Acórdão nº 1285/12.5TBPMS-F.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Abril de 2014

Magistrado ResponsávelMANUEL CAPELO
Data da Resolução01 de Abril de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra Relatório Nos autos de processo de insolvência em que é requerente/insolvente “A…, S.A.” esta apresentou plano de insolvência na modalidade de recuperação da empresa, peticionando a sua homologação.

Proferido despacho de admissão liminar, em 9.10.2013 efectivou-se a assembleia de apreciação e votação do plano de insolvência na qual o mesmo foi aprovado, tendo o MP, em representação da Fazenda Pública, votado desfavoravelmente.

Com base no voto desfavorável do MP o Tribunal veio a indeferir a homologação do plano de insolvência da Requerente A…, S.A. nos termos do art.º 215.º do CIRE.

Inconformado com esta decisão dela interpôs recurso a requerente, concluindo que: (…).

Na resposta o MP contra alegou defendendo a confirmação da decisão recorrida.

Cumpre decidir Fundamentação Interessam à decisão os seguintes factos: - A assembleia de apreciação do plano de insolvência ocorreu com a presença de credores que representavam 94,56% dos direitos de voto.

- O plano foi aprovado pelo Banco C…, pelo Banco A…, pelos credores trabalhadores, pela T…, pela G…, S.A., pelo Instituto da Segurança Social, pela R…, N… e L… - Os demais credores votaram desfavoravelmente, exceptuando-se J… que se absteve.

- o plano de insolvência foi aprovado por credores representativos de mais de 70 % dos direitos de voto.

- No que se refere aos créditos fiscais, é proposto no plano o pagamento integral da dívida em regime prestacional, com recalculo dos juros a taxas mais benéficas para a insolvente em função das garantias a prestar.

- O MP, em representação da Fazenda Pública, votou desfavoravelmente o citado plano.

- o valor total dos créditos é de 12.786.662,21 € e o crédito da Fazenda Nacional é de 191.801,52 € (1,5% do total) Além de delimitado pelo objecto da acção e pelos eventuais casos julgados formados na instância recorrida e pela parte dispositiva da decisão impugnada que for desfavorável ao impugnante, o âmbito, subjectivo ou objectivo, do recurso pode ser limitado pelo próprio recorrente. Essa restrição pode ser realizada no requerimento de interposição ou nas conclusões da alegação (arts. 635 nº3 e 4 e 637 nº2 do CPC).

Na observação destas prescrições normativas concluímos que o objecto do presente recurso é o de saber se existe nulidade da decisão por falta de fundamentação e se o Plano de insolvência deveria ter sido homologado mesmo perante o voto desfavorável do M.P.

Quanto à suscitada nulidade da decisão por falta de fundamentação, protesta a recorrente que “na douta sentença proferida não se vislumbra com suficiente clareza - violando-se o n.º 4 do Art. 607 do NCPC – quais os factos julgados e os não provados especificando-se com clareza quais os fundamentos que foram decisivos para a convicção do Mtº Juiz na decisão tomada.”.

Estabelece o art. 607 nº 4 do NCPC que na fundamentação o juiz declara quais os factos que julga provados e não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção, tomando ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados s presunções impostas pela lei ou por regras de experiência.

Este preceito (o art. 607) corresponde, essencialmente, aos artigos 658º e 659º do CPC e, particularmente, a primeira parte do nº 4 é inovadora na sua localização na fase da sentença, tendo correspondência com a segunda parte do nº 2 do artigo 653º do CPC. Por seu turno, a segunda parte do nº 4 tem alguma correspondência com o nº 3 do artigo 659º do CPC.

Trata-se pois de um normativo que tem como finalidade regular o julgamento da matéria de facto.

Se verificarmos que o CIRE nos seus art.s 209 e ss regula o modo como em tribunal se aprecia o Plano de Insolvência, concluímos que nesses procedimentos não se realiza qualquer actividade probatória tudo passando pela evidência já constante nos autos de quais os créditos verificados e graduados (vd. nº2 do art. 209 do CIRE).

De facto, na diligência de aprovação e homologação do plano de insolvência, estando já determinados quais os créditos existentes e feita a sua graduação, com trânsito em julgado, tudo o que se realiza é uma contabilidade para garantia do quórum da reunião de aprovação e do exigido para a aprovação (nº2 do art. 212 do CIRE).

Assim, cremos que a decisão proferida pelo tribunal recorrido não carecia de fazer constar quais os créditos que se encontravam aprovados qual o seu valor relativo em percentagens ou, menos ainda, a indicação de que nenhum credor tivesse solicitado a recusa da homologação nos termos do art. 216 do CIRE, porquanto todos estes elementos não resultavam de nenhuma actividade probatória realizada na diligência de aprovação e estavam já adquiridos nos autos, estando pois a fundamentação da não homologação oficiosa do plano de insolvência construída de forma inteligível sobre todas a matéria de facto que existe no processo e fixada em momento anterior, sendo sobre essa matéria que o tribunal concluiu pelo indeferimento.

Indeferem-se assim, nesta parte, as conclusões de recurso, quanto á protestada nulidade da decisão por violação do art. 607 nº4 do NCPC.

A recorrente argui ainda a nulidade da decisão recorrida, agora baseada no art. 615 nº 1 al. b) do NCPC no qual se prevê tal consequência para o vício de falta de fundamentação de facto e de direito que justifique a decisão.

Como refere Teixeira de Sousa, “esta causa de nulidade verifica-se quando o tribunal julga procedente ou improcedente um pedido (e, por isso, não comete, nesse âmbito, qualquer omissão de pronúncia), mas não especifica quais os fundamentos de facto ou de direito que foram relevantes para essa decisão. Nesta hipótese, o tribunal viola o dever de motivação ou fundamentação das decisões judiciais (art. 208º, n.º 1, CRP; art. 158º, n.º 1)”, acrescentando o mesmo autor que “o dever de fundamentação restringe-se às decisões proferidas sobre um pedido controvertido ou sobre uma dúvida suscitada no processo (...) e apenas a ausência de qualquer fundamentação conduz à nulidade da decisão (...); a fundamentação insuficiente ou deficiente não constitui causa de nulidade da decisão, embora justifique a sua impugnação mediante recurso, se este for admissível”[1] [In “Estudos sobre o Processo Civil”, pg. 221].

Ou, como refere Lebre de Freitas, “há nulidade quando falte em absoluto indicação dos fundamentos de facto da decisão ou a indicação dos fundamentos de direito da decisão, não a constituindo a mera deficiência de fundamentação” [In CPC, pg. 297].

No mesmo sentido diz o Conselheiro Rodrigues Bastos, que “a falta de motivação a que alude a alínea b) do n.º 1 é a total omissão dos fundamentos de facto ou dos fundamentos de direito em que assenta a decisão; uma especificação dessa matéria apenas incompleta ou deficiente não afecta o valor legal da sentença” [in "Notas ao Código de Processo Civil", III, 194].

E como advertia o Professor Alberto dos Reis “há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade.

Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto. Se a sentença especificar os fundamentos de direito, mas não especificar os fundamentos de facto, ou vice-versa, verifica-se a nulidade do nº 2.° do art. 668º”.

Deste modo, face à doutrina exposta, se conclui que a nulidade da sentença não se verifica quando apenas tenha havido uma justificação deficiente ou pouco persuasiva, antes se impondo, para a verificação da nulidade, a ausência de motivação que impossibilite o anúncio das razões que conduziram à decisão proferida a final[2].

Ora, analisada a decisão recorrida constata-se que todas as questões, que se colocaram à consideração do tribunal, foram devidamente ponderadas, aduzindo-se, se não uma profícua e exaustiva fundamentação, pelo menos uma fundamentação bastante em face da dificuldade da lide, de modo que a decisão recorrida não pode ser havida por não motivada, salientando-se que a questão central (a da não homologação do plano de insolvência aprovado por 70% dos credores mas com o voto desfavorável d MP) se encontra mais que suficientemente motivada.

Improcedem assim, nesta parte, as conclusões de recurso quanto à nulidade prevista no art. 215 nº1 al.b) do NCPC.

Passando agora a conhecer da questão de saber se o plano de insolvência podia ser recusado oficiosamente pelo tribunal com base na sua não aprovação pelo MP em representação da Fazenda Nacional, quando 70% dos restantes credores aprovaram tal plano, neste domínio, o tribunal recorrido entendeu que “No que se refere aos créditos fiscais, é proposto o pagamento integral da dívida em regime prestacional, com recalculo dos juros a taxas mais benéficas para a insolvente em função das garantias a prestar, sendo que o MP, em representação da Fazenda Pública, votou desfavoravelmente o citado plano.

Ante a mencionada vicissitude, impõe-se a equação da admissibilidade da descrita modificação dos créditos tributários.

Na verdade, em convergência com o prescrito no art.º 30.º/1 da Lei Geral Tributária, integram a relação jurídica tributária: a) O crédito e a dívida tributários; b) O direito a prestações acessórias de qualquer natureza e o correspondente dever ou sujeição; c) O direito à dedução, reembolso ou restituição do imposto; d) O direito a juros compensatórios; e) O direito a juros indemnizatórios.

Ademais, o crédito tributário é indisponível, só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção...

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