Acórdão nº 275/05.9TBCTB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Abril de 2008

Magistrado ResponsávelHÉLDER ROQUE
Data da Resolução01 de Abril de 2008
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA: A....., casada, farmacêutica, residente em……., propôs a presente acção contra B.....e mulher, C....., ambos residentes na ……, pedindo que, na sua procedência, seja declarado resolvido o contrato de arrendamento subsistente entre a autora e os réus, condenando-se estes a despejar o locado, imediatamente, livre de quaisquer pessoas e bens, restituindo-o ao estado em que se encontrava, ressalvadas as deteriorações inerentes a uma prudente utilização, conforme aos fins do contrato, condenando-se ainda os réus a pagar à autora as rendas vencidas, no montante de 4788,48€, e vincendas, até à efectiva entrega do locado, acrescidas dos respectivos juros de mora, invocando, para o efeito, e, em síntese, que deu de arrendamento ao réu marido a fracção autónoma, infradiscriminada, destinada ao comércio, pela remuneração mensal de 9576,92€, que deixou de ser paga, desde Agosto de 2004.

Na contestação, os réus, para além do que ainda interessa considerar, com vista à decisão do mérito da apelação, confessam os factos alegados pela autora e, em reconvenção, pedem a condenação desta a pagar-lhes a quantia global de 68785,03€, a título de benfeitorias realizadas no locado, devidamente autorizadas pela autora, operando-se, eventualmente, a compensação com qualquer quantia que os réus, por seu turno, venham a ser condenados a pagar à autora.

Na réplica, a autora alega que não autorizou a realização de quaisquer obras, por parte dos réus, as quais não têm qualquer utilidade para o arrendado.

A sentença julgou a acção, procedente por provada, e, consequentemente, ao abrigo do estipulado pelos artigos 63º, nº 2, 64º, nº 1, a) e d), 56º, nº 3, do RAU, 216º, nºs 1, 2 e 3, 479º, nº 1, 1046º, 1273º e 1275º, do Código Civil, decretou a resolução do contrato de arrendamento celebrado entre a autora e o primeiro réu [a], condenou os réus/reconvintes no pagamento das rendas vencidas, entre Agosto de 2004 e Abril de 2006, inclusive, sendo a renda mensal de 798.08€, acrescidas de juros de mora, desde os respectivos vencimentos, à taxa legal, na ocasião, de 10,58%, (vd. Aviso nº 190/2007 (extracto), in Diário da República, II Série, nº 4, de 5 de Janeiro de 2007) e até efectivo e integral pagamento [b], julgou extinto, por inutilidade superveniente da lide, o pedido quanto à restituição do arrendado à autora [c] e condenou a autora/reconvinda, no pagamento da quantia de 13.130,85€, devida desde a notificação do pedido reconvencional, à qual acrescem juros, à taxa legal, então, de 10,58%, referida, e até efectivo e integral pagamento.

Desta sentença, a autora interpôs recurso de apelação, terminando as alegações com o pedido da sua revogação e substituição por outra que a absolva do pedido reconvencional, formulando as seguintes conclusões: 1ª – As respostas aos pontos nºs 2, 3, 4, 5, 6, 7, 9, 12, 13 e 14 pecam por deficiência e por contradição com as respostas dadas aos pontos nºs 15 e 16 da base instrutória.

  1. – Tais respostas deveriam ser referidas da seguinte ou equivalente expressão: “…sem qualquer utilidade para a A.”.

  2. – As respostas dadas por esta forma e em tal sentido eliminariam não só a sua deficiência com a contradição entre elas e as respostas dadas aos pontos nºs 15 e 16 da base instrutória.

  3. – Deve, pois, a sentença ser revogada e substituída por outra que dê como provados os factos constantes dos pontos nºs 2, 3, 4, 5, 6, 7, 9, 12, 13 e 14 pela forma que se referiu em 2.

  4. – A sentença ora em recurso violou, pelo menos, as seguintes disposições legais: artigo 1043º, nº 1, do CC, 56º, nº 3, 64º, nº 1, d) e 89º-A do RAU, 216º, nº 3, 1273º e 1275º, estes todos do CC.

Nas suas contra-alegações, os réus defendem que devem ser mantidas as respostas questionadas, dado tratar-se de benfeitorias que ficaram a fazer parte integrante do locado, devendo o seu valor ser levado à compensação.

* Tudo visto e analisado, ponderadas as provas existentes, atento o Direito aplicável, cumpre, finalmente, decidir.

As questões a decidir, na presente apelação, em função das quais se fixa o objecto do recurso, considerando que o «thema decidendum» do mesmo é estabelecido pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, com base no preceituado pelas disposições conjugadas dos artigos 660º, nº 2, 661º, 664º, 684º, nº 3 e 690º, todos do Código de Processo Civil (CPC), são as seguintes: I – A questão da alteração da decisão sobre a matéria de facto.

II – A questão da qualificação das obras realizadas pelos locatários.

III – A questão da indemnização.

I. DA ALTERAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO A autora sustenta que as respostas dadas aos pontos nºs 2, 3, 4, 5, 6, 7, 9, 12, 13 e 14 da base instrutória, deveriam ser referidas da seguinte ou equivalente expressão, ou seja, “…sem qualquer utilidade para a A.”.

Independentemente da prévia audição da prova objecto de gravação, no que contende com os pontos da matéria de facto em que a autora suscitou a respectiva alteração, importa, desde já, considerar que esta pretende, em relação aos vários pontos da base instrutória onde se questiona se os réus efectuaram determinadas obras no locado, introduzir respostas, de natureza explicativa ou restritiva, quais sejam as de que as mesmas não revestiram “…qualquer utilidade para a autora”.

Tem a ver este propósito da autora com a necessidade de alcançar a absolvição no pedido reconvencional, onde os réus, com fundamento na realização de benfeitorias, pretendem a condenação daquela no pagamento do valor das que se provaram ter sido realizadas.

Estipula o artigo 216º, nº 1, do Código Civil (CC), que se consideram benfeitorias “…todas as despesas feitas para conservar ou melhorar a coisa”.

Estas despesas correspondem a trabalhos ou obras de vária ordem, realizados na própria coisa bonificada, ou à satisfação, ou, em todo o caso, à extinção de encargos que pesam sobre ela, visando a própria coisa, a sua utilidade ou melhoria permanentes, ao contrário do que sucede com as despesas de frutificação que se destinam a preparar e, portanto, um resultado transeunte[1].

As benfeitorias, ou melhor, a obra em que elas se concretizam, tem vocação de perenidade, intervindo na substância da coisa, enquanto que os frutos têm como marcas caractereológicas a produção periódica e a não afectação da substância da coisa.

Assim, os frutos, enquanto não separados, não constituem um objecto próprio, fazendo parte integrante, até esse momento, do objecto que os produz, sendo seu proprietário quem for o titular deste.

Quer isto dizer que, para as benfeitorias, ao...

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