Acórdão nº 1636/17.6PAPTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 06 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelJOÃO AMARO
Data da Resolução06 de Outubro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - RELATÓRIO No Processo Comum (Tribunal Singular) com o nº 1636/17.6PAPTM, do Juízo Local Criminal de Portimão (Juiz 2), e mediante pertinente sentença, foi decidido: “I - Julgar a pronúncia procedente, por provada, e, consequentemente: A. Condenar o arguido JVA como autor material de um crime de difamação, p. e p. pelo artigo 180º, nº 1, do Código Penal, na pena de 90 (noventa) dias de multa, à razão diária de € 5,00, (cinco euros), o que perfaz o montante de € 450,00 (quatrocentos e cinquenta euros)

  1. Condenar o arguido nas custas e encargos do processo, fixando a taxa de justiça em 2 UC

    II - Julgar o pedido de indemnização cível deduzido pela demandante EMSL parcialmente procedente, por parcialmente provado, e, consequentemente: C. Condenar o demandado JVA a pagar à demandante a quantia de € 500,00 (quinhentos euros), a título de indemnização pelos danos não patrimoniais por esta sofridos, acrescida de juros de mora à taxa legal contados a partir desta decisão e até efetivo e integral pagamento

  2. Absolver o demandado do demais peticionado

  3. Condenar demandado e demandante no pagamento das custas do pedido de indemnização civil, na proporção dos respetivos decaimentos, sem prejuízo da do benefício do apoio judiciário concedido à demandante”

    * Inconformado, o arguido interpôs recurso da sentença, formulando na respetiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões: “

  4. O julgador encontra-se vinculado à busca da verdade e limitado pelas regras da experiência comum e por restrições legais. Pelo que, inexistindo uma prova coerente e imparcial, o Tribunal deve concluir pela inconcludência da prova e ser remetido ao princípio do in dubio pro reo, dando por via disso como não provados os factos constantes da acusação

  5. Com efeito, o julgador deve decidir a favor do arguido se, face ao material probatório produzido em audiência, tiver dúvidas sobre qualquer facto. O que se impunha in casu. E porque? Porque da conjugação de todos os depoimentos - assistente e duas testemunhas de acusação - resultam sérias dúvidas sobre os factos consubstanciadores da acusação

  6. Não se pode conceber que, à luz do princípio matricial da presunção de inocência, consagrado no artigo 32.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa (adiante designado por CRP), o Tribunal assente o seu juízo sobre os elementos de prova na credibilidade que determinado meio de prova oferece. Os factos cuja veracidade seja duvidosa deverão ser tidos como provados ou não provados consoante seja mais favorável ao arguido

  7. Entende o recorrente que, salvo douto melhor entendimento, tais factos dados como provados foram incorretamente julgados como provados, a assistente refere ao longo das suas declarações, para as quais, com a devida vénia, se remete na íntegra, que telefonou ao marido porque havia combinado com o mesmo ir fazer visita ao hospital a um familiar, após o seu regresso da igreja. Uma vez que o mesmo não regressava decidiu ligar-lhe, dando a entender, a instâncias da sua Ilustre mandatária, da digníssima Magistrada do Ministério Público e da Meritíssima Juiz que tinha falado com o seu marido ao telefone 5:45m

  8. Quando, afinal - bem como do depoimento de AS - se conclui que nunca trocaram quaisquer palavras ao telefone, acaba por dizer: “só escutou, o marido não disse nada” 17:25m A dia ao minuto 6: 15 e 8:25m e que nunca atendeu o telemóvel à assistente. Terá ouvido a conversa, através do telefone do marido que pode sido inadvertidamente atendido quando estava no seu bolso. A diz “não sabe como ela ouviu 6:15m” “A conversa é dela 6:55m” A diz ainda que nunca confirmou no seu telemóvel a dita chamada da assistente 18h15m Ora, não nos parece de todo credível que a assistente tenha ouvido tal conversa através de uma chamada que não sabemos sequer que existiu que terá ficado a ouvir uma conversa durante 30 minutos com varias vozes 10:50m

  9. Alegadamente os seus compadres também ouviram a conversa pro estar em alta voz 15:30m, mas é certo que não foram aqui convocados como testemunha, minuto 11:00m G) Colide com os factos provados dos pontos 8 e 12 que assim tenha ocorrido, uma vez que a assistente refere expressamente que o marido nunca a questionou, não teve problemas com o marido, nem nunca lhe disse nada – minuto 8:05m; minuto 8:35: minuto 22:40; marido não se zangou e disse-lhe que se quisesse apresentar queixa era com ela 8: 55m e 13:55m. Quando o marido regressa a casa a assistente afirma que o mesmo tinha bebido. 20:30. O estado alcoolizado teria tendência a dramatizar ou exagerar na alegada conversa que o arguido alegadamente havia feito, mas o que é certo é que nunca disse nada à mulher. Quer isso dizer que a testemunha A não atribuiu relevância alguma à dita conversa

  10. O que contraria a conclusão de que a assistente tenha temido pela sua relação

  11. Existem ainda outras discrepâncias a salientar: a testemunha A refere expressamente que A atendeu o telefonema da assistente 6:45m e 8:00 m e 8:20m, quando este desmentiu isso claramente, conforme supra referido

  12. Ainda, A refere que entra sozinho no estabelecimento e o arguido já lá estava 3:10m e a testemunha A 3:55m e 12:20m diz que se encontraram os três - A, A e o arguido - na rua e entraram os três no estabelecimento, mas nada chegaram a consumir. A diz que quando entrou no café o arguido já lá estava e que estava ao balcão a beber 3:10m

  13. Quanto ao momento em que terão sido perpetuados os alegados factos suscetíveis de integrar o ilícito criminal, as histórias também não são coerentes, a testemunha A diz que assim que entra no café e cumprimenta o arguido ele sem mais lhe refere que não era mulher para si, logo no início do depoimento. A testemunha A refere que A estava ao telefone com a assistente e o arguido a intrometer-se no telefonema a falar “por cima” L) Quanto ao lapso temporal dos factos, todos referem que não durou muito, A 21:00m; A 11:30m 1 minuto, quando a assistente refere ter ouvido durante 30 minutos 19:50 m M) Aliás A refere que foi para o exterior do estabelecimento conversar com o arguido quando a testemunha A refere que após o telefonema todos seguiram o seu caminho 14:15m e então o A não estava zangado com o arguido

  14. O recorrente entende que, dos depoimentos, articulados entre si e com as regras da expediência comum, a decisão deveria ir no sentido da sua absolvição, no que concerne à imputação do crime de difamação

  15. Não é de todo crível que a assistente tenha através um telemóvel guardado dentro de um bolso tenha ouvido ou percebido a conversa ao ponto de se sentir ofendida na sua honra e consideração

  16. A testemunha A contradiz os testemunhos anteriores ao dizer que a testemunha AS saiu do estabelecimento a falar ao telefone

  17. As contradições existentes e a dúvida gerada pela forma como a assistente terá tomado conhecimento dos factos, não alcançam a dignidade penal

  18. Na verdade a testemunha AS nem queria que a sua companheira apresentasse a queixa-crime que deu origem a este processo, sintomático de que os factos não mereceram a relevância que se lhes assaca na decisão proferida. Ele diz que ela chorou e fiou nervosa, mas humilhada não falou. 13:55

  19. Os pontos 1 (PARTE FINAL) 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12 e 13 da matéria de facto sempre terão que ser considerados como não provados

  20. Ainda que todos os factos em causa fossem dados como provados, não atingiriam a dignidade penal para merecer esta condenação em termos de crime de difamação. Beleza dos Santos refere que «nem tudo aquilo que alguém considere ofensa à dignidade ou uma desconsideração deverá considerar-se difamação ou injúria punível (...).” V. Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 92°, pág. 167

  21. Pois, ensina o Ac. do TR de Lisboa de , que “a proteção penal dada à honra e consideração e a punição dos factos lesivos desses bens jurídicos, só se justifica em situações em que objetivamente as palavras proferidas não têm outro conteúdo ou sentido que não o da ofensa, ou em situações em que, ultrapassada a mera suscetibilidade pessoal, as palavras dirigidas à pessoa a quem o foram, são verdadeiramente lesivas da honra e consideração do visado

  22. Da análise dos factos e inclusive da versão do arguido se percebe que em momento algum agiu o mesmo com dolo ou que quisesse com a conversa que manteve com a testemunha A ofender a honra e consideração da assistente

  23. O arguido considera excessiva e desproporcional pena aplicada face aos factos praticados e insuscetível de assegurar as finalidades que estão na base da punição

  24. É de notar que as necessidades de prevenção geral “encontram-se dentro da normalidade” como refere a própria sentença e as de “prevenção especial não assumem especial relevo posto que o arguido não regista antecedentes criminais e se mostra profissional, familiar e socialmente integrado”

  25. Entende o arguido, salvo melhor opinião em contrário, que a pena de multa de 90 (noventa) dias é exagerada face aos factos provados e às necessidades de prevenção geral e especial. A lei admite no artigo 47º do Código penal que a pena de multa tenha como limite mínimo 10 (dez) dias, ou muito próxima

  26. O arguido esta plenamente integrado na sociedade, tendo efetivamente um trabalho. Ao contrário do que é referido na sentença recorrida o grau da ilicitude dos factos não é de todo elevado, e tal entendem-se do cotejo das declarações da assistente e das testemunhas AS e A

    A

  27. A moldura penal do crime em questão atinge os 240 dias e in casu foi fixada uma pena superior a um terço da moldura penal

    BB) O arguido não agiu com dolo e o grau de culpa não é elevado, mas sim diminuto. Nem ficaram provados factos que demonstrem essa culpa agravada do arguido

    CC) Bem ainda se considera exorbitante o valor fixado em termos de indemnização cível e danos não patrimoniais. À luz da jurisprudência maioritária deste Tribunal e ao grau de ilicitude que efetivamente lhe deve ser assacado, o valor nunca poderá ser...

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