Acórdão nº 68/11.4GDFTR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 07 de Março de 2017

Data07 Março 2017

Acordam os Juízes, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - RELATÓRIO Nos autos de Processo Comum (Tribunal Singular) nº 68/11.4GDFTR, do Tribunal Judicial de Fronteira, em que é arguido NS, foi proferido, em 23-09-2016, despacho judicial que decidiu a revogação da pena substitutiva de trabalho a favor da comunidade, determinando-se que o arguido cumpra a pena de prisão de 12 meses e 15 dias.

Deste despacho interpôs o arguido o presente recurso, terminando a respetiva motivação com as seguintes (transcritas) conclusões: “1. A decisão de revogação da pena de trabalho a favor da comunidade e a consequente condenação a cumprir prisão efetiva viola o princípio da proporcionalidade e adequação.

  1. Face à intensidade da violação de deveres verificada, a ponderação da proporcionalidade daquela revogação não pode conduzir, sem mais, à consideração de existência de uma violação grosseira do dever de prestar trabalho.

  2. O Tribunal a quo não valorou a justificação dada pelo Recorrente para tal incumprimento, nem a sua situação atual, bem como não fundamentou o motivo do indeferimento do requerimento do arguido para substituição da pena de prisão pela multa.

  3. Na verdade, o Recorrente não agiu com intuito de não cumprir, simplesmente não o conseguiu fazer por ter estado a trabalhar fora do país.

  4. Admitindo-se que houve um incumprimento, este nunca se poderá considerar um incumprimento grosseiro dos deveres da pena.

  5. O cumprimento da pena de prisão efetiva provocará danos irreversíveis no futuro do arguido, seja a nível social, familiar, e, acima de tudo, a nível do desenvolvimento profissional.

  6. O Despacho de que se recorre viola as disposições constantes dos artigos 58º e 59º do Código Penal, ao revogar a pena substitutiva de trabalho a favor da comunidade, e, em consequência, o cumprimento pelo Recorrente da pena de 12 (doze) meses e 15 (quinze) dias de prisão.

    Termos em que, e nos mais de direito que V. Exas. muito doutamente suprirão, face ao exposto, deve conceder-se provimento ao presente recurso, revogando-se o Despacho que revogou a pena substitutiva de trabalho a favor da comunidade, e, em consequência, o cumprimento pelo Recorrente da pena de 12 (doze) meses e 15 (quinze) dias de prisão, substituindo-se por outro que permita a continuidade do trabalho a favor da comunidade ou substituição da pena de prisão por multa, assim fazendo V. Exas. a devida e esperada Justiça”.

    A Exmª Magistrada do Ministério Público junto da primeira instância respondeu, concluindo tal resposta nos seguintes termos (em transcrição): “1. O arguido, aqui recorrente, foi condenado, por sentença proferida a 6 de Junho de 2012, na pena única de 16 meses de prisão, substituída por 480 horas de prestação de trabalho a favor da comunidade.

  7. A prestação de trabalho iniciou-se na Câmara Municipal de Alter-do-Chão, após 4 de Dezembro de 2012, conforme relatório da DGRSP de fls. 310 dos autos; 3. Até 8 de Julho de 2014, o arguido havia prestado 30 horas de trabalho a favor da comunidade, tendo a entidade beneficiária do trabalho passado a ser, após 15 de Setembro de 2014, a Escola Profissional de Desenvolvimento Rural de Alter-do-Chão; 4. Em 19 de Outubro de 2015 a DGRSP informou aos autos que o arguido iria trabalhar para o Reino Unido e que tal implicaria a cessação (ainda que temporária) da prestação de trabalho a favor da comunidade; 5. Dos relatórios da DGRSP é possível perceber que durante a execução do trabalho a favor da comunidade nas entidades beneficiárias, o arguido apresentou problemas de assiduidade e “não apresenta razões/justificações reais e fundamentadas que legitimem o seu comportamento” e tem “uma certa dificuldade em cumprir a assiduidade estabelecida, não comparecendo, nem justificando a sua ausência”; 6. O arguido foi ouvido em Tribunal a 22 de Fevereiro de 2016, altura em que já estava em Portugal e foi alertado para o hiato temporal que já havia decorrido entre a condenação e as poucas horas de trabalho prestadas, tendo-se comprometido a prestar o trabalho a favor da comunidade restante.

  8. No entanto, a 6 de Junho de 2016 a DGRSP voltou a enviar relatório aos autos onde dava conta de que o arguido voltou a incumprir o dever de assiduidade e que manifestou comportamento de má educação para com membros da entidade beneficiária; 8. Inquirido novamente em Tribunal, a 7 de Julho de 2016, o arguido afirmou que a entidade beneficiária não o ajudava na execução da pena de trabalho a favor da comunidade e culpou-a pelo seu incumprimento; 9. Das 480 horas de trabalho a favor da comunidade, que podiam ser prestadas em pouco mais de 60 dias, o arguido apenas prestou 104 horas de trabalho a favor da comunidade, ou seja, menos de um quarto do previsto; 10. Não obstante ter-se comprometido a executar o trabalho, o arguido, ante nova oportunidade, ao invés de a cumprir, não só registou elevado número de faltas como ainda conseguiu inimizar-se com membros da entidade beneficiária, adotando, segundo o relatório de 369 verso dos autos, “episódios de má educação por parte do condenado, assim como o incumprimento das ordens dadas pelo encarregado, sendo o mesmo inconveniente com os colegas”.

  9. Resulta à saciedade que a justificação de que os membros da entidade beneficiária não o ajudam a executar a pena em que foi condenado, não se pode considerar como recusa justificada em prestar o trabalho e que a ausência do arguido no estrangeiro não foi em tempo suficiente que possa ser também entendida como justificadora do não cumprimento da pena de trabalho a favor da comunidade.

  10. Mais, a ausência de postura crítica da sua atuação não pode deixar de ser valorada pelo Tribunal na determinação da revogação da pena substitutiva, porquanto demostra não só o incumprimento grosseiro dos deveres decorrentes da pena, como a total ausência de capacidade crítica da sua conduta.

  11. Em suma, entendemos que o despacho recorrido não viola nem o princípio da proporcionalidade nem o da adequação, quando entende revogar a conversão da pena substitutiva de trabalho a favor da comunidade e determinar o cumprimento da pena de prisão, por ter existido uma infração grosseira dos deveres decorrentes da pena a que o arguido foi condenado, conforme estatuído no artigo 59º, nº 2, alínea b), do Código Penal.

    Termos em que, negando provimento ao recurso e mantendo o douto despacho recorrido, V.ªs Ex.ªs farão Justiça”.

    Neste Tribunal da Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto, aderindo, no essencial, aos fundamentos da resposta apresentada pelo Ministério Público na primeira instância, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

    Cumprido o preceituado no artigo 417º, nº 2, do C. P. Penal, o arguido apresentou resposta, na qual diz manter o já exposto na motivação do recurso.

    Efetuado o exame preliminar, e colhidos os vistos legais, foi o processo à conferência, cumprindo agora apreciar e decidir.

    II - FUNDAMENTAÇÃO 1 - Delimitação do objeto do recurso.

    No presente caso a única questão evidenciada no...

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