Acórdão nº 33/15.2GBBNV.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 21 de Março de 2017
Magistrado Responsável | MARIA LEONOR ESTEVES |
Data da Resolução | 21 de Março de 2017 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: 1. Relatório Na secção criminal da instância local de Benavente, da comarca de Santarém, em processo comum com intervenção do tribunal singular, foi submetido a julgamento o arguido A., devidamente identificado nos autos, tendo no final sido proferida sentença, na qual se decidiu condená-lo, pela prática de um crime de exploração ilícita de jogo de fortuna ou azar, p. e p. pelo art. 108° n°s 1 e 2 do DL n.° 422/89 de 21/12, na redacção introduzida pelo DL nº 10/95, de 19.01, na pena de 6 meses de prisão, substituída por 180 dias de multa, e na de 180 dias de multa, e, em cúmulo jurídico, na pena única de 360 dias de multa à taxa diária de 7€, perfazendo o montante global de 2.520 €.
Inconformado com a sentença, dela interpôs recurso o arguido, pugnando pela sua revogação e substituição por decisão que o absolva ou, assim se não entendendo, que reduza substancialmente as penas aplicadas, para o que apresentou as seguintes conclusões: l - A decisão de facto do ponto l, quanto á questão jurídica da propriedade e exploração do estabelecimento assenta, em sede de fundamentação, unicamente, no depoimento dos agentes apreensores. Estes, por um lado, não podem percepcionar a “propriedade” ou “exploração” de estabelecimento. Isso, só pode emergir de prova documental. Assim como não é válida a reprodução, por estes, em audiência “de declarações do Arguido, através das quais terá sido, por tais agentes, percepcionada a assunção, pelo primeiro, da “responsabilidade” pelo estabelecimento - art°. 356º, nº 7, do CPP; 2 - Há um salto lógico entre a fundamentação e a decisão de facto. Na primeira diz-se que, perante os agentes apreensores, o Arguido “assumiu-se como responsável pelo estabelecimento” para, sem mais, se passar para decisão de que este é “dono” e “legítimo explorador” de tal estabelecimento; 3 - Os pontos 2 a 4 da matéria assente encontram fundamento probatório no relatório de exame pericial de Fls. 40-47. Contudo, em tal relatório, o Perito reconhece que, por falta de “um conjunto de códigos de activação/validação”, “não foi possível visualizar em pleno funcionamento os referidos jogos. Ou seja, o perito não viu os jogos que descreve, e que a sentença acolhe entre a matéria provada; 4 - Neste caso, não foram respeitadas as regras sobre o valor da prova vinculada, na medida em que se qualifica como prova pericial meras opiniões do Perito e conhecimentos empíricos, retirados de outras situações “devidamente referenciadas”, dando-se por provados factos desconformes à prova produzida, nomeadamente, o funcionamento dos jogos referidos no ponto 4. Funcionamento este que o Perito não constatou directamente através da máquina apreendida por “carência de códigos de activação/validação”; 5-O tribunal a quo nos pontos l a 4 deu como provados factos desconformes com a prova produzida, o que resulta do próprio texto da decisão recorrida, pelo que incorreu em erro notório na apreciação da prova- art°. 410°, n° 2, alínea c), do CPP; 6 - Está assente que a máquina estava no estabelecimento no dia 21/2/2015 e, nessa data não foi vista a jogar. Não consta em que data aí foi colocada. Do relatório de Fls. 40-47 consta que os jogos ilícitos terão sido jogados no primeiro trimestre de 2014 (um ano antes da apreensão). A falta de qualquer facto relativo á data de colocação da máquina no estabelecimento, não deveria permitir ao juiz a quo, a formulação de qualquer juízo de culpabilidade quanto á prática do crime pelo Arguido. Não se pode saber se, em 2014, esta máquina já estava neste estabelecimento, sob a disponibilidade do Arguido, e não noutro local, à guarda de outra pessoa. A falta deste facto (data da colocação) bem como o princípio da presunção de inocência tornam os factos assentes insuficientes para a condenação.
O recurso foi admitido.
Na resposta, o MºPº defendeu a manutenção integral da sentença recorrida e a consequente improcedência do recurso, concluindo que: 1.
A sentença recorrida não padece dos vícios de erro notório na apreciação da prova ou insuficiência para a decisão da matéria de facto dada como provada, previsto no artigo 410º, nº 2, alíneas c) e a), do Código de Processo Penal 2.
Não foi violado qualquer imperativo legal.
Nesta Relação, a Exmª Procuradora-geral Adjunta emitiu parecer no qual, e à semelhança do sustentado pelo MºPº na 1ª instância, considerou não enfermar a sentença recorrida de qualquer dos vícios invocados pelo recorrente ou de qualquer outro gerador de nulidade, pelo que também se pronunciou no sentido da improcedência do recurso.
Foi cumprido o disposto no art. 417º nº 2 do C.P.P., sem que tenha sido apresentada resposta.
Colhidos os vistos, foi o processo submetido à conferência.
Cumpre decidir.
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Fundamentação Na sentença recorrida foram considerados como provados os seguintes factos: 1.
O arguido A. é dono e legítimo explorador do estabelecimento comercial denominado “A ..” e sito na Estrada Nacional n.º 114-3, …, em Várzea Fresca.
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No dia 21 de Fevereiro de 2015, pelas 2h30, o arguido tinha no interior do estabelecimento comercial acima referido e exposta para ser utilizada pelos clientes que ali se deslocassem, como efectivamente acontecia, uma máquina que desenvolve jogos de fortuna ou azar, cujas características e funcionamento se encontram melhor descritos no relatório pericial de fls. 40-47 e que aqui se dá por integralmente reproduzido.
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Tal máquina é constituída por um móvel de estrutura em madeira e metal, de cor preta, possuindo na sua parte frontal superior um monitor, abaixo do qual se situa uma prateleira que suporta um teclado de computador e um rato; na parte intermédia da máquina encontram-se instalados os mecanismos de introdução de notas e moedas, bem como o cofre respectivo; no interior da máquina, acedido por uma porta traseira, encontram-se os vários componentes de um vulgar computador, incluindo um disco rígido, da marca Toshiba, que serve como seu suporte.
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A referida máquina desenvolvia jogos de fortuna ou azar, tipo slot machines (designados “Bang-Bang”, “Halloween”, “Pantanal”, “Trevo da Sorte” e “Frutinha), tipo poker (Extra-Poker 2) e tipo bingo (“denominado Nitroball”).
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O arguido não tinha licença para explorar no estabelecimento em causa temas de jogos de fortuna ou azar.
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O arguido sabia que a máquina acima referida era uma máquina que desenvolvia temas de jogos de fortuna ou azar e sabia que não tinha licença para explorar tais jogos, assim como sabia que tais jogos apenas podiam ser explorados nos locais legalmente autorizados para o efeito.
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Ainda assim, agiu do modo descrito, o que quis e conseguiu, visando obter proventos económicos em resultado da sua utilização pelos clientes do seu estabelecimento, assim se apropriando das quantias apostadas por estes.
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O arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida pela lei penal, e tinha a liberdade necessária para se determinar de acordo com essa avaliação.
Da situação económico-social do arguido 9.
O arguido reside com a mulher e dois filhos de 18 e 23 anos de idade.
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A casa onde residem arrendada, suportando uma renda mensal no montante de € 350,00 (trezentos e cinquenta euros).
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O arguido no exercício da sua actividade aufere quantia equivalente ao Salário Mínimo Nacional.
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A mulher do arguido trabalha auferindo retribuição equivalente ao Salário Mínimo Nacional.
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O arguido suporta uma prestação bancária mensal no montante de € 500,00 (quinhentos euros) com crédito para aquisição de viatura automóvel, e cerca de € 150,00 (cento e cinquenta euros) mensais em prestações associadas a créditos pessoal – cartão de crédito.
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O arguido tem como habilitações literárias o 9.º ano de escolaridade.
Dos antecedentes criminais 15.
Por sentença datada de 26/10/2011, transitada em julgado em 12/03/2012, proferida no âmbito do processo comum singular n.º --/09.6 EASTR, do 1.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Benavente, foi o arguido condenado, pela prática em 10/03/2009, de um crime de exploração ilícita de jogo, previsto e punido pelo Decreto-Lei n.º 422/89 de 2/12, na pena de 3 meses de prisão, substituída por 160 dias de multa à taxa diária de € 7,00, a qual se encontra extinta.
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Por sentença datada de 15/01/2016, transitada em julgado em 11/04/2016, proferida no âmbito do processo sumaríssimo n.º --/14.5 EAEVR da Comarca de Santarém – Benavente – Instância Local – Secção Criminal – J1, foi o arguido condenado, pela prática em 21/02/2014, de um crime de exploração ilícita de jogo, previsto e punido pelo Decreto-Lei n.º 422/89 de 2/12, na pena de 5 meses de prisão, substituída por 150 dias de multa à taxa diária de € 5,00, e na pena de 70 dias de multa à taxa diária de € 5,00.
Consignou-se inexistirem quaisquer factos não provados com interesse para a decisão da causa.
A motivação da decisão de facto foi explicada nos seguintes termos: O Tribunal fundou a sua convicção, concreta e globalmente, a partir da prova produzida em audiência de julgamento, depois de criticamente analisada, à luz das regras de experiência comum e da verosimilhança, incluindo-se o depoimento da testemunha inquirida e os documentos juntos aos autos, designadamente, o relatório pericial, e, o certificado de registo criminal.
Assim vejamos.
O arguido não prestou declarações quanto aos factos, apenas o fazendo quanto à sua situação económica e pessoal.
A testemunha MF, disse ser militar da GNR e quanto aos factos referiu que no dia em questão se deslocou em fiscalização ao estabelecimento “Café A..” na Várzea Fresca, por denúncia anónima que referia a existência de uma máquina de jogo ilegal no estabelecimento. Mencionou a testemunha que a máquina se encontrava no do lado direito no fundo do salão de jogos ali existente, não se recordando a testemunha se a máquina se encontrava a ser utilizada naquela altura. Aludiu ainda ao facto de já se ter deslocado por diversas vezes ao...
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