Acórdão nº 97/19.0T9SRP.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Julho de 2021
Magistrado Responsável | EDGAR VALENTE |
Data da Resolução | 13 de Julho de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - Relatório
No Juízo de Competência Genérica de Serpa do Tribunal Judicial da Comarca de Beja corre termos o processo de instrução n.º 97/19.0T9SRP, no qual, mediante despacho judicial, foi (i) indeferido o requerido pelo assistente AMMALR quanto a nulidades do inquérito e (ii) rejeitado o requerimento para abertura da instrução apresentado pelo mesmo assistente, com fundamento na sua inadmissibilidade legal. Inconformado com essa decisão, recorreu tal assistente, terminando a motivação do recurso com as seguintes (transcritas) conclusões: “A - O Assistente não se conforma com as decisões constantes do Despacho ora recorrido, porquanto, no seu entendimento, verifica-se um erro de julgamento na aplicação do direito pelo douto Tribunal a quo no que concerne ao fundamento que apresenta para não se pronunciar sobre a verificação das nulidades processuais invocadas no RAI, bem como um erro de julgamento ao decidir pela rejeição do RAI por considerar que o Assistente não enunciou os factos consubstanciadores do elemento subjectivo do crime de Infidelidade; acrescendo ainda a tais erros de julgamento a nulidade do Despacho recorrido por omissão de pronúncia. B - O douto Tribunal a quo incorreu num erro de julgamento ao indeferir a pretensão do Assistente/ao não se pronunciar sobre a verificação das nulidades processuais invocadas no RAI, concretamente nos artigos 18° a 32°, 33° a 45°, e 46° a 63°, por considerar que a competência para decidir as mesmas cabe ao Ministério Público, e, conexamente, ao entender que para que tal pronúncia pelo Juiz de Instrução fosse legalmente possível o Assistente, ora Recorrente, deveria primeiramente ter requerido ao Ministério Público que se pronunciasse sobre as nulidades processuais que veio a invocar nos aludidos artigos do seu RAI. C - No caso dos autos não estão em causa nulidades cuja verificação ocorreu durante a fase de inquérito, mas sim nulidades que decorrem da omissão de actos de inquérito e que se verificam apenas com a decisão de encerramento dessa fase processual, estando em causa a ausência de actos de inquérito que o Assistente apenas pôde constatar aquando da notificação do despacho de arquivamento, e sendo apenas nesse momento da decisão de arquivamento do inquérito sem a prática dos actos em questão, e não em momento antecedente, que tais nulidades se verificaram e se tornaram detectáveis e invocáveis pelo Assistente. D - Contrariamente ao que resulta da decisão ora recorrida, o Juiz de Instrução tem competência para conhecer de vícios ocorridos a montante desta fase, nomeadamente decretando a nulidade por falta ou insuficiência de inquérito invocada pelo Assistente no seu requerimento para abertura da instrução perante a decisão de arquivamento proferida pelo Ministério Público
E - O Juiz de Instrução pode, e deve, pronunciar-se sobre as nulidade de falta ou insuficiência de inquérito arguidas no requerimento instrutório do Assistente, se não se deverem considerar sanadas, sem que para tal seja necessário o Assistente requerer previamente ao Ministério Público que se pronuncie sobre as mesmas. F - Na fase em que os presentes autos se encontram, tendo sido requerida a abertura da instrução pelo Assistente, é do Juiz de Instrução a competência para se pronunciar e declarar a verificação das nulidades de falta ou insuficiência do inquérito arguidas nos artigos 18° a 32°, 33° a 45°, e 46° a 63° do RAI na sequência do encerramento do inquérito com a decisão de arquivamento, sem que para tal fosse necessária a prévia invocação das nulidades em apreço pelo Assistente junto do Ministério Público, ou a prévia pronúncia do mesmo. G - O Despacho recorrido é nulo face à total omissão de pronúncia do douto Tribunal a quo sobre o vício de falta de fundamentação e consequente nulidade/irregularidade expressamente invocada pelo Assistente nos artigos 6° a 17° do RAI. H - Nos artigos 64° a 98° do seu RAI, e sob esse preciso título, o Assistente descreveu os "factos que fundamentam a aplicação de uma pena ao Participado", remetendo cada um deles, sempre que adequado, para a respectiva prova documental que os sustenta e já se encontrava junta ao processo, e aí narrando de forma clara o lugar, o tempo e a motivação da prática dos factos que imputou ao Participado, bem como o seu grau de participação nos mesmos. I - Nos artigos 99° a 112° do RAI o Assistente sintetizou os factos descritos nos artigos 62° a 98°, e seguidamente, nos artigos 113° a 122° do RAI, o ora Recorrente referiu-se expressamente ao ilícito criminal p.p. no artigo 224.° Código Penal, fazendo expressa menção aos elementos que integram o tipo objectivo e subjectivo do crime de Infidelidade. J - Salvo o devido respeito, não tem correspondência com a realidade verificável no RAI o fundamento apresentado pelo douto Tribunal a quo no Despacho ora recorrido para rejeitar a Instrução requerida, concretamente ao considerar que no RAI o Assistente "não faz menção expressa ao elemento subjectivo do tipo. Isto porque, em nenhum lado está explícito de forma clara que o "participado" atuou de forma livre, voluntária e consciente, com o propósito conseguido de causar prejuízo patrimonial importante aos interesses da herança que administra judicialmente e fazendo-o intencionalmente ou com grave violação dos deveres legais de que foi incumbido'': constituindo tal entendimento um evidente erro de julgamento. K - Com efeito, e muito pelo contrário, para além de ao longo dos artigos 64° a 112° do RAI o Assistente referir-se por diversas vezes de forma expressa à conduta consciente do Participado na prática dos factos aí descritos, dos artigos 119° e 121° do RAI pode constatar-se facilmente que o Assistente faz menção expressa ao elemento subjectivo do tipo, utilizando até a mesma terminologia referida na fundamentação da decisão recorrida como sendo necessária para esse efeito, podendo ler-se no RAI, entre o mais, que "o Participado, na qualidade de Cabeça de Casal da herança, por acção e por omissão conscientes, causou aos interesses da herança (que são os interesses de todos os herdeiros, no seu conjunto, e não de um ou outro em detrimento dos demais) intencionalmente, e com grave violação dos deveres legalmente previstos que lhe incumbem, um prejuízo patrimonial importante" (cfr. artigo 119° do RAI), e que "O Participado é Administrador Judicial, sendo sócio-gerente da sociedade comercial por quotas com a firma …, sendo alguém com vastos conhecimentos e experiência para realizar uma cuidada, rigorosa e zelosa administração do património hereditário, tendo agido de forma livre, deliberada e consciente, e sabendo que com a actuação e omissão pela qual optou estava a violar gravemente os seus deveres, causando aos interesses da herança (e não aos interesses de um ou outro herdeiro) um prejuízo patrimonial importante (cfr. artigo 121° do RAI). L - Contrariamente ao que entendeu o douto Tribunal a quo num erro de julgamento em que baseia a sua decisão de rejeição do requerimento de abertura da instrução por alegada inadmissibilidade legal, o Assistente fez a necessária imputação do elemento subjectivo à conduta do Participado, não deixando o RAI de preencher nenhum dos requisitos legalmente exigíveis, e concretamente o requisito previsto no artigo 283° nº3 alínea b) do CPP, resultando da sua leitura que é manifestamente possível concluir que nos artigos 62° a 122°, e em especial nos artigos 119° a 121°, o Assistente explicitou de forma clara que o Participado actuou de forma livre, voluntária e consciente, bem como a existência de indícios de que causou um prejuízo patrimonial importante aos interesses da herança que administra judicialmente, fazendo-o intencionalmente ou com grave violação dos deveres legais de que foi incumbido. M - Contrariamente ao entendimento do...
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