Acórdão nº 630/20.4T8PTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 19 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelALBERTINA PEDROSO
Data da Resolução19 de Novembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Tribunal Judicial da Comarca de Faro[1]*****Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora[2]: I. – RELATÓRIO 1. A…, requerida nos autos do procedimento cautelar acima identif‌icado, que M… contra si deduziu visando a restituição provisória da posse sobre um seu prédio urbano, tendo sido notif‌icada do despacho proferido em 19-06-2020 (refª.: 116926969) que indeferiu a invocação de justo impedimento e mandou desentranhar o articulado de oposição que apresentou, e não se conformando com o mesmo, apelou, terminando a sua minuta recursória com prolixas conclusões que se sintetizam nas seguintes: «A requerente recebeu a notif‌icação para os termos da presente providência cautelar em 17 de Março, na altura em que já tinham sido estabelecidas medidas especiais de isolamento social, de conf‌inamento sanitário e de encerramento do atendimento ao público dos serviços públicos, do encerramento da generalidade dos estabelecimentos comerciais e das actividades de prestação de serviços, determinados pelo Decreto-Lei 10-A/2020, de 13 de Março, reforçadas pelo Decreto Presidencial nº 14-A/2020, de 18 de Março, a determinar a situação de Estado de Emergência, pela publicação da Lei 1-A/2020, de 19 de Março e pelo Decreto governamental nº 2-A/2020, de 20 de Março, objecto de sucessivas alterações posteriores); Esse complexo normativo foi objecto de uma reforçada campanha de comunicação e de informação promovida pelo governo e pela comunicação social em geral na qual se publicitaram as medidas de conf‌inamento sanitário, de isolamento social e as restrições da liberdade de circulação das pessoas nas vias públicas locais e nacionais, que, a nível local foi reforçada com a circulação de carros das forças policiais, com de amplif‌icação sonora, pelas ruas das povoações a informar das restrições à circulação e a exortar para as pessoas permanecerem nas suas habitações, ao que acrescia a realização de patrulhas a chamar à atenção dos transeuntes e a apelar para o regresso às suas habitações; [Q]uer pelo que decorria das normas acima referidas, sobretudo as constantes do artº 5º nº 1, do Decreto do Governo nº 2-A/2020, de 20 de Março, quer da campanha de comunicação antes referida, a generalidade das pessoas – como foi reconhecido e aplaudido por todos – interiorizou essa necessidade de conf‌inamento, de isolamento social e das restrições da limitação à circulação nas vias públicas contribuindo com esta atitude para o sucesso das medidas e dos bons resultados com combate à doença do Covid-19; [T]oda a informação colhida pela requerente foi a de que os serviços públicos, incluindo os Tribunais tinham encerrado ao atendimento directo ao público, só se mantendo para acudir a situações muito excepcionais de graves violações de direitos liberdades e garantias fundamentais; [A] decisão ora recorrida é precisamente contrária ao sentido da lei e a toda a mensagem pública que se transmitiu sobre que a decretação das medidas de excepção não perturbaria a defesa efectiva dos direitos substantivos e processuais das pessoas, especialmente nos casos em que esteja em causa o direito fundamental à habitação … tanto mais que, nesta parte e no caso em apreço, existe um paralelismo e uma plena identidade de razões com as situações previstas no artº 7º, nº 11, da Lei 4-A/2020, de 6 de Abril, em que foram suspensas as acções de despejo e os processos de entrega de coisa imóvel arrendada».

Termina pedindo que seja considerado «procedente o invocado motivo de justo impedimento para a apresentação em data anterior à de 4 de Maio de 2020, que foi aquela em que a ora recorrente apresentou o seu requerimento de justo impedimento e o seu articulado de oposição à providência cautelar aqui em apreço».

A acrescer a este argumentário, a Apelante invoca ainda que «por despacho da Mtª Juiz a quo datado de 4 de Abril de 2020, a f‌ls. …, cujo conteúdo se reproduziu no corpo desta alegação, no qual foi processualmente determinada a suspensão da providência cautelar e o prazo para a apresentação da oposição pela requerida e ora recorrente; Esse despacho manteve-se sempre no processo, nunca tendo sido alterada a decisão nele contida, isto é não foi revogado, nem foi substituído por outro que tivesse levantado tal suspensão»; sendo que «a situação de contenção decorrente da pandemia covid-19, no que respeita ao normal funcionamento dos tribunais, só ocorreu no 3 de Junho, com a entrada em vigor da Lei 16/2020, de 29 de Maio; e «só em 12 de Maio de 2020, após a apresentação da oposição pela requerida, é que foi proferido despacho a f‌ls. …, que, de algum modo, revoga tacitamente o despacho que ordenou a suspensão da providência cautelar e do prazo de apresentação dessa oposição, mandando notif‌icar a requerente para se pronunciar sobre o invocado motivo de justo impedimento e, igualmente, para aperfeiçoar o seu articulado inicial; Tendo a requerente tido a lisura e correcção de nada ter a opor ou a requerer e, também, de chamar a atenção para o despacho mencionado na conclusão precedente, no qual se decretou a suspensão do dito prazo de oposição», concluindo que «o douto despacho proferido nos autos em 4 de Abril de 2020, não foi directa e imediatamente revogado pela entrada em vigor das invocadas normas dos artºs 6º e 7º nº 7, da Lei 4-A/2020, de 6 de Abril, que esclareceu o confuso e contraditório do regime jurídico da contagem dos prazos processuais urgentes decorrente da Lei 10-A/2020, de 19 de Março e do Decreto-lei 10-A/2020, de 13 de Março, por ela ratif‌icado», donde, «Não tendo sido proferida, no processo, nova decisão judicial a revogar e a levantar a suspensão da contagem do prazo para apresentação da referida oposição, essa suspensão manteve-se totalmente operante, pelo menos, até à data em que foi produzido, em 12 de Maio de 2020, o novo despacho a ordenar a notif‌icação da requerente para se pronunciar sobre o requerimento de justo impedimento e para apresentar um novo articulado de aperfeiçoamento do articulado inicial».

  1. Não foram apresentadas contra-alegações.

  2. Observados os vistos, cumpre decidir.

    *****II. – O objecto do recurso Com base nas disposições conjugadas dos artigos 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º, e 663.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil[3], é pacífico que o objecto do recurso se limita pelas conclusões das respectivas alegações, evidentemente sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, não estando o Tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos produzidos nas conclusões do recurso, mas apenas as questões suscitadas, e não tendo que se pronunciar sobre as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.

    Assim, vistos os autos, e atenta a respectiva ordem lógica, as questões a apreciar, consistem em saber se: i) deve ser considerado verificado o alegado justo impedimento e revogado o despacho recorrido; em caso negativo, se ii) deve a oposição considerar-se ainda assim tempestiva em virtude do despacho que decretou a suspensão da instância.

    *****III – Fundamentos III.1. – Tramitação processual O iter processual relevante para a decisão do presente recurso é o seguinte: A) – A Requerida, ora Apelante, foi regularmente citada para deduzir oposição ao presente procedimento cautelar no dia 17-03-2020, não constando no ofício que então lhe foi entregue, conforme certificação Citius de elaboração em 10-03-2020, menção ao carácter URGENTE do processo, em linguagem simples, acessível a qualquer cidadão.

    1. – No dia 03-04-2020 foi proferido despacho com o seguinte teor: «A requerida foi citada para, querendo, opor-se a esta providência cautelar em 17 de Março de 2020.

      Por força do disposto nos artigos 7º n.º s 5 e 10 da Lei 1-A/2020, de 19 de Março e 37º do DL 10-A/2020, 13 de Março, a produzir efeitos desde o dia 09 de Março, o prazo para deduzir oposição nestes autos está suspenso até à cessação da situação excepcional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infecção epidemiológica por SARS-Cov2 e da doença Covid-19.

      Por ora, e face ao exposto, devem os autos aguardar a cessação da situação que determinou a suspensão do presente prazo».

    2. – Em 04-05-2020 a requerida apresentou oposição, iniciando o requerimento com o título “Do Justo Impedimento”, e aduzindo que: «1. A requerente recebeu a notificação para os termos da presente providência cautelar em 17 de Março, na altura em que já tinham sido estabelecidas medidas especiais de isolamento social, de confinamento sanitário de funcionamento dos serviços públicos (Decreto-Lei 10-A/2020, de 13 de Março, ratificado pela Lei 1-A/2020, de 19 de Março) e objecto de...

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