Acórdão nº 589/15.0JALRA de Tribunal da Relação de Évora, 10 de Setembro de 2019
Magistrado Responsável | JOÃO GOMES DE SOUSA |
Data da Resolução | 10 de Setembro de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: A - Relatório Nos autos de inquérito supra numerados que corre termos no Tribunal de Judicial da Comarca de Santarém – Instrução Criminal, J2 - por despacho da Mmª Juíza de 12.04.2019 a fls. 6661 a 6670, foi declarada a excepcional complexidade dos autos e indeferida uma peticionada separação de processos.
* Inconformados interpuseran recurso do referido despacho, com as seguintes conclusões (transcritas), os arguidos A... e R...: 1. A..., Arguido melhor identificado nos autos em epígrafe, tendo sido notificado do Despacho que decretou a especial complexidade dos presentes autos - Despacho com a ref. 80889431 de 12/04/2019 - vem, por não concordar de todo, com aquela decisão, interpor recurso daquele Despacho.
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Primeiro, o Recorrente recorre do Despacho que decretou a especial complexidade dos presentes autos porque a promoção do MP de 24/01/2019 tem como finalidade única a de aumentar os limites máximos da prisão preventiva dos arguidos nomeadamente do Recorrente e esse não é o objetivo da especial complexidade.
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Em segundo lugar: porque entende o Recorrente, como resulta do seu requerimento de 09/04/2019, que os eventuais ATRASOS VERIFICADOS NO PRESENTE INQUÉRITO NÃO SÃO, NEM PODEM SER, IMPUTADOS AOS ARGUIDOS, MAS ANTES À INÉRCIA FUNCIONAL E INVESTIGATÓRIA.
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O MP promove a especial complexidade em 24/01/2019 e os restantes sujeitos processuais só são "validamente" notificados para se pronunciarem quanto a tal matéria a 1/04/2019! 3 MESES DEPOIS!!!! 5. Os arguidos apenas são notificados 3 meses depois POR CULPA EXCLUSIVA DO TRIBUNAL,ora porque o Tribunal profere despachos para os quais não tinha competência (veja-se decisão 29/01/2019), ora porque profere decisões sem antes apreciar as questões que lhe foram colocadas pelos sujeitos processuais, nomeadamente, pelos arguidos (veja-se Despacho 21/03/2019), tudo isto em prejuízo dos arguidos, principalmente, dos que se encontram em prisão preventiva como é o caso do Recorrente.
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Note-se que apesar de tudo o que se disse, o MP insiste em promover a especial complexidade com o fundamento - repare-se - de que o MP não tem tempo para encerrar o presente inquérito dentro do prazo legal que tem para o efeito, com a desculpa de que o presente inquérito é complexo, quando a verdade é que o presente inquérito corre termos desde 2015 (ou seja o MP encontra-se a investigar há quase 4 anos), com arguidos em prisão preventiva há tempo demais e "por coisa nenhuma" e, ainda assim, se "perde" tempo, três meses, entre lapsos e erros por parte do Tribunal e com o processo a "passear" entre Santarém e Tomar ...
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Terceiro fundamento: há muito decorreu o prazo para que o JIC em sede de inquérito pudesse declarar a especial complexidade dos persentes autos.
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Antes de mais, não corresponde à verdade que só a partir de 12/07/2018 (data do despacho que determinou as interceções telefónicas) o presente inquérito começou a correr contra pessoa determinada.
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Esta afirmação é falsa e mais não é do que um artificio para se prolongar a presente fase de inquérito para além de todos os prazos que a nossa lei prevê para esta fase! 10. A maioria das queixas crime ou denúncias apresentadas foram apresentadas contra pessoas determinadas, que estas queixas foram apresentadas antes do despacho que autorizou as intercepções telefónicas; muito antes do Despacho que determinou as intercepções telefónicas todos os arguidos e sociedades arguidas estavam já bem identificados como suspeitos,tendo sido até realizadas várias diligências de investigação quanto a todos eles, 11. Constando dos autos, ainda, e já antes do referido Despacho certidões da Conservatória do Registo Comercial relativamente a todas as sociedades, sociedades arguidas e, portanto, identificação dos seus sócios e gerentes (alguns dos arguidos) 12. Bem como constava já dos autos os registos de BI dos arguidos, Fichas biográficas, fotografias retiradas das fichas biográficas e até do Facebook dos arguidos, identificação das viaturas usadas pelos arguidos, viaturas seguradas ou que constavam como sendo da propriedade dos arguidos, informações bancárias, contratos de arrendamento, moradas e sede das sociedades arguidas.
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Constava até análises feitas pelos OPC das relações existentes entre os arguidos e até a informação de que alguns tinham tido processos judiciais em que eram arguidos num mesmo processo.
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Da análise de toda a prova documental existente nos autos verificamos, assim, que já muito antes da data de 12/07/2018 o presente inquérito corria contra pessoas determinadas.
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A grande maioria das queixas apresentadas no âmbito dos presentes autos foram apresentadas contra pessoas determinadas e não contra desconhecidos, tendo tais queixas-crime sido apresentadas em data anterior à data do despacho que determinou as interceções telefónicas.
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Por outro lado, antes de ter sido proferido o despacho que determinou as intercepções telefónicas já o OPC tinha levado a cabo várias diligências investigatórias, nomeadamente, reconhecimentos fotográficos, vigilâncias e diligências externas, requerido informação bancária e comercial relativamente a pessoas concretas e devidamente individualizadas e identificadas: os arguidos e as sociedades arguidas.
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Na boa verdade dos factos quando foi determinada a interceção telefónica aos arguidos, como nos parece evidente, os mesmos já eram do conhecimento da investigação e a mesma já corria contra eles, caso contrário estar-se-ia a determinar a intercepção telefónica de quem e de que números?! 18. Já haviam testemunhas ouvidas na PJ e as suas declarações encontravam-se já reduzidas a auto.
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Os arguidos eram já suspeitos nos presentes autos e encontravam-se devidamente identificados em data muito anterior a 12/07/2018 20. É falso que só a partir 12/07/2018 é que o presente inquérito começou a correr contra pessoa determinada, devendo ser fixada este marco processual em data muito anterior àquela, tendo em conta a prova documental existente nos autos e à qual o Recorrente - infelizmente - ainda não teve acesso em toda a sua extensão e plenitude, mas que tendo em conta aquela que lhe foi dada a conhecer jamais poderá ser fixada para data posterior a Janeiro de 2016 data em que foram inquiridas as primeiras testemunhas e surgem os primeiros dos suspeitos C.... Sendo que nesta data já havia queixas crime apresentadas contra aqueles - tudo nos termos do art. 276°, n 4 do CPP.
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Os presentes autos tiveram o seu início a 30/12/2015 e que, no caso dos autos, nos termos do disposto na alínea a) do n° 3 do art. 276°, em conjugação com a alínea d) do n. 2 do art. 215° do CPP, é de 8 meses o prazo do inquérito, considerando que há arguidos detidos à sua ordem - sendo o Recorrente um deles.
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Assim sendo como é, é incompreensível que o MP em Abril de 2018 venha requerer que seja decretada a especial complexidade alegando que o processo apenas começou a correr contra pessoa determinada a 12/07/2018 e que ainda necessita de mais tempo para concluir a presente investigação, sendo que ela já dura há cerca de 4 anos e apenas deveria durar 8 meses.
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É certo que o artigo 276° do Código de Processo Penal não prevê sanções para incumprimento do prazo máximo de inquérito, o incumprimento tem consequências 24. O incumprimento do prazo máximo do inquérito tem uma outra consequência E QUE É O NOSSO QUARTO E GRANDE FUNDAMENTO DE RECURSO DA DECISÃO QUE DECRETOU A ESPECIAL COMPLEXIDADE DOS PRESENTES AUTOS.
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Nos presentes autos, duvidas não existem, nem podem existir, que nos termos do disposto na alínea a) do n. 3 do art. 276°, em conjugação com a alínea d) do n. 2 do art. 215° do CPP, de 8 meses o prazo do inquérito, considerando que há arguidos detidos à sua ordem.
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Tendo sido decretada a especial complexidade dos presentes autos, então, o prazo máximo do presente inquérito - nos termos do art. 276°, n 2 alínea c) do CPP - passou a ser de 12 meses.
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Ora, tendo em conta que o presente inquérito teve o seu início em dezembro de 2015 e que logo em janeiro de 2016 o presente inquérito começou a correr contra pessoas determinadas verificamos que a presente investigação se prolonga por 3 anos e 3 meses, encontrando-se, consequentemente largamente excedidos todos os prazos referidos no art. 276° do C. P. P. mesmo na situação de especial complexidade prevista no art. 276°, n 2 alínea c) do CPP em que o presente inquérito teria um prazo máximo de 12 meses e, portanto, jamais poderia agora o Tribunal recorrido ter decretado a especial complexidade.
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Mas mesmo que se entenda que o prazo máximo de inquérito apenas começa a correr a partir da tal data fictícia de 12/07/2018, a verdade é que a especial complexidade teria sempre que ser decretada dentro do prazo de inquérito de 8 meses que era esse o prazo que se encontrava a decorrer até ser proferido o despacho agora recorrido.
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Ou seja, O tribunal recorrido teria que ter decretado a especial complexidade dos presentes autos até 12/03/2019.
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Porém, o Tribunal recorrido apenas o fez em 12/04/2019.
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Nos termos do disposto no artO 276°, n° 3 do CPP, o prazo para encerramento do inquérito, é um prazo de caducidade, e conta-se do momento em que o inquérito tiver passado a correr contra pessoa determinada, ou em que se tiver verificado a constituição de arguido.
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DECORRIDO POR INTEIRO O PRAZO PARA ENCERRAR O INQUÉRITO JÁ NÃO É POSSíVEL AO JIC PROFERIR DECISÃO A DECLARAR O PROCESSO DE ESPECIAL COMPLEXIDADE.
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Tal declaração efectuada após o decurso do prazo para encerrar o inquérito não tem a virtualidade de renovar um prazo que já decorreu por inteiro.
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A intenção do legislador foi a de fixar prazos máximos para a conclusão do inquérito.
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Com efeito, se em sede de direitos disponíveis o prazo para exercício dos direitos é um prazo de caducidade, mal se compreenderia que em processo penal, em que estão em causa direitos, liberdades e garantias com tutela constitucional directa, máxime o direito...
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