Acórdão nº 150/15.9GEPTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 04 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA LEONOR ESTEVES
Data da Resolução04 de Abril de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora 1. Relatório Na secção criminal – J1 da instância local de Portimão da comarca de Faro, em processo comum com intervenção do tribunal singular, foi submetido a julgamento o arguido Damian, devidamente identificado nos autos, tendo no final sido proferida sentença que o absolveu da prática do crime de furto simples p. e p. pelo art. 203º nº 1 do C. Penal de que vinha acusado.

Inconformado com a sentença, dela interpôs recurso o MºPº, pretendendo que a mesma seja revogada e, alterada que seja a decisão da matéria de facto nos termos propugnados, substituída por decisão que condene o arguido pela prática daquele crime, para o que formulou as seguintes conclusões: 1 – A sentença recorrida deu como não provados o facto constante da acusação relativo ao tipo subjectivo do crime, absolvendo o arguido da prática do crime de furto simples que lhe era imputado; 2 – Da prova produzida na audiência, nomeadamente do depoimento prestado pela testemunha Mark deveria ter sido dado como provado o facto dado como não provado; 4 – Apesar da evidência da prova produzida, nomeadamente de o arguido ter sido visto por uma testemunha a pegar no telemóvel e a levá-lo consigo, bem sabendo que o mesmo não lhe pertencia, tal foi dado como não provado ocorrendo a consequente absolvição do arguido; 5 – A prova impunha decisão diversa da recorrida, nomeadamente a condenação do arguido pela prática do crime de furto que lhe era imputado; 6– Daí que, se considere incorrectamente julgado o pontos de facto dado como não provado na decisão, devendo, considerar-se provado e em consequência, ser o arguido condenado pela prática do crime pelo qual foi acusado; 7 – Ao decidir em contrário da prova produzida, o tribunal violou de forma ostensiva o princípio da livre apreciação da prova consagrado no art. 127 do C.P.P.

8 – Da simples leitura da decisão recorrida verifica-se que a mesma enferma de erro notório na apreciação da prova, p. e p. pelo art. 410 nº 2 als. a c) do C.P.P. justificando-se o reenvio do processo para novo julgamento.

9– Ao decidir como decidiu, o tribunal violou o disposto nos arts. 127 do C.P.P. e 203 e 204 nºs. 1 do C.P.

10 - Pelo exposto, deve esse Venerando Tribunal, apreciar a prova produzida em audiência, proferindo decisão que dê como provados todos os factos constantes da acusação e consequentemente deverá condenar o arguido pela prática do crime que lhe foi imputado.

O recurso foi admitido.

Não foi apresentada resposta.

Nesta Relação, o Exmº Procurador-geral Adjunto emitiu parecer no qual se limitou a manifestar o entendimento de que a sentença recorrida deve ser substituída por outra que condene o arguido pela prática do crime pelo foi acusado, tal como defendido pelo recorrente.

Foi cumprido o art. 417º nº 2 do C.P.P., tendo o arguido/recorrido apresentado resposta na qual defendeu a manutenção da sentença recorrida, considerando que esta julgou correctamente os factos e que, em face dos não provados, se impunha a sua absolvição, tendo cumprido todos os requisitos legais sem merecer qualquer reparo Colhidos os vistos, foram os autos submetidos à conferência.

Cumpre decidir.

  1. Fundamentação Na sentença recorrida foram considerados como provados os seguintes factos: 1. No dia 21 de Agosto de 2015, pelas 22h35m, no interior do Bar “J”, sito na Rua …, em Carvoeiro, John A. dirigiu-se ao balcão, para pedir bebidas, tendo, nessa altura, pousado o seu telemóvel, de marca NOKIA, de cor azul, touch screen, no valor de 200 euros, em cima do balcão, próximo do local onde estava sentado o arguido.

  2. Em seguida, John A, afastou-se do balcão, para ir à casa de banho, no piso superior, tendo-se esquecido de levar o telemóvel consigo.

  3. Instantes depois, o arguido pegou no telemóvel e guardou-o no bolso, saindo do Bar.

    Considerou-se não se ter provado nenhum outro facto com relevo para o objecto do processo, designadamente que: 1. O arguido fez seu o telemóvel Nokia, tal como quis fazer, sabendo que o mesmo não lhe pertencia, tendo agido de modo deliberado, livre e consciente, sabendo que aquela conduta não lhe era permitida e era punida por lei.

    A decisão da matéria de facto foi explicada nos seguintes termos: Sendo certo que, salvo quando a lei disponha diferentemente, a prova, nos termos do art.º 127.º do CPP, deve ser apreciada no seu conjunto segundo as regras da experiência e segundo a livre convicção do julgador, foram os seguintes os meios de prova nos quais o Tribunal fundou a sua convicção quanto à factualidade apurada: 1.

    Declarações do arguido: que apresentou uma versão dos factos segundo a qual, recordando-se de ter estado no Bar dos autos, na noite em apreço, estaria a tal ponto embriagado, que de pouco se recordava do que havia sucedido. Ainda assim, não tem ideia de ter pegado em qualquer telemóvel ou outro objecto que não lhe pertencesse. Recorda-se de o barman ter ido ter consigo, depois de ter saído do Bar, reclamando um telemóvel, do qual nada sabia e que não tinha sequer em seu poder. Acrescentou que o barman, por causa da situação do telemóvel, não lhe devolveu o computador portátil que, nessa noite, levara consigo para o Bar e que lhe pedira para guardar enquanto ali estivesse. Esta versão não foi contrariada pelos restantes meios de prova, mostrando-se adequada a gerar dúvidas sobre a realidade dos factos tal com narrados nos autos, razão pela qual foi a mesma valorada ao abrigo do princípio do in dubio pro reo.

  4. Depoimento da testemunha Mark…: funcionário do Bar à data dos factos, o qual esclareceu sobre os factos presenciados na noite em questão, tendo confirmado que o arguido ali teria estado, ao balcão, a consumir bebidas alcoólicas e que a dada altura dali se aproximou o ofendido, que fez o seu pedido e se dirigiu à casa de banho. Recorda-se de ter visto o arguido alcançar um telemóvel que estava em cima do balcão, e que se lembrava de ser de cor azul e touch screen e, com toda a naturalidade, o ter guardado no bolso e saído do bar. Dado o à vontade com que guardou o telemóvel não suspeitou que o mesmo não lhe pertencesse. Ainda ali regressou, com sinais de ter caído (estava embriagado), mas logo voltou a sair novamente. Foi então que o ofendido se lembrou de ter deixado o telemóvel sobre o balcão e veio à sua procura. Nessa altura a testemunha associou uma coisa à outra e concluiu que o telemóvel que o arguido guardara no bolso só podia ser o telemóvel do ofendido, pelo que, mais tarde, foi à procura do arguido para o mesmo lhe entregar o telemóvel. A testemunha esclareceu ainda que o arguido aparentava estar embriagado (até cambaleava). Ora, a testemunha depôs de modo que suscitou reservas a respeito da sua isenção, apesar da coerência do seu relato. Com efeito, o mesmo revelou um envolvimento inusitado no desfecho da situação, que revela parcialidade na sua intervenção (a testemunha, suspeitando que o arguido se mantém na posse do telemóvel dos autos, “tomou-se das dores” do ofendido, e tem-se recusado em devolver ao arguido o seu computador, enquanto o mesmo não lhe entregar o tal telemóvel…). Assim, apenas se valoraram as suas declarações na parte em que se mostraram corroboradas por outros meios de prova.

    Os factos dados como provados resultam da conjugação de todos os meios de prova produzidos, avaliados à luz das regras da lógica e da experiência comum, que os confirmam.

    Assim, que o arguido esteve no Bar dos autos, na data e hora em apreço, foi tal admitido pelo próprio e corroborado pela testemunha.

    Que o arguido aí ingeriu bebidas alcoólicas e se encontrava afectado pelo álcool, também foi afirmado pelo arguido e confirmado pela testemunha (que até referiu ter visto o arguido a andar cambaleante, e ter saído do bar e depois voltado...

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