Acórdão nº 2712/20.3T8STR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 15 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelCRISTINA DÁ MESQUITA
Data da Resolução15 de Abril de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Apelação n.º 2712/20.3T8STR.E1 (1.ª Secção) Relator: Cristina Dá Mesquita Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Évora: I. RELATÓRIO I.1. (…), requerente do presente procedimento cautelar de arresto que moveu contra (…), SA – Comércio e Industria de Artigos em Pele, SA interpôs recurso da decisão proferida pelo Juízo Central Cível de Santarém, Juiz 2, do Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, o qual julgou «extinta a providência cautelar e, consequentemente, ordenou o levantamento do arresto dos bens da requerida melhor identificados nos autos. Na ação cautelar, o ora recorrente pediu ao tribunal que decretasse o arresto das contas de depósitos à ordem com os n.ºs (…), do Banco (…), e (…), da Caixa (…), respetivamente, e do prédio urbano sito em (…), freguesia de (…), inscrito na matriz urbana sob o art. (…) e descrito na Conservatória do Registo Predial de Alcanena sob o n.º (…). Para tal desiderato, o requerente alegou o seguinte: foi acionista da requerida até 18.12.2015, data em que, por contrato, cedeu a (…), acionista da requerida, a totalidade das ações que detinha sobre a segunda; na data de 18.12.2015, a requerida era devedora a instituições bancárias, nomeadamente à Caixa (…); nos termos do contrato acima referido, as responsabilidades pessoais do requerente resultantes de avales emergentes de operações de crédito realizadas entre instituições bancárias e a requerida deveriam ser extintas gradualmente, no prazo de duração máxima dos financiamentos MLP em vigor à data da celebração do referido acordo; porém, a requerida incumpriu o acordado porquanto não procedeu ao pagamento das suas responsabilidades nas operações de crédito n.ºs (…) e (…) realizadas com a Caixa (…) e na sequência daqueles incumprimentos a Caixa (…) exigiu ao requerente e à requerida o pagamento de € 240.569,98 e de € 404.761,90 resultantes, respetivamente, das duas operações de crédito acima referidas; a requerida não efetuou o pagamento daqueles valores e o requerente conseguiu celebrar acordo com a Caixa (…) para pagamento do montante de € 299.092,35, o que fez em 21 de setembro de 2020; a requerida não lhe pagou o valor de € 299.092,35, encontrando-se no âmbito de um Plano Especial de Revitalização aprovado no processo n.º 1535/19.7T8STR, e que corre os seus termos no Tribunal de Comércio de Santarém; em 10 de abril de 2019, a requerida alienou as marcas de calçado que detinha – “(…)” e “(…)” – à sociedade (…), SA, perdendo desta forma o seu maior ativo, sendo que foi este que levou à viabilização do plano de recuperação; ademais, nos últimos tempos, a requerida tem diminuído a sua atividade e, consequentemente, o seu volume de negócios, tendo já sido anunciada a venda de dois prédios urbanos onde tem instalada a sua sede e os seus armazéns. Após produção da prova testemunhal arrolada pelo requerente, foi proferida decisão pelo tribunal recorrido que julgou procedente o procedimento cautelar e, consequentemente, decretou o arresto dos bens acima identificados. Após a efetivação do arresto, a requerida foi citada, tendo vindo deduzir oposição, arguindo a nulidade de todo o processado por ineptidão do requerimento inicial, impugnando os factos alegados e alegando que está a cumprir o plano especial de revitalização e que o crédito que o requerente invoca foi reclamado pela Caixa (…) no PER e ali reconhecido, estando a requerida a cumprir o plano homologado e que o valor do prédio arrestado é, de qualquer modo, suficiente para garantir o crédito do requerente. O tribunal a quo proferiu então a decisão objeto do presente recurso. I.2 O Recorrente formulou alegações que culminam com as seguintes conclusões: «

  1. Vem o presente recurso interposto da decisão do tribunal a quo que julgou extinta a presente providência cautelar de arresto e, em consequência, ordenou o levantamento do arresto e a entrega à requerida dos bens arrestados.

  2. A mera homologação de um PER não é fator extintivo ou impeditivo do crédito do recorrente não o impedindo de lançar mão dos indispensáveis meios de conservação da garantia patrimonial, não havendo, pois, razão para se julgar extinta a presente providência de arresto.

  3. As limitações decorrentes do artigo 17.º-E/1 do CIRE não se aplicam ao caso sub judice, já que vigoram apenas entre a data em que é proferido o despacho que nomeia o administrador judicial provisório e a data do trânsito em julgado da decisão que homologa o plano de recuperação.

  4. No caso concreto está assente que a decisão que homologou o plano de recuperação da recorrida transitou a 17.10.2019, pelo que a recorrida regressou ao normal da sua atividade no tráfego jurídico, com a particularidade de os credores que tenham votado favoravelmente ficarem vinculados a apenas poderem exercer os seus direitos de crédito nos exatos termos constantes no mesmo.

  5. O mesmo não sucedendo, porém, em relação aos credores que votaram contra o plano e, no caso concreto, resultou provado que a Caixa (…) votou contra o plano de recuperação não estando, consequentemente, a ele vinculada.

  6. E, por essa via, também o recorrente, enquanto avalista que satisfez a obrigação da recorrida, não está vinculado ao respetivo plano, assim se devendo interpretar o artigo 217.º/4 do CIRE.

  7. De todo o modo o crédito do recorrente e que se pretende ver assegurado por via da presente providência de arresto é de constituição posterior à sentença de homologação do plano de recuperação, e, assim sendo sempre se terá de possibilitar ao credor o respetivo ressarcimento sob pena de não ter meio de cobrar o seu crédito … o que configura uma situação de inconstitucionalidade por violação do princípio do acesso ao direito e aos tribunais” – Ac. da RP de 14.12.2017, proc. 5831/15 in www.dgsi.pt.

  8. De facto, resultou provado que o recorrente na qualidade de avalista no dia 21.09.2020 pagou o elevado montante de € 299.092,35 da dívida da recorrida já vencida.

  9. Também se mostra assente que a Caixa (…) contra o PER.

  10. Ao contrário do que decidiu o tribunal a quo, a aprovação de um plano de recuperação não impede a aplicação do disposto no artigo 780.º do Código Civil (perda do benefício do prazo e consequente exigibilidade da dívida).

  11. Dos factos provados pelos pontos 47.º a 53.º resulta que a recorrida, após a aprovação do PER, tem vindo a praticar atos que diminuem significativamente o valor do seu património e, consequentemente, a garantia do pagamento das suas muito elevadas dívidas.

  12. É manifesto o lapsus calami no ponto 54 dos fatos assentes já que da leitura do plano de insolvência resulta cristalinamente que “A requerida não está autorizada nos termos do seu plano de recuperação, a proceder a tal alienação.” m) Brevitatis causa, alcança-se do acervo probatório que a recorrida alienou as suas principais marcas comerciais e que haviam alicerçado o plano de recuperação e que tem em curso operações para venda dos seus únicos dois imóveis, após o que fica sem qualquer ativo tangível de valor para satisfazer as exigências de conservação da garantia patrimonial dos seus credores.

  13. Face ao que, ainda que o crédito do recorrente estivesse sujeito à disciplina do plano de recuperação ex vi artigo 217.º/4 do CIRE, que não está, certo é que havendo considerável ou significativa diminuição do valor do ativo patrimonial da recorrida, a mesma perde o benefício do prazo quer quanto à moratória quer quanto ao pagamento em prestações, vencendo-se de imediato a obrigação.

  14. O artigo 218.º/1 e 3 do CIRE deve ser interpretado e aplicado no sentido de que que o incumprimento do plano de recuperação não se cinge apenas à situação de falta de pagamento das prestações acordadas (que ainda nem sequer se iniciaram!); p) Mas também às situações em que o devedor incumpre a obrigação de conservação da garantia patrimonial ou, até e outrossim, quando o devedor não atinge ou cumpre os objetivos económicos e financeiros pressupostos do plano de modo que inviabilize a sua projetada recuperação resvalando para uma situação de insolvência de fato.

  15. Ademais, no plano de recuperação da recorrida está estatuído: “Repristinação: Fica expressamente consignado que em caso de incumprimento do presente plano de recuperação, as moratórias ou perdões nele previstos, ficam sem efeito, sendo os créditos repristinados de harmonia com o título em que se fundam e as reclamações de crédito apresentada no processo.

  16. Assiste, assim, ao recorrente não só o direito de intentar ação para ver reconhecido o seu crédito constituído posteriormente à sentença de homologação do plano de recuperação, e, portanto, por ele não abrangido, assim como preliminarmente requerer arresto, contra o devedor, como medida de conservação de garantia patrimonial – cfr. arts. 619.º e segs. do Código Civil e artigos 391.º e segs. do Código Processo Civil.

  17. O crédito do recorrente, por, enquanto avalista, ter satisfeito uma obrigação de que a recorrida é devedora principal, é uma dívida de constituição posterior ao despacho que homologou o plano de recuperação e que, portanto, não está vinculada ao mesmo.

  18. A norma constante no artigo 17.º-F/10 do CIRE deve ser interpretado e aplicado no sentido de que o crédito do avalista que se constituiu posteriormente ao despacho que homologou o plano de recuperação não se encontra abrangido pelo mesmo, podendo o credor mover as ações judiciais adequadas à satisfação do seu crédito.

  19. Mesmo que se entendesse que assim não é, o tribunal a quo devia ter aplicado a norma constante do artigo 218.º/1 al. a) do CIRE segundo o qual a moratória ou o perdão previstos no plano ficam sem efeito quanto a crédito relativamente ao qual o devedor se constitua em mora, se a prestação, acrescida dos juros moratórios, não for cumprida no prazo de 15 dias após interpelação escrita pelo credor.

  20. No caso concreto dos autos, resultou provado que interpelada a 19.10.2020 para pagar a dívida a recorrida nada disse.

  21. O tribunal a quo erra ao considerar a «falsa» informação prestada pelo senhor (...) na medida em que...

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