Acórdão nº 73/15.1GHSTC.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 18 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelMARTINHO CARDOSO
Data da Resolução18 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

I Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: Nos presentes autos de Processo Comum com intervenção de tribunal singular acima identificados, do Juiz 2 do Juízo de Competência Genérica de Santiago do Cacém, do Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal, o arguido EE foi, na parte que agora interessa ao recurso, condenado pela prática, em autoria material e na forma tentada, de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos art.º 203.º, n.º 1, 204.º, n.º 1 al.ª f), 22.º e 23.º, do Código Penal, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão efectiva.

2- Os motivos da discordância com a decisão contida na douta sentença, com a qual o arguido não se conforma, dizem respeito à escolha da pena aplicada- pena de prisão- e ao facto do julgador ter determinado a não suspensão da pena.

3- A moldura penal abstratamente aplicável ao crime de furto qualificado p. e p.pelo art. 204° n° 1 alinea f) do Codigo Penal é de pena de prisão até cinco anos ou pena de multa até 600 dias.

4- Por se tratar de tentativa, é aplicável a pena do crime consumado, especialmente atenuada (art 73° do código Penal) 5- Prescreve o art. 70° do Codigo Penal (Critérios da escolha da Pena):"Se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa de liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição" .

6-0 Mt Juiz do Tribunal "a quo" optou pela pena de prisão, o que se afigura, desde logo, injustificado.

7 -O ora recorrente tem 4 antecedentes criminais, dois dos quais se referem a factos praticados há mais de 20 anos e os crimes então cometidos são de natureza diferente daquele que está aqui em apreciação.

8- Dos dois crimes cometidos nas duas últimas décadas, existe uma única condenação por crimes contra o património. Trata-se da condenação no âmbito do proc.

---/13.0GHSTC pela prática de um crime de furto simples em que foi aplicada ao arguido uma pena de multa.

9- Tendo em consideração o modo de entrada no estabelecimento e os concretos bens subtraídos, dos quais os arguidos não se chegaram a apropriar e que foram integralmente recuperados, bem como o seu valor (não concretamente apurado, mas não inferior a 102,00 E), afigura-se que o grau de ilicitude não é elevado.

10- Face a este circunstancialismo e ao facto de o arguido ter averbada uma única condenação pela pratica de crimes contra o património, na âmbito do já mencionado proc.

---/13.0GHSTC em que lhe foi aplicada pena de multa, entendemos que também neste processo lhe deveria ter sido aplicada uma pena de multa.

11- Sem prescindir e por mera cautela de patrocinio, ainda se acrescentará que, mesmo que se optasse pela pena de prisão por se entender que a pena de multa já não satisfaz, in casu, as exigências de prevenção geral e especial, aquela deveria ter ser suspensa na sua execução, nos termos dos artigos 50 e segs.do Codigo Penal.

12- Pelos motivos já expostos na parte C deste recuso, que aqui damos por integralmente reproduzidos.

13- Não foi solicitado qualquer relatório social em relação aos arguidos e o recorrente não compareceu às sessões de julgamento, de modo que, na douta sentença recorrida, nada ficou a constar a respeito das condições de vida do arguido e da sua integração social, profissional e familiar.

14- O arguido ainda não teve qualquer contacto com o sistema prisional e é o cuidador e suporte dos pais, ambos septuagenários e doentes, que com ele residem e dele dependem para as tarefas do quotidiano (does 1 a 3).

15- Privá-los da sua companhia representaria para estes uma total ausência de apoio familiar.

16- Pelo exposto, entendemos que deve subsistir um juízo de prognose favorável em relação à conduta futura do arguido e que a pena de prisão aplicada, a manter-se, deverá ser suspensa na sua execução, ainda que subordinada a deveres ou à observância de regras de conduta.

17- Ao decidir pela aplicação de uma pena de prisão efectiva ao arguido EE, a douta sentença recorrida violou, por erro de interpretação e aplicação, o disposto nos artigos 70°, 40° e 50°, todos do Codigo Penal.

Nestes termos, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença recorrida e substituindo-a por outra que: - faça correcta interpretação e aplicação dos preceitos legais supracitados, condenando o arguido ora recorrente numa pena de multa; - caso assim se não entenda e se opte pela pena de prisão, deverá a mesma ser suspensa na sua execução, ainda que subordinada ao cumprimento de deveres ou à observância de regras de conduta.

A impugnação da sentença recorrida reconduz-se ao facto de, na opinião do arguido, a escolha da pena de prisão efectiva se afigurar excessiva, uma vez que, segundo alega, duas das condenações anteriores que o mesmo sofreu pela prática do mesmo crime “já contam com cerca de 20 anos”, sendo que das mais recentes apenas uma é pela prática de crime da mesma natureza, pelo que devia o tribunal ter optado pela pena de multa ou, no limite, ter aplicado uma pena de prisão suspensa na sua execução, pelo que conclui que o tribunal a quo violou os artigos 70.º, 40.º, e 50.º, todos do Código Penal.

  1. Alega o recorrente que as duas primeiras condenações referidas nos factos dados como provados contam com cerca de 20 anos, ao passo que a condenação datada de 2009 é pela prática de crime de natureza diversa (tráfico de estupefacientes) e, por fim, que a condenação pela prática de crime contra o património (portanto, da mesma natureza daquele em causa nos autos) é apenas uma, em que foi aplicada uma pena de multa.

  2. Contudo, convém recordar que esta última decisão, no processo n.º ---/13.0GHSTC transitou em julgado no dia 29.05.2014, sendo que os factos em causa nos autos foram praticados, pelo ora recorrente, no dia 19.02.2015, ou seja, menos de um ano após o trânsito da condenação em apreço. Daqui decorre que o arguido praticou os factos em causa nos presentes autos decorrido que se encontrava curto espaço de tempo após a sua última condenação pela prática de factos da mesma natureza. Não cremos, pois, que subsista qualquer dúvida acerca da ineficácia das sucessivas condenações de que o arguido foi alvo para a alteração dos seus comportamentos, em particular acerca da ineficácia da última condenação de que foi alvo. Na verdade, e como bem focou o Mm.º Juiz de Direito, estas circunstâncias revelam que as condenações anteriores, ao contrário do que pretende fazer crer o recorrente na motivação de recurso apresentada, “não tiveram no(s) arguido(s) a virtualidade de o(s) fazer moldar o seu comportamento conforme ao direito, tanto assim que voltou a delinquir e, precisamente, no mesmo crime”.

  3. Atento o teor da fundamentação ora transcrita, aliado ao que se acabou de referir, é patente que não houve qualquer violação do critério de preferência por sanções não detentivas plasmado no artigo 70.º do Código Penal, justamente na medida em que deve ser dada preferência à pena não privativa da liberdade quando esta satisfaça de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, pressuposto este que, neste caso, não se verificava, tendo andando bem o Mm.º Juiz de Direito ao optar pela aplicação, ao arguido, de uma pena de prisão.

  4. No que concerne à possibilidade de suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido, de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão, temos a referir que também aqui andou bem o Mm.º Juiz de Direito ao decidir como o fez.

  5. Vem o recorrente alegar que não compareceu às sessões de julgamento, de modo que, na douta sentença recorrida, nada ficou a constar a respeito das condições de vida do arguido e da sua integração social, profissional e familiar, bem como que este “é o cuidador dos pais, ambos septuagenários e doentes, que com ele residem e dele dependem”.

    Ora, o arguido não compareceu às sessões da audiência de julgamento realizadas no dia 25.10.2018 (tendo sido decidida a sua condenação na multa processual prevista pelo artigo 116.º, n.º 1 do CPP e a o início da audiência de julgamento, por se considerar que a sua presença não era imprescindível, nos termos do artigo 333.º, n.º 2 do CPP), no dia 31.10.2018 e no dia 06.11.2018.

  6. Desta forma, impediu o arguido que o Tribunal recolhesse elementos relativamente às suas condições económicas, familiares e sociais. A comparência na audiência de julgamento, além de um dever, afigura-se como um direito do arguido, do qual o mesmo se poderá fazer valer para, querendo prestar declarações quanto aos factos ou, ainda que não o pretenda, quanto às suas condições socioeconómicas. Não tendo o arguido comparecido às várias sessões realizadas, não tendo apresentado qualquer justificação, não pode agora, em sede de...

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