Acórdão nº 374/17.4T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 29 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelELISABETE VALENTE
Data da Resolução29 de Abril de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os juízes da secção cível do Tribunal da Relação de Évora: 1 – Relatório.

R…, LLC e A… (AA) intentaram a presente ação declarativa, sob a forma do processo comum, contra Al… (R), pedindo: - seja declarada a caducidade da providência decretada no processo n.º 789/16.5T8FAR, que correu termos na Comarca de Faro - Faro - Instância Local - Secção Cível- J1; - seja ordenado o levantamento da suspensão da obra decretada na providência cautelar e, consequentemente, a não proceder à reconstrução das paredes e do telhado nos precisos termos em que se encontravam antes do início dos trabalhos de demolição; - o não reconhecimento da ré como dona e legítima proprietária do prédio urbano sito em Montenegro, freguesia de Montenegro, concelho de Faro, composto por casas de morada de um pavimento com três divisões assoalhadas, cozinha e casa de banho, com a área total de 517m2, correspondendo a 126m2 à área coberta e 390,90m2 à área descoberta, confrontando do Norte com lote 4, do Sul com lotes 1 e 2, Nascente com M… e do Poente com rua, inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo … (anteriormente inscrito sob o artigo …, da freguesia de S. Pedro, concelho de Faro) e descrito na Conservatória do Registo Predial de Faro sob o n.º …, adquirido por usucapião, no que se refere à configuração e limites; - se reconheça que a autora é dona e única proprietária e possuidora, com exclusão de outrem dos bens imóveis adquiridos nos termos do disposto no art.º 874.° e seguintes do Código Civil: - Prédio urbano, lote de terreno destinado a construção urbana, sito em Montenegro, Faro, denominado lote três, freguesia de Montenegro, concelho de Faro, inscrito na respetiva matriz sob o artigo …, descrito na Conservatória do Registo Predial de Faro sob o n.º …, da freguesia de Faro, Alvará de Loteamento de 30 de agosto de 2000; - Prédio urbano, lote de terreno destinado a construção urbana, sito em Montenegro, Faro, denominado lote quatro, freguesia de Montenegro, concelho de Faro, inscrito na respetiva matriz sob o artigo …, descrito na Conservatória do Registo Predial de Faro sob o n.º …, da freguesia de Faro, Alvará de Loteamento de 30 de agosto de 2000; e que - a R seja condenada a abster-se de praticar quaisquer atos contra as propriedades da A supra descritas, com as devidas consequências legais.

Para fundamentar a sua pretensão invocam, em suma, que no âmbito do referido procedimento cautelar foi reconhecido o direito de propriedade da R sobre o prédio urbano descrito sob o n.º …, determinando-se a suspensão imediata da obra que levavam a efeito nos prédios que adquiriram no âmbito de processo de insolvência, bem como a reconstrução das paredes e telhado nos termos em que se encontravam antes dos trabalhos de demolição, decretando-se a inversão do contencioso, não pretendendo os autores que a decisão proferida se consolide como composição definitiva do litígio, na medida em que entendem não existir o direito de propriedade da ré sobre o identificado prédio urbano.

A R contestou, defendendo, em síntese, a aquisição por usucapião do direito de propriedade sobre o referido prédio urbano, concluindo pela manutenção da providência decretada.

Os AA apresentaram réplica, na qual se pronunciam pela improcedência do pedido reconvencional deduzido.

Foi realizada audiência prévia, no âmbito da qual foi declarada a inexistência de pedido reconvencional, considerando não escrita a resposta dos AA, proferido despacho saneador, fixado o objeto do litígio e enunciados os temas da prova, sem que tenha sido objeto de reclamação.

Foram habilitados como adquirentes do direito de propriedade da A. T… e I… Realizou-se a audiência final.

A sentença julgou a ação improcedente, por não provada, e, em consequência, absolveu a R do pedido.

Inconformados com a sentença, os AA vieram interpor recurso contra a mesma, tendo este Tribunal da Relação proferido acórdão que anulou a sentença e parcialmente o julgamento, ordenando que se complete a perícia para suprimento e apuramento de elementos, proferindo-se nova sentença.

Foi realizada a perícia.

Após, vieram T… e I… com articulado autónomo pronunciar-se sobre a perícia, invocar a incompetência absoluta em razão da matéria e a ilegitimidade passiva dos requeridos no procedimento cautelar e AA nestes autos.

A R respondeu, pedindo o indeferimento do requerido.

Em audiência final foi proferido o seguinte despacho (despacho recorrido): "Requerimentos de fls. 657 e seguintes:- Toda a defesa deverá ser deduzida na Contestação - Art. 573º nº1 do c.r.c.: Apenas pode ser deduzida excepção superveniente, nos termos do disposto no Art. 573, nº2 do CPC; ou quando a lei expressamente o admite, ou o Tribunal deva conhecer oficiosamente.- O tribunal já declarou a sua competência material para a apreciação do litígio, o que mantém, mormente porque se discute a propriedade de determinados prédios, vindo a ser intentada esta acção na sequência do procedimento Cautelar, intentado pela aqui Ré, e no qual o Tribunal da Relação de Évora decidiu pela inversão do contencioso.- Por outro lado, as Partes são legítimas, como também o Tribunal já apreciou, atento o pedido e a causa de pedir dos presentes autos, sendo apenas quanto a estes que haverá que apreciar e decidir tal pressuposto processual, e não já do procedimento Cautelar que anteriormente foi interposto.- Por último, a questão suscitada pelos Requerentes/Autores prende-se com o mérito da causa, que será apreciado em sede de Sentença. Notifique.” Foi proferida sentença que julgou a ação improcedente e absolveu a R dos pedidos.

Os AA vieram recorrer do despacho proferido em audiência, com as seguintes conclusões de recurso (transcrição): “I. A competência do tribunal em razão da matéria afere-se de harmonia com a relação jurídica controvertida, tal como definida pelo autor no que se refere aos termos em que propõe a resolução do litígio, a natureza dos sujeitos processuais, a causa de pedir e o pedido.

  1. Para fixação da competência material do Tribunal impõe-se determinar o conteúdo da lide, aferido face à relação jurídica que se discute na ação.

  2. O objeto do litígio definido nos autos, é o seguinte: “discute-se na acção aferir da existência do direito de propriedade da ré acautelado no âmbito do procedimento cautelar nº789/16.5t8far que correu termos no 1º juízo local cível do Tribunal da Comarca de Faro.” IV. Na Petição Inicial alegam os Autores, ora Recorrentes que a propriedade dos dois lotes em causa, denominados lote três e lote quatro, têm origem no Alvará de Loteamento … datado de 30-08-2000, emitido pela Câmara Municipal de Faro.

  3. No Procedimento Cautelar e nos presentes autos, alegou Recorrida que por lapso ou má-fé, o seu imóvel foi indevidamente englobado na área do loteamento aprovado pelo alvará n.º ….

  4. No Relatório de Perícia e Relatório de Esclarecimentos de Perícia, constante dos autos, a senhora perita conclui que o prédio da Recorrida está inserido nos Lotes 3 e 4 do Alvará de Loteamento …, VII. Face à identificação do objeto do litígio, à relação jurídica e situação factual descrita na petição inicial e às conclusões da senhora perita constantes dos Relatórios de Perícia e de Esclarecimentos de Perícia, o ato que alegadamente põe em causa o direito da mesma é um ato administrativo.

  5. Na eventualidade de se considerar que o ato de licenciamento se encontrava eivado de vício de violação de lei, o mesmo estaria sujeito ao regime da revogação previsto no n.° 1 do artigo 141.° do Código do Procedimento Administrativo então em vigor, aprovado pelo Decrelo-Lei n.° 442/91, de 15 de novembro, com a redação conferida pelo Decreto-Lei n.° 6/96, de 31 de janeiro.

  6. Sendo a competência para a apreciação da legalidade de atos administrativos dos tribunais administrativos.

  7. Pelo que, deveria o tribunal “a quo” ter julgado procedente a exceção de incompetência absoluta em razão da matéria, invocada pelos ora Recorrentes.

  8. Ao decidir pela competência do Tribunal para apreciação do litígio, quer no âmbito dos presentes autos, quer no âmbito da providência cautelar instaurada pela Ré, ora recorrida, violou o Tribunal as disposições constantes do art.º 4.º do ETAF, de acordo com o qual compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham por objeto questões relativas a fiscalização da legalidade de atos administrativos praticados por quaisquer órgãos do Estado.

  9. Não vale para a matéria administrativa e fiscal a previsão do artigo 211.°, n.º 1, da Constituição e do art.º 64.º do CPC, segundo as quais os tribunais judiciais "exercem jurisdição em todas as áreas não atribuídas a outras ordens judiciais", estando a matéria administrativa e fiscal, desde logo atribuída, à ordem jurisdicional administrativa e fiscal pela própria Constituição, no artigo 212.°, n.º 3.

  10. A infração às regras de competência material, consubstanciando uma exceção dilatória típica, aliás de conhecimento oficioso, determina a incompetência absoluta do tribunal, conforme arts. 96.º, al. a), 99.º, n.º 1, 278.º, n.º 1, al. a), 576.º, n.º 2, 577.º, al. a), e 578.º, todos do CPC, a qual deveria ter sido declarada pelo Tribunal.

  11. Ao declarar a competência material do Tribunal para decidir o presente litígio, o douto despacho recorrido violou as supra citadas disposições legais, de acordo com as quais os tribunais judiciais são totalmente incompetentes em razão de matéria do foro administrativo.

  12. A ilegitimidade das partes constitui exceção dilatória prevista no art.º 577.º e) do CPC, tendo a referida exceção como consequência a absolvição da instância nos termos dos art.ºs 278.º n.º 1 d) e 279.º do CPC.

  13. A qual deveria ter sido declarada pelo Tribunal “a quo”.

  14. A Recorrida instaurou procedimento cautelar contra os Recorrentes, que são partes ilegítimas no referido procedimento e consequentemente na presente ação.

  15. A considerar-se existir violação do direito da Ré, ora Recorrida, o ato alegadamente ofensivo do seu direito é um ato...

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