaram contestações, defendendo-se por impugnação e excepcionando a caducidade do direito de preferência, pugnando pela improcedência da acção, tendo a 1ª R. pedido ainda a condenação da A. como litigante de má fé.
A A. apresentou resposta a este pedido bem como à matéria da excepção.
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Dispensada a realização da audiência prévia, foi proferido despacho saneador tabelar, e procedeu-se à identificação do objecto do litígio, enunciação dos temas da prova e admissão das provas requeridas.
Realizada a audiência de julgamento veio a ser proferida sentença, na qual se decidiu: A) Julgar improcedente, por não provada, a excepção de caducidade invocada pela 1.ª ré CC; e, B) Julgar a acção integralmente procedente, porque provada e, por conseguinte: · Reconhece-se à autora BB o direito de preferência na compra e venda, pelo preço de € 96.500,00 (noventa e seis mil e quinhentos euros) do prédio urbano sito na Rua Professor Egas Moniz, nºs … e …, freguesia e concelho de Vila Real de Santo António, inscrito na matriz sob o artigo …, descrito sob o n.º …, da freguesia de Vila Real de Santo António; · Transfere-se a titularidade do direito de propriedade do identificado prédio, directamente, do réu DD para a autora BB, determinando-se o cancelamento do registo a favor daquele réu; · Condena-se o réu DD a reembolsar à autora todas as rendas recebidas na pendência da presente acção, desde a sua citação, acrescidos de juros de mora, à taxa legal em vigor a contar dessa data até integral e efectiva restituição, absolvendo-o do pedido de restituição das rendas relativas aos meses de Agosto e Setembro de 2016; C) Julgar improcedente, por não provado, o pedido de condenação da autora como litigante de má-fé, absolvendo-a do mesmo.
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Inconformado com o assim decidido recorreu o 2º R.
, DD, pedindo a revogação da sentença, nos termos e com os fundamentos seguintes [segue transcrição das conclusões do recurso]: 1.ª O facto provado 3 deverá passar a ter a seguinte redacção: A Autora fez do referido imóvel o centro da sua vida familiar, é ali que vive há mais de 40 (quarenta) anos, exceptuando os períodos em que se encontra doente, ali dormindo, tomando as refeições, recebendo amigos e familiares.
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O facto provado 4 deverá passar a ter a seguinte redacção: A 1.ª ré e o 2.º réu celebraram um acordo sujeito a escrito, datado de 21/7/2016, através do qual, a 1.ª ré se comprometia a vender e o 2.º réu a adquirir, o imóvel em questão, pelo preço global de € 96500,00 (noventa e seis mil e quinhentos euros), tendo, no momento da assinatura desse acordo, o 2.° réu entregue à 1.ª ré, na quantia de € 48.250.00€ (quarenta e oito mil duzentos e cinquenta euros) através do cheque n.º …74 sacado sobre a conta de que o 2.º réu “é titular no Banco Santander Totta, a título de sinal e princípio de pagamento, da qual a” 1.ª ré ficou de dar “quitação após boa cobrança do mesmo”. Acordaram, ainda, a 1.ª ré e 2.º réu, que o “remanescente do preço acordado, ou seja, o montante de € 48.250.00€ (quarenta e oito mil duzentos e cinquenta euros),” seria “pago no ato da escritura definitiva de compra e venda, através de cheque visado ou bancário, emitido a favor da” da 1ª ré. Mais acordaram que, a “escritura pública de compra e venda será celebrada no dia 12 de Agosto de 2016, às 10:00h, na Conservatória do Registo Predial de Vila Real de Santo António”, devendo o 2.º réu providenciar “pela entrega da documentação necessária à escritura até à referida data”.
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O facto provado 12 deverá passar a ter a seguinte redacção: Através de carta datada de 3/8/2016, tendo como remetente “CC” e estando assinada por uma ilustre Advogada, a mesma referiu o seguinte: (…) A escritura será realizada no dia 12 do corrente mês, a favor de DD, tal como previamente comunicado.
Por último, informo que, após a venda, será V. Exa. contactada pelo Sr. DD que lhe comunicará o modo de pagamento da renda.
Anexo - cópia da procuração que menciono no texto “(Vide doc. 5)” 4.ª Devem ser dados por provados os seguintes 3 factos que a instância recorrida deu por não provados ou omitiu referência: · A carta datada de 29.07.2016 e expedida por correio a 01.08.2016, foi recebida pela ré em 02.08.2016.
· Na reunião de dia 1/8/2016, a autora comunicou à Dra EE que não tinha condições para celebrar a escritura de compra e venda do imóvel e que não dispunha de qualquer meio de pagamento relativo ao sinal que lhe era exigido.
· A autora não pagou à ré CC o sinal de 48.250,00 Euros referido no contrato referido em 4 e 5 dos factos provados e na carta referida em 6 dos mesmos factos.
Quanto à matéria de direito: 5.ª A autora nunca exerceu validamente o seu direito de preferência, uma vez que a carta que aquela enviou à obrigada não se traduziu numa "aceitação" incondicional, sem modificações ou reticências do Projecto contratual que lhe foi comunicado; assim a autora renunciou ao direito de preferir; 6.ª A autora preferente não aceitou e não cumpriu de modo incondicional a matéria contratual relacionada com o pagamento do sinal e a celebração no tempo do contrato prometido, não pagou o sinal e tentou negociar a data da celebração do contrato prometido. Pelo que a autora renunciou ao direito de preferir 7.ª Sendo que na reunião havida em 1 de Agosto de 2016 entre a preferente e a advogada da obrigada resultou que a primeira pretendia outras cláusulas contratuais, nomeadamente a celebração do contrato prometido com terceira pessoa e em tempo de cumprimento diverso, pelo que a autora renunciou ao direito de preferir.
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A carta que a obrigada recebeu e enviada pela autora em 1 de Agosto de 2016 chegou seguramente após ter terminado o prazo legal de 8 dias para o exercício do direito de preferir, pelo que ocorreu a caducidade do direito.
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Assim, é inquestionável que a resposta ao tema essencial em debate só poder a ser a de: Não assiste à autora o direito de preferência na venda do imóvel descrito na Conservatória de Registo Civil de V.R.S.A sob o n.º …, da respectiva freguesia porque o mesmo caducou em virtude do seu não exercício atempado ou ao mesmo a autora renunciou.
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A julgar de outro modo, a Digníssima Juiz a quo fez uma má interpretação das regras de direito que resultam dos artigos 279º e 414º e segs, em especial do artigo 416º, n.º 2, todos do Código Civil, e das demais normas de direito que o Venerando Tribunal da Relação de Évora queira aplicar.
Nestes termos e nos demais de Direito que o Venerando Tribunal da Relação de Évora doutamente suprirá, deve ser julgado procedente o presente recurso e revogada a sentença impugnada, substituindo-se por douto Acórdão que julgue improcedente a acção.
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Contra-alegou a A., pugnando pela rejeição do recurso quanto à matéria de facto, por falta de cumprimento dos ónus impugnatórios, concluindo pela confirmação da sentença recorrida.
O recurso foi admitido como de apelação, com subida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
* II – Objecto do recursoO objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta dos artigos 608º, nº 2, 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil.
Considerando o teor das conclusões apresentadas, importa decidir as seguintes questões: (i) Da impugnação da matéria de facto; (ii) Da caducidade do direito de preferência e da renúncia do preferente.
* III – FundamentaçãoA) - Os Factos A.1.
Na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos [em destaque os pontos impugnados]: 1. A autora tomou de arrendamento há pelo menos 40 (quarenta) anos o prédio urbano, composto de edifício térreo com quintal, destinado a habitação sito na rua Professor Egas Moniz, n.º … e …, freguesia e concelho de Vila Real de Santo António, inscrito na matriz sob o artigo …, descrito sob o número … da freguesia de Vila Real de Santo António.
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No âmbito do acordo estabelecido, a autora pagava à 1.ª ré uma renda mensal no valor de €163,61 (cento e sessenta e três euros e sessenta e um cêntimos).
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A autora fez do referido imóvel o centro da sua vida familiar, é ali que vive, ininterruptamente, há mais de 40 (quarenta) anos, ali dormindo, tomando as refeições, recebendo amigos e familiares; 4. A 1.ª ré e o 2.º réu celebraram um acordo sujeito a escrito, datado de 21/7/2016, através do qual, a 1.ª ré se comprometia a vender e o 2.º réu a adquirir, o imóvel em questão, pelo preço global de € 96.500,00 (noventa e seis mil e quinhentos euros), mediante entrega da quantia de € 48.250.00€ (quarenta e oito mil duzentos e cinquenta euros) através do cheque.
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Na cláusula 9.ª do referido acordo ficou estabelecido: “1. A concretização do negócio prometido, fica subordinada ao não exercício do direito legal de preferência por parte das autoridades administrativas (nomeadamente, IGESPAR ou Câmara Municipal), ou da arrendatária, nos termos da lei, constituindo o exercício desse direito condição...
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