Acórdão nº 1985/13.2TBPTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 27 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelTOMÉ DE CARVALHO
Data da Resolução27 de Abril de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo nº 1985/13.2TBPTM.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Faro – Instância Central – 2º Juízo de Competência Civil de Portimão – J3 Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório: Na presente acção proposta por (…) contra (…) (entretanto falecido), (…), (…) e (…), a Autora veio interpor recurso da decisão que declarou a instância deserta ao abrigo do disposto no artigo 281º, nº 1, do Código de Processo Civil.

* A recorrente não se conformou com a referida decisão e as suas alegações apresentaram as seguintes conclusões: I) O presente recurso tem por objecto a douta decisão da 2.ª secção Cível – J3, da Instância Central de Portimão, Tribunal da Comarca de Faro, de 14 de Outubro de 2016, na qual foi julgada deserta a instância sendo invocado que a instância se considera deserta quando por negligência das partes o processo estiver a aguardar impulso por mais de seis meses – artigo 281º, nº 1, do Código de Processo Civil.

II) Em 15/04/2015 a Autora foi notificada por despacho de fls. do óbito do Réu (…) tendo sido declarada a suspensão da instância sem prejuízo da deserção – artigos 277º, nº 1 e 281º, ambos do Código de Processo Civil.

III) A Autora deduziu incidente de Habilitação de herdeiros em 09/07/2015.

IV) O incidente foi apensado aos autos do presente acção em 10/07/2015.

  1. A Autora foi contactada pelo mandatário das Réus (…) e (…) em 18/09/2015 para apurar se a mesma estaria disposta a receber o sinal em singelo pondo fim ao processo com uma desistência do pedido.

    VI) O incidente de habilitação de herdeiros foi indeferido liminarmente por sentença de 11/11/2015.

    VII) Depois de várias reuniões e trocas de emails que se prolongaram por aproximadamente um ano, a Autora e as Rés acordaram que aquela apresentaria a desistência do pedido, mediante a devolução em singelo do sinal, acrescido de uma compensação de € 5.000,00 (cinco mil euros) a título de compensação pelas despesas tidas com o processo de aquisição.

    VIII) Em 04/10/2016 o mandatário da Ré (…), informou a Autora na pessoa do seu mandatário, que não seria possível concluir o acordo, pois existiam divergências entre a sua constituinte e a irmã (…) que impossibilitavam a finalização do acordo, deixando em aberto que até ao início de Novembro tudo ficaria resolvido.

    IX) Por impossibilidade de entendimento entre os RR. herdeiros o acordo não se concretizou na data prevista, sendo que ainda se mantém aberto que o mesmo se concretize logo que as Réus cheguem a um entendimento sobre as questões que as separam.

  2. O tribunal a quo nunca notificou as partes para no decurso do prazo da deserção da instância, nem após o decurso do mesmo, virem ao processo indicar o motivo da falta de impulso processual.

    XI) Embora Autora e Réus não tivessem vindo aos autos informar das negociações que haviam encetado para a resolução amigável da demanda que as opunha, nunca foi sua intenção actuar negligentemente, não impulsionando os autos.

    XII) A Autora face à impossibilidade de chegar a um acordo cujas negociações duraram aproximadamente um ano aprestava-se para vir aos autos informar do sucedido.

    XIII) Actualmente, o reconhecimento da deserção produz-se ope judicis, e não ope legis. O juiz conhece da deserção ex officio.

    XIV) O julgamento da deserção é meramente declarativo do facto jurídico processual extintivo da instância, tendo a decisão efeitos constitutivos ex tunc sobre o processo.

    XV) Após a ocorrência da deserção, e antes de ser ela judicialmente reconhecida, os actos espontaneamente praticados pelas partes são potencialmente desprovidos do seu efeito jurídico processual típico. Se o tribunal praticar actos processuais, poderá ficar impedido de, oficiosamente, declarar extinta a instância.

    XVI) O juiz tem o dever de comunicar às partes que o processo aguarda o seu impulso, esclarecendo-as sobre os efeitos da sua conduta.

    XVII) No espírito da lei deve haver um contraditório prévio à decisão – se as partes já tiverem sido alertadas para a consequência da omissão do impulso pelo prazo de deserção, a lei não exige a sua audição após o decurso de tal prazo.

    XVIII) Assim, não se nos suscita outra solução que não seja ser ordenado ao tribunal a quo a notificação das partes para virem aos autos informar porque se encontra os mesmos parados e consequentemente praticarem os actos necessários para suprir a falta de impulso processual, revogando-se a decisão recorrida.

    XIX) Ao decidir nos termos em que fez na douta decisão, o tribunal a quo violou e fez errada interpretação e aplicação do disposto nas normas e princípios legais supra referidos.

    Nestes termos e nos melhores de direito que Vexas. proficientemente suprirão, requer-se a Vexas. que seja concedido provimento ao recurso e por consequência revogada a decisão recorrida. Justiça!».

    * Não houve lugar a resposta.

    * Admitido o recurso, foram observados os vistos legais.

    * II – Objecto do recurso: É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do tribunal ad quem (artigo 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do NCPC), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608º, nº 2, ex vi do artigo 663º, nº 2, do NCPC). Acresce que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido.

    Analisadas as alegações de recurso, a questão que se suscita neste recurso é apurar se para prolatar a decisão de deserção o Tribunal está vinculado a proceder à audição das partes para se pronunciarem.

    * III – Factos com interesse para a decisão da causa (Do histórico do processo): 1 – Em 22/05/2013 a Autora (…) propôs acção contra (…), (…), (…) e (…) em que pede que se declare resolvido um contrato promessa de compra e venda outorgado entre as partes.

    2 – No dia 20 de Janeiro de 2015 faleceu o Réu (…).

    3 – Em 15/04/2015, as partes foram notificadas do despacho que declarou a suspensão da instância devido à aludida morte, sem prejuízo da deserção.

    4 – Em 09/07/2015, a Autora (…) deduziu incidente de habilitação de herdeiros.

    5 – Em 11 de Novembro de 2015, foi proferido despacho de indeferimento liminar relativamente ao incidente de habilitação, o qual faz notar que a improcedência do incidente não obsta a que seja deduzida nova habilitação.

    6 – Em 13/10/2016, foi proferido o seguinte despacho: «Nos presentes autos em que são partes (…) (parte activa) e (…), (…), (…) e (…) (partes passivas) foi a instância declarada suspensa (em Abril de 2015), em virtude do falecimento do primeiro dos identificados Réus.

    A instância considera-se deserta quando, por negligência das partes, o processo estiver a aguardar impulso por mais de seis meses – artigo 281º, nº 1, do Código de Processo Civil.

    Assim, pelo exposto, julgo deserta a instância.

    Custas pela Autora – artigo 527º, nº 1, do Código de Processo Civil.

    Notifique».

    * IV – Fundamentação: No domínio da legislação do pretérito concorriam três modalidades de paralisação dos termos normais da acção, a saber: a suspensão, a interrupção e a deserção. Actualmente a figura da interrupção encontra-se eliminada.

    José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre fazem notar que «no esquema do código revogado, tal como no do C.P.C. de 1939, a deserção da instância pressupunha uma anterior interrupção da instância, quando as partes, máxime o autor, tivessem o ónus de impulso subsequente»[1].

    Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro assinalam que «com a extinção da figura da interrupção da instância, o requisito da negligência das partes em promover o impulso processual transita para a deserção»[2].

    Neste caso a questão submetida à apreciação do Tribunal Superior visa apurar se a decisão de deserção da instância implica uma aferição prévia do julgador relativamente à causa do não impulso processual.

    A recorrente apelou sustentando que a deserção da instância pelo decurso do prazo de seis meses não é automática e que não foi notificada para ser ouvida quanto à falta de impulso processual, o que se impunha face ao disposto nos artigos 281º, nº 4 e 3º, nº 3, do...

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