Acórdão nº 44/03.0IDPBL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Outubro de 2008
Magistrado Responsável | JORGE GONÇALVES |
Data da Resolução | 15 de Outubro de 2008 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
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No processo comum com intervenção do tribunal singular n.º 44/03.0IDPBL, do 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Pombal, o Ministério Público deduziu acusação contra … e a …, ambos melhor identificados nos autos, imputando-lhes: · ao primeiro arguido, a prática, em concurso efectivo, de três crimes de abuso de confiança fiscal p. e p. pelos artigos 105.º nºs 1, 2 e 4 do RGIT (Lei n.º 15/01 de 5.6); de uma contra-ordenação p. e p. pelo artigo 29.º do RJIFNA quanto aos factos anteriores a 5/6 e pelo artigo 114.º do RGIT quanto aos factos ocorridos após 5/6, por infracção ao disposto nos artigos 14.º e 17.º do Código de Imposto de Selo (pela falta da entrega de imposto de selo do exercício de 2001); de uma contra-ordenação p. e p. pelo artigo 119.º do RGIT, por infracção do disposto nos artigos 20.º e 98.º do IRC (omissão de proveitos em sede de IRC); de uma contra-ordenação p. e p. pelo artigo 114.º do RGIT, por infracção do disposto no artigo 26.º do CIVA (por falta de entrega de valores do IVA); · à arguida sociedade imputou-se a responsabilidade criminal pelos aludidos ilícitos, nos termos dos artigos 6.º, 7.º, 8.º e 9.º da Lei n.º 15/01 de 5/6.
O Ministério Público, em representação do Estado Português, deduziu contra os arguidos pedido de indemnização da quantia de 7 714,45 €, sendo 5 408,87 de IVA em falta acrescido de juros, 928,87 referente ao imposto do selo e 839,71 referente ao IVA, acrescendo os juros de mora vencidos e vincendos até ao efectivo pagamento.
Efectuado o julgamento, o arguido … foi condenado, como autor material de três crimes de abuso de confiança fiscal p. e p. pelo artigo 105.º da Lei n.º 15/01, na pena de 120 dias de multa para cada um deles, à taxa diária de 3 € e, em cúmulo jurídico destas penas, foi condenado na pena única de 280 dias de multa à taxa diária de 3 €, perfazendo a multa global de 840 €. Por sua vez, a arguida-sociedade foi condenada, pelos três crimes de abuso de confiança fiscal, na pena de 200 dias de multa para cada um deles, à taxa diária de 7,00 € e, em cúmulo jurídico, na pena única de 450 dias de multa, à taxa diária de 7,00 €, perfazendo a multa global de 3 150 €.
A sociedade … foi ainda condenada nas seguintes coimas: pela falta do pagamento do IS na coima de 928,87 €; pela falta de apresentação dos proventos a nível do IRC na coima de 500 € e pela falta do pagamento do IVA na coima de 839,71 €, totalizando o montante das coimas a quantia de 2 267,58 €.
Mais foram os arguidos condenados solidariamente a pagarem ao Estado Português a quantia global de 7 714,45 € a que acrescem juros à taxa de 4% calculados desde 23/11/03 e contados até efectivo pagamento (cfr. sentença de 7 de Janeiro de 2005, fls. 270 e seguintes).
Interposto recurso pela arguida-sociedade, foi proferido acórdão por esta Relação de Coimbra que declarou nula a sentença por inobservância do disposto no artigo 374.º, n.º2, do Código de Processo Penal (cfr. fls. 340 e seguintes).
Proferida nova sentença pela 1.ª instância, foram os arguidos condenados nos mesmos termos acima referidos (sentença de 5 de Junho de 2006, fls. 353 e seguintes).
Veio mais uma vez a arguida-sociedade recorrer da nova sentença. Na sequência, foi proferido acórdão que, conhecendo de uma questão prévia que havia sido suscitada pelo Ex.mo Procurador-Geral Adjunto, declarou nula a sentença, por omissão de pronúncia quanto aos ilícitos contra-ordenacionais imputados ao arguido.
Foi então proferida nova sentença que, para além da condenação dos arguidos nos termos já supra referidos, condenou ainda o arguido … nas seguintes coimas: pela falta do pagamento do IS na coima de 928,87 €; pela falta de apresentação dos proventos a nível do IRC na coima de 500 € e pela falta do pagamento do IVA na coima de 839,71 €, totalizando o montante das coimas a quantia de 2 267,58 € (cfr. sentença de fls. 435 e seguintes).
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Inconformados com esta sentença, recorrem, agora, ambos os arguidos, formulando as seguintes conclusões (transcrição): 1.º A actuação do Tribunal, no que concerne à ponderação e avaliação da conduta que consubstanciou o crime de abuso de confiança fiscal, uma vez que foi confessada, não merece qualquer reparo, não servindo para fundamentar o presente recurso.
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No entanto, de toda a matéria apreciada, em relação às contra-ordenações, não podem os arguidos deixar de mostrar a sua discordância, respeitando o disposto no art. 403.º, n.º1, tendo como fundamento a insuficiência para a decisão de facto provada, nos termos do 410.º, n.º2, b).
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Em relação à questão do Imposto do Selo, da análise do Código do Imposto do Selo (antes das alterações do DL 287/2003), segundo o art. 2.º e 14.º, os arguidos não são responsáveis pela liquidação e pagamento do imposto, não decorrendo da matéria provada que sobre eles impendesse qualquer obrigatoriedade de proceder ao pagamento do Imposto do Selo, pelo que, ainda que se considere provada a existência de suprimentos, inexiste uma conduta que possa ser punida a título de contra-ordenação.
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Quanto à omissão de proveitos, os arguidos também discordam da apreciação que o Tribunal fez da sua conduta, pela insuficiência para a decisão de facto.
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Ao remeter a fundamentação para uma explicação baseada num relatório “analisado, explicado e comentado”, sustentado a prova que “foi verificado que a contabilidade da arguida não reflectia o resultado efectivamente obtido. Assim, analisada a conta de sócios ao longo do ano de 2001, verificada pela Sra. Inspectora e constante do seu relatório a fls. 58 e do rendimento declarado pelo sócio-gerente em sede de IRS, estes factos permitem concluir com segurança que a contabilidade não reflecte o resultado efectivamente obtido (…)”, não são explicitados os verdadeiros pontos que justificaram o recurso a métodos indirectos, o cerne da questão.
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Isto porque da análise do relatório, em meia dúzia de linhas e dados (constantes do fls. 58 do processo), se chega à conclusão que “a contabilidade não reflecte o resultado efectivamente obtido e não sendo possível a comprovação e quantificação exacta e directa dos elementos necessários à sua determinação, encontram-se reunidos os pressupostos para o cálculo do resultado para efeitos fiscais com recurso a métodos indirectos, para o exercício de 2001 nos termos dos artigos 51.º e 52.º do CIRC conjugados com os arts 84.º do CIVA e 88.º e 90.º da LGT”, o que é tudo menos elucidativo.
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A análise de um relatório necessitaria, não só por critérios legais, mas também para se atingir todo o seu alcance, de ser “analisado, explicado e comentado”, o que segundo a douta sentença só o foi graças às declarações da técnica, única testemunha para além do arguido, mas cujas declarações pouco explicaram, analisaram ou comentaram para além do relatório.
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Os métodos indirectos pressupõem que, ao abrigo do princípio da investigação, para se aferir a verdadeira situação material do contribuinte, terá de se apurar os rendimentos mediante os elementos indiciários que tiver à disposição – fornecidos ou não pelo contribuinte.
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A avaliação através de métodos indirectos tem um carácter de subsidiariedade, tal como é disposto nos artigos 85.º, n.º1, e 81.º, n.º1 da LGT, segundo os quais, só é aplicável quando não for possível calcular a matéria colectável directamente segundo os critérios próprios de cada tributo.
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Nesse caso, a Administração tem que afastar a presunção do art. 75.º do LGT que estipula que se “presumem verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita ( ... )” 11.º Caso estejam preenchidas as condições previstas no artigo 87.º da LGT, a Administração poderá lançar mão dos métodos de avaliação indirecta, cabendo-lhe a prova da verificação dos pressupostos de aplicação dos mesmos, sendo necessário que se verifiquem os pressupostos previstos nos artigos 87.º e 88.º.
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Sendo um grau de fundamentação elevado, devendo estar concretizada num acto processual que respeite as exigências legais e que permita ao sujeito passivo, destinatário do acto, conhecer de facto e de direito as razões que levaram a Administração a afastar a veracidade dos elementos por si declarados.
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Essas razões não constavam do relatório, nada havendo que fundamente o recurso aos métodos indirecto, uma...
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