Acórdão nº 373/14.8T9STR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 21 de Março de 2017

Data21 Março 2017

Proc. 373/14.8T9STR.E1 Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a 1.ª Subsecção Criminal do tribunal da Relação de Évora: 1. No Tribunal da Comarca de Santarém (Santarém, Instância Local, Secção Criminal, J2) correu termos o Proc. Comum Singular n.º 373/14.8T9STR, no qual foi julgada a arguida BB (…), pela prática: - de um crime de injúria, na pessoa do assistente CC - porque a ele se dirigiu diretamente - p. e p. no art.º180 do Código Penal, com a agravação prevista no art.º 183 n.º 1 al.ª a) do Código Penal; - e de um crime de difamação agravada p. e p. pelos art.ºs 181 e 183 n.º 1 al.ª a) do Código Penal, cuja vítima foi o assistente CC.

O Ministério Público não acompanhou a acusação particular deduzida pelo assistente (cfr. fls. 140).

CC, na qualidade de demandante, deduziu pedido de indemnização cível contra a demandada BB, pedindo que esta seja condenada a paga-lhe a quantia de € 2.500,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais emergentes da sua conduta ilícita.

A final veio a decidir-se: 1) Absolver a arguida BB do crime de injúria agravada de que vinha acusada; 2) Condenar a arguida BB, como autora material de um crime de difamação, p. e p. pelos art.ºs 180 n.º 1 e 183 n.º 1 al.ª a) do Código Penal, na pena de 130 (cento e trinta) dias de multa, à taxa diária de € 6,00, o que perfaz a pena de € 780,00 de multa; 3) Julgar procedente o pedido de indemnização cível e, assim, condenar a demandada BB a pagar ao demandante CC a quantia de € 600,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais.

--- 2. Recorreu a arguida dessa sentença, concluindo a motivação do recurso com as seguintes conclusões: 1 - O tribunal a quo deveria ter dado como provado que à época da ocorrência dos factos a arguida mantinha um litígio laboral com o ofendido, por falta de pagamento de ordenados, que culminou num processo no Tribunal de Trabalho da Comarca de Évora, onde foi efetuada uma transação, onde o assistente aceitou pagar à arguida, a título de compensação pela cessação do contrato de trabalho, a quantia de €654,54.

2 - Tal facto resulta da análise da ata de julgamento junta com a contestação apresentada pela arguida, e referida expressamente na douta sentença de que se recorre, e dos testemunhos de (…).

3 - Resulta claro que à data da publicação em questão subsistia um conflito laboral, que só veio a ser resolvido em finais de 2015, facto que foi menosprezado e ignorado pelo tribunal a quo e que era fundamental para a determinação da ilicitude da conduta da arguida.

4 - O tribunal a quo, na douta sentença, a fol.ªs 9, linhas 17 e seguintes, faz uma leve referência a esse conflito, mas nenhuma ilação ou consequência jurídica retira do mesmo, nomeadamente, de que as expressões proferidas pela arguida não são falsas, pois o assistente devia-lhe dinheiro à época.

5 - A arguida não ofendeu ou pretendeu ofender o arguido na sua honra e consideração, pois não agiu com dolo e, mesmo que o suposto crime tivesse sido praticado a título de negligência, o que não se aceita, tal crime não é punível a esse título.

6 - Nenhuma testemunha ouvida foi capaz de falar de factos que revelassem ter havido intenção de atingir a honra do ofendido.

7 - Mas caso se considere que se encontra preenchido o tipo legal do crime de difamação, p. e p. no artigo 180 do C. Penal, a conduta da arguida não será punível, pois a mesma preenche os pressupostos de exclusão da ilicitude previstos no n.º 2 do referido artigo.

8 - Tais requisitos são cumulativos e a conduta da arguida preenche os mesmos, porquanto, no caso em concreto, estamos perante um interesse de legítimo da arguida, o interesse em receber os valores que o arguido lhe devia, e também está provada a verdade da imputação feita pela arguida, pois o assistente devia dinheiro a esta.

9 - Acresce ainda que quando se diz, na alínea b) do n.º 2 do C. Penal, que tem de se provar a verdade, a doutrina ensina-nos que a mesma não é uma verdade absoluta, exata e científica, poderá mesmo ter pequenos exageros e imprecisões, que resultam do calor do momento.

10 - Assim. é forçoso, concluir que se encontram preenchidos os requisitos para aplicação ao caso sub judice da cláusula de exclusão da ilicitude prevista no n.º 2 do artigo 180 do C. Penal.

11 - A decisão em causa também viola o princípio do in dubio pro reo, pois, com a prova produzida em sede de audiência de julgamento, de que o assistente era devedor da arguida, era claro que pelo menos uma dúvida insanável no espírito do tribunal a quo, acerca da veracidade e legitimidade das imputações feitas pela arguida ao assistente, tinha de se levantar.

12 - Na douta sentença, que agora se recorre, a fol.ªs 9, ao afirmar-se: “Como neste caso em concreto, dúvidas não revelaram que o texto foi escrito e inserido pela arguida. Esta não provou o contrário nem existem nos autos elementos de prova que contrariem a versão das testemunhas de acusação”, o tribunal a quo inverteu o ónus da prova, pois em processo penal cabe a quem acusa, neste caso, ao assistente, provar que foi praticado um crime e que a arguida foi a sua autora e não o inverso.

13 - E mesmo que se considerasse, o que não se aceita e apenas por mera hipótese académica se põe, que cabia fazer alguma prova à arguida, esta era somente quanto ao preenchimento das condições definidas no n.º 2 do artigo 180 do C. Penal, para se verificar a exclusão da ilicitude, mas mesmo nesse caso prevalecerá sempre o princípio do in dubio pro reo.

14 - Assim, deve a douta sentença recorrida ser alterada, devendo a arguida ser absolvida do crime, bem como do pedido de indemnização civil em que foi condenada.

15 - Pelo exposto, deve conceder-se provimento ao presente recurso, devendo a douta sentença recorrida ser alterada, absolvendo-se a arguida da prática do crime de que foi acusada e do pagamento do pedido de indemnização civil em que foi condenada.

--- 3. Respondeu o Ministério Público junto da 1.ª instância, retirando-se da sua resposta as seguintes conclusões: 1 - Desde logo, contrariamente ao defendido pela recorrente, o princípio in dubio por reo, enquanto corolário do princípio constitucional da presunção de inocência do arguido (artigo 32 n.º 1 da Constituição da República), não se aplica às...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT