Acórdão nº 35/19.0T8ODM-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 08 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelALBERTINA PEDROSO
Data da Resolução08 de Outubro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Tribunal Judicial da Comarca de Beja [1] *****Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora[2]: I - RELATÓRIO 1. M…, A…, e J…, na qualidade de únicos herdeiros de A…, instauraram a presente acção declarativa sob a forma de processo comum contra os Réus V…, L…, e P…, pedindo a condenação destes no pagamento da quantia de 47.744,50 €, acrescida de juros legais a contar da citação até efectivo e integral pagamento.

Em fundamento da sua pretensão alegaram que o falecido A… era proprietário de um tractor agrícola, que foi penhorado pelo 3.º réu, agente de execução, no âmbito de um processo executivo para pagamento de quantia certa, instaurado pelo réu V… contra J…, filho do referido A…, pelo que este e, após a sua morte, a herança, deixaram de auferir os proventos que advinham dos serviços prestados com o referido tractor.

  1. Os RR. contestaram, por impugnação, e por excepção, invocando a incompetência material e a ilegitimidade dos 1.º e 2.º RR., tendo o 3.º R. deduzido incidente de intervenção de terceiros, visando a intervenção como parte principal ou subsidiariamente como parte acessória, da C… Seguros, S.A., invocando que: «Impõe o art. 123º, nº1 da Lei n. 154/2015, de 14 de Setembro, que os AE devem subscrever um contrato de seguro de responsabilidade civil profissional de valor não inferior a 100.000,00 €.

    Mais estatuindo o nº6 deste preceito legal, que os custos do referido seguro de responsabilidade civil podem ser suportados, total ou parcialmente, pela Ordem, relativamente aos associados que não tenham dividas de qualquer natureza para com aquela.

    A OSAE celebrou contrato de seguro com a O…Seguros S.A., NIPC 501 836 918, com sede na Avª … Porto Salvo, (apólice nºRC78572401) tendo por objecto garantir a responsabilidade extracontratual que, ao abrigo da lei, seja imputada ao segurado ou no exercício da actividade de AE, cobrindo as indemnizações legalmente exigíveis em consequência de danos causados a clientes ou a terceiros resultantes dos actos ou omissões cometidos durante o exercício da referida actividade.

    Apólice vigente à data dos factos geradores da responsabilidade profissional alegada pelos AA.. O 3º réu não tinha à data, dívidas à sua ordem profissional.

    Donde, a responsabilidade civil profissional do 3º réu está transferida para a chamada.

    Importa assim chamar à demanda a O… Seguros S.A., como parte principal, ou caso assim se não entenda, como parte acessória do 3º réu».

  2. Por decisão proferida em 25-06-2019, foi declarado que «o incidente de intervenção principal provocada é o incidente adequado para o 3.º réu assegurar a presença na causa da seguradora para a qual se encontrava transferida a responsabilidade civil decorrente da sua actividade profissional».

    Citada, a Seguradora deduziu contestação, alegando a prescrição do direito invocado pelos Autores, considerando que estando em causa direito fundado em responsabilidade extracontratual, será aplicável o prazo prescricional de três anos, pelo que, tendo o facto ilícito em causa (penhora do tractor) ocorrido em 25 de Janeiro de 2016, sendo também esse o dia em que os Autores tiveram conhecimento do mesmo, e que a Interveniente apenas foi citada em 02-07-2019, deve ser declarada a prescrição do direito contra si exercido e a sua absolvição do pedido.

  3. Autores e Réus, responderam, alegando, em suma, que a Seguradora não pode invocar de forma autónoma a prescrição e que a obrigação principal se reporta ao Segurado.

  4. Na audiência prévia, foi julgada procedente a excepção peremptória deduzida pela Interveniente O… Seguros, S.A., e determinada a sua absolvição do pedido.

  5. Inconformado, o 3.º Réu, agente de execução, apelou, finalizando a respectiva minuta recursória com as seguintes conclusões: «1. O Tribunal recorrido violou os art.s 146, nº1, 147º do RJCS, 323º, n.2 e 498º ambos do CC.

  6. Nos seguros obrigatórios, como o presente, a obrigação de indemnização não é autónoma para a seguradora, antes uma obrigação originária do segurado.

  7. A responsabilidade da companhia de seguros é de natureza contratual, fundada no contrato de seguro de responsabilidade, mediante o qual se comprometeu a substituir o segurado no pagamento de qualquer indemnização por este devida a terceiros, 4. É, assim uma posição subordinada, consentânea com a sua função de garante social nos seguros obrigatórios.

  8. Donde, o efeito interruptivo produzido na relação principal estende-se à relação subordinada».

  9. A Interveniente apresentou contra-alegações, pugnando pela improcedência da apelação, e no segmento relevante da sua minuta, concluindo que: «10. A prescrição pode interromper-se quanto à seguradora e não quanto ao segurado, aproveitando a prescrição apenas àquele que a invoca.

  10. A seguradora de responsabilidade civil pode invocar contra o lesado a prescrição do direito à indemnização mesmo que o segurado a não haja invocado.

  11. De facto, o lesado, conforme expresso no artº 146/1 RJCS, tem o direito de exigir o pagamento da indemnização diretamente do segurador. Todavia, esse direito termina após decorrido o prazo prescricional legalmente previsto.

  12. Assim, ao contrário do que o Recorrente quer fazer crer, a posição assumida pela seguradora no contrato de seguro em causa é autónoma face à do Tomador do Seguro, in casu, do Recorrente.

  13. Não o tendo realizado, isto é, tendo apenas intentado a ação contra o Réu, pode agora a seguradora arguir a prescrição, o que se alega para os devidos e legais efeitos».

  14. Observados os vistos legais, cumpre decidir.

    *****II. O objecto do recurso.

    Com base nas disposições conjugadas dos artigos 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º, e 663.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil[3], é pacífico que o objecto do recurso se limita pelas conclusões das respectivas alegações, evidentemente sem prejuízo daquelas questões cujo conhecimento oficioso se imponha, não estando o Tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos produzidos nas conclusões do recurso, mas apenas as questões suscitadas, e não tendo que se pronunciar sobre as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.

    Assim, vistas as conclusões do recurso, a única questão a apreciar respeita a saber se, não estando prescrita a obrigação do segurado (alegado lesante), pode ou não a seguradora da responsabilidade civil deste invocar e ver autonomamente declarada a prescrição a seu favor, do direito do alegado lesado.

    *****III – Fundamentos III.1. – De facto A factualidade relevante para a decisão do recurso é a seguinte: 1- A presente acção deu entrada em 18-01-2019; 2- O facto ilícito invocado pelos autores em fundamento do seu pedido indemnizatório, é a penhora de um tractor agrícola, realizada em 25-01-2016 pelo 3.º R., agente de execução, da qual o intitulado proprietário do referido tractor, tomou conhecimento no dia 28-01-2016[4].

    3- Citado, na sua contestação apresentada em 28-02-2019, o 3.º R., agente de execução, invocou a existência de seguro de grupo de responsabilidade civil, e requereu a intervenção da Ocidental, S.A.; 5- Admitida a intervenção principal, a Seguradora foi citada em 02-07-2019, e invocou a excepção de prescrição.

    *****III.2. – O mérito do recurso Como é consabido, e para o que ora importa considerar, são fonte das obrigações, nomeadamente da obrigação de indemnizar, o contrato, e a responsabilidade civil, nomeadamente por facto ilícito.

    A presente acção foi intentada com fundamento em responsabilidade civil extracontratual, com assento no artigo 483.º do Código Civil[5], decorrente da invocada ilicitude...

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