Acórdão nº 301/18.1T8STB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelTOMÉ DE CARVALHO
Data da Resolução13 de Abril de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo nº 301/18.1T8STB.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal – Juízo de Comércio de Setúbal – J1 * Recurso com efeito e regime de subida adequados.

* Decisão nos termos dos artigos 652.º, n.º 1, alínea c) e 656.º do Código de Processo Civil: I – Relatório: (…) foi declarado insolvente e requereu o procedimento de exoneração do passivo restante. Não se conformando com a decisão que indeferiu o cálculo do apuramento do montante disponível fosse realizado anualmente, em função do rendimento médio auferido, o insolvente veio interpor o competente recurso.

* Foi admitido liminarmente o incidente de exoneração do passivo restante relativamente ao insolvente (…). * Por decisão datada de 16/05/2018, o Tribunal determinou que, durante o período de cessão, de cinco anos, contados desde o encerramento do presente processo de insolvência, o rendimento disponível que o insolvente viesse a auferir fosse considerado todo cedido ao fiduciário ora nomeado, com exclusão da quantia mensal correspondente a uma vez a remuneração mínima mensal garantida, doze meses por ano.

* Posteriormente, o insolvente requereu que o apuramento do montante disponível fosse realizado anualmente, em função do rendimento médio por si auferido.

* Na parte que interessa o despacho recorrido tem o seguinte conteúdo: «Quer isto dizer que o devedor, quando por si recebidos os seus rendimentos (normalmente com regularidade mensal), está obrigado a proceder à entrega ao Sr. Fiduciário da parte desses rendimentos que sejam objecto de cessão.

E nesta parte, tem sido entendimento deste Tribunal que, se os rendimentos do insolvente são recebidos mensalmente, também a entrega tem de ser mensal, afastando-se, em regra, qualquer espécie de cálculo anual ou compensação entre meses para apuramento dos rendimentos objecto da cessão, na esteira do decidido no Douto Ac. do TRC de 28.3.2017, Processo n.º 178/10.5TBNZR.C1, e do TRE de 03.12.2020, Processo n.º 612/14.5T8STB-F.E1, ambos disponíveis em www.dgsi.pt.

Logo, nos meses em que os rendimentos excedem o que foi considerado necessário para o sustento do insolvente, terá de ocorrer a entrega dos valores em excesso ao Fiduciário.

Nos meses em que for inferior, não há rendimento disponível e por isso não há cessão de rendimentos.

Sendo esta a regra, deve, no entanto, ter-se em atenção os rendimentos mensais do insolvente, de modo a que se evite que exista um grande desequilíbrio entre os montantes que lhe estão disponíveis mensalmente.

Pensemos em concreto nas situações em que o insolvente não tem rendimentos durante alguns meses, e nos meses em que os rendimentos existem apenas pode ficar com o montante que lhe é fixado para um mês.

Se a diferença for mínima, entende-se que será de aplicar a regra, como sucede no caso concreto em que existiram rendimentos regulares em todos os meses.

Assim, entende-se que nesta situação deve ser aplicada regra mensal, indeferindo-se assim a pretensão do insolvente».

* O insolvente não se conformou com a referida decisão e as suas alegações contenham as seguintes conclusões:

  1. Por douto despacho de fls., foi decidido que o rendimento indisponível tem por referência o mês a que se reporta e deve ser apurado mensalmente, sendo que é de tal decisão que recorre o apelante.

  2. Com efeito, acredita que o cálculo do rendimento a entregar pelo devedor, deve ser efectuado com base no rendimento anual.

  3. Aliás, entendimento que está de acordo com a jurisprudência mais recente: “(…) II – Do facto de o salário mínimo mensal nacional constituir um critério referência para fixação do montante necessário ao sustento minimamente condigno dos exonerandos, daí não decorre que o legislador pretendeu e previu o cálculo ou apuramento dos rendimentos disponíveis vinculado a uma cadência mensal, por referência estanque aos rendimentos auferidos em cada mês de cada ano do período de cessão, tando mais que, conforme artigo 240.º, n.º 2, do CIRE, é anual a periodicidade para a elaboração e apresentação do relatório do período de cessão pelo Fiduciário. III – Perante a irregularidade dos montantes mensais dos rendimentos auferidos pelos exonerandos, com inclusão de meses com rendimentos de montante inferior ao judicialmente excluído da cessão de rendimentos, só através do apuramento dos rendimentos objeto de cessão por referência aos rendimentos anualmente auferidos é possível garantir aos devedores disporem, em cada mês de cada ano do período de cessão e por recurso aos rendimentos que ao longo do ano vão auferindo, de rendimentos de montante não inferior, ou de valor o mais aproximado possível, ao rendimento mensal indisponível fixado. (…) – Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 22/09/2020, proc. 6074/13.7TBVFX-L1-1, in www.dgsi.pt.

  4. Pelo exposto, entende-se que o Tribunal posto em crise decidiu erradamente ao não permitir a alteração ao modo de cálculo do rendimento disponível a entregar pelo insolvente.

Nestes termos e nos melhores de direito que V. Exas certamente mui doutamente suprirão, deverá a decisão recorrida ser substituída por uma outra que fixe que o apuramento do montante disponível far-se-á anualmente, em função do rendimento médio auferido pelo insolvente, fazendo-se, desse modo, inteira justiça».

* Não houve lugar a resposta.

* Admitido o recurso, foram observados os vistos legais. * II – Objecto do recurso: É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do Tribunal ad quem (artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do mesmo diploma).

Analisadas as conclusões das alegações de recurso, o thema decidendum está circunscrito a apurar se existe motivo para determinar que o cálculo subjacente à cessão do rendimento disponível seja realizado com base numa periodicidade anual.

* III – Factos com interesse para a decisão da causa: Os factos com interesse para a decisão são aqueles que se encontram enunciados no relatório inicial e, bem assim, os seguintes que foram retirados do relatório elaborado pelo fiduciário ao abrigo do artigo 240.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas: 3.1 – O requerente é solteiro, mas vive em união de facto com a namorada, que é mãe de um menino, com dez anos de idade. O agregado familiar é constituído assim por 3 pessoas.

3.2 – A residência habitual do agregado familiar fica situada na Rua (…), n.º 32, em (…), Loures.

3.3 – Em 2001, o requerente adquiriu uma viatura de marca Opel, modelo Corsa 1.2 Confort, com matrícula (…), com recurso a financiamento, no valor de € 11.821,51, concedido pelo “Banco (…), S.A.” (actualmente denominado “Banco …, S.A.”, integrado, por fusão, na Sociedade “…, Sucursal em Portugal da S.A. Francesa …”).

3.4 – Em 2003, o requerente decidiu proceder à entrega da viatura ao Concessionário da Opel, em (…).

3.5 – Não obstante a referida entrega do veículo, o contrato de mútuo não foi regularizado e a dívida incrementada pelos juros e cláusulas penais contratuais ascende a € 44.505,91 (quarenta e quatro mil, quinhentos e cinco euros e noventa e um cêntimos).

3.6 – Em 2018, o requerente era motorista e auferia a remuneração fixa mensal ilíquida de € 667,32 (seiscentos e sessenta sete euros e trinta e dois cêntimos), acrescida de extras, que lhe garantia um vencimento líquido de € 876,60 (oitocentos e setenta e seis euros e sessenta cêntimos).

3.7 – Entre Maio de 2019 e Abril de 2020, o insolvente recepcionou rendimentos de € 9.963,61 (nove mil, novecentos e sessenta e três euros e sessenta e um cêntimos).

3.8 –...

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