Acórdão nº 46/04. 0GTLRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 16 de Julho de 2008

Magistrado ResponsávelELISA SALES
Data da Resolução16 de Julho de 2008
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

NM veio interpor recurso da sentença que o condenou, pela prática de dois crimes de homicídio por negligência grosseira p. e p. pelo artigo 137º, n.ºs 1 e 2 do Código Penal, na pena de 1ano e 7 meses de prisão, por cada um deles, e ainda pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez p. e p. pelo artigo 292º, n.º 1 do mesmo Código, na pena de 3 meses de prisão.

Em cúmulo jurídico foi condenado na pena única de 3 anos de prisão, cuja execução ficou suspensa pelo período de 3 anos.

Foi ainda o arguido condenado na pena acessória de proibição de conduzir pelo período de 5 meses, nos termos do artigo 69º, n.º 1, al. a) do CP.

Da motivação extraiu as seguintes conclusões ([1]): 1) Conforme resulta de fls. 137 a 139, foi deduzida acusação contra o arguido: "Cometeu, em concurso efectivo, um crime de homicídio negligente, previsto pelo artigo 137º, n.º 1 do C.P., ..., e um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto no artigo 292° do C.P.; 2) O arguido apresentou a contestação, conforme resulta de f1s. 167 a 168; 3) Foi realizado o julgamento e a final o Meritíssimo Juiz a fls. 253, decidiu: "Assim, verificando-se a existência de três crimes p. e p. nos termos do artigo 137°, n.º 2 e 292° n.º 1 do C.P., em concurso real, verifica-se incompetência do Tribunal singular bem como a alteração substancial. ... Atenta à posição dada pela defesa e arguido, sendo certo que o facto normativo novo é constituído por um novo crime de homicídio por negligência, o certo é que deverão os autos seguirem totalmente para o Ministério Público desta comarca, uma vez que é eficiente e útil o julgamento unitário respeitante aos três crimes em causa"; 4) Na sequência de tal Despacho, a fls. 257, 258 e 259, foi deduzida nova acusação; 5) Nesta acusação foi o arguido acusado de: "Cometeu, em concurso efectivo, dois crimes de homicídio negligente, previstos pelo artigo 137°, n.º 2 do C.P., ..., e um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto no artigo 292° do C.P."; 6) A fls. 269., o arguido requereu a abertura da instrução, e alegou o que dela consta; 7) Foram inquiridas as testemunhas e disseram o que aí consta de f1s. 298 a 300; 8) A fls. 302 a 310., foi deduzida pronúncia; 9) O arguido apresentou a sua contestação a fls. 330 a 335 e disse o que acima se transcreveu para melhor apreciação neste recurso; 10) Foi realizado julgamento, e das provas que o arguido requereu, algumas foram indeferidas, sem qualquer fundamento por parte do Tribunal; 11) Não se entende como neste caso em concreto, como é possível indeferirem-se provas requeridas e com interesse importante para as questões em apreço, nomeadamente as solicitadas sobre os números 1 e 2 do pedido final (aqui se referindo o recorrente à contestação); 12) O indeferimento é ilegal e inconstitucional: 13) Foi realizado julgamento e a final foi decidido: " Condenar o Arguido NM como Autor material e em concurso real de dois crimes de homicídio por negligência grosseira, p. e p. no artigo 137°, n.° 2 do Código Penal, e ainda, como Autor material de um crime de condução em estado de embriaguez, na pena de 3 meses de prisão; Condenar o Arguido em cúmulo jurídico na pena única de 3 anos de prisão: ...

decide-se suspender a execução da pena de prisão aplicada pelo período de 3 anos; Condenar o Arguido na pena acessória de proibição de conduzir pelo período de 5 meses; ... ; 14) Para chegar a esta decisão, entende o Meritíssimo Juiz, nomeadamente na parte destinada aos FACTOS CONSIDERADOS PROVADOS, pelo depoimento das testemunhas indicadas pela acusação, não dando qualquer relevância ao depoimento das testemunhas arroladas pelo Arguido, que apesar de não terem assistido EFECTIVAMENTE aos factos descritos na acusação, têm conhecimento da forma como o Arguido conduz, e da forma de como ele é prudente e cauteloso no decorrer da sua vida; 15) Como o depoimento das testemunhas foi gravado, se requeria a renovação da prova, nos termos do artigo 4300 do Código do Processo Penal; 16) O que desde já aqui se requer; 17) Atendendo à prova produzida em audiência de julgamento nunca se poderia condenar o arguido, pois decidir-se como se decidiu, viola as regeras elementares do C.P.P. e C.P. aplicáveis ao caso em apreço, nomeadamente o princípio "in dubio pro reo"; 18) Para contrariar o que consta da sentença recorrida, requerer-se a audição do depoimento das testemunhas que se encontra gravado, sendo necessário para o efeito que a secção transcreva tais depoimentos de forma a que esse Venerando Tribunal possa apreciar convenientemente tudo o que se passou nas audiências de julgamento; 19) O que se passou e provou na audiência de julgamento é aquilo que resulta do depoimento das testemunhas inquiridas, e que é o que se encontra gravado, e não o que consta da sentença recorrida; 20)Tendo em conta a prova produzida em sede de audiência, nomeadamente o depoimento de todas as testemunhas inquiridas durante o julgamento, nunca se poderiam ter dado como provados os factos indicados sob os pontos n.º 14., 15, 16, 17., 18., 19., 20., 21. e 22., dos factos dados como provados na decisão recorrida, nomeadamente os seguintes factos: O acidente ficou a dever-se ao facto do Arguido, na ocasião, ter assumido um tipo de condução descuidada e leviana, não cuidando, como lhe era exigível e possível, de despistar, considerando que circulava numa localidade e em local onde não podia exceder a velocidade de 50Km/hora; E à circunstância de imprimir ao seu veículo uma velocidade que não era adequada e permitida para o local, por ser muito elevada, superior a 50 km/hora, motivando perda de controlo da viatura; Aquele conhecia bem a estrada onde ocorreu o acidente por ali passar a frequência; O Arguido, na ocasião, foi submetido ao teste de pesquisa de álcool no sangue, tendo acusado uma taxa de álcool no sangue de 1,99 gramas por litro; A mesma era resultante da ingestão voluntária de bebidas de teor alcoólico antes feita por aquele; O mesmo sabia as características e natureza das bebidas que ingeria, bem como das suas competências; Sabia que não podia conduzir veículos automóveis na via pública com uma TAS semelhante à acima indicada; O Arguido assumiu uma condução a uma velocidade superior à aconselhada para o local, não conseguindo dominar o veículo, e levando-o despistar-se; Ao mesmo era exigível e possível adoptar outra forma de condução, assim evitando o despiste da viatura; O arguido actuou de forma livre e consciente, bem sabendo que a sua conduta lhe era proibida por lei; 21) No caso dos autos, nenhum dos factos dados como provados, nomeadamente os que se deixaram supra destacados tem suporte na prova produzida em audiência; 22) Bastaria, para esse efeito, ter em conta a prova produzida em julgamento, nomeadamente nos depoimentos das testemunhas de defesa, nomeadamente: LS, conforme depoimento registado em duas fitas magnéticas desde o nº 1425 ao nº 1688 do Lado B e cassetes 2, desde o nº 0000 ao nº 0730 do Lado A referente aos presentes autos - PG, conforme depoimento registado em duas fitas magnéticas, cassete nº 2 desde o nº 0731 ao nº 1315 referente aos presentes autos - JC, conforme depoimento registado em duas fitas magnéticas, cassete 2 desde o nº 1316 ao nº 1537 referente aos presentes autos - CF, conforme depoimento registado em duas fitas magnéticas cassete 2 desde o nº 1538 ao nº 1678 e cassete 3 desde o nº 0000 ao nº 0877 referente aos presentes autos - PO, conforme depoimento registado em duas fitas magnéticas. cassete 3 desde o nº 0878 ao nº 1031 - DS, conforme depoimento registado em duas fitas magnéticas, cassete 3 desde o nº 1032 ao nº 1132 referente aos presentes autos - TA, conforme depoimento registado em duas fitas magnéticas, cassete 3 desde o nº 1133 ao nº 1211 referente aos presentes autos; 23) Elementos de prova estes, que, se fossem devidamente tidos em conta pelo Tribunal "a quo" impunham uma decisão diversa daquela que foi tomada na decisão recorrida no que diz respeito à matéria de facto; 24) Mesmo analisando o que foi dito pelas testemunhas de acusação, não é possível condenar-se o arguido 25) Os Elementos de prova que foram analisados em audiência de julgamento, impunham uma decisão diversa daquela que foi tomada na decisão recorrida no que diz respeito à matéria de facto e de direito consequentemente; 26) Mesmo que se entendesse como devidamente apurada a matéria de facto indicada na decisão recorrida, ainda assim, cremos não estarem reunidos os elementos do tipo legais para que fosse o arguido condenado como autor material de dois crimes de Homicídio Negligente Grosseira; 27) É considerado Negligência Grosseira quando sobre o agente recaia um particular dever de representar que pode resultar um evento mais grave, nomeadamente a morte de alguém, sendo a sua actuação particularmente censurável, sendo considerada como grosseira; 28)Tendo em conta toda a prova produzida, tal circunstância não se encontra concretizada, pois ninguém viu o arguido ingerir bebidas alcoólicas, não se provou o nexo de causalidade entre a taxa de álcool imputada ao arguido, o despiste e a conduta do Arguido - qual conduta, pois até hoje não se sabe quem conduzia a viatura e em que circunstâncias ocorreu o acidente; 29) Desta forma nunca poderia o Arguido ter sido condenado por dois crimes de Homicídio Negligente Grosseiro; 30) Mesmo que os factos dados como provados, nomeadamente os já referidos nesta peça processual, fossem devidamente apurados, que não foram, ainda assim a conduta do agente não é susceptível de integrar o crime previsto pelo artigo 137°, n.º 2 do Código Penal; 31) Era necessário que do comportamento do arguido resultassem elementos objectivos que permitam concluir que o agente praticou os factos constantes da acusação; 32) Nunca podia o Arguido ser condenado pela norma do artigo 137°, n.º 2 do Código Penal, conforme erradamente se entendeu na decisão recorrida; 33) Se fosse dado provimento à tese de acusação e que teve acolhimento...

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