Acórdão nº 139/19.9PFSTB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 26 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelMARIA CLARA FIGUEIREDO
Data da Resolução26 de Outubro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - Relatório.

Nos presentes autos de processo comum com intervenção do Tribunal Coletivo que correm termos no Juízo Central Criminal de Setúbal - Juiz 3, do Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal, com o n.º 139/19.9PFSTB, foi o arguido (...), condenado da seguinte forma: a) - Na pena de 2 (dois) anos de prisão pela prática, no dia 3 de agosto de 2019, em coautoria, de 1 (um) crime de roubo, p. e p. no artigo 210.º n.º 1, do Código Penal; b) - Na pena de 2 (dois) anos de prisão, pela prática, no dia 3 de agosto de 2019, em coautoria, de 1 (um) crime de roubo, p. e p. no artigo 210.º n.º 1, do Código Penal; c) - Na pena de 5 (cinco) anos de prisão, pela prática, no dia 20 de dezembro de 2019, em coautoria, de 1 (um) crime de roubo “agravado”, p. e p. no artigo 210.º n.º 1 e nº 2 alínea b) e 204.º n.º 2, alínea f), ambos do Código Penal; e) - Na pena de 45 (quarenta e cinco) dias de multa, à razão diária de €6,00 perfazendo um total de €270,00, à qual correspondem, subsidiariamente, 30 (trinta) dias de prisão, pela prática no dia 3 de Agosto de 2019, de 1 (um) crime de consumo de estupefacientes, p. e p. no artigo 40.º n.º 2 e tabela I-C, do Decreto-lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro; - Na pena única de 7 (sete) anos de prisão, em cúmulo jurídico das penas indicadas nas alíneas a), b) e c).

***Inconformado com tal decisão, veio o arguido interpor recurso da mesma, tendo apresentado, após a motivação, as conclusões que passamos a transcrever: “A- A determinação da medida da pena, não deve ultrapassar os limites definidos na lei, a qual deve ser efetuada, conforme dispõe o artigo 71.º do Código Penal, isto é, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.

B- É verdade que as exigências de prevenção geral antecipam a afirmação da validade das normas e dos valores e bens jurídicos que protegem e a garantia da paz social «esbulhada» com a prática de factos criminosos.

C- Não obstante, aquela antecipação versada nas exigências de prevenção geral, é necessariamente adequada e coordenada com as exigências de prevenção especial que o Tribunal deve intuir do caso concreto e do agente.

D- No caso em apreço, estamos perante a restrição, na sua verdadeira aceção, de direitos, liberdades e garantias (artigo 18º, da Constituição da República Portuguesa).

E- Em virtude do que a restrição do direito à liberdade, por via de aplicação de uma pena, sempre se deverá submeter à previsão legal, bem como ao princípio da proporcionalidade, segundo o qual a pena deve ser aplicada na “justa medida”, não devendo ser desproporcionada ou excessiva.

F- Devendo corresponder às necessidades de tutela do bem jurídico em causa e às exigências sociais decorrentes daquela lesão, preservando, no entanto, a dignidade humana do agente/delinquente.

G- O arguido, ora recorrente é primário e não regista condenações averbadas no seu Certificado de Registo Criminal, mostra-se socialmente inserido, apresenta motivação para inserção no mercado, beneficia do apoio da mãe.

H- Tinha hábitos de consumo de haxixe e de bebidas alcoólicas, dos quais tem mantido a abstinência dos seus consumos durante a execução da medida de coação que lhe foi aplicada (prisão preventiva).

I- O arguido, à data da prática dos factos, considerados provados no Douto acórdão, era menor de 21 (tinha 20 anos).

J- Face ao tudo exposto e ao facto de o arguido ter experienciado, e continuar a experienciar, a situação de reclusão (há mais de 12 meses), a qual lhe proporcionou uma profunda reflexão, o que lhe permitiu revelar capacidade de entendimento e juízo crítico dos factos, reconhecendo a sua ilicitude e gravidade, facilmente se conclui que a simples censura do facto e a ameaça de prisão, ainda permite formular um juízo de prognose positivo quanto ao comportamento futuro do arguido.

K- Efetivamente, aquando da determinação das medidas concretas das penas, o Tribunal a quo considerou a atenuação prevista nos artigos 72º e 73º do Código Penal.

L- Não obstante considerar possível a formulação de um juízo de prognose favorável ao arguido, bem como dever aplicar a correspondente atenuação da pena, nos termos dos artigos 72 e 73º do Código do Processo Penal, a realidade é a de que as penas parcelares impostas ao arguido, bem como a aplicação da pena única de 7 (sete) anos de prisão, são excessivas e limitadoras da sua reinserção na sociedade.

M- Deveriam, no modesto entender do arguido, e salvo Douto entendimento em contrário, as penas parcelares impostas deveriam ter sido aplicadas pelos limites mínimos da moldura penal.

N- E, em consequência, a pena única ser reduzida substancialmente, devendo ter sido fixado um limite mínimo e um limite máximo compreendidos entre 3 (três) e 5 (cinco) anos de prisão.

O- Tudo ponderado, entende o arguido, ora recorrente que, atenta a excessiva severidade das penas cominadas para os crimes que lhe são imputados, não persistem razões para que a pena única a aplicar se afaste dos mínimos legais, a qual entende que deverá ser reduzida para não mais de 4 (quatro) anos de pena de prisão.

P- A qual, atendendo à personalidade do arguido, às condutas por si adotadas, quer anteriormente, quer posteriormente aos factos, deverá ser suspensa na sua execução, nos termos do artigo 50º do Código Penal, uma vez que a simples censura do facto e a ameaça da prisão, a qual tem sido experienciada pelo arguido, uma vez que lhe foi aplicada a medida de coação mais gravosa (prisão preventiva), realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

Q- Em suma, o Tribunal a quo não valorou devidamente a favor do arguido as invocadas circunstâncias que depõem a seu favor, as quais se demostram bastante atenuativas, devendo, assim, reputar-se como violados os critérios constantes do artigo 71º do Código Penal.

R- O Douto acórdão proferido pelo Tribunal a quo, violou o disposto nos artigos 40.º, 71º, 72º, 73º, 77º, todos do Código Penal e artigo 4º do Decreto-Lei 401/82, de 23 de setembro, bem como desrespeitou o disposto no artigo 30º da constituição da República Portuguesa.” Termina pedindo a alteração da pena que lhe foi imposta, solicitando que se determine a suspensão da pena de prisão que lhe foi aplicada.

*O recurso foi admitido.

Na 1.ª instância, o Ministério Público pugnou pela improcedência do recurso e pela consequente manutenção da decisão recorrida, tendo apresentado as seguintes conclusões: “1.

Com a ressalva mencionada quanto ao limite máximo da moldura a considerar no que tange ao crime de roubo agravado, concordamos na íntegra com a fundamentação plasmada no texto decisório, quanto à escolha e medida da pena, pouco mais havendo a acrescentar, por redundante.

  1. Ao contrário do pretendido por este arguido, o Tribunal valorou a ausência de antecedentes criminais por parte do mesmo – que o levou a beneficiar da atenuação especial da pena prevista no Regime Penal para Jovens, improcedendo deste modo a invocada violação do disposto no artigo 4º do Decreto-Lei 401/82, de 23 de Setembro e dos artigos 72º e 73º, do Código Penal, que nem sequer foi fundamentada -, pouco mais havendo a considerar a seu favor.

  2. De igual modo, não se vislumbra qualquer violação do preceituado nos artigos 40º, 71º e 77º, todos do Código Penal, bem como, no artigo 30º da Constituição da República Portuguesa, já que o Tribunal fundamentou adequadamente os parâmetros considerados para a determinação das penas parcelares e da pena única aplicada.

  3. Afinal, o arguido não se encontra profissionalmente inserido, sendo que a sua pretensão em se inserir no mercado laboral e o facto de beneficiar do apoio da mãe – que tem apresentado dificuldade em exercer uma monitorização adequada do quotidiano dos filhos -, a aparente abstinência do consumo de produtos estupefacientes e de bebidas alcoólicas durante o período de reclusão, bem como, a verbalização da necessidade de alterar o seu estilo de vida, não se concretizaram em qualquer mudança de comportamento, mormente após a prática dos factos em apreciação.

    Designadamente, não demonstrou durante a audiência de julgamento, qualquer arrependimento pela prática dos factos, nem evidenciou por qualquer modo, a interiorização do desvalor da sua conduta, não revelando qualquer preocupação ou empatia para com as vítimas.

    O que releva, a nosso ver, negativamente, no que tange às exigências de prevenção especial.

  4. A dosimetria penal encontrada para a punição do arguido, ora recorrente, não nos merece, deste modo, qualquer censura, afigurando-se-nos justa e adequada acautelando, dentro do limite inultrapassável imposto pela culpa, as finalidades retributivas da pena e as elevadas exigências de prevenção geral e especial, tendo sempre em mente a finalidade de ressocialização daquele.

  5. Precludida se mostra, deste modo, a possibilidade de suspensão da execução da pena, por carência de um dos seus pressupostos, atento o preceituado no artigo 50º do Código Penal, sendo certo que as elevadas exigências de prevenção geral sempre imporiam uma pena de prisão efectiva, sob pena de ficarem irremediavelmente comprometidas as finalidades de prevenção que a pena deve prosseguir..”*A Exmº. Procurador Geral Adjunto neste Tribunal da Relação emitiu parecer, tendo-se pronunciado no sentido da sua improcedência.

    *Procedeu-se a exame preliminar.

    Foi cumprido o disposto no art.º 417.º, n.º 2 do CPP, não tendo sido apresentada qualquer resposta.

    Colhidos os vistos legais e tendo sido realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.

    II – Fundamentação.

    II.

    I Delimitação do objeto do recurso.

    Nos termos consignados no artigo 412º nº 1 do CPP e atendendo à Jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19/10/95, publicado no DR I-A de 28/12/95, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente na sua motivação, as quais definem os poderes cognitivos do tribunal ad quem, sem prejuízo de poderem ser...

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