Acórdão nº 5/14.4JDLSB-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 14 de Julho de 2020

Magistrado ResponsávelFERNANDO PINA
Data da Resolução14 de Julho de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

ACORDAM OS JUÍZES, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA: I. RELATÓRIO A – Nos presentes autos de Instrução que com o nº 5/14.4JDLSB-A, correm termos no Tribunal Judicial da Comarca de Évora – Juízo de Instrução Criminal de Évora, recorre o assistente (...), devidamente identificado nos autos, do despacho proferido em 13 de Dezembro de 2019, pelo Juiz titular dos presentes autos, que rejeitou o requerimento de abertura de instrução formulado pelo mesmo assistente, nos termos do disposto no artigo 287º, nº 3, do Código de Processo Penal, por inadmissibilidade legal, face a falta da indicação dos factos que fundamentam a aplicação de uma pena ou de uma medida de segurança.

Da motivação do recurso, o assistente/recorrente (...), retira as seguintes conclusões (transcrição): 1. O assistente e recorrente (...), foi vítima de burla qualificada, perpetrada pelos denunciados (...) e, (...) (já falecido), a quem vendeu no dia 31 de Julho de 2015, 5.460 Kg de cortiça, conforme talão de pesagem a fls. 1132, dos autos e fls. 7, do inquérito 56/15.1GFPTG, incorporado nos presentes autos, pelo valor de € 8.768,00, que lhe foram pagos através de um cheque preenchido pelo (…), que lhe foi entregue pelo mesmo na empresa (…), localizada na freguesia de (…), onde foi pesada a cortiça, preencheu e da qual foi testemunha o Sr. (…), residente na (…) que efectuou a pesagem 2. A cortiça foi transportada pela empresa espanhola dos irmãos (…), com sede social em Espanha, alugada pelo arguido (...), a quem foi entregue, com destino à empresa (…), propriedade da sua esposa, (…), registada e a laborar em Espanha.

  1. Os contactos telefónicos entre o assistente e o (…) ocorreram através do telefone (…) de uma operadora espanhola de telecomunicações, que está registado em nome de (…), residente em Espanha, pessoa, que seguramente conhece o (...).

  2. No dia 05 de Agosto de 2015, o assistente apresentou na Caixa Geral de Depósitos, Balcão de (…) no cheque nº (…) do Banco BPI, referente à conta (…), titulada por “(...), Lda.” o qual foi devolvido pela Caixa Geral de Depósitos em 07 de Agosto de 2015 por motivo Revogado/Extraviado – cfr fls. 1131 e 1132 dos autos e fls 5 e 6 do inquérito nº 56/15.1GFPTG.

  3. Nessa sequência o recorrente tentou contactar o (...) através dos telemóveis que tinha em seu poder, mas não logrou obter qualquer resposta, ligando então para o nº (…), de onde lhe respondeu um tal (…), com sotaque diferente do que tinha falado pessoalmente, sabe agora que aquele número pertence ao arguido (...), que lhe respondeu que não tinha nada a ver com aquilo, porque desconhecia que o (...) lhe tinha passado um cheque sem provisão e que lhe deu a indicação que o mesmo residiria em Santa Maria da Feira 6. No inquérito nº 56/15.1GFPTG, incorporado nos presentes autos a fls 1125, a investigação dos factos dele constantes não foi concluída, ficando por realizar diligências probatórias, através de carta rogatória, para as autoridades judicias espanholas, reputadas necessárias à descoberta da verdade material, à boa decisão da causa e boa aplicação da justiça, das quais emergiria, seguramente quem foram os autores dos factos e a sua responsabilidade – cfr fls 68 e 69 do inquérito, a que correspondem as fls 1193 e 1194, designadamente: 7. Para cabal esclarecimento do constante em toda a matéria de facto constante do inquérito nº 56/15.1GFPTG, incorporado nos presentes autos e cuja investigação não foi concluída, mas ali vinha um relatório do OPC que procedeu à investigação, sugerindo a continuação da investigação, através de carta rogatória dirigida às autoridades espanholas e as diligências de prova constantes de folhas 68 e 69, correspondentes a fls 1193 e 1194 dos presentes autos, por se reputarem essências à descoberta da verdade, à boa decisão da causa e boa aplicação da justiça e, a fim de se poder apurar quem são os autores dos factos praticados nos presentes autos e demais intervenientes, designadamente: - Inquirição do arguido (...), acerca da sua participação nos factos praticados nos presentes autos - Confirmar se o nº de telefone da operadora espanhola (…), é do arguido (...), utilizado para contactar o requerente - Inquirir (…), proprietária de empresa (…), no sentido de apurar se a cortiça do lesado (…) foi escoada através da sua empresa.

    - Inquirir sobre a sua participação nos factos o cidadão espanhol (…), por ser o indivíduo titular do número de telefone de onde foi contactado o requerente e saber, ainda, se o nº de telefone (…), de origem espanhola lhe está atribuído.

    - Inquirir os responsáveis da empresa transportadora que terá efectuado o transporte da cortiça do requerente, nomeadamente (…) e (…), irmãos conhecidos como (…), para apurar se estes registaram a identidade da pessoa que contratou os seus serviços e o local de entrega.

    - Apurar a identidade dos titulares dos números de telefone (…, … e…), fixos, todos de origem espanhola e utilizados pelo (...).

    - Apurar quem era o proprietário, à data, da viatura de matrícula espanhola (…), conduzida pelo (...) 8. A Digníssima Procuradora titular do processo descurou totalmente o teor daquele relatório e das diligências investigatórias que dele constavam e deduziu acusação contra indivíduo que nada tem a ver com os factos perpetrados contra o recorrente, sem se ficar a saber, efectivamente, quem era a personagem principal nos presentes autos – o (...).

  4. Daí que, no modesto entendimento, do recorrente, os autores materiais, ou pelo menos um deles, dado o decesso do outro, ficam completamente impunes, por inércia do Ministério Público que não concluiu a investigação e proferiu douto despacho de arquivamento.

  5. O assistente/recorrente só se pode insurgir contra o despacho de arquivamento proferido pelo Digníssimo Magistrado do MP fazendo uso do mecanismo legal que tem à sua disposição que é um requerimento de abertura de instrução e ali invocar os fundamentos de facto e direito da manifestação da sua discordância.

  6. Os pressupostos do requerimento da abertura da instrução são muito específicos e rigorosos e, no caso concreto aqui em apreço, dada a falta de concretização da investigação, tal como vinha sugerida pelo OPC, mais dificuldades se apresentaram ao seu requerente, designadamente saber, em concreto, quem foram, ou são, os seus autores, sem, em primeira mão, serem efectuadas as diligências probatórias reputadas necessárias e pertinentes para a sua descoberta e que foram descuradas 12. Diligências, que aliás, fez constar no final do seu requerimento de abertura de instrução, onde, ainda, acrescentou: - Para esclarecimento do vertido no artigo 19º, requer a inquirição do ofendido (…), identificado a fls 1237 e 1238, a fim de esclarecer que entidade é que lhe exibiu a fotografia do (...), para poder ser notificado para vir aos presentes autos prestar o necessário depoimento sobre a identidade do (...) - Dada a dificuldade em identificar o arguido (...), por existir nos autos uma certidão permanente da sociedade por quotas denominada “(...), Lda.”, com o IPC (…), com sede social em (…), com o CAE (…) – indústria de preparação de cortiça, reputa-se pertinente que se averigue se já foi, ou actualmente é, sócio da mesma o (...).

  7. É certo que a não observância das formalidades legais contribui para a não admissão do requerimento de abertura da instrução, mas no caso aqui em apreço, apenas com os elementos probatórios disponíveis dos autos não é possível ao ali requerente, ora recorrente, individualizar e concretizar a identificação correcta e a localização do arguido, com vista à sua pronúncia 14. Afigura-se relevante ao recorrente que a realização das diligências probatórias requeridas no final do seu requerimento de abertura instrução, no que concerne ao denunciado (...), ainda que através de carta rogatória dirigida às autoridades espanholas, contribuiria, de forma segura, para a sua identificação, localização, notificação e constituição como arguido 15. Caso assim se não entenda, fica um arguido por punir e um assistente, vítima de burla qualificada, sem justiça 16. O recorrente não se conforma com o douto despacho de rejeição do requerimento de abertura de instrução proferido pelo Meritíssimo Juiz de Instrução, pelo que o impugna, porquanto, com todo o respeito que o mesmo lhe merece, a decisão a tomar deverá ser no sentido da sua admissão e ordenar a realização das diligências de prova no mesmo requeridas, em virtude de não terem sido realizadas na fase de inquérito e, a terem-no sido, a conclusão seria totalmente diferente, na justa medida em que teriam permitido a identificação, a localização e a sua constituição na qualidade de arguido e a imputação dos factos configurados com burla qualificada 17. Ao assistente não lhe é permitido insurgir-se contra o despacho de arquivamento, proferido pelo MP, e repor a verdade dos factos, sem ser através de requerimento de abertura de instrução e, neste caso em especial, dada a deficiência do inquérito, no que...

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