Acórdão nº 1590/10.5TBLRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 20 de Maio de 2014
Magistrado Responsável | SÍLVIA PIRES |
Data da Resolução | 20 de Maio de 2014 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 3ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra Os Autores intentaram contra os Réus a presente acção declarativa sob a forma de processo ordinário, pedindo que se declare resolvido o contrato-promessa que identificam sob 1º a 4º na petição inicial e que se condene os demandados a entregarem-lhes a quantia de € 249.000,00, acrescida de juros de mora à taxa legal contados desde a citação até integral pagamento.
Para fundamentar a sua pretensão alegaram, em síntese: Ø Comprometeram-se a comprar e os Réus a venderem-lhes cinco terrenos sitos em …, pelo preço de € 124.700,00, pagos em dois momentos e metades, sendo a última aquando da realização da escritura em Novembro de 2007, obrigando-se outrossim os Réus a entregar neste último momento dois projetos para barracões aprovados pela Câmara Municipal com a área total de construção de 973,60 m2, e os AA. a avisar da data da celebração com quinze dias de antecedência.
Ø Na altura, Autores e Réus condicionaram a realização do contrato prometido à obtenção do licenciamento de dois projectos para barracões destinados à indústria.
Ø Os Réus deram entrada de dois projectos de licenciamento, a 8-6-2006 e a 3-7-2007, tendo em 29-11-2007 recebido o remanescente do preço.
Ø Porém, os Autores, após questionarem os Réus sobre o andamento do processo de licenciamento e da resposta positiva destes, enviaram a 13 de Outubro de 2010 cartas para resolução do problema, nada tendo sido respondido.
Ø Por fim, os Autores vieram a considerar rescindido o contrato-promessa por via de notificação judicial avulsa, tendo os Réus conhecido a mesma a 10 de Fevereiro de 2010.
Os Réus contestaram, alegando, em síntese: Ø Foi negociada a venda dos terrenos bem como a entrega de dois projectos, um que estava na Câmara quando foi assinado o contrato e outro que foi entregue depois, tendo os Autores tido acesso a toda a documentação para avaliar riscos, sendo pessoas experientes nestes negócios.
Ø Não foi acordado condicionarem a outorga do contrato prometido à obtenção de licenciamento sobre os projectos.
Ø Os Autores não marcaram a escritura como estavam obrigados e a partir da data aprazada seriam os Autores a promover o processo camarário, sendo que os Réus estiveram sempre disponíveis para assinar a escritura, tendo até marcado a sua realização por duas vezes, não tendo os Autores comparecido.
Concluíram pela improcedência da acção.
Os Autores, na réplica, alegaram que o Réu marido garantiu obter a aprovação municipal, tendo o seu desinteresse advindo da inviabilidade do licenciamento.
Pediram a condenação dos Réus como litigantes de má-fé e indemnização a seu favor no valor de €. 2.500,00 e no pagamento de despesas e honorários.
Veio a ser proferida sentença que julgou a causa nos seguintes termos: Por tudo exposto, decide-se: a) Julgar procedente a acção por provada e em consequência declarar resolvido o contrato promessa id. em § 6. a), condenando-se os RR. a entregar a quantia de cento e vinte e quatro mil e setecentos euros, acrescida de juros de mora à taxa legal desde 25-03-2010; b) Condenar os RR. como litigantes de má-fé na multa de cinco unidades de conta, determinando-se a audição das partes nos termos do art. 457 nº 2 do Código de Processo Civil; A indemnização aos Autores decorrente da litigância de má-fé pelos Réus veio a ser fixada em € 3.134,00.
Inconformados os Réus interpuseram recurso, formulando as seguintes conclusões: … Os Autores apresentaram resposta, defendendo a confirmação da decisão proferida.
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Do objecto do recurso Considerando que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegações dos Recorrentes, as questões a decidir são as seguintes: a) A resposta dada ao quesito 2º formulado na base instrutória deve ser alterada para não provado? b) Não é imputável aos Réus o incumprimento do contrato-promessa? e) Os Réus não usaram de má-fé quando deduziram contestação? 2. Dos factos Neste recurso os Réus pretendem, além do mais, que, após reapreciação da prova produzida, seja alterada a resposta ao quesito 2º formulado na base instrutória. Para a alteração pretendida invocam em 1º lugar o texto do contrato-promessa celebrado com os Autores e a impossibilidade decorrente do art.º 393º do C. Civil de não ser possível a utilização da prova testemunhal, uma vez que o facto que aquele visa não consta do texto do contrato.
Dispõe o art.º 393º do C. Civil: 1. Se a declaração negocial, por disposição da lei ou estipulação das partes, houver de ser reduzida a escrito ou necessitar de ser provada por escrito, não é admitida prova testemunhal.
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Também não é admitida prova por testemunhas, quando o facto estiver plenamente provado por documento ou por outro meio com força probatória plena.
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As regras dos números anteriores não são aplicáveis à simples interpretação do contexto do documento.
O n.º 1 deste preceito proíbe a prova testemunhal como meio de se determinar a existência de uma cláusula contratual quando se esteja perante um contrato que deva ser reduzido a escrito.
Ora, no caso que nos ocupa não se visa com o recurso à prova testemunhal o apuramento da existência de uma clausula contratual que não esteja expressa no acordo celebrado entre as partes, mas tão só a interpretação das declarações negociais escritas por aqueles contraentes no momento da celebração do contrato, pelo que estamos no domínio do n.º 3 daquele preceito, não estando, por isso, proibido o recurso à prova testemunhal.
Assim, visando-se determinar o alcance do contrato celebrado entre as partes e sendo para a sua determinação possível o recurso quer à prova testemunhal quer documental, passamos a apreciar a mesma.
… De todos estes depoimentos conjugados com os documentos juntos aos autos e que constituem fls. 14 e 15, que são os requerimentos dirigidos pelo Réu em 6.6.2006 e 26.6.2007 à Câmara Municipal com vista ao licenciamento da construção nos terrenos, do contrato-promessa celebrado com os Autores em 12.5.2007 e do contrato-promessa celebrado entre os Autores e J…, L.da, em 19.7.2007, resulta a convicção de que a aprovação dos projectos era essencial à celebração do contrato prometido, pois não faria sentido algum que, se assim não fosse, o Réu requeresse o licenciamento referente a um dos prédios, já depois de celebrado o contrato-promessa com os...
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