Acórdão nº 366/05.6PATNV-D.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 07 de Março de 2017
Magistrado Responsável | JOÃO AMARO |
Data da Resolução | 07 de Março de 2017 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam os Juízes, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - RELATÓRIO Nos autos de Processo Comum (Tribunal Coletivo) nº 366/05.6PATNV, do Tribunal Judicial de Torres Novas, em que é arguido C (e outros), foi proferido, em 13-09-2016, despacho judicial que determinou a revogação da suspensão da execução da pena de prisão em que tal arguido foi condenado nos autos.
Deste despacho interpôs o arguido o presente recurso, terminando a respetiva motivação com as seguintes conclusões: 1ª - O arguido não assinou a notificação do acórdão condenatório, sendo a assinatura constante de fls. 435 vº falsa (não foi feita pelo seu punho).
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- Assim, o arguido não foi regularmente notificado do acórdão condenatório, o que configura nulidade insanável (artigo 119º, al. c), do C. P. Penal).
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- O entendimento contrário, perfilhado pelo tribunal a quo, constitui preterição dos direitos e das garantias de defesa do arguido, nomeadamente do direito ao recurso, violando o preceituado no artigo 32º da Constituição da República Portuguesa.
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- A condenação pela prática de um crime, no decurso do período de suspensão da execução da pena de prisão, só implicará a revogação da suspensão se a prática desse crime infirmar definitivamente o juízo de prognose favorável que esteve na base da suspensão.
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- O arguido, durante o período de suspensão da execução da pena de prisão, praticou um crime pelo qual veio a ser condenado, mas, no entanto, esse crime tem natureza diferente daquele que está em causa nos presentes autos.
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- A prática desse novo crime não é suficiente para se extrair, sem mais, a conclusão de que se mostram esgotadas as possibilidades de socialização do arguido.
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- O entendimento contrário viola o disposto no artigo 56º, nº 1, al. b), do Código Penal.
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- O arguido não infringiu, de forma grosseira ou repetida, os deveres que lhe foram impostos, pelo que a pena aplicada deveria ter sido declarada extinta, nos termos do preceituado no artigo 57º, nº 1, do Código Penal.
A Exmª Magistrada do Ministério Público junto da primeira instância respondeu, entendendo que deve negar-se provimento ao recurso, e concluindo a sua resposta nos seguintes termos (em transcrição): “1 - O arguido veio alegar não ter sido notificado do douto acórdão condenatório, pois, para além de ter sido julgado na sua ausência, não foi o autor da assinatura aposta na certidão de notificação, pelo que não teve conhecimento da decisão que o condenou.
2 - Resulta dos autos que o arguido, regularmente notificado da data designada para a audiência de julgamento, não compareceu, tendo sido julgado na sua ausência, ao abrigo do disposto no artigo 333º, nºs 1 e 2, do C.P.P.
3 - Conforme o previsto no nº 5 do mesmo preceito legal, o acórdão foi notificado pessoalmente ao arguido através do o.p.c. competente, que foi à residência do arguido e entregou a cópia do douto acórdão condenatório à pessoa que se identificou como tal e que assinou o mandado, apondo-lhe a sua assinatura.
4 - O arguido teve conhecimento do teor do douto acórdão condenatório e conformou-se com ele, tanto mais que, como bem foi referido no douto despacho em crise, apresentou no dia 14 de Maio de 2010 documento comprovativo do pagamento da quantia de 300€ ao ofendido JMO, que havia sido imposto como condição da suspensão da execução das penas de prisão aplicadas, e no dia 15 de Outubro de 2015, na sequência de notificação para exercer o contraditório em relação a promoção, declarou nos autos concordar com a promoção de extinção da pena que lhe foi aplicada com fundamento na circunstância de a omissão de entrega à APAV da quantia de € 200,00 (dever igualmente imposto como condição da prorrogação do período da suspensão) não lhe ser imputável e de não ter cometido qualquer outro crime, no decurso do prazo da suspensão.
5 - É de facto estranho, tal como foi mencionado no douto despacho em crise, que só agora venha suscitar a questão da falsidade da assinatura, precisamente no momento em que se coloca a questão da eventual revogação da suspensão da pena de prisão em que foi condenado.
6 - Resulta dos autos que o arguido foi notificado pessoalmente do douto acórdão, pelo que nenhum reparo nos merece o douto despacho que indeferiu o por ele requerido.
7 - Por outro lado, o arguido foi condenado nos presentes autos por acórdão proferido a 31/10/2008, transitado em julgado no dia 18/12/2009, na pena de 3 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, na condição de pagar ao ofendido a quantia de € 300.
8 - Apesar de ter comprovado a entrega da quantia monetária ao ofendido, o arguido veio a cometer no período de suspensão da execução da pena outros crimes pelos quais veio a ser condenado, o que levou a que, analisada a situação, fosse prorrogado o período de suspensão da execução da pena, mediante a obrigação de entregar, no prazo de um ano, a quantia de 200€ à APAV, cfr. fls. 579 a 583.
9 - O arguido não cumpriu a condição.
10 - Requisitado o CRC atualizado do arguido, constatou-se que o mesmo fora condenado no processo nº ---/14.5JELSB, por factos cometidos no dia 26/03/2014, ou seja, no período de suspensão, na pena de cinco anos de prisão pela prática do crime de tráfico de estupefacientes, pena que está a cumprir.
11 - Nos termos do artº 56º, nº 1, al. b), do C. Penal, “a suspensão da execução da pena de prisão é revogada sempre que, no seu decurso, o condenado (…) cometer crime pelo qual venha a ser condenado, e revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas”.
12 - Não sendo legalmente admissível a revogação automática da suspensão, para que se revogue a suspensão da execução da pena de prisão é necessário não apenas que o arguido cometa um novo crime, e seja por isso condenado, mas também que tal comportamento revele que as finalidades de prevenção geral e especial que permitiram a suspensão da execução não puderam, em consequência disso, ser atingidas.
13 - O facto do cometimento do novo crime levar à aplicação de uma pena privativa da liberdade, como foi o caso, revela que se considerou que não havia possibilidade de se efetuar um juízo de prognose favorável.
14 - Note-se que já havia sido concedido ao arguido o benefício da dúvida num primeiro momento, quando se constatou que havia cometido outros crimes no período de suspensão e se decidiu mesmo assim prorrogar o período da suspensão, vindo o arguido a cometer novo crime, agora no período da prorrogação, pelo qual veio a ser condenado em pena de prisão efetiva.
15 - Daqui resulta que o arguido, após ter tido conhecimento da sua condenação em pena de prisão suspensa na sua execução, e após lhe ter sido dada nova oportunidade apesar de ter cometido novos crimes, continuou, mesmo assim, a praticar ilícitos penais, não adaptando o seu comportamento ao direito.
16 - Tendo o comportamento posterior do arguido demonstrado que não conseguiu pautar o mesmo de acordo com os ditames orientadores da vida em sociedade, sendo que a simples censura do facto e a ameaça da pena não foram suficientes para o afastar da prática de ilícitos penais, não se encontram satisfeitas as exigências de prevenção, pelo que nenhum reparo nos merece o douto despacho que decidiu pela revogação da suspensão da execução da pena.
17 - Em suma, o douto despacho recorrido fez serena, rigorosa e competente análise do caso, pelo que nenhum reparo nos merece”.
Neste Tribunal da Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer (a fls. 78 dos autos), aderindo, no essencial, aos fundamentos enunciados na decisão recorrida e aos argumentos aduzidos pela Exmª Magistrada do Ministério Público na resposta ao recurso, e concluindo, assim, que o recurso não merece provimento.
Cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2, do C. P. Penal, não foi apresentada qualquer resposta.
Efetuado o exame preliminar, e colhidos os vistos legais, foi o processo à conferência, cumprindo agora apreciar e decidir.
II - FUNDAMENTAÇÃO 1 - Delimitação do objeto do recurso.
No presente caso, duas questões são evidenciadas no recurso, segundo o âmbito das correspondentes conclusões, que delimitam o objeto do recurso e definem os poderes cognitivos deste tribunal ad quem, nos termos do disposto no artigo 412º, nº 1, do C. P. Penal: 1ª - Nulidade insanável, por falta de notificação ao arguido do acórdão condenatório.
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- Manutenção (ou não) da revogação da suspensão da execução da pena de prisão em que o recorrente foi condenado nos autos.
2 - A decisão recorrida.
O despacho revidendo é do seguinte teor: “Requerimento de fls. 697 a 699: Veio o arguido C, invocando a falsidade da certidão de fls. 435 verso, requerer a realização de perícia à escrita dela constante, para se aferir da autoria da assinatura ali aposta.
Tal como resulta da ata de audiência de discussão e julgamento constante de fls. 368 a 371, realizada em 30 de Setembro de 2008, o Tribunal Coletivo deu início à audiência de discussão e julgamento, na ausência de todos os arguidos, incluindo o arguido C, ao abrigo do preceituado nos arts. 331º e 333º nºs 2 e 3 do CPP, sem que o seu Ilustre Defensor, que o representou no decurso da audiência, conforme previsto no art. 334º nº 4 do mesmo diploma, tenha requerido a comparência do mesmo.
O acórdão foi lido em 31 de Outubro de 2008, conforme ata de fls. 426, igualmente, na ausência do arguido, mas estando presente o seu Ilustre Defensor.
Daí que a notificação de tal decisão deveria ter sido feita de acordo com as regras contidas no art. 333º nº 5.
De fls. 435 e verso consta uma certidão de notificação ao arguido C, em 18 de Novembro de 2008, a mesma que agora, no requerimento de fls. 697 e seguintes, entrado em Juízo quase oito anos depois, vem dizer que é falsa, porque não foi assinada por ele.
Refira-se que a falsidade a existir, como alegado pelo requerente, teria como consequência a repetição do ato da notificação e a manutenção da validade e eficácia de todos os demais...
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