Acórdão nº 123/19.2T9LAG.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 16 de Dezembro de 2021

Magistrado ResponsávelMARTINHO CARDOSO
Data da Resolução16 de Dezembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

IAcordam, em conferência, na 2.ª Subsecção da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: Nos autos de inquérito acima identificados, do Juiz 2 do Juízo de Instrução Criminal de Portimão, da Comarca de Faro, o assistente (...) não se conformou com o despacho de arquivamento do inquérito ordenado pelo M.º P.º e apresentou o seguinte requerimento de abertura de instrução (RAI): 1— DA ABERTURA DE INSTRUÇÃO1.

Os presentes autos foram arquivados, porquanto e em referência aos Denunciados "que não foram colhidos indícios suficientes que os ora denunciados tenham intencionalmente falseado a realidade dos factos no decurso do seu depoimento, de forma a impedir o correto exercício da justiça."2. Salvo o devido respeito discorda em absoluto o Assistente de tal decisão.

  1. Vejamos os factos alegados na participação do ora Assistente que, grosso modo, estão demonstrados nos documentos juntos aos autos: a) Da decisão no processo 142/15.8 GALGS, foi absolvido do crime de gravações e fotografias ilícitas na forma continuada, por que vinha acusado, assim como do crime de ofensa à integridade física, mas condenado pelo crime de apropriação ilegítima em caso de acessão ou de coisa achada, nos termos do artigo 209, n21 do Código Penai.

    b) Por este crime referido em último, foi o Assistente condenado a uma pena de trinta dias de multa, à razão diária de € 5,00 (cinco euros), perfazendo o montante global de € 150,00 (cento e cinquenta euros) e a que correspondiam vinte dias de prisão subsidiária.

    c) Não se conformando com a douta decisão da 12 Instância, recorreu o Assistente da sentença que o condenou, tendo nas suas alegações de motivação do recurso, invocado que a sentença não havia corretamente apreciado e valorado as declarações prestados pelo próprio, assim como das testemunhas inquiridas.

    d) Que ante a incorreta valoração das declarações das testemunhas, foram dados como provados factos que o não deveriam ter sido, pelo que se impunha a revogação dessa sentença recorrida.

    e) Considerou depois o Tribunal da Relação de Évora, que o recurso deveria ter provimento, revogando-se parcialmente a sentença recorrida, alterando a matéria de facto dado como provada constante dos pontos 4 e 6 da mesma sentença e absolvendo-se o Assistente da prática do crime de apropriação ilegítima em caso de acessão ou coisa achada, prevista e punida pelo artigo 209, n21 do Código Penal.

    II-DO PREENCHIMENTO DOS ELEMENTOS DO CRIME DE FALSIDADE DE TESTEMUNHO4.

    O crime de falsidade de testemunho, p. e p. pelo artigo 360, n21 e 3, do Código Penal, tem como bem jurídico protegido no seu essencial, a realização ou administração da justiça como função do Estado, sendo elementos objetivos do tipo: a) o agente se encontrar investido numa dada função processual (neste caso de testemunha); b) prestar uma declaração falsa; c) após ter prestado juramento e sido advertido das consequências penais a que se expõe por autoridade com competência.

  2. Quanto ao tipo subjetivo de ilícito, trata-se de um tipo doloso, que exige a verificação de dolo genérico em qualquer das suas modalidades.

  3. Ora os denunciados em sede de audiência e julgamento denunciaram atuações do Assistente de ficar na sua posse com bolas atiradas para a sua propriedade, de nunca as entregar e as cortar.

  4. Sendo certo, que dos locais onde os denunciados alegaram que estariam e conseguiam ver o denunciante praticar tais atos, não conseguiam na realidade ver tais acontecimentos, se os mesmos tivessem efetivamente acontecido, o que não foi sequer o caso.

  5. Nomeadamente, a denunciada (...), ocultou que durante cerca de dois anos, acompanhava os menores (filhos de …), à propriedade do assistente para irem buscar as bolas, que eles mesmos atiravam para lá.

  6. A mesma denunciada mentiu dizendo que o Assistente ficava sempre com as bolas e não as entregava.

  7. O denunciado (…) declarou que o Assistente todos os dias ficava com bolas, que as cortava e não devolvia nada a ninguém.

  8. Este denunciado também declarou em sede de inquérito que viu o Assistente a apanhar bolas, mas não o viu a cortar bolas, mas como as bolas nunca apareciam, devia ser o Assistente que as destruía.

  9. Ora este denunciado é funcionário da concessão de praia, que trabalhava na praia e não perto da casa do Assistente, pelo que não poderia ter presenciado os factos que relata.

  10. Ora, já em sede de recurso, o Tribunal da Relação de Évora veio dar razão ao Assistente e afastou a prática do crime de apropriação ilegítima em caso de acessão ou de coisa achada.

  11. Assim, nesta linha de pensamento, percebe-se que os denunciados, não falaram a verdade em tribunal, o que prejudicou o Assistente na sua honra e reputação, tendo o mesmo sofrido uma condenação em 12. instância por causa das suas declarações, além de que com as suas atuações colocavam em causa a realização da Justiça.

  12. Os denunciados atuaram com a intenção concretizada de prestar depoimento falso quando inquiridos na qualidade de testemunhas, quer na fase do inquérito, quer na fase do julgamento, não obstante terem sido advertidas de que caso não falassem a verdade, incorriam em responsabilidade criminal.

  13. Este tipo de crime é um crime de perigo abstrato, nem sendo necessário que a declaração falsa prejudique efetivamente o esclarecimento da verdade suporte da decisão.

  14. É um crime de mera atividade em que o comportamento se esgota logo no momento da efetivação da conduta proibida, bastando a existência de contradição de depoimentos, independentemente de se apurar qual deles é o verdadeiro.

  15. No caso em concreto nos presentes autos, ainda se apresenta uma situação mais gravosa, na medida em que por causa dos depoimentos falsos dos denunciados, resultou na condenação do Assistente em 12 instância, por um crime que depois veio a ser absolvido em sede de recurso no Tribunal da Relação de Évora, provando-se efetivamente que esses testemunhos não tinham qualquer credibilidade.

  16. Sem esquecer que tanto é falso o depoimento expresso de não dizer a verdade, como a omissão intencional de factos ou situações que possam esclarecer a verdade.

    III-INQUÉRITO SEM INVESTIGAÇÃO –...

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