Acórdão nº 37/18.3T8OLH.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 10 de Setembro de 2020

Magistrado ResponsávelMARIA JOÃO SOUSA E FARO
Data da Resolução10 de Setembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

ACÓRDÃO I - RELATÓRIO 1. C…, Lda.

, intentou acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra J… pedindo seja declarado resolvido o contrato de arrendamento relativo ao imóvel identificado no artigo 1.º da petição inicial, com o consequente despejo imediato do Réu do arrendado, com vista à sua entrega à Autora livre e devoluto, e o Réu condenado a pagar, à mesma Autora, a quantia de €4.125,00, a título de rendas vencidas e não pagas, bem como as que se vencerem até à efectiva entrega do arrendado, acrescidas de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal.

Alegou, para tanto e em síntese, ser proprietária do prédio urbano identificado no artigo 1.º da petição inicial, o qual, por contrato escrito datado de 11.06.1986, foi dado de arrendamento ao Réu, pelo anterior proprietário, para habitação daquele, com início em 01.07.1986, e mediante o pagamento da renda mensal de 2.500$00, que fruto das sucessivas actualizações se cifra em €50,00 pelo menos desde 2012.

Referiu também que, por comunicação de 07.03.2013 por carta registada com aviso de recepção, fez transitar o contrato de arrendamento em apreço para o NRAU, com uma duração do contrato de 5 anos e renda de €75,00 mensais, por o Réu não ter rejeitado tal transição e montante de renda proposto, não tendo, contudo, o Réu pago qualquer das rendas que se venceram desde o mês de Junho de 2013.

Acrescentou, ainda, ter o Réu construído, sem autorização da Autora, nas imediações do arrendado, um abrigo para automóvel e um pavilhão para criação de pombos, e que deposita grandes quantidades de lixo, restos de máquinas e ferro velho no terreno que circunda o imóvel arrendado, o que proporciona abrigo a ratos e outros animais, maus cheiros, riscos de doença e de incêndio, levando a reclamações dos vizinhos.

O Réu apresentou contestação , excepcionando o pagamento de todas as rendas através de depósito na C… em nome da Autora, atenta a recusa desta, através do seu representante V…, em receber as rendas como até então, refutando a transição do contrato de arrendamento para o NRAU com a duração de 5 anos e renda mensal de €75,00, por ter exercido o seu direito de resposta em prazo, informando que requereu certidão do Rendimento Anual Bruto Corrigido à Autoridade Tributária.

Quanto às alegadas construções feitas pelo Réu, alegou que nunca o anterior proprietário se opôs, nem a Autora, até agora, desconhecendo quem colocou lixo e “ferro velho” no terreno adjacente, não tendo sido o Réu.

Procedeu-se à realização da audiência final, vindo subsequentemente a ser proferida sentença que julgou a acção improcedente, por não provada e, em consequência, absolveu o Réu de todos os pedidos formulados pela Autora.

  1. É desta sentença que, descontentada, recorre a Autora formulando na sua apelação as seguintes conclusões: i- Os procedimentos legais destinados a fazer transitar para o NRAU os contratos de arrendamento bem como a respectiva actualização de renda dependem de forma escrita e obedecem aos requisitos previstos nos arts 30º a 36º do NRAU (Lei 6/2006 na sua actual redacção).

    ii- A senhoria ora recorrente tomou a iniciativa de fazer transitar para o NRAU o contrato de arrendamento celebrado com o R mediante carta registada com A/R, datada de 07 de Março de 2013 propondo contrato a prazo certo com a duração de 5 anos e a renda mensal de 75,00€, cumprindo todos os demais requisitos exigidos pelo art.º 30 do NRAU na redacção vigente ao tempo.

    iii- O arrendatário, por carta datada de 25 de Março de 2013 acusou a recepção da carta da A e referiu que pediu uma certidão à autoridade Aduaneira e que “logo que a mesma esteja na sua posse dirá o que tiver por conveniente”.

    iv- A carta do R de 25 de Março de 2013 é uma declaração escrita que tem que ser interpretada nos termos do art. 236 e 238 do Cod. Civil com o sentido que um declaratário normal o entendesse, não podendo valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no seu respectivo texto.

    v- A declaração em causa é totalmente omissa relativamente a qualquer das alíneas dos nºs 3 e 4 do art. 31º do NRAU sobre as quais se podia e devia pronunciar, designadamente não se opõe ao valor da renda proposta, não se pronuncia sobre o tipo e duração do contrato proposto, nem alega que o RABC do seu agregado familiar fosse inferior a cinco RMNA.

    vi- O prazo para o arrendatário se pronunciar sobre as propostas do senhorio relativamente ao tipo e duração do contrato bem como a renda proposta e ainda para poder alegar que o seu agregado familiar auferia um RABC inferior a 5 RMNA é de 30 dias a contar da comunicação da proposta do senhorio nos termos previstos no art. 31º nº 1 do NRAU.

    vii- O R na carta que enviou à A datada de 25-03-2013 não se pronunciou sobre as propostas do senhorio relativamente ao tipo, duração do contrato e renda propostos, nem alegou que o seu agregado familiar auferia um RABC inferior a 5 RMNA, valendo a falta de resposta como aceitação do tipo de contrato, sua duração e montante da renda propostos, ficando o contrato submetido ao NRAU (art. 31º nº 10 do NRAU.

    viii- Apesar do o R ter comunicado à A que logo que estivesse na posse da certidão da AT diria o que tivesse por conveniente, o certo é que após ter recebido tal certidão, em 6 de Setembro de 2013 nada disse à A sobre o que tinha por conveniente, não se pronunciou sobre as alíneas do nº 3 do art. 31º do NRAU nem invocou qualquer das circunstancias previstas no nº 4 da mesma disposição legal, sendo certo que também já não o poderia fazer atento o disposto no nº1 do artigo 31º do NRAU.

    ix- O contrato de arrendamento transitou para o NRAU desde 1 de Julho de 2013 com o prazo certo de 5 anos e a renda mensal de 75,00€ (artigo 31º nº10 do NRAU).

    x- O R não pagou no mês de Julho de 2013 e nos seguintes a renda de 75,00€ que era devida.

    xi- O R depositou 50,00€ na C… no dia 9 de Julho de 2013 para pagamento da renda desse mês mas tal deposito não é liberatório por a renda ser de 75,00€, mas mesmo que fosse de 50,00€ também não era liberatório por ter sido depositado fora de prazo (art. 1039º do Cod. Civil), e nem tampouco foi comunicado ao senhorio (art. 19º da NRAU).

    xii- O deposito da indemnização de 50% efectuado pelo Reu em 26.04.2018 relativamente à renda depositada no dia 9 de Julho de 2013 não afasta a mora das rendas subsequentes (art. 1041º nº 3 e 4 do Cod. Civil) enquanto relativamente a elas o locatário não oferecer ao senhorio o pagamento da respectiva indemnização pelo mora (art. 1041º nº 3 e 4 e 1042º do Cod. Civil).

    xiii- O contrato de arrendamento celebrado entre A e R destinava-se à habitação deste e não comporta qualquer autorização para o mesmo proceder a obras no exterior do local arrendado.

    xiv- A A alegou e provou que o R construiu no exterior do local arrendado um pavilhão para criação de pombos e um abrigo para veículo automóvel nos termos que as respectivas fotografias documentam (factos provados 17 e 18) como era seu ónus, sendo ónus do Reu alegar e provar que não executou tais obras ou que as mesmas lhe foram autorizadas pelo senhorio, o que não logrou provar.

    xv- O R incumpriu o contrato de arrendamento ao não pagar durante mais de 3 meses a renda devida e ao efectuar obras que se não provou terem sido autorizadas o que constitui fundamento para resolução do contrato de arrendamento previsto no art.º 1083º nº 2 al. a), b) e nº 3 do Cod. Civil.

    xvi- Na douta sentença recorrida mostram-se violadas, por não aplicadas as disposições conjugadas dos artigos 19º nº 1 e 31º nº 10 do NRAU, artigos 236º, 238º, 1039º, 1041º, 1083º nº 1 e 2 todos do Cód. Civil.

    Nestes termos e nos mais de Direito aplicável a suprir doutamente por V. Exas. deve o presente recurso merecer provimento e em consequência ser revogada a douta sentença recorrida e substituída por uma outra que, julgando a acção procedente, declare resolvido o contrato de arrendamento decretando o despejo do local arrendado, com o que se fará a costumada J U S T I Ç A”.

  2. Não houve contra-alegações.

  3. O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões do recorrente, como resulta dos artigos 608º, nº 2, 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil.

    Assim, considerando o teor das conclusões apresentadas, importa proceder à reapreciação da decisão jurídica do caso abordando as seguintes questões: - Do procedimento de transição do contrato de arrendamento para o NRAU; - Do (in) cumprimento do dever de pagamento da renda e da (in) existência de fundamento para a resolução do contrato de arrendamento.

    II- FUNDAMENTAÇÃO i. É a seguinte a decisão da matéria de facto inserta na sentença recorrida e da qual não houve dissidência por parte da recorrente: “Discutida a causa, tendo em conta as regras do ónus da prova e de acordo com os temas de prova delineados, mostram-se provados os seguintes factos, com relevo para a sua boa decisão: 1. Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Olhão, sob o n.º …, da freguesia de Olhão, o prédio urbano sito na Rua 18 de Junho, composto por quatro compartimentos, inscrito na respectiva matriz sob o artigo ….

  4. Pela AP. 52 de 2001/05/24, foi inscrita a aquisição, por compra, da propriedade do prédio urbano...

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