Acórdão nº 2429/08.7PBHUN.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 02 de Abril de 2014
Magistrado Responsável | JORGE DIAS |
Data da Resolução | 02 de Abril de 2014 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra, Secção Criminal.
No processo supra identificado foi proferida sentença que julgou procedentes a acusação deduzida, pelo Mº Pº.
São arguidos nos autos: A...
, solteira, vendedora ambulante, nascida no dia 28.3.1984, natural da Freguesia de (...), Lisboa, filha de (...) e de (...), residente na Rua (...), em Lisboa, e B...
, divorciado, armador de ferro, nascido no dia 9.8.1980, natural da Freguesia de (...)e, Lisboa, filho de (...) e de (...), residente na Rua (...), Lisboa, atualmente preso no estabelecimento prisional de Sintra.
Sendo decidido:
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Condenar a arguida A..., pela prática de um crime de apropriação ilegítima em caso de acessão ou de coisa achada, p. e p. pelo art. 209, n.º 1 do CP, na pena de 10 (dez) meses de prisão; i) Suspensa na sua execução pelo período de um ano; ii) Com a condição de entregar a C...
, no prazo de um ano, a quantia a que a arguida foi condenada no âmbito do pedido de indemnização civil (ponto 3.2.i) desta sentença); b) Condenar o arguido B..., pela prática de um crime de apropriação ilegítima em caso de acessão ou de coisa achada, p. e p. pelo art. 209, n.º 1 do CP, na pena de 9 (nove) meses de prisão (efetiva); 3.2. Parte Cível.
i) Condenar a arguida A... a pagar a C... o montante de 20.133,00 € (vinte mil cento e trinta e três euros), acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde a notificação até integral pagamento; e ii) Condenar o arguido B... a pagar a C... o montante de 5.600,00 € (cinco mil e seiscentos euros), acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde a notificação até integral pagamento.
*** Inconformada, da sentença interpôs recurso a arguida A... e, formula as seguintes conclusões na motivação do mesmo e, que delimitam o objeto: I- O julgamento realizou-se na ausência da arguida que ao longo do processo colaborou para a realização do julgamento, veja-se, foi a Recorrente que informou o paradeiro do coarguido ao Tribunal da Covilhã para que o mesmo fosse transportado ao Julgamento, conforme fax remetido a 16 de Abril de 2013, informando da sua gravidez, aliás que foi dada como provada na douta Sentença. Foi levantando pelos mandatários dos arguidos n justo impedimento para a data de 20 de Maio indicando novas datas alternativas, conforme fax datado de 10 de Maio de 2013, embora não tenha sido levadas em consideração ficou designado o dia 12 de junho de 2013.
II- No entanto e após a deslocação ao Hospital, a arguida, através da sua mandatária, logo no início da manhã do dia 12 telefonou para o 3° Juízo do Tribunal da Covilhã a avisar que não se iria deslocar àquele Tribunal por questões de saúde dado ao estado avançado da gravidez da arguida não se estava a sentir bem, e a conselho médico estava impedida de viajar, sendo ainda enviado um fax durante a manhã desse mesmo dia juntando a declaração médica e referindo, expressamente, que não prescindia de estar presente em audiência de julgamento, todos os impedimentos eram dados ao Tribunal e ao ilustre mandatário do coarguido. Contudo, no final do mês de Julho, princípio do mês de Agosto de 2013, foi notificada da douta Sentença Condenatória.
III- Exige-se no 1 do art. 333 que, na ausência do arguido, o presidente do tribunal tome as medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a sua comparência. E, na falta do arguido, o tribunal deverá pronunciar-se necessariamente sobre a sua imprescindibilidade desde o início da audiência (nº 2 do art. 333 do CPP), justificando a sua decisão de prosseguir, ou não, com o julgamento.
IV- Apesar da comunicação e justificação da arguida o douto Tribunal a quo violou s nºs 2 e 3 e 4 e 6 do art. 117 do CPP, a que se refere o nº 2 do art. 333.
V- O douto Tribunal não se consignaram quaisquer diligências para fazer comparecer a arguida; não se determinaram quaisquer elementos de onde fosse legítimo concluir que a arguida não pretendia estar presente no seu julgamento, pelo contrário, foi manifestado, expressamente, o seu desejo de estar presente na audiência de julgamento; não se justificou minimamente a razão pela qual a audiência se podia iniciar, e concluir, sem a presença da arguida; não houve a mínima preocupação em esclarecer as razões pelas quais se prescindiu da presença da arguida em toda a audiência, dando como certa a sua dispensabilidade, quando o que consta nos autos é exatamente o contrário. A fundamentação do tribunal sobre a indispensabilidade da presença do arguido e sobre a possibilidade de começo da audiência sem essa presença (nº 1, parte final e nº 2 do art. 333) devem ser objeto de despacho devidamente fundamentado (art. 97, nº 4).
VI- Tendo avançado para o julgamento sem justificar no despacho respetivo porque considerava que a audiência podia começar sem a presença do arguido, violando o disposto no art. 97, nº 4, o tribunal não acautelou como devia o seu direito de defesa. A ausência do arguido impossibilitou-lhe o exercício desse direito constitucionalmente garantido, tornando nulo, de forma insanável, o ato em que essas garantias não foram respeitadas, a nulidade prevista no art. 119, al. c), com as consequências previstas no art. 122, nº 1, ou seja, a invalidade do ato praticado bem como dos que dele dependerem. A ausência do arguido ou do seu defensor, nos casos em que a lei exigir a respetiva comparência.
VII- Ficando prejudicado o direito de do exercício dos direitos de defesa, que ao mesmo assistem e que são merecedores de tutela constitucional dispensada pelo nº 1 do art. 32 da CRP, e, em certa medida, da sujeição daquele ato processual ao princípio do contraditório, também constitucionalmente consagrado pelo nº 5 do mesmo artigo.
VIII- Impugna-se os pontos 10, l l, 12, 13, 14, 15, 16 e l7, da matéria de facto dada como provada, por violação do artigo 410, n.º 2, al. a), do C.P.P. IX - Ora da prova produzida em audiência de julgamento, ninguém falou no nome da arguida A... que tenha praticado qualquer ato criminoso, o que se refere na acusação é a utilização de uma conta em nome da arguida e que não se logrou produzir prova que a mesma tivesse conhecimento dos factos, nem tão pouco a arguida A... ficou na posse de qualquer quantia de dinheiro da senhora C..., há uma manifesta insuficiência de prova para a matéria de facto dada como provada, nulidade que desde já se argui, nos termos do art. 410, n.º 2, al. a), do C.P.P..
X- A única prova relevante para os autos é a existência/utilização de uma conta em nome da arguida, não resultou da audiência de julgamento obtenção de prova da identificação dos autores dos factos em apreço, a não ser como já referimos a existência da utilização da conta em nome da arguida A..., que por si só não poderá levar à condenação da mesma. XI- Não ficaram provados os pressupostos do crime de apropriação ilegítima em caso de acessão ou de coisa achada, p. e p. no art. 209 n.° 1 do CP, tanto mais que não se provou o conhecimento da transação na sua conta e quem efetivamente, fez o levantamento e quem ficou com o dinheiro, muito menos quem se apropriou dos códigos do acesso à conta etc etc.
XII- A coordenação entre a natureza do bem jurídico protegido e a especificidade típica como crime de execução vinculada supõe que a produção do resultado tenha de ser determinada por procedimentos e ações que sejam tipicamente vinculados na descrição específica da norma que define os elementos materiais do crime. Visto os elementos típicos do crime em causa, e tendo em conta a matéria de facto provada, temos que concluir que à arguida não se poderá assacar a prática do crime por que vinha acusada.
XIII- Desde logo, não resultou apurada a identidade do agente do ilícito descrito na acusação, ou seja, não se provou ter sido a arguida a praticar tais factos que lhe são imputados, o que inviabiliza qualquer possibilidade de imputação criminal à arguida. Decidindo-se pela condenação da arguida coloca-se em causa o princípio constitucional do "in dubio pro reo", artigo 32 da C.R.P..
XIV- Caso se entenda pela condenação da arguida, ora, parece-nos, salvo outro e melhor entendimento, ser tal condenação manifestamente exagerada, atentos os factos apurados, a culpa do agente, à ilicitude, os seus antecedentes, as suas perspetivas de reinserção social, bem como o universo de condenações em Portugal, por estes e outros crimes, forçoso será de concluir pela inadequabilidade de tal condenação; XV- A arguida é primária; tem 3 filhos: um de 14, outro de 12 e outro de 6 anos; Encontra-se atualmente grávida; Realiza trabalho remunerado de limpeza, nomeadamente numa escola perto da sua residência: Recebe 240,00 € de rendimento social de inserção: Recebe l29,00€ de abono de família; Vive numa casa com 4 assoalhadas, num bairro camarário.
XVI- Justifica-se a aplicação da pena de multa à arguida e esta ser convertida em trabalho a favor da comunidade.
XVII- Parece-nos que houve uma notória violação da medida da pena aplicada ultrapassado em muito a medida da culpa concreta do arguido face aos factos dados como provados, tendo ainda, o acórdão em crise violado disposto nos artigos 40 n.º 2 e 71, n.º 1 al. a), do Cód Penal; Violaram-se: os artigos 32 da CRP, 47, n.° 2, 143, 161, 71 e 72 do CP, 125, 127, 132, n.º 1, al. d), 186, 341, al. a), 343, nºs 1 e 2 e 345, 410 n.º 2, al. b), e 412 do C. P. P A não se determinar o reenvio do Processo, para repetição do Julgamento, por via da verificação dos pressupostos nos artigos 410 e 426 do Código de Processo Penal, do conhecimento oficioso, deverá o douro Acórdão ora recorrido ser revogado e substituído por outro que absolva a Arguida ora Recorrente, por manifesta falta de matéria para concluir diferentemente, ou, assim se não entendendo, haverá que substituir a pena aplicada, apenas por pena de multa e convertida em trabalho a favor da comunidade face às dificuldades económicas da arguida.
Foi apresentada resposta pelo Magistrado do Mº Pº que conclui: 1- De nenhuma nulidade padece a audiência de julgamento e a sentença proferida nos autos...
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