Acórdão nº 285/07.1TBMIR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 08 de Abril de 2008
Magistrado Responsável | HENRIQUE ANTUNES |
Data da Resolução | 08 de Abril de 2008 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: 1.
Relatório.
A... e cônjuge, B..., propuseram, no Tribunal Judicial da Comarca de Mira, contra C..., procedimento cautelar comum, pedindo a condenação do último a permitir a sua passagem momentânea pelo prédio daquele, possibilitando o acesso dos seus contratados, materiais, ferramentas, assim como a colocação de andaimes pelo período de um mês.
Deduzida a oposição e realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que, com fundamento no facto da providência cautelar não especificada mais que conservar o direito, exercê-lo-ia e de o processo próprio para levar a cabo a pretensão ser uma acção de suprimento consentimento (artº 1425.º ss. do Código de Processo Civil), processo, por sinal de jurisdição voluntária, com a potencialidade de ser bem expedito, julgou improcedente a providência e absolveu o requerido do pedido.
Os requerentes pedem, por via do recurso de agravo, a revogação dessa decisão e a sua substituição por outra que decrete a providência, tendo condensado as suas alegações nas conclusões seguintes: […] O recorrido não respondeu.
2.
Factos provados.
[...] 3.
Fundamentos fáctico-conclusivos e jurídicos.
3.1.
Delimitação do objecto do recurso e enunciação das questões concretas controversas a decidir.
Além de delimitado pelo objecto da acção e pelos eventuais casos julgados formados na instância recorrida e pela parte dispositiva da decisão impugnada que for desfavorável ao impugnante, o âmbito do recurso pode ser limitado pelo próprio recorrente. Essa restrição pode ser realizada no requerimento de interposição ou nas conclusões da alegação (artº 684 nºs 2, 1ª parte, e 3 do CPC).
Nestas condições, a questão concreta controversa que importa resolver é, assim, a de saber se a sentença impugnada deve ser revogada e, consequentemente, substituída por acórdão que decrete a providência.
Tendo em conta o conteúdo da sentença cuja reapreciação é pedida e das conclusões da alegação dos recorrentes, a resolução da referida questão pressupõe o exame das finalidades e dos pressupostos das providências cautelares não especificadas e a determinação do seu objecto e do da causa de que constituem dependência.
Para recusar a providência a decisão impugnada adianta dois argumentos: a procedência da providência mais do conservar o direito, exercê-lo-ia; o processo próprio para levar a cabo a pretensão é uma acção de suprimento do consentimento (artº 1425.º ss. do Código de Processo Civil), processo, por sinal, de jurisdição voluntária, com a potencialidade de ser bem expedito. Deste raciocínio extraiu a conclusão que não se trata de uma providência antecipatória ou conservatória, o que inviabiliza a procedência do procedimento.
Demonstrando-se que qualquer destas razões não colhe e que se verificam, no caso, os requisitos de que a lei faz depender a concessão da providência, a revogação da decisão recorrida é meramente consequencial. É a essa demonstração que se dirigem as considerações subsequentes.
3.2.
Finalidades e pressupostos da providência cautelar não especificada.
Como é natural, nem sempre a regulação dos interesses conflituantes pode aguardar o proferimento de uma decisão definitiva do tribunal que resolva, de modo definitivo, o conflito. Por vezes, torna-se necessário obter uma composição provisória da situação controvertida antes da decisão definitiva.
Nos termos gerais, tal composição provisória justifica-se sempre que ela seja necessária para assegurar a utilidade da decisão ou a efectividade da tutela jurisdicional (artº 2 nº 2, in fine, do CPC).
Na verdade, o direito fundamental, de matriz constitucional, de acesso aos tribunais inclui, desde logo como sua dimensão ineliminável, o direito de acção (artº 20 nº 1 da CR Portuguesa). Mas o direito de acesso aos tribunais e de acção não é garantia suficiente. A tutela disponibilizada pelos tribunais deve ser efectiva (artº 20 nº 5 da CR Portuguesa). O princípio da efectividade da tutela judicial não é garantido apenas quando os direitos são efectivamente violados – mas igualmente quando exista o perigo dessa lesão. O princípio da tutela judicial efectiva exige, por isso, a existência de procedimentos cautelares de carácter urgente, destinados, precisamente a esconjurar o perigo de lesão dos direitos.
Maneira que pode dizer-se que a todo o direito corresponde uma acção ou um procedimento não apenas para fazê-lo reconhecer – mas igualmente destinada a prevenir a violação dele ou a assegurar o efeito útil daquele reconhecimento (artº 2 nº 2 do CPC).
A tutela processual provisória decorrente das decisões provisórias e cautelares é instrumental perante as situações jurídicas decorrentes do direito substantivo, porque o direito processual é meio de tutela dessas situações. A composição provisória realizada através da providência cautelar não deixa de se incluir nessa instrumentalidade, porque também ela serve os fins gerais de garantia que são prosseguidos pela tutela jurisdicional[1].
A composição provisória que a providência cautelar torna disponível pode visar uma de três finalidades: aquela composição pode justificar-se pela necessidade de garantir um direito, de definir uma regulação provisória ou de antecipar a...
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