Acórdão nº 1415/19.6T8ENT-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 16 de Dezembro de 2021

Magistrado ResponsávelFRANCISCO XAVIER
Data da Resolução16 de Dezembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acórdão da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora I – Relatório1.

Por apenso à acção executiva para pagamento de quantia certa que lhe foi movida pelo Banco Comercial Português, S.A., veio M… deduzir oposição à execução mediante embargos de executado, na qual confessa a celebração com o exequente, em 31/10/2007, de um contrato de mútuo, no montante de € 64.900,00, mas alega que o exequente não cumpriu as obrigações decorrentes do Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI) estipulado no Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10, não sendo suficiente para o efeito o que resulta do documento n.º 3 junto com o requerimento executivo, por intermédio do qual foi informada, através de carta datada de 31-01-2019, do atraso no cumprimento e dos montantes em dívida.

Concluiu, assim, pela verificação de excepção dilatória atípica ou inominada que obsta ao conhecimento do mérito da causa e importa a absolvição da instância, com a consequente extinção da execução.

  1. O Exequente contestou os embargos, alegando, em síntese, que a executada/embargante apresenta registos de incumprimento (tanto quanto ao crédito exequendo nos autos principais, como ao que foi reclamado no Apenso B), desde Dezembro de 2016, data a partir da qual foi contactada pelos serviços do exequente, através de contactos telefónicos e mensagens de telemóvel que discrimina, no sentido de regularizar a situação e encontrar uma solução consensual para o efeito, sendo que em 29 de Janeiro de 2018, e perante o incumprimento contratual por falta de pagamentos das prestações acordadas por parte da embargante, enviou-lhe carta informando a sua integração em PERSI; que, posteriormente, na sequência da troca de comunicações entre as partes, o embargado integrou novamente em PERSI apenas o empréstimo dado em execução; e, porque não foi possível alcançar acordo quanto ao incumprimento contratual, o Banco embargado procedeu à extinção do PERSI, e posteriormente procedeu à interpelação e resolução contratual.

    Invoca ainda o embargado o abuso de direito, alegando que “… não faz sentido que decorrido bem mais de um ano de início de incumprimento e negociações para por termo a tal incumprimento, sem sucesso por alegada incapacidade financeira para o efeito, seja exigível ao Banco embargado que demonstre uma integração meramente formal no regime de PERSI, tendo aqui alegado e demonstrado que o cumpriu de facto na íntegra, mas infelizmente sem desfecho favorável”.

    Juntou três documentos, alegando tratarem-se de missivas que foram recebidas pela embargada.

  2. A executada/embargante impugnou os documentos juntos com a contestação, alegando que nunca teve conhecimento deles, posição à qual o exequente/embargado reagiu requerendo a prestação de depoimento de parte da executada/embargante.

  3. Foi dispensada a realização de audiência prévia, fixado o valor da causa, proferido despacho saneador com identificação do objecto do litígio e enunciação dos temas da prova, assim como apreciados os requerimentos probatórios das partes.

    Realizada a audiência final, veio a ser proferida sentença, na qual se decidiu: “… julgar totalmente improcedente a presente oposição à execução mediante embargos de executado” 5.

    Inconformada recorreu a executada/embargante, finalizando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões: 1.ª Discute-se no presente recurso a aplicação do regime consagrado nos artigos 12.º e seguintes - atinentes ao denominado Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI) - do referido Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de Outubro.

    1. O Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25-10 impõe, assim, às instituições de crédito mutuante uma “renegociação forçada” e confere ainda ao cliente diversas garantias não displicentes tais como a impossibilidade de a instituição de crédito mutuante (a) resolver o contrato com fundamento no incumprimento, (b) intentar acções judiciais com vista à satisfação do seu crédito, (c) ceder a terceiros, total ou parcialmente, o crédito em questão, ou (d) transmitir a sua posição contratual – tudo isto, enquanto durar o PERSI.

    2. As partes não discutem o âmbito de aplicação do referido diploma legal (D.L. 227/2012, de 25 de Outubro), aceitando que assim é, divergindo apenas quanto à questão de saber se foi devidamente cumprido o disposto no aludido Decreto-Lei a respeito do PERSI: a executada defendeu na petição de embargos que o exequente não promoveu as diligências necessárias à implementação do Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI), sustentando o exequente que diligenciou pela implementação de PERSI, remetendo para os documentos que juntou com a Contestação.

    3. É indiscutível que não estamos perante cartas registadas com aviso de recepção, nem sequer perante meras cartas registadas, não constando dos autos nenhuma prova documental (mormente talão de registo, prova de depósito, aviso de entrega) da qual resulte a expedição e muito menos a recepção dessas cartas.

    4. Dos pontos 17. a 20. dos factos provados consta que as putativas cartas foram enviadas à executada/embargante através de correio simples.

    5. A executada/embargada não confessou tê-las recebido por tal não ter acontecido.

    6. Os depoimentos testemunhais foram de funcionários do Banco que não tiveram qualquer intervenção na elaboração e/ou envio das cartas em questão (pontos 17. a 20. dos factos provados), conforme melhor resulta do depoimento da testemunha Olívia Rua, que esclareceu “tratar-se de cartas automáticas expedidas pelo sistema interno do banco e enviadas por correio simples”, mas da descrição genérica que fizeram nada resultou que prove o efectivo envio e recebimento das cartas em causa.

    7. A jurisprudência tem decidido de modo uniforme, que aqui se invoca, mormente o acórdão da Relação de Lisboa, de 21-05-2020, proferido no processo 5585/15.4T8FNC-A.L2-2 (disponível em www.dgsi.pt), segundo a qual esta forma de comunicação, não pode, por via de regra, ser provada por testemunhas.

    8. Resta concluir que não existem elementos de prova objectivos que permitam considerar provados os factos descritos nos pontos 17. a 20. no que concerne ao envio e recepção das cartas cujas cópias foram juntas aos autos com a Contestação, pelo que devem proceder, neste particular, as alegações de recurso.

    9. Razão pela qual devem os pontos 17. a 20. ser eliminados do elenco dos factos provados, o que se invoca e requer.

    10. A jurisprudência tem considerado que, não tendo a instituição de crédito diligenciado previamente à instauração da acção executiva pela implementação de PERSI, se está, com as devidas adaptações, perante uma excepção dilatória inominada, de conhecimento oficioso, já que não estando demonstrado o prévio cumprimento por parte da instituição de crédito dos princípios e regras imperativas estabelecidas naquele Decreto-Lei, a mesma não pode intentar acções judiciais com vista à satisfação do seu crédito - cf. art.º 17.º, n.º 1, al. al. b) -, faltando assim um pressuposto processual ou uma condição de procedibilidade da pretensão.

    11. A lei exige que a integração dos clientes bancários no PERSI e a extinção do mesmo lhes sejam devidamente comunicadas em suporte duradouro (cf. artigos 14.º, n.º 4, e 17.º, n.º 3, do referido diploma legal), tratando-se, sem dúvida, de declarações receptícias, o que significa que tinha que ser feita a prova da existência dessas comunicações, do seu envio e da sua recepção pela executada, cabendo o ónus da prova desses factos à instituição de crédito (exequente/embargada), já que se trata de condição indispensável para o exercício do direito que pretende fazer valer.

    12. Neste sentido, se pronunciaram os acórdãos da Relação de Évora de 27-04-2017, proferido no processo n.º 37/15.5T8ODM-A.E1, de 28-06-2018, proferido no processo n.º 2791/17.0T8STB-C.E1 e de 08-03-2018, proferido no processo n.º 2267/15.0T8ENT-A.E1, todos disponíveis in www.dgsi.pt.

    13. Em face da matéria de facto provada, impõe-se concluir que o exequente/embargado não logrou demonstrar o efectivo cumprimento das normas imperativas atinentes à integração da executada/embargante no...

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