Acórdão nº 390/20.9T8BNV.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Setembro de 2020

Magistrado ResponsávelJOSÉ ANTÓNIO MOITA
Data da Resolução24 de Setembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Proc. nº 390/20.9T8BNV.E1 Comarca de Santarém – Juízo Local Cível de Benavente Apelante: (…) Apelada: Águas do (…) EM, S.A.

*** Sumário do Acórdão (Da exclusiva responsabilidade do relator – artigo 663º, nº 7, do CPC) (…) *** Acordam os Juízes na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora no seguinte: I – RELATÓRIO (…), advogado com cédula (…), pleiteando em causa própria, residente na Rua dos (…), 77, em (…), Benavente, contribuinte fiscal n.º (…), veio intentar Procedimento Cautelar Comum, não especificado, com inversão de contencioso, contra Águas do (…) EM, S.A.

, NIF (…), com sede na Rua (…), n.º 38, Salvaterra de Magos, peticionando que seja ordenado o restabelecimento do fornecimento de água pela Requerida, com dispensa do contraditório face aos riscos para a saúde, quer do requerente e família, como da comunidade, de forma a evitar pôr em risco o fim da providencia e a efectividade do direito que se pretende acautelar sobretudo as medidas excepcionais por motivo de emergência sanitária inerentes ao Covid 19 face ao justo receio de lesão grave ou irreversível e de difícil reparação do direito que se visa proteger, mais requerendo a inversão do contencioso e a aplicação de sanção pecuniária compulsória por cada dia de incumprimento em montante a fixar pelo Tribunal.

Para o efeito alegou, em síntese, que tem a sua residência na Rua dos (…), 77, (…) e contratou com a Ré o fornecimento de água no referido local, acrescentando que perante as baixas temperaturas que se verificam em (…) no Inverno, e depois, perante à actual crise de Covid 19, deixou de se deslocar à freguesia para acautelar a sua família, sucedendo que em 19 de Maio de 2020 ali voltou, tendo, porém, sido inexplicavelmente surpreendido com o inusitado corte de fornecimento de água e retirada do contador, esclarecendo não ter recebido qualquer pré-aviso.

Mais alegou que em 05.05.2017 solicitou a alteração da morada, razão pela qual desconhece porque motivo a Requerida continua a querer notificá-lo em morada diversa e que os pré-avisos não foram enviados para a nova morada, sendo certo que caso tivessem sido enviados para a morada certa teria invocado a prescrição, como ora invoca.

Sustentou ainda que no dia 19 de Maio reclamou, solicitando a máxima urgência face aos cuidados de higiene inerentes à conjuntura do Covid 19 e que apenas em 12 de Junho a Requerida veio responder, dizendo não ser aplicável a Lei 7/2020.

Acrescentou que a lei não exclui qualquer cidadão, mesmo com dívidas existentes, sendo que não lhe foi dada a possibilidade de celebrar acordo de pagamento para regularizar a sua situação. E que apesar de ter manifestado a sua disponibilidade para regularizar a sua divida, a Requerida não permitiu o restabelecimento do serviço, entendendo que quaisquer que sejam as razoes que a Requerida possa ter nada justifica que não se tenha acautelado com 20 dias de antecedência com pré-aviso adequado, e menos ainda fazer “ouvidos de mercador” perante os pedidos de regularização da divida.

Continuou, invocando que tal situação tem-lhe provocado gravíssimos problemas e prejuízos, obrigou à separação da família por falta de condições mesmo em circunstancias normais, porque se tornou impossível o uso da casa de banho e da confecção de refeições e o lavar da roupa, entendendo ser de grupo de risco nas actuais circunstâncias pandémicas, em virtude de já ter 55 anos aumentando o grave e sério risco para a sua saúde, mais acrescentando que a atitude da Requerida, além dos prejuízos que provoca pela falta de água, põe em risco a vida e a segurança do Requerente e da sua família, ao não respeitar a imperatividade da Lei.

Conclui o seu arrazoado dizendo que a Requerida se recusa a restabelecer o fornecimento, ao mesmo tempo que continua a debitar novas mensalidades sem qualquer tipo de contraprestação e, bem assim, que não está em causa apenas a sua saúde e da sua família, mas a de toda a comunidade onde se inserem.

Tendo os autos sido conclusos à Mmª Juíza a quo foi proferida decisão de indeferimento liminar com o seguinte dispositivo: “Decisão: Nestes termos, por manifestamente improcedente, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 590.º, n.º 1 e 226.º, n.º 4, alínea b), do CPC: - Indefere-se liminarmente o procedimento cautelar requerido.

- Custas pelo requerente – cfr. art.º 539.º do CPC.

Valor do procedimento – € 2.000,01.

Notifique.” * Inconformado com a decisão, veio o Requerente interpor recurso de apelação da mesma para este Tribunal da Relação de Évora, alinhando as seguintes conclusões: “CONCLUSÕES: I. A matéria de facto provada conduzia a decisão a favor da procedência do pedido do Requerente face ao pedido de alteração de morada não assumida pelo Requerido que arrastou a nulidade do pré-aviso de corte, imperativo face ao regime do artº 5º da Lei 23/96, que se demonstra que foi feita para morada desactualizada – motivo que levou ao Requerente não só não a receber como ignorar o seu conteúdo, e cuja desconsideração levaria à condenação do Requerido a esse título peticionado e demais consequências legais; II. O pré-aviso feito pela requerida em 26 de Novembro de 2019 continha facturas prescritas aquando do corte de água de 28 de Janeiro de 2020 e jamais foi notificada para a nova morada alterada em 05-05-2017 pelo que é nula e sem qualquer efeito; III. A sentença limitou-se a ignorar a alteração de morada ao afirmar que dirigida a uma mandatária, não vinculava a requerida ao arrepio do artº 258º do CC – o que suscita nulidade da sentença face às alíneas c) e d) do artigo 615º do NCPC! IV. Logo a omissão de aplicação de lei, em circunstâncias em que é feita prova documental da alteração da morada logo o poder é vinculado mas conclui precisamente o contrário – com a inerente omissão de pronúncia – o que suscita nulidade da sentença face às alíneas b), c) e d) do artigo 615º do NCPC! V. O requerente requereu ao requerido a celebração de Plano de Pagamentos ao abrigo da Lei 7/2020, 10.04 e este literalmente nem respondeu ao arrepio do previsto no artº 5º da Lei 23/96.

VI. A sentença literalmente confirma o silêncio do requerido desatendendo o regime automático da lei 7/2020 10.04 a todas as dívidas após 20 de Março de 2020 das outras dívidas que deveriam ser regularizadas por Plano de Pagamentos para beneficiar do seu regime – o que suscita nulidade da sentença face às alíneas b), c) e d) do artigo 615º do NCPC! VII. A douta sentença entende o contrário suscitando uma intolerável discriminação e uma incompreensível inconstitucionalidade bem como violação do Direito Internacional rececionado ao discriminar claramente cidadãos protegidos e cidadãos não protegidos pela lei 7/2020, 10.04 – o que suscita nulidade da sentença face às alíneas b), c) e d) do artigo 615º do NCPC! VIII. Além do efeito pérfido do entendimento da douta sentença acabar por proteger uma fatura emitida pelo requerido da 2ª metade de Janeiro até à primeira metade de Fevereiro e com data de vencimento a 27 de Março logo dentro da previsão da lei 7/2020, 10.04 o que é aberrante considerar que a lei visa proteger credores... o que é inconstitucional ao violar o princípio da igualdade artº 13º da CRP – o que suscita nulidade da sentença face às alíneas b), c) e d) do artigo 615º do NCPC! IX. Além da Água é um direito, liberdade e garantia fora do catálogo mas a raiz dos outros como o direito à vida, direito à saúde, ao ambiente e qualidade de vida – o que suscita nulidade da sentença face à sua desconsideração como “prejuízo reparável” face à alíneas b), do artigo 615º do NCPC e inconstitucionalidade por violação artº 204º CRP! X. E depois a sentença remete-se a um total obscurantismo especulativo em considerar o escritório de advogado do requerente como inqualificavelmente como uma sua 2ª habitação sem ter qualquer base fáctica para semelhante ilação quando está registado como tal na Ordem dos Advogados e no próprio Citius – o que suscita nulidade da sentença face à alínea b), do artigo 615º do NCPC e inconstitucionalidade por violação artº 204º CRP! XI. Acresce que posição idêntica que já tínhamos confrontado com o pedido de apoio judiciário, insistindo a ilustre magistrada na entrega do requerimento por link eletrónico da Segurança Social ora com a sua entrega pessoal – pese embora não haver link electrónico e a própria lei indicar que a entrega pessoal nos casos excecionais a regulamentar.

XII. Pelo que é notório que toma posição pessoal e altera a lei em conformidade ou as chamadas condições sinépicas da decisão como Menezes Cordeiro chama – o que viola a lei… A sentença conclui ainda: XIII. - que o Requerente não fez o pagamento logo não existe a probabilidade séria do direito – mesmo depois da sentença ter ignorado a alteração da morada e mesmo do aviso de pré-corte ter sido notificado para morada errada – não tem o direito de aceder ao direito, liberdade e garantia de usufruir da água nem a sua esposa nem filhos no mesmo molde dos outros cidadãos mesmo nas circunstâncias excepcionais impostos pelo Covid 19; XIV. - mesmo ter requerido o Plano de Pagamentos e o requerido ter ilegalmente negado com o silêncio; XV. Sendo claro o perigo de lesão cfr. já descrito no contexto atual de pandemia sobretudo quando agora é inevitável uma segunda vaga e o perigo em que se traduz a privação em operações de simples higiene pessoal e da sua família e para a própria comunidade como é do domínio público em (…) vai agora neste preciso momento no segundo surto com 82 cidadãos brasileiros em isolamento social.

Pelo que o perigo que impende sobre a sua saúde e da sua família é real e atual! XVI. Mas a sentença conclui pelo contrário...

XVII. Isto sem esquecer a irrisoriedade do hipotético prejuízo desproporcional para o requerido como a fatura em anexo doc. 1 representa no total de € 8,69...

XVIII. Nos autos constatamos uma inclinação a proteger notoriamente a requerida mesmo sendo notório a sua incapacidade para gerir o vencimento das faturas bem como as alterações de...

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