Acórdão nº 2075/13.3GBABF.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 10 de Janeiro de 2023

Magistrado ResponsávelJOÃO CARROLA
Data da Resolução10 de Janeiro de 2023
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, os Juízes da 2.ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I.

No processo comum n.º 2075/1.3GBABF do Juízo Central Criminal ..., Comarca ..., o arguido AA foi submetido a julgamento e, realizada a audiência, foi proferido acórdão que o condenou: - Pela prática de um crime de burla qualificada, previsto e punido pelo artigo 217º e 218º, n.º 2, alínea a), do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos de prisão; - Pela prática de um crime de burla qualificada, previsto e punido pelo artigo 217º e 218º, n.º 2, alínea a) do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos de prisão; - Pela prática de um crime de burla qualificada na forma tentada, previsto e punido pelo artigo 217º e 218º, n.º 2, alínea a) e 22º do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão e, - Em cúmulo jurídico das penas parcelares acabadas de indicar, na pena única de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão.

Desta decisão condenatória veio o arguido interpor recurso, com os fundamentos constantes da respectiva motivação que aqui se dá por reproduzida e as seguintes conclusões: “1. Por intermédio da sentença recorrida, foi o Recorrente condenado, pela prática de dois crimes de burla qualificada e um crime de burla qualificada na forma tentada.

  1. O Recorrente não se conforma com a decisão contra si proferida.

  2. Primeiramente considera não ter a sentença dado como provado de forma correta a prova produzida em sede de julgamento, bem como ter sido valorado os fatos de forma equitativa, o que obstou a boa decisão da causa.

  3. Os ofendidos BB e CC sequer contactaram diretamente o recorrente, tendo acreditado numa história contacta por terceiros, o que não pode resultar numa culpa ao recorrente.

  4. Primeiro porque dos atos praticados pelo recorrente não resulta a incidência dos crimes a que vem o recorrente condenado, o que influi diretamente com a aplicação da pena.

  5. Não nos parece que tendo em conta os factos ora expostos e imputados ao Recorrente, seja proporcional a pena de prisão efetiva.

  6. Até porque a pena privativa de liberdade obstará a possibilidade de ressarcimento do dano efetivamente causado ao Sr. DD.

  7. Ademais, se a culpa é o limite máximo e inultrapassável na determinação da medida de qualquer pena, se atendermos ao facto de que do referido período até a presente data já decorreram mais de 10 anos sem nova incidência em novos crimes, tal facto também deverá ser valorado.

  8. Resultando que, na determinação da pena, o tribunal recorrido violou o art.º. 71º do C.P. – visto que errou na ponderação dos elementos atenuantes e agravantes.

  9. Pelo que, no limite deverá ser imposta outra pena, face a ausência do preenchimento do crime de burla qualificada na forma tentada, devendo no seu limite ser imposta uma pena passível de suspensão na sua execução.

  10. Na verdade o Tribunal a quo não analisou bem a prova produzida em sede de julgamento e aquela constante nos autos.

  11. Ora, o princípio da livre apreciação da prova é um princípio atinente à prova, que determina que esta é apreciada, não de acordo com regras legais pré-estabelecidas, mas sim segundo as regras da experiência comum e de acordo com a livre convicção do juiz, uma livre convicção que não pode ser arbitrária ou subjetiva e por isso, deve ser motivada. A motivação da convicção apresenta-se, pois, como o meio de controlo da decisão de fato, em ordem a garantir a objetividade e a genuinidade da convicção formada pelo tribunal.

    1 13. Nestes termos e nos melhores de Direito, deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência face a prova produzida em sede de julgamento, ser o recorrente condenado apenas e tão-somente aos crimes por si praticados, devendo ser aplicada uma pena que coadune aos atos praticados.

  12. Na medida em que a prova produzida impunha diversa consideração sobre a matéria de facto, pelo que a sentença recorrida incorre em erro notório na apreciação da prova. E de igual forma na aplicação da pena, ferindo de legalidade a sentença recorrida.

  13. Alterando-se a matéria de facto provada e balizando-se a livre convicção pelas provas objetivas constantes nos autos, tanto mais que as declarações das testemunhas, deverá esse Venerando Tribunal revogar a sentença condenatória quanto ao Arguido, devendo ser aplicada uma nova pena, suspensa na sua execução, com vista a ser possível a compensação do ofendido DD.

    1 ACSTJ de 11-07-2007. Consultado em www.dgsi.pt.” O M.º P.º respondeu, concluindo: “1 – O arguido AA, vem recorrer do douto Acórdão proferido nos autos à margem referenciados, que o condenou, pela prática de um crime de burla qualificada, previsto e punido pelo artigo 217.º e 218.º, n.º 2, alínea a), do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos de prisão; pela prática de um crime de burla qualificada, previsto e punido pelo artigo 217.º e 218.º, n.º 2, alínea a) do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos de prisão; pela prática de um crime de burla qualificada, na forma tentada, previsto e punido pelo artigo 217.º e 218.º, n.º 2, alínea a) e 22.º, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão; Em o cúmulo jurídico foi o arguido condenado na pena única de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão.

    2 – O recorrente entende que não foi produzida prova suficiente que permita a sua condenação pela prática de um dos crimes de burla.

    3 – Estriba tal entendimento no facto de nunca ter chegado sequer a falar com as testemunhas EE e FF, pessoas que supostamente desembolsaram os valores referidos no Acórdão recorrido e, como tal, não ser possível tê-los enganado astuciosamente.

    4 - A convicção do Tribunal Colectivo foi devidamente motivada, dando, assim, adequado e cuidadoso cumprimento ao dever de fundamentação.

    5 - O Tribunal formou a sua convicção através da conjugação de várias provas, designadamente: nas declarações do ofendido GG e das testemunhas HH, EE e II e no teor dos documentos juntos aos autos, em particular as declarações de fls. 194 e 196, elaborada pelo ofendido JJ a confirmar, respectivamente, o recebimento de €20.200,00 da testemunha BB, (datada de 24.10.2013) e de €10.500,00 da testemunha FF (datada de 24.10.2013).

    6 – Desses depoimentos conjugados e documentos não restam dúvidas de que os factos dados como provados tiveram pleno apoio na prova produzida em audiência.

    7 - Quanto à qualificação jurídica desses factos consideramos que nenhuma censura merece o d. Acórdão recorrido pois não há dúvida que são integradores do crime de burla qualificada pelo qual o arguido foi condenado.

    8 – Na verdade, face à matéria dada como provada concluímos que o arguido actuou com astúcia produzindo um erro/engano no ofendido GG e que foi essa actuação que determinou o seu enriquecimento ilegítimo, com o correspondente prejuízo patrimonial que veio a ser sofrido pelas testemunhas EE e FF.

    9 - Esta circunstância, em nada “afecta” o preenchimento dos elementos do tipo já que, como se retira da letra da lei, o prejuízo patrimonial pode ser do sujeito passivo ou de terceiro.

    10 – O tribunal não errou no doseamento das penas parcelares e única.

    11 - O crime de burla qualificada é punido com pena de prisão de 2 a 8 anos e o arguido foi condenado, pela prática de dois crimes de burla qualificada e um crime de burla qualificada tentada, na pena única de 6 anos e 6 meses de prisão.

    12 - O Acórdão a quo tomou em linha de conta todas as circunstâncias impostas: o grau de ilicitude acentuado, atento nomeadamente aos valores de que o arguido se apropriou, ao dolo directo, e às elevadas exigências de prevenção especial, tendo o arguido antecedentes criminais pela prática de crimes da mesma natureza.

    13 - Para além destes aspectos, não podem também deixar de se considerar, como fez o tribunal, as fortíssimas exigências ao nível da prevenção geral.

    14 - No que concerne à eventual suspensão da pena, considerando que se pugnou pela manutenção da pena concreta aplicada de 6 anos e 6 meses de prisão não se mostram reunidos os pressupostos do disposto no art. 50.º, do Código Penal, que apenas se refere a penas de prisão de medida não superior a 5 anos.” Termina no sentido de não merecer censura a decisão recorrida.

    Neste Tribunal, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta teve vista nos autos, elaborando parecer em que, aderindo à resposta ao recurso já apresentada, propugna pela improcedência do recurso.

    Foi dado cumprimento ao artigo 417.º n.º 2 do C.P.Penal, o arguido ofereceu resposta em que reitera o que alegou na motivação.

    II.

    Colhidos os vistos legais, procedeu-se a conferência, cumprindo agora apreciar e decidir.

    Antes de elencarmos as questões suscitadas no recurso importa tecer duas ou três observações quanto ao modo como o recurso se mostra interposto. Assim, a primeira dirige-se à divergência entre o que consta da motivação e o que consta das conclusões, em termos de clara não convergência decorrente de uma não integral observância do disposto no art.º 412º n.º 1 CPP - “…termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido.” – uma vez que, enquanto naquela enuncia “as questões a decidir são as seguintes: - Impugnação da matéria de facto dada como provada - o Tribunal a quo julgou incorretamente os factos constantes da acusação no que tange a incidência do crime de burla qualificada quanto aos ofendidos BB e CC…”, nestas esse aspeto impugnativo mostra-se omisso.

    Poder-se-ia dizer que essa divergência seria ultrapassável mediante o convite ao aperfeiçoamento das conclusões previsto na primeira parte do n.º 3 do art.º 417º CPP [“Se das conclusões do recurso não for possível deduzir total ou parcialmente as indicações previstas nos n.os 2 a 5 do artigo 412.º, o relator convida o recorrente a completar ou esclarecer as conclusões formuladas, no prazo de 10 dias, sob pena de o recurso ser rejeitado ou não ser conhecido na parte afetada.”], mas esse convite mostra-se comprometido pelo facto de, na própria motivação, não se mostrar indicado em concreto...

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