Acórdão nº 69/18.1GAMAC.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 26 de Janeiro de 2021
Magistrado Responsável | MOREIRA DAS NEVES |
Data da Resolução | 26 de Janeiro de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
ACÓRDÃO Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: 1. No Juízo Local Criminal de Abrantes, do Tribunal Judicial da comarca de Santarém, procedeu-se a julgamento em processo comum, com tribunal singular, de N…, filho de C… e de L…, divorciado, nascido em …, natural de S… pedreiro e residente na Rua do …, em …, a quem a acusação imputava a autoria, na forma consumada, de um crime de violência doméstica, previsto no artigo 152.º, § 1.º, al. a), § 2.º do Código Penal (CP). A ofendida, constituída assistente, formulou pedido civil, peticionando a condenação do arguido/demandado no pagamento de uma indemnização no montante de 13 000€ a título de danos não patrimoniais sofridos, decorrentes da conduta perpetrada daquele sobre a sua pessoa, no essencial descritos na acusação pública. O arguido contestou a acusação e impugnou o pedido civil, negando a prática dos factos imputados, tendo apresentado rol de testemunhas
A final o tribunal proferiu sentença na qual condenou o arguido como autor de um crime de violência doméstica, previsto no artigo 152°, § 1.º, al. a) e 2.º CP, na pena de 2 anos de prisão, suspensa por igual período, sujeito ao cumprimento de regras de conduta (i. Responder a convocatórias do magistrado responsável pela execução e do técnico de reinserção social; ii. Receber visitas do técnico de reinserção social e comunicar-lhe ou colocar à sua disposição informações e documentos comprovativos dos seus meios de subsistência; iii. Informar o técnico de reinserção social sobre alterações de residência; iv. Não contactar, de qualquer forma, ou aproximar-se da ofendida; v. Realização de consulta de alcoologia com médico e em serviço que serão indicados ao arguido pela DGRSP e, se necessário for, submeter-se a tratamento da aludida adição a bebidas alcoólicas, uma vez que o arguido deu consentimento para tal; vi. Realização, durante o período da suspensão, de entrevistas com técnicos da DGRSP com a periodicidade por esta definida, onde deverão ser trabalhadas as competências pessoais do arguido no sentido que o mesmo se deve abster da prática de crimes seja de que natureza for, educando-o para o direito e devendo as entrevistas serem direcionadas para a educação cívica e interiorização de que a lei e decisões judiciais são para ser cumpridas e respeitadas) e na pena acessória de proibição de contactos com a ofendida pelo período de 5 anos; na parcial procedência do pedido de indeminização civil mais o condenado a pagar à demandante a quantia de 1 000 €, acrescida de juros de mora contabilizados a partir da data da sentença
Inconformados com a decisão recorreram: - o arguido relativamente à condenação penal e cível; - e a assistente relativamente ao decaimento cível. No seu recurso o arguido finaliza a motivação nas seguintes (extensas) conclusões (transcrição): «1 - O arguido foi acusado e condenado pelo crime de violência domestica, na pena de 2 anos prisão, suspensa na sua execução, em regras de conduta e pena acessória. 2 - Na fase de inquérito foi ouvida a menor, e no decorrer do mesmo o arguido apenas foi sujeito a TIR. 3 - A Meritíssima Juíza a quo dá como provados os factos constantes da sentença recorrida, factos que constavam da acusação e do despacho de alteração não substancial dos factos. Também a sentença considera factos não provados. 4 - Não foi feita quaisquer peritagens aos telemóveis, nem do arguido nem da assistente, nem se encontra nos autos prova relativamente a quem pertenciam os números de telefone que constam dos autos. 5 - Também durante a fase de julgamento a assistente, apesar de a Meritíssima juíza lhe ter pedido para ir a casa buscar essa prova, não comprovou os alegados telefonemas feitos pelo arguido á assistente. 6 - O arguido com sinceridade e humildade, esclareceu a verdade dos factos e negou aqueles que não correspondiam à verdade. 7 - Em sede de audiência de julgamento foi comunicada, ao arguido a alteração não substancial dos factos, mas os factos aditados não são factos novos. 8 - São factos dos quais a assistente e o MP já tinham conhecimento durante a fase de inquérito, não podendo nesta fase ser imputados ao arguido. 9 - O arguido negou que durante o casamento alguma vez tenha agredido ou insultado a assistente, disse que o seu casamento era um casamento normal, nega perentoriamente que ingerisse bebidas alcoólicas em excesso. 10 - Reconhece que ficou desorientado quando soube que a sua mulher tinha um caso amoroso com o professor da filha, e que apos a separação lhe chamou puta e cabra. 11 - Mas a Meritíssima Juíza valoriza sim o depoimento da assistente, não se apercebendo das contradições dos depoimentos e do narrado nos autos de notícia. 12 - A testemunha S..., sobrinha da Assistente, diz que viu a agressão, em agosto de 2018, com o capacete e o aperto de pescoço l3 - Mas depois, do mm 00:08:30 ao mm 00:08:41, do seu depoimento, acaba por dizer que entende que o N… não tinha intenção de apertar o pescoço á V…, a intenção do N… era apenas levar a menina, não queria magoar a V…. 14 - O arguido esclarece que a sua mulher saiu de casa porque conheceu alguém, e que reagiu mal a isso, diz que lhe custou muito aceitar isso, confessa de forma sentida, que se sentiu humilhado
15 - Também o arguido de forma emocionada, diz que naquela altura havia muitos impedimentos para estar com a filha o que originava conflitos
16 - A Assistente V…, prestou apenas declarações, com início pelas 11 horas e 47 minutos e termo pelas 13 horas e 24 minutos, confirma que saiu de casa em 18.05.2018, 17 - Diz que tinha discussões com o arguido, relacionadas com o dinheiro, com idas ao café, que ele bebia muito, que discutiam muito, que este lhe chamava nomes e que a empurrou, durante o casamento de 15 anos, 3 vezes. 18 - A versão da assistente não merece credibilidade, pois fica claro que está zangada com o arguido, tem que estar zangada, houve um processo litigioso de divórcio e corre termos um Processo de RRP. 19 - O seu depoimento não é crível, o que levou o próprio tribunal - ao mm 00:17:38 - a adverti-la que tinha que ser sincera e dizer a verdade. 20 - Não é crível, nem se aceita que a assistente tenha estado casada 15 anos com um homem que lhe chamava puta e vaca constantemente. 21 - A assistente é uma mulher culta, com família, economicamente não era dependente do marido, tanto assim que em maio de 2018 saiu de casa. 22 - Não se aceita que se isso fosse verdade a assistente nunca tivesse chamado as autoridades, já que após a separação chamou a GNR e foi á esquadra apresentar queixas contra o seu marido inúmeras vezes. 23 - A assistente diz clara e expressamente, que o episódio da piscina, de 11 de agosto de 2018, foi o último. 24 - Facto importante, mas a Meritíssima juíza a quo não o dá como provado. 25 - A assistente confirma que em 2017, no verão toda a família foi de férias para … e que andaram tranquilamente, confirma ainda que todos os anos a família ia de férias não refere quaisquer maus tratos ou ofensas por parte do arguido. 26 - Ora não é de todo credível, que se o arguido lhe chamasse constante puta e vaca (4 vezes por semana) e estivesse sempre embriagado e discutisse com ela, a assistente ainda tivesse vontade e mesmo forças para ir de férias com ele. 27 - A verdade é que a assistente sempre esteve bem no seu casamento, com discussões sim, mas nunca graves nem ofensivas, o arguido saía do trabalho e muitas das vezes antes de ir para casa ia ao café, fumava muito e não ajudava nas lides domésticas, o que desagradava profundamente a assistente e gerava discussões, nunca se podendo esquecer que para haver discussões são necessárias duas pessoas. 28 - A assistente só passou a não estar bem no seu casamento, quando se começou a relacionar amorosamente com o professor da sua filha, só apos essa data o arguido passou a ter todos os defeitos e a ser um péssimo marido. 29 - O depoimento da assistente pretende esconder, que antes de terminar o casamento, já mantinha um relacionamento amoroso com o professor da filha, se mente nessa situação, mesmo depois de advertida pelo tribunal, mente também em outros pontos
30 - Não estamos perante uma situação de maus tratos, estamos sim, eventualmente, perante um crime de ofensa a integridade física e de injúrias, o arguido não infligiu maus tratos à sua mulher. 31 - Toda a situação factual descrita pela assistente, não é de forma alguma grave que possa integrar o conceito jurídico de "maus tratos"
32 - A testemunha A… - Militar da GNR, nunca assistiu a qualquer confusão provocada pelo arguido. Nem se recorda de nada. 33 - A testemunha S…, sobrinha da assistente, confirma a versão da assistente no episódio de agosto, mas diz perentoriamente que nunca, para além daquela, assistiu a qualquer confusão entre o casal. 34 - A testemunha S…, amiga do casal há vários anos, também nunca viu qualquer outra confusão entre o casal. 35 - A testemunha F…, é patrão do arguido há 18 anos, diz que ele é uma pessoa excelente, que nunca o viu bêbado, nem falta ao trabalho. 36 - As testemunhas, N… e T…, ambos amigos do arguido de anos, nunca viram o N… beber de forma a ficar violento ou agressivo. 37 - Analisando criticamente os depoimentos das testemunhas, todos os documentos juntos aos autos e pelas regras da experiência comum, deveria a Meritíssima juíza ter dado como não provados os factos constantes nos pontos 3, 5, 6, 8, 10, 14 a 18,20 a 22, 24 a 30, da sentença recorrida. 38 - O facto 9 e 11, devem ser alterados, 39 - À matéria dada como provada devem ser aditados os factos 31, 32 e 33. 40 - O Recorrente impugna, em concreto, os pontos 3, 5, 6, 8, 10, 14 a 18, 20 a 22,24 a 30, da sentença recorrida. que considera incorretamente apreciados e julgados, dado que as provas produzidas impõem decisão diversa da recorrida, nos termos do artigo 412.0 n.° 3 a) e b) do C.P.P. 41 - Assim, deveria o Tribunal recorrido ter considerado provado que o arguido na sequência da sua esposa ter saído de...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO