Acórdão nº 167/15.3T8ADV.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 23 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelMÁRIO BRANCO COELHO
Data da Resolução23 de Fevereiro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes da 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: No Julgado de Paz de Castro Verde foi proferida sentença declarando que os AA. (…), (…), (…) e (…), são titulares de um direito ilíquido e indiviso sobre o prédio descrito sob o n.º (…) na Conservatória do Registo Predial de Ourique, nos precisos termos em que o registo o define, mas absolvendo os RR. (…), (…) e (…) do pedido de restituição do aludido prédio.

Inconformados, os AA. interpuseram recurso dessa decisão, mas na Instância Local de Ourique foi-lhes negado provimento.

De novo recorrem e apresentam as seguintes conclusões: 1. O Tribunal recorrido omitiu a pronúncia sob uma questão de direito levantada pelos recorrentes.

  1. Os recorridos colocaram expressamente a questão à apreciação do Tribunal a quo – subsunção dos factos num contrato de uso de habitação 3. O dever de cognoscibilidade impunha que aquele apresentasse um juízo apreciativo de tal questão.

  2. Porém, a este respeito nada refere, limitando-se a decidir sob as alterações à matéria de facto pugnadas, bem como pela questão de saber da validade do termo resolutivo do contrato (de comodato no entendimento do Tribunal recorrido) celebrado.

  3. Praticou assim uma nulidade, por omissão de pronúncia.

  4. Por outro lado, andou mal ao dar como provado (ponto 6, parte final) “podendo os demandados lá permanecer enquanto fossem vivos.” 7. Tal excerto foi introduzido ex officio pelo Tribunal, sem que alguma vez haja sido alegado pela parte em tempo e, no modo devido.

  5. Numa acção de reivindicação como a dos presentes autos, tal facto, em tese, constitui justo titulo que obsta a restituição do bem reivindicado (e a prova disso, foi justamente com base nesse facto que foi julgada improcedente o pedido da restituição).

  6. O justo título que obsta à restituição da coisa reivindicada consubstancia um facto impeditivo, excepção peremptória portanto, cuja alegação e prova compete a quem nisso tenha interesse – cfr. art.º 342º, nº 2, do C.Civil.

  7. Ao Tribunal está vedado substituir-se às partes na articulação de factos essenciais ou às excepções invocadas.

  8. Ao fazê-lo, o Tribunal violou o art.º 5º do C.P.C.

  9. Face ao exposto, deverá ser removido o referido excerto do ponto 6 da matéria de facto provada. Por outro lado, 13. O Tribunal a quo errou ao não seleccionar o art.º 1484º do C. Civil para qualificar a relação contratual estabelecida entre as partes.

  10. A cedência do uso do imóvel reivindicado para toda a vida dos recorridos, caracteriza-se como direito de uso e habitação.

  11. Porém, não foi respeitada a forma legal imposta pelo artº 80º, nº 1, do Código do Notariado, na redacção anterior ao Decreto-lei nº 116/2008, de 4 de Julho, aplicável, atenta a data de celebração, que exigia a escritura pública; 16. A inobservância da forma legal implica a nulidade do contrato – art. 220º C. Civil 17. Perante a nulidade do contrato, inexiste causa legítima que obste ao pedido de reivindicação do imóvel, pelo que, a acção terá de ser declarada totalmente procedente.

  12. Caso assim se não entenda e, se subsumam os factos num contrato de comodato, duas hipóteses se levantam.

  13. Uma primeira, caso seja dada procedência ao recurso da matéria de facto.

  14. Cenário em que, fica somente provado que, pela cedência de utilização do imóvel reivindicado não acordaram qualquer prazo, 21. A este respeito, estatui o art. 1137º, nº 2, do C. Civil que “Se não foi convencionado prazo para a restituição … o comodatário é obrigado a restituí-la logo que lhe seja exigida”.

  15. Donde se conclui que deve ser ordenada a restituição do bem imóvel reivindicado.

  16. E, mesmo no segundo cenário, ou seja, caso permaneça inalterada a matéria de facto provada, tal circunstância não obsta que se alcance o mesmo desfecho.

  17. É que o contrato de comodato finda: 1- se foi estipulado prazo, será decorrido este; 2- se foi estipulado que a coisa cedida seria para uso determinado, deverá ser restituída assim que o uso finde e, 3- não tendo sido estipulado prazo certo, ou não foi determinado uso, cessa assim que reivindicada.

  18. Tendo em conta que o marido e pais respectivamente dos recorrentes emprestou o imóvel reivindicado a favor dos recorridos, ter-se-á constituído para os mesmos um direito vitalício, ou seja, só após a morte do último dos recorridos, haveria a obrigação de restituir.

  19. Ora, não tendo estipulado prazo certo, o uso cessa assim que a coisa for reivindicada.

  20. Por outro lado, tal estatuição (utilização vitalícia) é incompatível com a natureza do comodato.

  21. O Tribunal a quo violou assim o art. 1137º, nº 2, do C. Civil, que admite a restituição ad nutum “se não foi convencionado prazo para a restituição”, 29. Daqui decorre que somente obsta à restituição quando houver estipulação de prazo certo.

  22. Assim, e em suma, quando não convencionado prazo para a restituição nem determinado o uso da coisa, o comodante pode exigir a restituição da coisa ad nutum.

    Contra-alegam os RR. e concluem: A - Deverá manter-se incólume a decisão proferida pelo Tribunal a quo, pois a mesma não padece de qualquer juízo de censurabilidade; B - Desde logo se afirma que a sentença ora em crise não padece de qualquer vício de nulidade, por omissão de pronúncia, na...

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