Acórdão nº 343/10.5TBTND.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Abril de 2014
Magistrado Responsável | MARIA DOMINGAS SIMÕES |
Data da Resolução | 01 de Abril de 2014 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
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Relatório No Tribunal Judicial da comarca de Tondela, A...
, LDA., com sede na rua (...), concelho e comarca de Tondela, veio instaurar contra B...
e marido, C...
, casados sob o regime da comunhão de adquiridos, residentes na Rua (...), Tondela, acção declarativa de condenação, a seguir a forma sumária do processo comum, pedindo a final a condenação dos RR a pagarem o montante de 23.072,00 (vinte e três mil e setenta e dois euros), acrescido dos juros legais contados desde a data da citação e até integral e efectivo pagamento, a devolverem os utensílios identificados no artigo 19º do presente articulado e, bem assim, a pagarem a quantia mensal de € 300,00 relativa ao valor locativo de tais utensílios, desde a data de desistência da empreitada (21 de Maio de 2010) até à data da efectiva entrega de tais bens.
Em fundamento alegou, em síntese útil, dedicar-se à actividade de construção civil, no âmbito da qual celebrou com os RR, no mês de Outubro de 2009, contrato verbal de empreitada, tendo-se obrigado a proceder à edificação da casa de habitação destes, de harmonia com o projecto por eles encomendado e aprovado pela CM de Tondela. Conforme o acordado, à autora caberia fornecer a mão de obra e o equipamento, competindo aos RR adquirir os materiais e colocá-los em obra, tendo o preço da empreitada sido fixado em, pelo menos, € 80 000,00, o qual seria pago à medida que a obra fosse sendo executada e mediante a apresentação das pertinentes facturas.
Face ao Inverno muito chuvoso de 2009/2010, o que determinou o encharcamento da escavação feita tendo em vista o início dos trabalhos, a autora apenas em Maio de 2010 iniciou a execução da obra, tendo construído os alicerces e elevado as paredes até ao primeiro piso, a cujo nível foi construída a primeira placa, daqui prosseguindo até ao nível do sótão.
No dia 21 de Maio de 2010, encontrando-se os trabalhos na fase de execução da segunda placa, ao nível do sótão, faltando apenas proceder ao enchimento da mesma, os RR dirigiram-se logo pela manhã à obra e, aí chegados, proibiram os trabalhadores da A. de prosseguir com os respectivos trabalhos, tendo-os expulsado do local. Mais comunicaram então aos legais representantes da A. que não queriam que esta prosseguisse com a obra, pretendendo proceder à contratação de uma nova empresa, tendo no entanto impedido a demandante de levar os utensílios que se encontravam na obra.
Por via da descrita actuação dos RR, que consubstancia uma desistência do dono da obra, estão estes obrigados, não só a pagar à A a totalidade dos trabalhos executados, encontrando-se em dívida o valor de € 3 072,00 titulado pela última factura emitida, como a indemnizá-la pelos lucros cessantes, reclamando a este título a quantia de € 20 000,00 correspondente ao proveito que obteria caso lhe tivesse sido permitido concluir a obra, conforme prevê o art.º 1229.º do Código Civil, que expressamente invoca.
Por outro lado, os equipamentos ilicitamente retidos pelos RR na obra têm valor locativo, reclamando a demandante a este título indemnização no valor de € 300,00 mensais.
* Regularmente citados, os RR contestaram, impugnando terem celebrado com a autora contrato de empreitada, defendendo tratar-se antes de um contrato de prestação de serviços, sendo a autora paga “à jorna”, ou seja, por dia de trabalho.
Mais invocaram que os trabalhos executados pela A. apresentavam defeitos, não observando o que se encontrava projectado e aprovado pela Câmara de Tondela, obrigando à presença no local do técnico da obra para corrigir e verificar erros de construção, o que levou a que os RR a mandassem embora, procurando um novo empreiteiro com maior competência. Confirmaram ter a A. deixado a obra por sua ordem, encontrando-se então a cofragem da segunda placa pronta para o enchimento, sendo certo que também aqui teve lugar uma rectificação, uma vez que as cofragens apresentavam desníveis de 4 cm.
A correcção dos identificados erros de execução da responsabilidade da demandante causou prejuízos aos contestantes, pelo que, concluem, de nada são devedores.
Finalmente, alegaram que desde a data em que a A. saiu da obra vêm insistindo com aquela para que remova do local os seus utensílios e equipamentos, cuja permanência no local constitui um verdadeiro estorvo, obrigando a gastos suplementares, tal como ocorreu aquando da abertura do alicerce do muro de delimitação da propriedade, o qual teve que ser aberto à mão, dada a impossibilidade de utilizar uma máquina retroescavadora.
Com os aludidos fundamentos concluem pela sua absolvição.
A A. respondeu, impugnando os factos alegados pelos RR no que respeita aos imputados defeitos, e ainda em relação ao que denominou de “questão da retenção, ou não, dos utensílios utilizados na obra”. Mais informou que na sequência da citação para a acção, mais precisamente a 10 de Setembro de 2010, os RR haviam procedido à entrega dos equipamentos cuja restituição fora pedida.
* Teve lugar audiência preliminar com as finalidades previstas nas alíneas c), d) e e) do n.º 1 e al. a) do nº 2 do artigo 508º do Código de Processo Civil e nela, frustrada a tentativa de conciliação, o Mm.º juiz “a quo”, admitindo embora que na contestação os RR não haviam referido de forma expressa pretenderem invocar a excepção da compensação pelos custos em que teriam incorrido ou iriam incorrer por força dos alegados defeitos de execução, determinou a notificação dos mesmos “para, em 20 dias, concretizarem por um lado os custos da reparação dos defeitos e por outro lados os custos decorrentes das alterações de métodos construtivos ou trabalhos”.
Correspondendo ao convite, vieram os RR alegar que na rectificação dos defeitos que então especificaram e diferença do custo de abertura manual do alicerce para o muro de delimitação, motivado pela presença no local do equipamento deixado pela A., que impediu a utilização de uma retroescavadora, despenderam € 3.425,00, crédito que (só) então declararam oferecer em compensação nos termos do art.º 847.º do CC.
Respondeu a A. e, reconhecendo uma alteração na estratégia de defesa delineada pelos RR, que passaria pela aceitação de que o contrato celebrado seria de qualificar como de empreitada para invocar a sua justificada resolução em face dos defeitos detectados, invocou expressamente a excepção da caducidade, uma vez que tais defeitos não foram, como se impunha, denunciados no prazo de 30 dias contados do descobrimento (cf. art.º 1220.º, n.º 1 do CC).
* Prosseguiram os autos com a prolação de despacho saneador tabelar, tendo sido relegado para final o conhecimento das excepções invocadas, selecção dos factos assentes e organização da base instrutória, peças que se fixaram sem reclamação das partes.
Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, finda a qual o Tribunal proferiu decisão sobre a matéria de facto controvertida, respostas não reclamadas, após o que foi proferida sentença que, na total improcedência da acção, absolveu os RR do pedido.
Inconformada, a A. recorreu da sentença e, tendo produzido pertinentes alegações, rematou-as com as seguintes necessárias conclusões: “I. Talqualmente resulta da factualidade provada e de acordo, aliás, com o douto entendimento do Mmo. Juiz “a quo”, o contrato celebrado entre Autora e Réus configura um contrato de empreitada.
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Considerando o desenvolvimento da obra, objeto do contrato de empreitada, os lesados, com a execução defeituosa da obra, se se quisessem ressarcir dos prejuízos daí advientes teriam de, previamente, se submeter ao iter legal que resulta das normas dos artigos 1220º e seguintes do Código Civil, ou seja, teriam de, em primeira linha, e após terem feito a respetiva denúncia dos defeitos, exigir a sua eliminação e, no caso de tal não se possível, exigir nova obra ou mesmo a resolução do contrato se os defeitos tornassem a obra inadequada ao fim a que se destinava, sem prejuízo do direito à indemnização que daí lhes pudesse advir.
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No caso dos autos não resulta que os Réus tivessem previamente denunciado qualquer defeito da obra à Autora sendo certo que não se submeteram ao referido iter legal da empreitada.
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A resolução do contrato talqualmente foi definida pela sentença recorrida só poderia ter assim lugar na sequência do exercício das chamadas “pretensões edilícias” dos artigos 1221º a 1223º do Código Civil e desde que se verificassem os respetivos pressupostos previstos na norma do artigo 1222º deste citado diploma legal.
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Assim, o ato praticado pelos Réus e configurado nos pontos 10º a 13º da fundamentação de facto da sentença recorrida configura uma clara desistência da empreitada por parte dos donos da obra, e isto porquanto pretenderam então com tal comportamento pôr fim imediato à execução do respetivo contrato, sendo certo que não teriam, nem a lei o impõe, de obedecer a qualquer forma.
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Esta desistência é consentida pelo artigo 1229º do Código Civil, do qual decorre a consequente obrigação do dono da obra de indemnizar o empreiteiro dos seus gastos e trabalho e bem assim do proveito que poderia tirar da obra.
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Em face da verificação da desistência da empreitada por parte dos Réus teriam estes de ser condenados a proceder ao pagamento dos gastos e trabalho, e bem assim do proveito que a Autora poderia tirar da obra, tudo nos precisos termos do pedido formulado.
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Sendo certo que caso da matéria de facto não resultassem elementos factuais suficientes para se poder fixar ou quantificar a indemnização devida sempre se impunha ao julgador relegar as partes para o posterior incidente da liquidação nos termos do artigo 609º nº 2 e 358º, ambos do CPC.
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No que concerne aos invocados defeitos da obra que o Mmo. Juiz “a quo” deu como provados e que vêm descritos nos pontos 18º a 22º da fundamentação de facto da sentença recorrida, não resulta da respetiva factualidade que tais alegados defeitos possam, de qualquer forma, ser imputáveis à Autora.
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Sendo certo que a respetiva factualidade constante da conclusão anterior está...
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