Acórdão nº 54/14.2TAVRS.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 12 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelANA BARATA BRITO
Data da Resolução12 de Setembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na Secção Criminal: 1.

No Processo Comum Singular nº 54/14.2TAVRS da Comarca de Faro, foi proferida sentença em que se decidiu absolver o arguido PR da prática de um crime de falsidade de testemunho do artigo 360°, nº 1 do CP.

Inconformado com o decidido, recorreu o Ministério Público, concluindo: “1. A sentença recorrida absolveu o arguido PR do crime de falsidade de testemunho, p. e p. pelo art.º 360º, nº 1 do C.P. de que se encontrava acusado.

  1. Tal deveu-se a não ter dado como provados os factos respeitantes ao elemento subjectivo de tal ilícito.

  2. Porém, face à prova produzida deveria ter dado tais factos como provados.

  3. A sentença recorrida encontra-se ferida do vício de erro notório na apreciação da prova previsto no art.º 410º, nº 2, al. c) do C.P.P., na medida em que considerou relevantes os factos não provados no julgamento em que ele terá faltado à verdade e exactamente por causa disso.

  4. E não recorreu às regras da experiência comum na apreciação da conduta do arguido em todo o seu percurso enquanto testemunha no processo que desencadeou este e nestes mesmos autos.

  5. Violou, assim, o disposto no preceito já referido em 1 e o art. 127º do C.P.P..

  6. Devendo ser substituída por outra que condene o arguido pela prática do crime referido em 1, que, atentos os seus dois antecedentes criminais no mesmo tipo de crime, deverá ser de prisão suspensa com regime de prova, assim se fazendo justiça.” O arguido respondeu ao recurso pronunciando-se no sentido da confirmação da sentença.

    Neste Tribunal, a Sra. Procuradora-geral Adjunta emitiu parecer pronunciando-se pela revogação da sentença absolutória e a condenação do arguido.

    Na resposta ao parecer o arguido reiterou a posição apresentada na resposta ao recurso. Colhidos os vistos, teve lugar a conferência.

  7. Na sentença, consideraram-se os seguintes factos provados: “1 - Entre as 14.20 horas e ás 17.59 horas do dia 7 de Novembro de 2013, no âmbito do Processo Comum Colectivo n° --/12.3GATVR, em que estavam a ser julgados, além de outros, FM e JC, conhecido pela alcunha de Jorge Pequenino, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, o arguido foi inquirido como testemunha; 2 - Nessa altura afirmou nunca ter adquirido estupefaciente a FM, mas apenas numa ocasião tinha acedido a um pedido do mesmo para lhe ir buscar um menu de um estabelecimento de Kebab; 3 - E afirmou não se recordar de algum dia ter telefonado a JC, designadamente no dia 17 de Setembro de 2012, para combinar uma compra de estupefaciente; 4 - No entanto, o arguido, quando inquirido entre as 15.30 horas do dia 28 de Fevereiro de 2013, no posto da GNR de Vila Real de Santo António, havia afirmado que tinha comprado heroína, em diversas ocasiões durante o ano de 2012, a FM, contactando-o, previamente, para o telemóvel com o n° 924----, concretizando-se a compra nas imediações do Restaurante "O Tapas" em Monte Gordo, ou entre o Café Pirinéus e o Bairro Camarário nesta cidade, por € 10,00 cada dose; 5 - E, numa intercepção telefónica efectuada ao arguido JC, entre ás 20.40 horas e 30 segundos e ás 20.41 horas e 26 segundos do dia 17 de Setembro de 2012, o arguido, através da utilização do nº de telemóvel 9624----, para o nº 925---, que se encontrava a ser objecto da referida intercepção telefónica, foi escutado a combinar com o mesmo uma compra de estupefaciente, em que se percebe não ter sido aquela a única vez que efectuaram tal tipo de transacção; 6 - Não obstante tal depoimento, os referidos indivíduos vieram a ser, por acórdão de 20 de Dezembro de 2013, condenados pela prática do crime de que se encontravam acusados; 7 - No acórdão aludido em 1, não consta da matéria de facto provada os factos aludidos em 4 e 5; 8 - No acórdão aludido em 1, consta dos factos não provados: "V. - A partir de Janeiro de 2012, por diversas vezes, em Vila Real de Santo António, entre o café «Pirenéus» e o Bairro Social, em Monte Gordo, nomeadamente, junto ao restaurante «Tapas», a PR que comprou ao arguido vários «panfletos» de «heroína» pelo preço de € 10,00 cada um, que este logo pagou e o arguido recebeu; 9 - O arguido tem antecedentes criminais, tendo sido condenado nos seguintes processos: - no Processo Comum Singular nº ---/07.2TAVRS da Secção Única do Tribunal Judicial de Vila Real de Santo António, com a pena de cem dias de multa à taxa diária de € 5,00, pela prática de um crime de falsidade de depoimento previsto e punido pelo artigo 360°, nºs 1 e 3 do Código Penal, por factos praticados em 10-5-2007, por decisão de 17-10-2008, transitada em julgado em 10-11-2008, cuja pena foi extinta por cumprimento em 31-1-2014; - no Processo Comum Singular nº ---/09.1TAVRS da Secção Única do Tribunal Judicial de Vila Real de Santo António, com a pena de seis meses de prisão suspensa na sua execução pelo período de um ano, pela prática de um crime de falsidade de depoimento previsto e punido pelo artigo 360°, nºs 1 e 3 do Código Penal, por factos praticados em 11-2-2009, por decisão de 14-3-2012, transitada em julgado em 12-4-2012, cuja pena foi extinta por cumprimento em 12-4-2013; 10 - Na ocasião aludida em 4, o arguido era consumidor de produtos estupefacientes e na ocasião aludida em 1, estava em tratamento de desintoxicação de produtos estupefacientes; 11 - O arguido trabalha por conta de outrem e aufere a esse título por mês cerca de € 530,00; 12 - O arguido é casado e tem uma filha maior e vive com o seu cônjuge, com a sua filha maior e com os sogros em casa destes, arrendada; 13 - O arguido tem como habilitações literárias o 9° ano de escolaridade.” Consignaram-se como factos não provados os seguintes: “- o arguido agiu de forma voluntária, livre e consciente, e com o propósito, conseguido, de faltar à verdade na referida audiência de julgamento e não fazer prova do cometimento pelos referidos arguidos de tal processo do crime de tráfico de estupefacientes de que se encontravam acusados; - sabia, perfeitamente, que a sua conduta era proibida e punida por lei.” A motivação da matéria de facto foi a seguinte: “O Tribunal formou a sua convicção quanto aos factos provados e não provados com base na apreciação crítica das declarações do arguido cujo teor consta do registo fonográfico apreciados à luz de regras de normalidade e de experiência comum.

    O arguido prestou declarações sobre os factos, referindo não se lembrar acerca do que depôs nos dois momentos, ciente no entanto da sua débil situação de toxicodependente perante a autoridade policial aquando da sua inquirição o que poderá tê-lo feito incorrer em confusão. Disse que á data era consumidor de produtos estupefacientes e depois efectuou tratamento de desintoxicação e actualmente não consome. Disse não se lembrar do que disse, apenas se lembra de ter estado no julgamento e ter estado na polícia.

    E prestou ainda declarações sobre a sua situação sócio-económica e familiar. Disse que trabalha como empregado de balcão, num estabelecimento comercial de café e aufere por mês o salário mínimo. Disse que é casado e vive com a esposa e com a filha maior e com os sogros em casa destes. Tem como habilitações literárias o 9° ano de escolaridade.

    E ainda com base no teor da prova documental analisada de forma critica e junta aos autos: - certidão de fls. 3 a 17,74 a 85, 86 a 98, 108 a 225 e 229 a 232; - certificado de Registo Criminal do arguido de fls. 23 a 26 e 251 a 256; - transcrição de fls. 32 a 51.

    Da prova produzida resultante das declarações do arguido em conjugação com a prova documental, designadamente do Acórdão aludido em 1 da matéria de facto assente, não resultam provados os factos da acusação que demandem a verificação do ilícito imputado ao arguido, em suma, da prova produzida não resulta ter o arguido actuado da forma descrita na acusação, o que demanda a improcedência da acusação e a consequente absolvição do arguido.

    Note-se que da factualidade assente apenas resulta ter havido desconformidade parcial nos depoimentos prestados pelo arguido na fase de inquérito e na fase de julgamento, sendo certo o facto...

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