Acórdão nº 1640/06.0TAAVR-C.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Setembro de 2008

Magistrado ResponsávelHEITOR VASQUES OSÓRIO
Data da Resolução10 de Setembro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

17 Por despacho de 4 de Janeiro de 2008, a fls. 106 a 107 do presente recurso, o Mmo. Juíz de Instrução do Tribunal Judicial da comarca de Aveiro condenou o assistente, AN, nos termos do art. 84º, do C. Custas Judiciais, em 2 Ucs de taxa de justiça.

Por despacho de 23 de Janeiro de 2008, a fls. 128 a 130 do presente recurso, o Mmo. Juíz de Instrução do Tribunal Judicial da comarca de Aveiro indeferiu os requerimentos apresentados pelo assistente, AN, nos quais este arguiu a nulidade de insuficiência do inquérito por falta de constituição de arguido, e a inexistência jurídica do despacho de 4 de Janeiro de 2008, que o condenou em custas de incidente.

Inconformado com o decido, o assistente interpôs o presente recurso, formulando no termo da respectiva motivação as seguintes conclusões, que se transcrevem: “ (…).

Questão prévia: o erro material relativo à identificação das fls do processo em que se encontra exarado o despacho de 23.1.2008, e das fls a que se encontram os requerimentos que dele são objecto, deve ser corrigido oficiosamente antes de o processo subir à Relação.

  1. - No presente recurso, a cronologia dos factos processuais ocorridos depois de 20.12.2007 releva para efeito da declaração de inexistência jurídica do despacho de 4.1.2008, e para demonstrar que o JIC, ao pronunciar-se sobre o requerimento de 14.1.2008, já havia assumido a competência legal para conhecer do seu objecto.

  2. - A resposta de 9.1.2008 à promoção de 20.12.2007, foi dada na convicção de que, antes de decorrido o respectivo prazo legal, o JIC não podia pronunciar-se sobre tal promoção.

  3. - A promoção do Dr…. – que não é titular do inquérito – não tem fundamento legal e é contra legem.

  4. - O JIC não tem competência legal para condenar em custas judiciais por acto praticado no inquérito perante o superior hierárquico imediato do respectivo titular, e o seu despacho de 4.1.2008, sendo falho de objecto legal e prematuro, é juridicamente inexistente, devendo ser declarado como tal.

  5. - O despacho de 23.1.2008, ao impor, com os fundamentos invocados, o recurso como meio de obter a declaração de inexistência jurídica do despacho de 4.1.2008, viola múltiplas normas e princípios legais e constitucionais.

  6. - Sendo também ofensivo de valores essenciais do sistema jurídico-constitucional vigente, tem de concluir-se ser o despacho de 23.1.2008 conscientemente contra direito.

  7. - Os fundamentos de facto invocados no requerimento de 14.1.2008 para justificar o pedido de declaração de nulidade do inquérito por violação da norma do artº 272º, nº 1, do CPP, são verídicos, sendo que a referência a "retenção" de reclamação para o PGD de Coimbra tem significado ideológico e não material, face à inexistência de pronúncia do mesmo e dos seus inferiores hierárquicos sobre as várias reclamações apresentadas no inquérito desde antes da respectiva decisão final, para que ela seja suprida de modo a não impedir o exercício dos direitos conferidos pelo disposto nos artºs 20º, nº 1, e 32º, nº 7, da Constituição, e 287º do CPP.

  8. - O efeito da conduta dos representantes do MP conjugada com a recusa do JIC em declarar a nulidade do inquérito nos termos previstos no artº 122° do CPP, encontra-se proibido pelo sistema jurídico-constitucional vigente.

  9. - O despacho de 23.1.2008, ao restringir a competência legal do JIC para conhecer da arguição de nulidade do inquérito por violação do disposto no artº 272º, nº 1, cominada no artº 120º, nº 2, al. d), do CPP, viola as normas dos artºs 4º do CPP, 9º do CC, e a do nº 3 do artº 122º do CPP.

  10. - O despacho de 23.1.2008 faz errada interpretação do princípio do acusatório e da competência do JIC.

  11. - O despacho de 23.1.2008, ao entender que o juiz de instrução não tem competência legal para conhecer da nulidade do inquérito, antes da fase de instrução, viola a norma do artº 122º, nº 3, do CPP.

  12. - O despacho de 23.1.2008, ao decidir que o JIC não é competente para conhecer da nulidade do inquérito por violação da norma do artº 272º, nº 1, do CPP, depois de o haver declarado competente para apreciar actos do Assistente visando obter o suprimento da mesma pelos representantes do MP, e promoção de representante do MP que não é titular do inquérito, no sentido de aquele ser condenado em custas judiciais, é incongruente.

  13. - O despacho de 23.1.2008, ao omitir pronúncia sobre os fundamentos legais e constitucionais do requerimento de 14.1.2008, nele expressamente invocados, viola o disposto no artº 660º, nº 2, do CPC, incorrendo na nulidade do artº 379º, nº 1, al. c), do CPP; sobre esta tem o juiz a quo de pronunciar-se antes de os autos de recurso subirem ao tribunal ad quem, por força do disposto nos artºs 379º, nº 2, do CPP, 668º, nº 4, e 744º do CPC, sob pena de o Relator ter de cumprir o disposto no nº 5 deste último.

Termos em que se pede seja provido o presente recurso.

(…)”.

Respondeu ao recurso o Digno Magistrado do Ministério Público junto da 1ª instância, formulando no termo da sua contramotivação as seguintes conclusões, que se transcrevem: “ (…).

  1. O recurso interposto é manifestamente extemporâneo, pelo que não deve ser admitido, nos termos do n.º 2 do art.º 414º do Código de Processo Penal.

  2. A repetição injustificada do requerido, renovando os requerimentos e secundando-os nos mesmos argumentos, não pode deixar de ser perspectivada como uma ocorrência estranha ao desenvolvimento normal do processo e, assim, susceptível de tributação nos termos do art. o 84º do Código das Custas Judiciais.

    Cremos, assim, que a douta decisão proferida pelo Meritíssimo Juiz a quo não deverá merecer qualquer censura, pelo que, deve ser negado provimento ao recurso interposto e mantida aquela decisão, nos seus precisos termos.

    (…)”.

    Na vista a que se refere o art. 416º, nº1, do C. Processo Penal, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer, pronunciando-se pela intempestividade do recurso interposto do despacho de 4 de Janeiro de 2008, e pela impossibilidade legal de ser sindicável perante o juiz de instrução, o juízo concreto realizado pelo Ministério Público em fase de inquérito de realizar actos requeridos pelo ofendido, enquadrando tal juízo na figura da nulidade por insuficiência de inquérito, concluindo pela improcedência do recurso.

    Foi cumprido o art. 417º, nº 2, do C. Processo Penal, tendo respondido o recorrente.

    Colhidos os vistos e efectuada a conferência, cumpre decidir.

    1. FUNDAMENTAÇÃO Dispõe o art. 412º, nº 1 do C. Processo Penal que a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido Por isso é entendimento unânime que as conclusões da motivação constituem o limite do objecto do recurso, delas se devendo extrair as questões a decidir em cada caso (cfr. Prof. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Vol. III, 2ª Ed., 335, Cons. Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 6ª Ed., 2007, 103, e Acs. do STJ de 24/03/1999, CJ, S, VII, I, 247 e de 17/09/1997, CJ, S, V, III, 173).

    Assim, atentas as conclusões formuladas pelo recorrente, as questões a decidir, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, são: - A inexistência jurídica do despacho de 4 de Janeiro de 2008, que condenou o recorrente em custas judiciais, na fase de inquérito, por incompetência do juiz de instrução, por falta de objecto e por violação do contraditório; - A competência do juiz de instrução para conhecer da nulidade prevista no art. 120º, nº 2, d), do C. Processo Penal, decorrente da violação do disposto no art. 272º, nº 1, do mesmo código, cometida no inquérito; - A omissão de pronúncia no despacho de 23 de Janeiro de 2008.

    Como questão prévia suscitada pelo Ministério Público, há que decidir a tempestividade ou não, do recurso relativamente ao despacho de 4 de Janeiro de 2008.

    Para a resolução destas questões, e muito particularmente, da questão prévia, importa ter presente, não só as decisões recorridas, como também os actos processuais mais relevantes com elas relacionados, tendo em conta os elementos disponíveis nestes autos de recurso.

    Assim:

    1. O assistente dirigiu uma queixa ao Ministério Público de Aveiro, que deu origem ao inquérito NUIPC 1640/06.0TAAVR, findo o qual o Sr. Procurador Adjunto titular proferiu despacho de arquivamento por entender não existirem indícios dos participados crimes de denúncia caluniosa e de coacção.

    2. O assistente suscitou a intervenção do superior hierárquico daquela Magistrado, pedindo a declaração da nulidade que entendeu ter sido praticada e requerendo a prática de outros actos processuais, tendo no entanto o Sr. Procurador da República junto do Círculo Judicial de Aveiro proferido despacho que, indeferindo o pretendido, manteve o despacho de arquivamento.

    3. O assistente requereu então ao Sr. Procurador-Geral Distrital o suprimento das nulidades que entendeu terem sido praticadas na investigação, tendo este Magistrado, entendendo que a reapreciação da justeza do despacho de arquivamento compete exclusivamente ao Sr. Procurador da República, indeferido o requerido, decisão esta notificada ao assistente por via postal registada datada de 4 de Julho de 2007.

    4. Posteriormente, o assistente requereu a junção ao inquérito de vários documentos e a notificação dos cidadãos que identificou como arguidos para apresentarem o livro de inventário e balanço dos anos de 1987 a 2004.

      Sobre este requerimento incidiu o despacho do Sr. Procurador Adjunto de 13 de Julho de 2007, que considerou que aquele em nada invalida ou abala o despacho de arquivamento.

    5. O assistente, em 17 de Julho de 2007, requereu novamente ao Sr. Procurador-Geral Distrital a reapreciação das invocadas nulidades, tendo este Magistrado, por ofício de 18 de Outubro de 2007, decidido que, por já se ter pronunciado sobre o requerido, em anterior decisão, nada mais tinha a decidir, decisão esta notificada ao assistente por via postal registada datada de 26 de Outubro de 2007.

    6. O assistente...

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