Acórdão nº 17/11.0GBAGD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Fevereiro de 2014

Magistrado ResponsávelISABEL VALONGO
Data da Resolução26 de Fevereiro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, os Juízes da 5ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: I - Relatório 1. No processo comum (tribunal singular) n.º 17/11.0GBAGD que corre termos no Juízo de Instância Criminal de Águeda, Comarca do Baixo Vouga, o Ministério Público acusou A...

, solteiro, mecânico auto actualmente desempregado, filho de (...) e de (...), nascido a 25.06.56, natural da freguesia de (...), concelho de Águeda, residente na Rua (...) (...), Águeda, da prática, como autor material, na forma consumada e em concurso efectivo, de dois crimes de importunação sexual, p.p. pelo Artur 170.º, do Código Penal.

* Efectuado o julgamento o tribunal a quo decidiu: Condenar o arguido A.... pela prática, como autor material e em concurso efectivo, de dois crimes de importunação sexual, p.p. pelo art.º 170.º, do Código Penal, na pena de 4 meses de prisão por cada um deles.

Operando o necessário cúmulo jurídico das referidas penas, condenar o arguido A.... na pena única de 5 meses e 15 dias de prisão.

* Inconformado com a decisão, dela recorreu o arguido, extraindo da respectiva motivação do recurso as seguintes conclusões:

  1. A prova produzida em julgamento, conjugada com as regras da lógica e da experiência comum impunham que o tribunal a quo absolvesse o arguido da prática, como autor material e em concurso efectivo de dois crimes de importunação sexual p.p. artigo 170 do Código Penal, na pessoa da menor B....

    e da adulta E...

    de actos de carácter exibicionista.

  2. Atentemos primeiramente nos factos do dia 6 de Janeiro de 2011, ou seja os factos que foram dados como provados de 1 a 6 e 12 e 13 na sentença de que se recorre, na pessoa da menor B.....

  3. Quanto a este crime, entende o arguido que o tribunal não procedeu a uma análise crítica de todas as provas produzidas, designadamente declarações do arguido, da menor B.... e da mãe H...., bem como das fotografias juntas a fls 222 a 226.

  4. O arguido nas suas declarações com as referências 20130228101412 - 618567-1495785, e 20130228102419 - 618567-1495785, da acta de 28/02/2013, negou ter mostrado o pénis, relatando a sua situação de sofrer de uma hérnia que o obriga quando sai “a empurrar para dentro “ usando a braguilha.

  5. No entanto, demonstrativo da falta de consciência da ilicitude do acto relatado pela menor, a que nos referiremos, foi o seu desabafo ao minuto 1,05 com a referência - 618567-1495785, da acta de 28/02/2013: “ Se elas dizem que viram o pénis peço desculpa, foi sem intenção." F) Por seu lado a menor B...., cujo depoimento se encontra gravado, em declarações para memória futura, com a referência 20120203111510-546981-1495787, da acta de 3/02/2012, do Juízo de Instrução, e que se encontram transcritas a fls 197 a 203, assim a fls 202 refere : “Abriu o fecho e mostrou, só.” Juiz:’’ Mas mostrou e voltou a por para dentro ou ficou assim de fora?" Menor: “ Voltou a meter para dentro." G) A menor não referiu ter ficado perturbada ou sequer que tenha imaginado que o arguido pretendesse algo mais consigo, demonstrativo de tal realidade é o facto de nem se recordar quando é que viu o pénis do arguido, e não estamos a falar de uma criança pequena, mas sim de uma que já tinha feito 15 anos de idade que já está na fase da adolescência.

  6. Ou seja, para a menor B.... o facto de ter visto o pénis ao arguido não passou de um episódio sem quaisquer outras consequências.

  7. Veja-se que foi a própria mãe da menor que também confirmou essa ideia, cujo depoimento se encontra gravado com a referência 20130228122316-546981-1495787, da acta de 28/02/2013, a dizer ao minuto 8,24:”7em dificuldade no porquê da ruindade nessas coisas todas. Sabe que foi mal, que está mal, mas...’’ J) Por outro lado não se compreende como é que foi dado como provado no facto 6 da matéria provada, “ ...pedido que esta acatou.” Quando ao minuto 2,30 refere: " De repente ela toca-me e queria-se ir embora e eu disse: ó filha tem calma que já vamos. Eu nunca deduzi.” K) Após a reforma de 2007, para a consumação do crime p.p. no artigo 170° do Código Penal exige-se que o agente importune o menor, no caso concreto a B...., isto é, ponha real e efectivamente em perigo a sua liberdade de autodeterminação sexual.

  8. Como defendeu Pinto Albuquerque in Comentário do Código Penal à luz da CRP e CEDH, Univ. Católica Editora, LX 2008, pág. 468: “é necessária a comprovação de um “fundado receio da prática subsequente de um acto sexual com a vítima. ” M) O que, manifestamente, não se verificou no caso dos autos, não tendo sido referido nem pela menor, nem pela sua mãe, nem percepcionado pelas várias pessoas que se encontravam no local.

  9. Ora, como foi defendido no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, publicado in www.dasi.pt/itrp.nsf. de 06/05/2009, no processo n° 598/06.JAPRT.P1: Para que se preencha o tipo criminal do art. 170° do Código Penal é necessário que o acto exibicionista represente para a pessoa perante a qual é executado o perigo de que se lhe siga a prática de um acto sexual que ofenda a sua liberdade de autodeterminação sexual:" O) Como o próprio arguido acabou por confessar, sem querer terá mostrado o pénis à menor e esta, porque olhou para o arguido acabou por o ver.

  10. No entanto, foi única e exclusivamente o que se passou, vejam-se as declarações para memória futura e que constam transcritas dos autos, da menor B...., que contrariamente ao que parece querer resultar da douta sentença recorrida, sabia muito bem do que estava a falar.

  11. O crime de importunação sexual, na esteira do que já resultava do tipo do artigo 171° do Código penal, na redacção de 1995, para que a realidade fosse criminalizada o que exigia, tal como agora: era e é o facto de o acto dito exibicionista representar, para a pessoa perante a qual era praticado, um perigo de que se lhe seguisse a prática de um acto sexual, precisamente por consideração ao local do corpo tocado pelo agente; o legislador preferiu criminalizar tais comportamentos pelo “convite” que eles envolviam. Desta opção resulta claro que o que era punido, antes como agora, repetimos, não era o acto mas o perigo de agressão à liberdade sexual que ele representava:’’ - Acórdão da Relação do Porto já acima referido em N.

  12. Atendendo a que no caso da menor B.... tal não se provou, teria o tribunal, por falta de preenchimento dos elementos subjectivo e objectivo de absolver o arguido da prática do crime de importunação sexual de que foi acusado, e isto por ponderação de todos os elementos de prova produzidos.

  13. E, se o arguido deveria ter sido absolvido pela prática do crime p.p. pelo artigo 170° do C. P. em relação à menor B...., o mesmo se diga no que à adulta E....diz respeito, vejamos: T) O arguido foi condenado pelo crime de importunação sexual por ter adoptado comportamento exibicionista, mais concretamente, por ter tirado o pénis do “resguardo das calças que tinha vestidas, exibindo-o através do fecho das calças, enquanto se masturbava e olhava e sorria na direcção de E....”, com o propósito de a molestar e incomodar.

  14. Não é este o entendimento da defesa, ou seja ante a prova produzida o arguido teria de ser absolvido da prática de tal crime.

  15. Começamos por dizer que existem vários autores que pugnam pela descriminalização dos chamados actos exibicionistas, entre eles destacamos Maria do Carmo Saraiva de Menezes da Silva Dias, Juíza de Direito, Docente do CEJ, no seu trabalho “ Repercussões da Lei n.º 59/2007, de 4/9 “nos crimes contra a liberdade sexual (Secção I do Capitulo V do Título I da Parte Especial do Código Penal” onde afirma: “ O legislador prevê aqui(referindo-se ao crime de importunação sexual art. 170° do C.P.) duas condutas distintas, cujo elo de ligação (tratamento conjunto) apenas se justifica pela falta de coragem para descriminalizar os chamados "comportamentos exibicionistas".

  16. Continua afirmando: “Ficar importunado por ter de presenciar “ actos de carácter exibicionista” significa que a vítima ficou chocada com o que observou, o que se prende com a sua liberdade de acção (com a sua esfera pessoal e íntima) mas não ofende directamente a sua liberdade sexual, quando se trata de um adulto.” X) Perante esta exposição vejamos a reacção da ofendida, cujo depoimento se encontra gravado em declarações para memória futura com a referência 20130108142638-618567-1495785, da acta de 8/01/2013, quando a Meritíssima Juíza lhe perguntou, minuto 16,37: “Como é que ficou na sequência dessa situação que presenciou?" E....: “Na hora fiquei um bocado transtornada ...na hora pensei: o quiosque é um sítio que tem muitas crianças e às vezes fica lá a filha da Senhora... que tem 12 anos e se acontecesse com uma criança ó pá fiquei transtornada por causa disso mais. Era muito pior se acontecesse a uma criança do que comigo.

  17. Assim, a conduta do arguido foi apenas um acto fugaz que não exerceu qualquer tipo de coação sobre a testemunha, mas sim surpresa, como ela própria referiu, mas não limitou a liberdade sexual da testemunha, pelo que apenas poderá ser considerado um atentado ao “pudor”, o qual não é tutelado pelo direito, pois estamos a falar de um adulto.

  18. Reafirma-se o que já se referiu no que à menor diz respeito, como foi defendido no Acórdão da Relação do Porto, publicado in www.dasi.Dt/itrp.nsf. de 06/05/2009, no processo n.º 598/06.JAPRT.P1: Para que se preencha o tipo criminal do art. 170° do Código Penal é necessário que o acto exibicionista represente para a pessoa perante a qual é executado o perigo de que se lhe siga a prática de um acto sexual que ofenda a sua liberdade de autodeterminação sexual:” AA) O que não foi o caso como tal por falta da verificação dos elementos subjectivo e objectivos do tipo legal de crime, não se podendo aceitar, como ressalta da douta sentença de que se recorre, que o arguido agiu com dolo intenso, pois não teve qualquer intenção de incomodar as testemunhas.

    AB) Por dever de patrocínio e, na eventualidade de VaS EXas entenderem que se deverão manter as condenações, desde já o arguido requer que se...

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