Acórdão nº 3542/14.7T8STB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 21 de Dezembro de 2017
Magistrado Responsável | ALBERTINA PEDROSO |
Data da Resolução | 21 de Dezembro de 2017 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal[1] Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora[2]: I – RELATÓRIO 1.
M… instaurou em 24-11-2014 a presente acção sob a forma de processo comum, contra I..., Ld.ª, peticionando que:
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Seja executado o contrato-promessa celebrado com a ré; b) Seja a Ré condenada a entregar o imóvel prometido tal como descrito no dito contrato promessa. Subsidiariamente; c) Seja a Ré condenada no pagamento total do dano causado ao Autor, tendo em conta o dobro do sinal dado, bem como todos os montantes pagos em acréscimo ao sinal.
Em fundamento da sua pretensão, alegou, em síntese, que celebrou com a R. um contrato-promessa de compra e venda de uma moradia que à data se encontrava em construção, tendo entregue àquela o montante devido a título de sinal e princípio de pagamento; porém, tendo decorrido o prazo de oito meses para marcação da escritura pública, a Ré nunca a marcou, apesar de interpelada para o efeito.
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Regularmente citada, a ré contestou, negando ter celebrado quer o “aditamento ao contrato promessa” que fundamenta o pedido, cuja genuinidade impugnou, quer algum contrato-promessa; que o R. não lhe entregou quaisquer quantias a título de sinal, e tão pouco a interpelou para a celebração da escritura definitiva; que não consegue precisar se a assinatura da primeira contraente no documento é ou não do seu legal representante «mas duvida seriamente que possa ser»; a existir, «terá esse documento sido assinado em branco, com qualquer outro propósito que não o estabelecido no documento junto aos autos.
Assim, «não pode a ré deixar de impugnar a genuinidade do documento nos termos do artigo 444.º do Código de Processo Civil, bem como a sua força probatória nos termos do artigo 446.º do mesmo código».
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Por despacho proferido em 31-03-2016 decidiu-se desatender «à impugnação de documentos na perspectiva do incidente equacionado», por falta de pagamento da respectiva taxa de justiça.
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Na audiência prévia ponderou-se a possibilidade do conhecimento do mérito em saneador/sentença, o que posteriormente a julgadora entendeu não se mostrar possível, tendo elaborado despacho saneador e seleccionado os seguintes temas de prova: «se, em que circunstâncias e com que propósito a R. assinou o documento junto a fls. 16 a 18; se o Autor entrou à Ré[3] as quantias aludidas na p.i.; das putativas interpelações do A. para a R. cumprir o negócio.
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Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi seguidamente proferida sentença onde se julgou a acção totalmente improcedente, por não provada, com a consequente absolvição da Ré do pedido.
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Inconformado, o Autor apresentou recurso de apelação, finalizando a respectiva minuta com prolixas conclusões[4] das quais se respiga que pretende seja considerado provado que «o autor cumpriu com o montante referente ao sinal e princípio de pagamento de €99.000 e, consequentemente, se condene a Recorrida nos precisos termos do peticionado, sendo que, em caso de execução específica do contrato promessa, com prévia notificação do Recorrente para depósito do remanescente do preço».
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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Por despacho proferido pela ora Relatora em 11.10.2017, considerando os pedidos - principal e subsidiário - formulados nestes autos, e para que este tribunal da relação possa aquilatar da (im)possibilidade da execução específica do contrato e suas consequências, foi determinada a junção aos autos de certidão actualizada da Conservatória do Registo Predial para verificarmos designadamente os ónus e encargos que impendem sobre o imóvel; e de certidão da acção executiva n.º …/14.1TBSTB.1, da qual conste informação sobre o estado daqueles autos. Ponderando-se ainda nesse despacho que nem as partes nem a primeira instância se pronunciaram sobre as consequências eventualmente decorrentes para cada um dos pedidos formulados nesta acção da existência de penhoras incidindo sobre o imóvel, anteriormente ao registo desta acção para execução específica do contrato, em cumprimento do preceituado no artigo 3.º, n.º 3, do CPC, foram as partes notificadas para se pronunciarem, querendo.
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Em cumprimento do determinado naquele despacho, cada uma das partes procedeu à junção da pertinente certidão, e o autor pronunciou-se afirmando que só tem interesse na execução específica do contrato, no caso de o imóvel prometido comprar se encontrar expurgado de todo e quaisquer ónus e/ou encargos, e que, a manter-se qualquer ónus ou encargo sobre o imóvel, é interesse do recorrente ser indemnizado, nos termos do pedido subsidiário efetuado nos autos.
Por seu turno, a Ré informou que a exequente naqueles autos, tem igualmente reconhecido a seu favor o direito de retenção sobre aquele imóvel, tendo solicitado a adjudicação do mesmo para pagamento do seu crédito.
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Observados os vistos, cumpre decidir.
*****II. O objecto do recurso.
Com base nas disposições conjugadas dos artigos 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º, e 663.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil[5], é pacífico que o objecto do recurso se limita pelas conclusões das respectivas alegações, evidentemente sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha, não estando o Tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos produzidos nas conclusões do recurso, mas apenas as questões suscitadas, e não tendo que se pronunciar sobre as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Assim, vistos os autos, as questões que importa apreciar no presente recurso, atenta a sua ordem lógica, consistem em saber se a indicada matéria deve ser considerada provada; consequentemente, se deve ser decretada a execução específica do contrato-promessa de compra e venda e, no caso de impossibilidade da mesma, se o Autor tem direito à indemnização peticionada.
*****III – Fundamentos III.1. – De facto Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes factos: «1. A e R., em 20.julho.2007, celebraram acordo escrito denominado “Contrato Promessa de Compra e Venda de Imóvel”, junto a fls. 57 a 59, e que aqui se dá por inteiramente reproduzido, em cujos termos a Ré prometeu vender ao Autor, livre de ónus ou encargos, a moradia urbana destinada a habitação, que à data ainda se encontrava em construção, sita na Urbanização …, da freguesia de …, concelho de …, inscrito na matriz sob o artigo … daquela freguesia, descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º …, com área aproximada de 250,00 m2, com Alvará de Licença de habitação n.º …/2007 passado pela Câmara Municipal de … em 10.04.2007.
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Nos termos da cláusula segunda o preço acordado para a venda era de € 192.500,00.
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A modalidade de pagamento é descrita na cláusula terceira do contrato em apreço, onde se refere que 88.000€ (oitenta e oito mil euros) foram pagos no momento de celebração do contrato de promessa, a título de sinal e princípio de pagamento e que a restante quantia no valor de € 104.500,00, seria liquidada até à data da outorga da respetiva escritura de compra e venda, em reforços sucessivos conforme o andamento da respetiva construção.
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A escritura pública de compra e venda (vide clausula 4.º) deveria ser celebrada num prazo máximo de 90 dias após a emissão da licença de habitabilidade emitida pelos serviços competentes, sendo a sua marcação da responsabilidade da primeira outorgante, ora ré.
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Em 30.janeiro.2008, autor e ré celebraram acordo escrito denominado “aditamento ao Contrato Promessa de Compra e Venda de Imóvel”, junto a fls. 16 a 18, e que aqui se dá por inteiramente reproduzido, em cujos termos a Ré prometeu vender ao Autor, livre de ónus ou encargos, a moradia urbana destinada a habitação, que à data ainda se encontrava em construção, sita na Urbanização…, da freguesia de …, concelho de …, inscrito na matriz sob o artigo … daquela freguesia, descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Setúbal sob o n.º…, com área aproximada de 183,75 m2, com Alvará de Licença de habitação n.º …/2008 passado pela Câmara Municipal de … em 03.11.2008.
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A modalidade de pagamento é descrita na cláusula terceira do contrato em apreço, onde se refere que 88.000€ (oitenta e oito mil euros) foram pagos no momento de celebração do contrato de promessa, a título de sinal e princípio de pagamento. Mais foi referido que “nesta data foi efetuado um reforço de sinal no valor de € 11.000,00 e que a restante quantia no valor de € 93.500,00, seria liquidada até à data da outorga da respetiva escritura de compra e venda.
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A escritura pública de compra e venda (vide clausula 4.º) deveria ser celebrada num prazo máximo de 8 meses, sendo a sua marcação da responsabilidade da primeira outorgante, ora ré.
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Apesar de algumas solicitações, a ré nunca chegou a comunicar a marcação da escritura».
E foram considerados não provados os seguintes factos: «
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O autor cumpriu com o montante referente ao sinal e princípio de pagamento de € 99.000,00.
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A R. não celebrou com o A. qualquer aditamento a contrato promessa de compra e venda.
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A R. não celebrou qualquer contrato promessa de compra e venda com o A. de que o doc. n.º 1 junto com a p.i. possa ser um aditamento».
*****III.2. – O mérito do recurso III.2.1. – Da impugnação da matéria de facto Pretende o Recorrente que a matéria de facto dada como não provada, mais concretamente o facto dado como não provado em A) quanto ao pagamento do sinal, deve ser considerado provado não podendo deixar de ser dado como assente que “O autor cumpriu com o montante referente ao sinal e princípio de pagamento de €99.000,00”.
Ora, atento o preceituado no artigo 640.º do CPC relativamente aos ónus a cargo do Recorrente que impugna a matéria de facto, e no artigo 662.º no concernente à modificabilidade da decisão de facto pela Relação, cumpridos aqueles ónus, cumpre verificar se efectivamente a prova produzida nos autos, impõe decisão diversa da recorrida.
Insurge-se o Recorrente contra a ponderação efectuada pela 1.ª instância de que «o “aditamento ao...
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