Acórdão nº 2034/19.2T8PTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 04 de Junho de 2020
Magistrado Responsável | EMÍLIA RAMOS COSTA |
Data da Resolução | 04 de Junho de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1]♣Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório E… (A.) intentou a presente acção especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, manifestando, por via da apresentação do requerimento a que alude o artigo 98.º - C do Código de Processo do Trabalho, a sua oposição ao despedimento promovido por “P…, Lda.” (R.), ambos devidamente identificados nos autos.
…Realizada a audiência de partes, não foi possível resolver por acordo o litígio.
…Seguiu-se a regular tramitação processual, tendo sido marcada audiência prévia, na qual não foi possível a conciliação das partes. Por o tribunal a quo considerar estarem reunidas as condições necessárias para proferir de imediato decisão, foi dada a palavra aos ilustres mandatários das partes para, querendo, alegarem, o que fizeram.
De seguida foi considerado não se justificar a realização da audiência de discussão e julgamento, tendo sido, posteriormente, proferido saneador-sentença, em 02-03-2020, na qual foi fixado o valor da causa em €8.244,61, com o seguinte teor decisório: Pelo exposto, considera-se a presente ação procedente e em consequência: 1. Declara-se a ilicitude do despedimento do autor E…; 2. Condena-se a ré P…, Ldª no pagamento ao autor de uma indemnização em substituição da reintegração, de valor equivalente a quarenta dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano ou fração de antiguidade até à data do trânsito em julgado da decisão (consignando-se que a antiguidade do autor remonta ao dia 04 de março de 2013 e que a retribuição a atender é de € 950,00 mensais), acrescida dos juros, calculados à taxa legal, desde o trânsito em julgado da decisão, até integral pagamento; 3. O valor constante do ponto 2 deverá ser fixado em liquidação, a efetuar em sede de eventual execução de sentença, por a sua fixação depender da data do trânsito em julgado da decisão.
Custas a cargo da ré (cf. artigo 527º do Código de Processo Civil).
♣Não se conformando com esta decisão, veio a R. interpor recurso, terminando as suas alegações com as conclusões que se seguem: 1.
A tomada de conhecimento do teor das mensagens de WhatsApp, enviadas pelo Recorrido a outro trabalhador da Recorrente, por parte da entidade patronal, não implica qualquer violação ou devassa de comunicações privadas; 2.
A Recorrente foi informada pelo próprio destinatário das referidas mensagens, no exercício do seu direito à liberdade de expressão, sobre o teor das mesmas; 3.
O Recorrido admitiu perante a gerente da Recorrente ter escrito tais mensagens, afirmando, de forma clara e agressiva, na presença de terceiros, que reiterava tudo quanto havia escrito; 4.
A Recorrente poderia e devia, no exercício do poder disciplinar que lhe cabe, ter usado o teor das mensagens em causa como prova do comportamento reprovável do A., as quais, enquanto tal, não enfermam de qualquer nulidade; 5.
A douta decisão recorrida, que declarou a ilicitude do despedimento e condenou a Ré ao pagamento de uma indemnização ao A., afigura-se prematura, sendo que cabia ao Tribunal a quo garantir a tramitação normal do processo, permitindo à Recorrente a produção de toda a prova relevante, designadamente a testemunhal, a produzir em sede de audiência de julgamento.
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O Recorrido, em sede de contestação ao articulado motivador, mesmo após ter sido convidado ao aperfeiçoamento, não fez qualquer pedido de indemnização, pelo que, ainda que, por mera hipótese de raciocínio, o despedimento venha a ser declarado ilícito, não tem o A., aqui Recorrido direito a qualquer indemnização, uma vez que a não peticionou.
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Ainda que se entenda pela confirmação da condenação da Ré, aqui Recorrente, ao pagamento de uma indemnização ao A., deverá a mesma ser reduzida pelo seu limite mínimo.
Nestes termos, E nos demais de direito que Vs. Exas. doutamente suprirão, deverá a douta sentença recorrida ser revogada, admitindo-se a prova indicada, e ordenando-se o prosseguimento dos autos, com vista à prolação de sentença após julgamento; Caso assim não se entenda, deverá a douta decisão recorrida ser alterada, sendo a Ré absolvida do pagamento de qualquer indemnização, por não peticionada; Ainda que se entenda pela confirmação da condenação da Ré, aqui Recorrente, ao pagamento de uma indemnização ao A., deverá a mesma ser fixada à razão de quinze dias de retribuição base e diuturnidades, por cada ano ou fracção de antiguidade, Só assim se fazendo a costumada JUSTIÇA.
♣Contra-alegou o A., pugnando pela improcedência do recurso, devendo ser mantida a sentença recorrida, apresentando as seguintes conclusões: A- Os presentes autos foram e bem decididos pelo tribunal recorrido com base no facto de estarmos perante um processo disciplinar baseado apenas numa única prova, a qual não é tampouco admissível, por ser violadora da reserva própria da vida privada, assente, toda ela em mensagens privadas enviadas através da aplicação Whatsapp.
B- Pelo que não existe mais nenhuma outra prova que não seja essas mensagens que, ainda assim não ficou sequer provado que foi ora recorrido, pessoalmente, a enviar essas mensagens, pelo que dúvidas não restaram ao tribunal “a quo” para considerar o despedimento ilícito.
C- A Ré discorda da decisão mas, salvo o devido respeito, sem razão, pois as mensagens de Whatsapp nem são sequer dirigidas à Ré, que continua a confundir a entidade patronal do Autor, com a qual nunca teve qualquer litígio, com a herdeira (D. Sharon) do antigo dono da Ré.
D- Por outro lado, as mensagens enviadas através da aplicação Whatsapp, não foram escritas pelo Autor, visavam a herdeira do antigo dono da Ré, a qual não aceitou que o seu pai tivesse legado um dos seus restaurantes ao Autor.
E- A Ré sabe que não podia aceder, como acedeu, às referidas mensagens, enviadas para um terceiro, através da aplicação do Whatsapp e ainda que não podia fazer uso das mesmas como o fez.
F- As provas apresentadas pela recorrente foram “fabricadas” pela Ré de modo a poder obter um pretexto para despedir o Autor, caso contrário, o terceiro envolvido na obtenção dessa mensagens não teria sido poupado a um processo disciplinar, como aconteceu, pois tratou-se de um “sermão encomendado”.
G- Ao contrário do alegado pela Ré no seu recurso, nunca foi confirmado que foi o Autor a enviar essas mensagens.
H- O acórdão da Relação do Porto, citado pela recorrente, refere-se, no modesto entendimento do Autor, à necessidade de apreciar “todas as provas” constantes dos autos, o que não acontece neste caso, pois só existia uma única prova no processo que eram as mensagens.
I- Pelo que, salvo o devido respeito, muito bem andou o tribunal recorrido ao decidir como decidiu, o que aliás vem no seguimento do anteriormente também já decidido pelo Venerando Tribunal da Relação de Évora, citado pelo Autor no seu articulado motivador. (TRE – Acordão datado de 28/03/2019, processo nº 747/18).
J- Finalmente, quanto à indemnização atribuída ao Autor, também nessa matéria a decisão do tribunal recorrido não merece censura, pois o tribunal recorrido condenou nos exactos termos peticionados e na proporção que entendeu ser adequada.
K- Pelo que, salvo o devido respeito, deve a decisão recorrida ser mantida nos precisos termos em que foi proferida pelo tribunal “a quo”.
L- Devendo, em consequência, ser o presente recurso considerado improcedente, por não provado.
TERMOS EM QUE: Deve a decisão anteriormente proferida ser mantida nos precisos termos proferidos. Porém, V. Excelências decidirão como de costume.
♣O tribunal de 1.ª instância admitiu o recurso como de apelação, a subir imediatamente nos próprios autos e com efeito devolutivo, e, após a subida dos autos ao Tribunal da Relação, foi dado cumprimento ao preceituado no n.º 3 do art. 87.º do Código de Processo do Trabalho, tendo o Exmo. Sr. Procurador-Geral Adjunto emitido parecer, pugnando pela improcedência do recurso, devendo ser mantida na íntegra a decisão recorrida.
Não foi oferecida resposta ao parecer.
Tendo sido mantido o recurso nos seus precisos termos, foram colhidos os vistos legais, cumprindo agora apreciar e decidir.
♣II – Objecto do Recurso Nos termos dos arts. 635.º n.º 4 e 639.º n.º 1 do Código de Processo Civil, aplicáveis por remissão do artigo 87.º n.º 1 do Código de Processo de Trabalho, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das partes, ressalvada a matéria de conhecimento oficioso (art. 662.º, n.º 2, do Código de Processo Civil).
No caso em apreço, as questões que importa decidir são: 1) Excesso de pronúncia; 2) Valor das mensagens de WhatsApp como meio de prova; 3) Insuficiência do pedido de indemnização; e 4) Excessivo quantum indemnizatório.
♣III – Matéria de Facto O tribunal de 1.ª instância deu como provados os seguintes factos: 1. O autor foi admitido ao serviço da ré em 04.03.2013, com a categoria profissional de «controlador» e o vencimento base mensal de € 950,00.
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Por carta datada de 28.05.2019, foi remetida ao autor a «nota de culpa» reproduzida a fls. 93 e ss. (cf. fls. 91), sendo-lhe simultaneamente comunicada a respetiva suspensão preventiva, por se reputar inconveniente a sua manutenção no local de trabalho; 3. O autor, remeteu à ré a «resposta à nota de culpa» reproduzida a fls. 97 e ss., por carta colocada no correio em...
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