Acórdão nº 193/19.3T9LAG.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 09 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelJOÃO AMARO
Data da Resolução09 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - RELATÓRIO Por despacho de 29 de maio de 2020, proferido no Proc. nº 193/19.3T9LAG, do Juízo de Instrução Criminal de Portimão (Juiz 2), não foi admitida a instrução requerida pela assistente Q…, com fundamento na sua inadmissibilidade legal

Inconformada com essa decisão, recorreu a assistente, pedindo que seja proferido acórdão que revogue o aludido despacho e ordene a substituição do mesmo por outro que admita a instrução requerida

Apresentou as seguintes conclusões: 1ª - No Requerimento para Abertura da Instrução apresentado, a assistente/recorrente indica, claramente, os factos que imputa aos arguidos (conforme pontos nºs 1.1, 1.2, 1.3 e 1.4 desse “Requerimento”), bem como elenca os elementos subjetivos do crime, não impondo a lei que a assistente tenha de organizar um Requerimento para Abertura da Instrução como o Ministério Público organizaria uma acusação

  1. - O que é necessário, isso sim, é que o Requerimento para Abertura da Instrução contenha todos os elementos referidos no artigo 283º, nº 3, als. b) e c), do C. P. Penal, o que sucede in casu

  2. - A assistente, no Requerimento para Abertura da Instrução apresentado, indica os factos e indica as disposições legais aplicáveis, de tudo resultando a imputação aos arguidos de um tipo legal de crime bem delimitado e bem definido, sendo perfeitamente percetível qual a sanção penal a aplicar

  3. - A “forma” como o Requerimento para Abertura da Instrução apresentado pela assistente está organizado não belisca o direito ao contraditório dos arguidos, uma vez que, dele, constam todos os factos que são imputados aos arguidos, e, bem assim, constam as normas jurídicas aplicáveis

  4. - A rejeição do Requerimento para Abertura da Instrução, nos termos e com os fundamentos em que foi levada a cabo pelo tribunal recorrido, constitui uma verdadeira denegação de justiça, com flagrante violação do direito da assistente a uma tutela jurisdicional efetiva

* O Ministério Público junto da primeira instância respondeu ao recurso, entendendo que deve manter-se o despacho recorrido, improcedendo o recurso

Neste Tribunal da Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto, possuindo entendimento contrário, emitiu parecer no sentido da procedência do recurso

Cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2, do C. P. Penal, não foi apresentada qualquer resposta

Foram colhidos os vistos legais e foi realizada a conferência

II - FUNDAMENTAÇÃO 1 - Delimitação do objeto do recurso

No presente caso a única questão evidenciada no recurso, segundo o âmbito das correspondentes conclusões, as quais delimitam o objeto do recurso e definem os poderes cognitivos deste tribunal ad quem, nos termos do disposto no artigo 412º, nº 1, do C. P. Penal, consiste em aferir da existência ou inexistência de motivo legal de rejeição da instrução, face ao requerimento para abertura de instrução apresentado pela assistente (e, face a tal aferição, concluir se o despacho recorrido deve ou não ser revogado e substituído por outro que admita o requerimento a pedir a abertura de instrução)

2 - A decisão recorrida

O despacho revidendo é do seguinte teor: “Requerimento de abertura da instrução de fls. 204 e seguintes: Conforme resulta da lei processual penal, a instrução, como fase intermédia entre o inquérito e o julgamento, «visa a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito em ordem a submeter ou não a causa a julgamento» – artigo 286.º, n.º 1, do Código de Processo Penal

Finda a instrução, o juiz deverá proferir despacho de pronúncia ou de não pronúncia, sendo certo que a opção por um ou por outro se relaciona com o facto de até ao encerramento da instrução se haver logrado ou não recolher indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou medida de segurança – conforme o disposto nos artigos 308.º, n.º 1, e 283.º, n.º 2, ambos do Código de Processo Penal

Efetivamente, nesta fase processual não se visa alcançar a demonstração da realidade dos factos, mas tão-só indícios suficientes de que um crime foi eventualmente cometido por determinado arguido, sendo certo que a decisão a proferir no final desta fase não é uma decisão jurisdicional demérito, mas sim uma decisão processual quanto à prossecução do processo até à fase do julgamento

Neste escopo, deve o Juiz de instrução compulsar e ponderar toda a prova recolhida e fazer um juízo de probabilidade sobre a condenação do arguido e, em consonância com esse juízo, remeter ou não a causa para a fase de julgamento

A fase de instrução permite que a atividade levada a cabo pelo Ministério Público durante o inquérito possa ser controlada através de uma comprovação por via judicial, traduzindo-se essa possibilidade na consagração, no nosso sistema, da estrutura acusatória do processo penal, a qual encontra assento legal no artigo 32.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa

Por isso, a atividade processual desenvolvida na instrução é materialmente judicial e não materialmente policial ou de averiguações – Acórdão da Relação de Lisboa de 12/07/1995, CJ, XX, 4.º, pág. 140, e...

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